Opinião - Em busca do mártir ideal


27/02/2014 10:53 | Vitor Sapienza*

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São dois fatos antigos, muito representativos e de repercussão mundial: os assassinatos do sertanista Chico Mendes e da missionária Doroty, ocorridos em regiões distantes dos grandes centros. Em ambos os casos havia interesses na disputa pela terra. E todos sabem o desgaste que isso provocou na imagem de nosso país. Trazendo o problema para as regiões urbanas, recordemos outros fatos mais recentes ocorridos no Rio de Janeiro, os assassinatos do jornalista Tim Lopes e agora, do cinegrafista de Rede Bandeirantes de Televisão.

Por uma simples coincidência, os fatos citados ocorreram fora de São Paulo, mas poderiam ocorrer em qualquer canto deste país. Há muito tempo aceitamos a violência como rotina, e apenas vai às manchetes quando o atingido pertence ao rol das personalidades mais conhecidas, ou integram este ou aquele segmento que tem força ou poder para erguer a voz. Nos demais casos, onde os atingidos são o povão ou policiais, salvo raras exceções, o crime servirá apenas para alimentar as estatísticas.

Esse quadro, que retrata bem a violência em nosso país, nos dá a oportunidade para alguns questionamentos: até quando a situação persistirá? Quando teremos, de fato, um controle rígido nas fronteiras, impedindo a entrada de armas e drogas em nosso país? Quando as nossas leis serão adequadas à nossa realidade? Quando a impunidade deixará de ser uma característica de nosso país?

Até agora, crimes como os citados acima serviram apenas para motivar protestos por parte de parentes e amigos dos envolvidos, e em este ou aquele caso, chamaram a atenção de correspondentes das agências de notícias do exterior. Fora isso, ficamos à mercê de novas tragédias até que outras, de igual ou superior proporção, consigam mexer com os nossos brios.

A verdade é que somos movidos a pedal, quando o nosso veículo precisa de propulsão nuclear. Precisou o sangue de muitas mulheres até que fizéssemos uma legislação específica, punindo os agressores. Nos crimes de pedofilia, praticamente agora é que começamos a implantar medidas rigorosas; nos crimes de Internet, ainda estamos engatinhando. No combate ao tráfico internacional, estamos muito aquém do necessário. O mesmo acontece no tráfico de armas. Isso, sem contar o atraso na nossa legislação e nas falhas do nosso sistema penal.

Assim, dentro de nossa mania de questionar, fica a mais contundente das perguntas: qual será o mártir ideal para que possamos, de fato, dar uma guinada em nossa postura e, de uma vez por todas colocarmos o país nos eixos? E qualquer que seja a resposta, ela será muito dolorida para nós, como sociedade civilizada. E, nesse dia, certamente estaremos vertendo lágrimas inesquecíveis, fruto de nossa omissão e do hábito de se jogar o lixo sob o tapete. Resta saber apenas qual é o tamanho do tapete, ou o volume que ele consegue encobrir.

* Vitor Sapienza é deputado estadual (PPS), ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, economista e agente fiscal de rendas aposentado

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