BENS NACIONAIS - OPINIÃO

Milton Flávio*
11/12/2001 14:36

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Não adianta querer tapar o sol com a peneira. Notícias recentemente divulgadas pela imprensa mostram que ainda há muito, mas muito mesmo, por se fazer na área da Educação, em todos os seus níveis. Os alunos brasileiros com quinze anos de idade tiveram um desempenho pífio no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), do qual participaram estudantes de trinta e dois países, vinte e oito desenvolvidos e quatro tidos como emergentes. Nossos alunos ficaram em último lugar. A média geral obtida pelos jovens no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano, por sua vez, também caiu - e muito - em relação à média do ano anterior.

Em ambas as provas, foi possível identificar a dificuldade que parte significativa dos adolescentes tem para entender o que está escrito. Bem ou mal, todos sabem juntar as sílabas; muitos, porém, não conseguem ir além disso. Uma lástima. Diante de tais resultados e dos artigos e editorais publicados na imprensa, é natural que o cidadão, justamente preocupado com o futuro dos filhos e da nação, fique tentado a imaginar que, na área educacional, vamos de mal a pior, por obra de um governo insensível, que nada faz pelos mais pobres etc.

O niilismo é uma doença infantil, fruto da ignorância, que, por sua vez, para usar uma expressão corriqueira, é o bem melhor distribuído no mundo. Eis um fato inegável: o de que todos nós, uns mais, outros menos, somos de fato ignorantes.

Não se pretende aqui fazer vistas grossas para as mazelas do ensino brasileiro. Elas são muitas e precisam ser - como estão sendo - enfrentadas. Nosso atraso é histórico. Como lembra o economista Cláudio de Moura Castro, na análise que fez sobre os resultados do Pisa, só conseguimos a universalização do ensino no final do século passado. Para que isso não pareça ao leitor desatento algo longínquo, convém lembrar que estamos terminando o primeiro ano de um novo século. Logo, o final do século passado foi anteontem. Em outros países, inclusive da América do Sul, a universalização do ensino foi conquistada no século XIX - há mais de cem anos, portanto.

Convém ainda lembrar que em 1920, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 65% dos brasileiros com mais de quinze anos de idade eram analfabetos. Nos últimos dez anos, esse índice caiu de 20% para 13%. Uma análise detalhada dos resultados do Enem mostra que a renda familiar e a escolaridade dos pais interferem significativamente no desempenho dos alunos. Registre-se que metade dos estudantes brasileiros que participaram do Pisa apresentava distorção entre a idade e a série. E isso é fruto do que se convencionou chamar de cultura da repetência - uma chaga que vem sendo combatida pelo atual governo.

Antes que me chamem de Polyanna, insisto: há muito, mas muito mesmo, a ser feito na área educacional. Mas, pela própria complexidade dos problemas, só um ingênuo ou oportunista pode imaginar que eles serão superados no curto prazo, ou a partir de uma portaria ou decreto ministerial. É preciso que haja um compromisso de todos - governos, famílias, empresários, educadores etc. -, com o desenvolvimento da educação. Não há mágica. Ela precisa ser, de fato, uma prioridade nacional. Não se formam bons professores de uma hora para outra, assim como não se consegue mudar o perfil educacional e econômico das famílias num piscar de olhos. Isso exige tempo, investimentos, políticas adequadas.

É curioso ver administradores públicos - que sempre defenderam a Educação - propor o corte de verbas para o setor, para que possam fazer obras mais vistosas, de maior retorno eleitoral. Tão curioso quanto ouvir gente graúda, useira e vezeira na prática da sonegação, exigir maiores investimentos do governo em Educação. Como se percebe, o cinismo, ao exemplo do niilismo, é igualmente um bem fartamente distribuído.

*Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB, presidente da Comissão de Assuntos Internacionais da Assembléia Legislativa de São Paulo e da União de Parlamentares do Mercosul (UPM)

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