Opinião: Os equívocos da Secretaria de Educação com as salas de leitura


24/02/2016 09:48 | Carlos Giannazi*

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Janeiro caminhava para o final quando a Secretaria de Educação fez valer sua autoridade central e publicou a Resolução SE 14, de 20/01/2016, dispondo sobre "Salas e Ambientes de Leitura nas Escolas da Rede Pública Estadual", alterando pontos da Resolução SE 70/2011, sobre o mesmo assunto.

Há, pelo menos, quatro equívocos nestes documentos legais.

O primeiro, talvez o maior deles, é nomear o espaço pedagógico como "salas e ambientes de leitura". Digo nomear, pois em nenhuma das resoluções houve preocupação em definir o que se entende por isso. Ambiente de leitura é toda a escola, convenhamos (ou então a escola não faz sentido). Sala de leitura é um conceito recente, de cerca de 30 ou 35 anos, em que se determina um espaço dentro da escola onde ocorrerão ações de mediação de leitura propostas por um mediador para os leitores (iniciantes ou não). Longe de ser um espaço improvisado, é um espaço privilegiado da ação pedagógica, diferente do predomínio de ações de "gerenciamento", "responsabilização pelo espaço" e "domínio de técnicas de informática" propostas nos documentos legais. Com todas " e tantas " "atribuições" do "professor responsável", pouco tempo sobrará para a mediação da leitura, essência do ato pedagógico desse equipamento docente.

Outro engano, decorrente desse primeiro, é o perfil do docente escolhido para exercer as tantas e muitas atribuições. Seria de imaginar, como fazem algumas redes públicas ao escolher o professor mediador de leitura, que a escolha recaísse sobre um educador que seja leitor, que conheça livros, que seja aberto ao diálogo, que tenha facilidade em conversar com leitores sobre livros e seus assuntos etc. Como falamos e escrevemos há mais de 30 anos: não se ensina aquilo que não se conhece e do que não se gosta. Os burocratas da secretaria tomaram o caminho mais fácil, o da economia de recursos: a escolha deverá incidir em professores que não estão em regência (readaptados, adidos e ocupantes de função atividade). Raciocínio econômico: não se tira ninguém da sala de aula e ocupa-se um docente que não está em regência. Nada contra escolher um profissional que não está na regência de aulas para ocupar a função de "responsável pela sala ou ambiente de leitura", desde que ele tenha o perfil adequado para um mediador de leitura. Ressalve-se aqui que há inúmeros professores readaptados fazendo trabalhos belíssimos de mediação de leitura em escolas estaduais, antes mesmo dessas resoluções e apesar das condições de trabalho. Mas não é disto que estamos tratando: criticamos o viés do critério de escolha.

Mais um equívoco: determinar que apenas um docente ocupe essa função, não importando o tamanho de cada escola, o número de alunos e de professores. Que se lasque o infeliz escolhido, que terá de fazer do seu horário de trabalho uma colcha de retalhos, um estica e puxa, um sobe e desce, um vem e vai. No mínimo dois docentes, e ainda torcer para que sobre um pouco de tempo para a mediação de leitura.

Por último, nestes breves comentários, mais uma vez é exposta a visão centralizadora dos burocratas da Educação: fica determinado que o diretor da escola fará a escolha do docente. Já há muitas experiências em redes públicas em que a escolha é feita dentre os interessados, com perfil apropriado, por todos os educadores da escola " afinal, o escolhido trabalhará com todos e não apenas com o diretor da escola.

Estas anotações nos fazem crer que os tais burocratas não estão nem um pouco preocupados com a qualidade da mediação de leitura e apenas "cumprem tabela" editando legislação que efetivamente não dá conta da complexidade e da importância que o tema "leitura" na escola pública deveria merecer.

Com a palavra o secretário da Educação.

*Carlos Giannazi é deputado estadual e membro titular da Comissão de Educação e Cultura.

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