Opinião - Violência e colonialismo


07/06/2013 10:48 | Vitor Sapienza*

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Sempre tivemos por hábito copiar o que vemos em outros países. E isso passa a ser quase que uma característica das nações mais novas, e, em muitos casos, resquícios do colonialismo. E quando citamos o termo devemos destacar que o colonialismo pode ser cultural, econômico e político. Fiquemos com o cultural, afinal é a partir da desestruturação da cultura que nasce o domínio. Foi e será sempre assim.

Apenas para ilustrar, basta lembrar o que fizemos com os nossos índios. Primeiro mandamos os nossos sertanistas, que fizeram os contatos; depois conseguimos a aproximação, a entrada na aldeia, a doação de presentes e iniciamos o convívio. E o índio começou a se alimentar de nossa cultura, considerada mais forte.

Com o tempo ele abandonou as suas raízes, adotou a roupa de etiqueta importada e aceitou os nossos hábitos. E a sua cultura foi sendo relegada a um segundo plano. E falamos cultura como o somatório de religião, artesanato, política, folclore. O nosso índio tem carteira de identidade, usa calçado importado, adotou a tecnologia e se mistura com qualquer manifestante, seja em área urbana ou na floresta, de onde ele vai, aos poucos, se afastando. A sua cultura foi pulverizada e caminha para o desaparecimento.

Usei três longos parágrafos para falar do hábito de copiar coisas que vemos em outras culturas e que nem sempre soam benéficas para nós. Bem sabemos do poder da indústria armamentista americana. Graças a esse poder, qualquer cidadão pode manter um arsenal em casa, ensinar as crianças a manipularem armas sofisticadas e, em muitos casos, demonstrar a sua habilidade atirando contra alvos vivos, estejam eles em uma escola ou uma avenida. No nosso caso, ainda não atingimos esse estágio, mas a preocupação é muito grande.

Apesar de nossa experiência de homem público, e sempre em contato com todos os segmentos de nossa sociedade, confesso que não tenho certeza da existência, entre nós, de algum tipo de pressão da indústria armamentista sobre o controle de fronteiras, o que impediria a ingresso de armas em nosso território. Se não existe a pressão, pode existir a inoperância, a omissão, ou a corrupção por parte de quem deveria impedir a entrada de armas. O fato é que elas estão aí, e a cada dia com uma sofisticação maior. E o mais grave: nas mãos das pessoas erradas.

Armas em punho, maldade à mostra, e consciência da impunidade, o crime vai ficando cada dia mais corriqueiro, mais comum, e transita em todos os setores da sociedade. Ele pode estar disfarçado no andar de cima, no prédio de classe média, onde o barulho do vizinho é o suficiente para a violência; ou nos bairros mais sofisticados, onde um simples telefone móvel, ou um relógio mais caro, seria justificativa; ou na periferia, onde todos têm a democrática situação de vítima, no trabalho, em casa ou na rua, onde predomina a trágica ironia da tal "bola da vez".

Na nossa condição de colonizados, só não absorvemos a importação acentuada nem o ensino massificado do uso de armas, tão comuns nos Estados Unidos. Mas isso pode ser questão de tempo. Tudo faz crer que o governo concorda que os nossos criminosos são mais humildes, que preferem a ilegalidade da importação e o empirismo do improviso. E enquanto isso a sociedade produtiva paga a conta acumulando cruzes, somando dores e exercendo em sua plenitude a condição de ingênuos e omissos. Ingênuos por pensar que nada pode ser mudado; omissos porque isso está virando uma característica nossa, as pessoas de bem.

*Vitor Sapienza é deputado estadual (PPS), ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, economista e agente fiscal de rendas aposentado.

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