Mordendo o próprio rabo

Opinião
05/05/2005 16:39

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Correndo o risco de parecer como o "chato de plantão", sinto a obrigação de me manifestar. A economia brasileira começa a apresentar sinais de desaquecimento, demonstrando que o ufanismo da propaganda oficial não pode mascarar os erros na condução da política econômica do governo Lula. A taxa de desemprego subiu para 10,8% nas grandes capitais; setores como os de calçados, têxtil, automotivo e de brinquedos já começam a reclamar da dificuldade de fechar novos contratos de exportação; a Serasa apontou novo recorde de inadimplência; o setor da soja já começa a ensaiar uma crise, diante da quebra da safra e da queda dos preços internacionais. Esses são só alguns exemplos de que a retomada do crescimento econômico pode não se sustentar. Infelizmente, para todos nós brasileiros.

O governo festeja o superávit comercial, mesmo sem uma política de atuação na questão cambial, e mantém um rigoroso controle monetário para cumprir sua meta de inflação. A questão agora é saber até quando o setor produtivo vai suportar a apreciação do real, o aumento dos juros e a falta de investimentos em infra-estrutura.

Parece um cachorro querendo morder o próprio rabo. Acredito que a forma mais consistente de combate à inflação é estimular investimentos privados na economia, em, com isso, elevar a oferta de bens e serviços. Com isso, seria possível compatibilizar o crescimento com inflação baixa, pois eliminaria a pressão permanente de reajustes de preços a cada vez que aumenta a demanda. Ou seja, o combate à inflação deve ser feito via aumento da produção interna " e não via contenção do consumo.

Mas, o que explica essa insegurança do setor privado em investir? Basicamente, a falta de investimentos em infra-estrutura e a queda da demanda interna, resultado da baixa renda da população somada à elevação contínua da taxa de juros. Juros, estes, que começaram a subir em setembro de 2004 e, hoje, estão em 19,5% (taxa Selic) e, ao que parece, são baixíssimas as chances de queda no neste primeiro semestre.

Só para efeito de análise, o setor elétrico demanda investimentos da ordem de R$ 5,5 bilhões por ano para afastar definitivamente o fantasma do racionamento. Já no setor de transportes, especialistas defendem que é preciso investir R$ 6 bilhões por ano, até 2009, para evitar um apagão logístico. Além disso, está crescendo a parcela da população que ganha até um salário mínimo " em 2002, eram 11,1% do total de empregados, mas, no mesmo período de 2005, o percentual saltou para 16,7%. Isso sem falar no número de desempregados que voltou a subir.

Nessa sinuca de bico, encontra-se a nossa política econômica.

Hoje, as previsões de crescimento já estão sendo revistas, a capitação de recursos externos diminuindo, imaginemos se a isto se somar alguma turbulência internacional. A cada dia que passa, crescem as suspeitas, até dentro do próprio governo, de que a reversão da economia poderia se dar em pleno ano eleitoral. Ao invés de alterações, a equipe econômica reforça o discurso ortodoxo que é melhor o governo apertar o cinto agora, comprometendo o nosso crescimento, do que ser obrigado a fazê-lo de forma mais dura no próximo ano, caso haja uma ameaça inflacionária. Essa seria a teoria do "capitão do caos", em que o governo teria uma massa de manobra para começar a baixar os juros a partir do final deste ano, criando um clima econômico positivo para as pretensões políticas de Lula em 2006.

Diante deste quadro, o brasileiro ainda tem que engolir a seco a acusação do presidente Lula de que a população é "incapaz de levantar o traseiro de uma cadeira" para procurar taxas de juros mais baratas. Acredito, que o presidente deveria parar de achar que está voando em céu de brigadeiro, no seu novo avião, e acompanhar de perto a via sacra de todo trabalhador para conseguir sobreviver em meio a essa política econômica perversa.



*Arnaldo Jardim é líder do PPS na Assembléia Legislativa

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