Opinião - Direitos humanos para policiais


28/08/2012 10:19 | Geraldo Cruz*

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Em São Paulo, policiais e civis vivem uma guerra cujo resultado são mortos e feridos nos dois grupos, que vem se intensificando nos últimos anos. De acordo com dados oficiais, disponibilizados na página da Secretaria de Segurança Pública, em 2009 foram 19 pessoas mortas por policiais em serviço, número que saltou para 33 em 2011. Policiais em dias de folga mataram outras 6 pessoas em 2009 e 20 em 2011, ou seja, quase três vezes mais.

Foram 36 pessoas feridas por policiais em serviço, em 2009, e 60 em 2011. Em dias de folga, policiais feriram 5 pessoas em 2009 e, dois anos depois, foram 12 feridos.

A estatística demonstra ainda que 6 policiais morreram no exercício da profissão em 2009 e outros 9, em 2011; também, 54 ficaram feridos em 2009 e 78 em 2011.

Não é o caso de fazer contas de proporcionalidade para descobrir quem matou ou morreu mais. Tampouco gastar energia com construção de hipóteses sobre circunstâncias ou condutas de um e outro lado.

Os dados demonstram que vidas humanas foram sacrificadas; e pessoas foram mutiladas por ferimentos. Tendo em vista que não vivemos um Estado de exceção, a pergunta é: o que governantes têm feito para promover o "cessar fogo" entre nós, paulistas, sejamos civis ou policiais.

Dirigentes da polícia, reconhecendo a violência institucionalizada à corporação, têm falado na criação de um bônus financeiro para os profissionais da segurança com bom desempenho. Estão previstos cinco "indicadores de qualidade": 1) redução de indicadores criminais; 2) produtividade operacional (como quantidade de droga apreendida); 3) índice de satisfação da população; 4) índice de confiança da população; e 5) índice de integridade dos policiais.

O último gerou polêmica não apenas pelo ato falho cometido pelo comandante-geral Roberval França no anúncio do estudo, em 10/8, mas pela dificuldade em estabelecer os indicadores. Como medir a integridade dos policias? Ainda não foi definido, mas o governo já avisou que não pretende avaliar atitudes individuais, mas de batalhões; e que a ideia é estimular policiais a manterem-se fiéis à sua missão de proteger e servir a população.

A dificuldade do governo estadual em estabelecer o indicador de integridade é consequência da tensão que existe em torno da compreensão da missão da Polícia.

Embora oficialmente a proteção e o serviço à comunidade sejam ressaltados, na prática a polícia de São Paulo é formada, prioritariamente, para exercer a violência, em suas mais diversas formas.

No início do mês, entrevistamos Adilson Paes de Souza, tenente-coronel da reserva que defendeu recentemente dissertação de mestrado em que investigou a formação de policiais em São Paulo.

A pesquisa evidencia que o Estado não se empenha em capacitar profissionais para a valorização da cultura da paz, que pressupõe o respeito aos direitos de todas as pessoas, em qualquer situação. Na formação dos policiais militares, por exemplo, de 6.107 horas de aula, apenas 90, cerca de 1,5% do total, são destinadas ao tema direitos humanos.

Não é exagero afirmar que o Estado treina os policiais para serem violentos. Mas as precárias condições de trabalho desses profissionais indicam que esta formação não é apenas ideológica " a propalada crença que "bandido bom é bandido morto". Trata-se de uma forma de gestão da política de segurança.

A brutalidade exige menos recursos. A segurança pública preventiva, que preserva as vidas das pessoas envolvidas em conflitos, usando ou não fardas, requer salários justos, equipamentos de inteligência e, acima de tudo, vontade política para, de todas as formas e em todas as instituições, afirmar a ideia de que qualquer pessoa só é boa quando viva; e que heróis e algozes só ficam bem na ficção.



*Geraldo Cruz é deputado estadual pelo PT

alesp