Opinião: Cpi da Merenda avança com pressão social


25/05/2016 14:30 | Enio Tatto*

Compartilhar:


No dia 19 de janeiro deste ano, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e a Polícia Civil deflagraram a Operação Alba Branca. Após meses de investigação, essas instituições identificaram a ocorrência de fraude na compra de alimentos para a merenda de escolas de prefeituras e da rede pública do Estado de São Paulo.

Em uma ponta do esquema, de acordo o MP-SP, estava a Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf), sediada em Bebedouro, que forjava contratos e adulterava o preço dos alimentos. Do outro lado, dentre os maiores beneficiários da fraude, estava o ex-chefe de gabinete da Casa Civil do governo estadual, que foi flagrado em telefonemas interceptados com autorização judicial orientando o lobista sobre como proceder em relação aos aditivos de contrato da Secretaria de Estado da Educação com a Coaf. De acordo com um dos funcionários da Coaf, o servidor teria pedido R$ 40 mil em espécie para "fazer o que fosse necessário" para aditar o contrato.

Levantamento preliminar do Ministério Público dá conta de que as irregularidades nas licitações da merenda no governo Geraldo Alckmin, do PSDB, podem ter levado ao desvio de pelo menos R$ 7 milhões em contratos com o Poder Público e R$ 2 milhões em propinas, que eram entregues a lobistas e servidores públicos, quase sempre em dinheiro.

Diante da gravidade dos fatos, com o objetivo de vê-los esclarecidos e no exercício da função fiscalizadora característica da atividade parlamentar, a bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa requereu a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para fortalecer as apurações que tinham se iniciado.

O número de assinaturas, entretanto, não foi suficiente para que o requerimento fosse protocolado, isso por que a base governista recusou-se a apoiar a investigação de mais um escândalo no Estado de São Paulo. Comportamento recorrente, aliás, pois foi assim que agiu quando vieram à tona as denúncias envolvendo o Metrô, a Siemens, a Alstom, a CPTM, o Rodoanel e a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), entre outras. Com o escândalo da merenda, os parlamentares ligados ao governo de novo cederam à ação do Executivo para bloquear prerrogativas do Poder Legislativo.

Foi nesse cenário que, no último dia 3 de maio, aproximadamente 70 estudantes ocuparam o plenário Juscelino Kubitschek da Assembleia para reivindicar a abertura da comissão de inquérito. Foram quatro dias de ocupação, encerrada após determinação judicial. A presença do grupo deu visibilidade à tentativa de acobertamento do escândalo e foi decisiva para que os governistas apresentassem um novo pedido de CPI da Merenda e afirmassem ter o número necessário de assinaturas para que fosse protocolizada.

A nova proposta não é a originalmente apresentada pelo PT e peca por ampliar demasiadamente o escopo da investigação, incluindo todas as escolas estaduais e todos os municípios que firmaram contratos com a Coaf. Mesmo assim, sua tramitação abrirá espaço para o aprofundamento das apurações.

Apesar desse avanço, ainda há desafios a serem enfrentados. Um deles está na escolha do presidente e do relator da comissão. Como quem preside CPIs, tradicionalmente, é quem a requer, sua presidência pode ficar com o DEM, autor do último requerimento apresentado. O DEM, como se sabe, aliado histórico do governador, pode não agir com a devida imparcialidade no caso. Por possuir a segunda maior bancada e em respeito ao princípio da proporcionalidade, ao PT caberia pelos menos um desses cargos.

A instalação e o pleno funcionamento da CPI da Merenda vai exigir uma ação constante dos parlamentares da Alesp comprometidos com a conclusão de seus trabalhos. Outra vez, a oposição na Assembleia terá de enfrentar os mecanismos de impunidade que as gestões tucanas construíram em São Paulo. Agora, todavia, está fortalecida pela presença de estudantes que se mobilizam em defesa da transparência e da relevância social dos atos de seus governantes.

*Enio Tatto é deputado estadual pelo PT e 1º Secretário da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa.

alesp