Opinião: Manifestações: para onde iremos?


27/06/2013 17:28 | Marco Aurélio*

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Muito se tem falado sobre as manifestações públicas ocorridas nos últimos dias. Uns contrários, outros favoráveis e outros indiferentes. Algumas pessoas me perguntam o que eu penso a respeito, e tenho citado o livro Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago.

No livro, que virou filme, há uma cena que me vem à mente neste momento: quase todos ficam cegos, e a única pessoa que enxerga, ao andar pelas ruas, vê supermercados saqueados e muitas pessoas nas ruas, sem saber o que fazer, e grupos ouvindo pseudolíderes com os mais variados discursos, em uma praça, cada um com seu grupo de ouvintes. Vejo certa semelhança entre a cena descrita no livro e o que está ocorrendo no Brasil.

Manifestações sem líderes, ao menos claramente identificados, sem bandeiras definidas, com inúmeros analistas falando a respeito, inclusive apresentadores de programas de TV, e políticos que ontem diziam "a" hoje dizendo "b". Até ontem, para Geraldo Alckmin (PSDB), eram baderneiros que deviam ser reprimidos. Depois, mudou para manifestantes que têm de ser ouvidos.

Vejo uma série de contradições: é um movimento que defende a livre mobilidade, mas impede o trânsito de veículos por longas horas; vibra pela liberdade, mas expulsa e rasga bandeira de partidários; defende empregos, mas deixou, por exemplo, 40 desempregados ao destruir, durante os protestos, um supermercado em São Vicente; movimento que luta por melhores condições sociais, mas em São Bernardo do Campo, arrasou uma família que vivia de uma banca de jornal, destroçada durante as manifestações.

A Rede Globo diz que "é um movimento pacífico", mas não coloca jornalistas claramente identificados (nem no microfone) para a cobertura das manifestações.

Com tanta contradição, o que está por trás disso tudo? Vejo pessoas de bem vibrando com a manifestação, mas temo que estejam sendo usadas por outros que se ocultam.

Lembro-me das coberturas jornalísticas, sobretudo televisivas, de movimentos ocorridos em anos anteriores, como a greve dos petroleiros, durante o governo FHC. Destacavam-se os prejuízos causados pelos movimentos, desqualificando-os e fortalecendo as ações governamentais.

Como no poder político forças populares avançaram, a cobertura jornalística mudou. Agora são pessoas que vão às ruas em busca de seus direitos, contra um governo constituído. Parece uma campanha para enfraquecimento de um espaço de poder democrático, visando fortalecer outros espaços onde os ares da democracia ainda não chegaram.

Por exemplo, podemos falar em democracia nos meios de comunicação? No Poder Judiciário? No Ministério Público? Instituições não democráticas ficam quase ilesas das tradicionais análises feitas desse movimento.

De toda forma, existe uma responsabilidade dos poderes democráticos em ouvir a voz das manifestações e promover mudanças necessárias, como legislação eleitoral, tributária, lei de licitações, reforma agrária e democratização dos grandes meios de comunicação.

Oxalá que essas mudanças sejam feitas, para que o movimento não seja cooptado por forças conservadoras, provocando um retrocesso num país que tem vencido o desemprego e a crise internacional, melhorando as condições de vida de todos, sobretudo dos menos favorecidos.

Pelo fim das repressões violentas e vandalismos inconsequentes e pelo avanço das conquistas sociais, fortalecendo a democracia e valorizando a participação popular. Estas devem ser as bandeiras de todos nós, nas ruas, nas fábricas, nas escolas, nas comunidades, enfim, onde estivermos, para construirmos juntos um país cada vez melhor.

*Marco Aurélio é deputado estadual pelo PT.

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