Comissão da Verdade recebe professora e pesquisadora argentina Pilar Calveiro

De 15 a 20 mil argentinos passaram por campos de extermínio, dos quais 90% desapareceram
30/10/2013 21:09 | Da Redação Fotos: Roberto Navarro

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Janaina Teles, Pilar Calveiro, Adriano Diogo, Rosa Cardoso, Marcos Orione e Alberto Albiero <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg132074.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Audiência pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg132076.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Nesta quarta-feira, 30/10, a  Comissão da Verdade do Estado de São Paulo recebe a professora e pesquisadora argentina Pilar Calveiro<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg132077.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> .<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg132078.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, presidida pelo deputado Adriano Diogo (PT), realizou, nesta quarta-feira, 30/10, audiência pública com a presença da escritora argentina Pilar Calveiro, para debater seu livro Poder e Desaparecimento: os Campos de Concentração na Argentina.

Pilar Calveiro é cientista política, professora e pesquisadora na Universidade Autônoma de Puebla. Doutorou-se em Ciência Política pela Universidade Nacional do México, onde se exilou depois de ter sido sequestrada durante a ditadura militar argentina, nos anos 1970. É autora de trabalhos publicados no México, na Argentina e na França e, além de Poder e desaparecimento, lançado originalmente em 2008, publicou Desapariciones: Memoria y Desmemoria de los Campos de Concentración Argentinos (Taurus, 2002).

Poder e Desaparecimento é uma reflexão sobre os campos de extermínio criados na ditadura militar argentina. A autora, que esteve presa e sobreviveu aos campos, analisa as dinâmicas de poder nas experiências do dia a dia nos campos e, de maneira mais ampla, o horror do regime autoritário. Pilar mostra que a experiência nos campos de concentração não foi um fenômeno isolado, mas parte de uma dinâmica arraigada na sociedade.

Alberto Albiero, advogado do Grupo de Memória da Convergência Socialista, afirmou que a experiência argentina, de punição aos torturadores e mandantes de crimes políticos, é fundamental para a redemocratização no Brasil. Marcos Orione, da Boitempo Editorial, editora do livro de Pilar, apresentou a obra da autora, enfatizando sua importância para o processo de redemocratização na Argentina e no Brasil.

Continuidade do autoritarismo

"Essa extraordinária militante argentina tem se dedicado a discutir o autoritarismo e o totalitarismo, em especial o desaparecimento forçado, que aconteceu na Argentina e no Brasil como política de Estado. Trata-se de uma reflexão de caráter humanista, ético e filosófico", afirmou Rosa Cardoso, da Comissão Nacional da Verdade, associando o recente caso brasileiro de Amarildo à mesma prática. "O Amarildo é um caso emblemático da continuidade dessa política por agentes do Estado", observou.

Para a historiadora Janaína Teles, o livro de Pilar é "uma das mais lúcidas abordagens do aparato repressivo na Argentina". De 15 a 20 mil pessoas passaram por campos de concentração e extermínio na Argentina, das quais 90% desapareceram. "Este foi o método por excelência da repressão argentina", analisou Janaína, observando que, no Brasil, a diversificação dos métodos repressivos permitiu a manutenção de uma aparência de normalidade ao status quo. "No Brasil, a apuração dos crimes da ditadura foi menos efetiva do que na Argentina. Cabe modificarmos este quadro", declarou.

Trechos do livro Poder e Desaparecimento: os Campos de Concentração na Argentina

"Na história humana não existem parênteses inexplicáveis. E é precisamente nos períodos de "exceção" " esses momentos infelizes e desagradáveis que as sociedades pretendem esquecer e colocar entre parênteses " que aparecem, sem mediações nem atenuantes, os segredos e as vergonhas do poder cotidiano. A análise do campo de concentração como modalidade repressiva pode ser uma das chaves para compreender as características de um poder que circulou em todo o tecido social e que não pode ter desaparecido. Se a ilusão do poder está em sua capacidade de fazer desaparecer o disfuncional, não menos ilusório é a sociedade civil supor que o poder desaparecedor desapareça através de uma mágica inexistente."

"Os campos de concentração, esse segredo altissonante que todos temem, muitos desconhecem e alguns negam, somente é possível quando a tentativa totalizadora do Estado encontra sua expressão molecular, penetra profundamente na sociedade, permeando-a e dela se nutrindo. Por isso constituem uma modalidade repressiva específica, cuja particularidade não se pode desdenhar. Não existem campos de concentração em todas as sociedades. Há muitos poderes assassinos; é quase possível afirmar que todos o são em certo sentido. Mas nem todos os poderes são concentracionários. Explorar suas características, sua modalidade específica de controle e repressão, é uma forma de falar da própria sociedade e das características do poder que então se instaurou e que se ramifica e reaparece, às vezes idêntico e às vezes modificado, no poder que hoje circula e se reproduz."

"O poder muda e reaparece, a cada vez diferente e igual. Suas formas são subsumidas, tornam-se subterrâneas, para aparecer novamente e renascer. Acredito que um exercício interessante seria tentar compreender como se recicla o poder desaparecedor. Quais são suas desintegrações e suas amnésias nesta pós-modernidade. Como reprime e totaliza, embora se manifeste no mais radical individualismo. Quais são suas esquizofrenias e como se nutre das falsas separações entre o que é individual e o que é social. Como conservar a memória, encontrar suas fissuras, e sobreviver a ele."

alesp