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DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA      001ªSS

DATA:99/03/29

           

 

O SR. PRESIDENTE - VANDERLEI MACRIS - PSDB -  Esta Presidência passa a nomear as autoridades presentes: Sr. Jon Aizpúrua, presidente da Confederação Espírita Pan-Americana; Dr . Roberto Brólio, presidente da Associação Médica Espírita do Brasil,  representando a Dra. Marlene Nobre; Sr. Dr . Paulo Toledo Machado, presidente do Instituto de Cultura Espírita de São Paulo; Sr. Dr . Milton Rubens Medran Moreira, 2º vice-presidente da Confederação Espírita de São Paulo; Sr. Eden Dutra Nascimento,  presidente de honra do Centro Espírita José Barroso; Dr.  Roberto Palazzi Ribeiro, diretor do Museu Espírita de São Paulo; Sra. Zélia Lopes, diretora e 1ª secretária, representando o Centro Espírita Nosso Lar, Casas André Luiz, Srs. Deputados, esta sessão solene foi convocada por esta Presidência, atendendo  à solicitação do nobre Deputado Alberto Calvo, com a finalidade de comemorar o aniversário de Allan Kardec.

            Convido a todos para, de pé, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, executado pela Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

 

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            - É executado o Hino Nacional.

 

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            O SR. PRESIDENTE - VANDERLEI MACRIS - PSDB -  Srs. Deputados, tenho a honra de, acompanhando a tradição desta Casa, transmitir a presidência desta sessão ao nobre Deputado Alberto Calvo, seu solicitante.

                       O Deputado Alberto Calvo é um parlamentar que, com sua atuação, fortalece a Assembléia Legislativa e dignifica a representação do Partido Socialista Brasileiro neste parlamento.

                       Aos que hoje aqui comparecem para relembrar o aniversário de Allan Kardec, quero registrar que é com muito orgulho que a Assembléia legislativa abre as suas portas para os que pretendem prestar esta justa homenagem. Esta Casa é de todos nós.

É com muito orgulho que transmito, a partir deste momento, a presidência dos trabalhos ao nobre integrante deste parlamento, Deputado kardecista, Alberto Calvo.

                      

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            - Assume a Presidência o Sr. Alberto Calvo.

 

 

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O SR. PRESIDENTE ALBERTO CALVO - PSB -  Tem a palavra a nobre Deputada Edir Sales.

 

A SRA. EDIR SALES - SEM REVISÃO DA ORADORA - Gostaria de aproveitar este momento solene para agradecer a Deus a oportunidade de estarmos aqui reunidos em nome de Deus, pedindo a Deus bastante serenidade, bastante tranqüilidade e sabedoria para podermos enfrentar todos os obstáculos e vicissitudes que os dias de hoje nos põem a par.

            Neste momento, temos de ser fortes e manter nossa faixa vibratória da melhor qualidade.  Uma sintonia plena com nosso ser maior, com o plano espiritual maior, aquele que nos encaminha sempre para o lado do bem, aquele que nos desvirtua do lado do mal, apesar de existir a lei do livre arbítrio, que nos dá condições de fazermos o bem e o mal.  Sabemos que a porta estreita é um caminho muito mais difícil do que a porta larga, não é verdade?  E é pela porta estreita que estamos caminhando todos os dias.

A doutrina espírita de Allan Kardec.  O que é Allan Kardec?  Um homem sábio, que veio para nós e nos mostrou a sabedoria, o consolo das almas.  A doutrina espírita, todos sabem, não é uma religião, é uma filosofia, uma ciência, não é?  É aquela que nos ensina todos os dias a praticar a reforma íntima, mas não aquela reforma íntima falada na teoria simplesmente, apesar de a teoria ser muito importante, pois sem ela nosso conhecimento e nossa prática ficariam muito mais difíceis.  E, no mundo de hoje, quem conseguir colocar em prática pelo menos no dia-a-dia um pouco dessa reforma íntima com certeza estará atingindo um estágio melhor.

Agradecemos ao nobre Deputado Alberto Calvo pela iniciativa de nos reunir aqui, assim como ao Presidente da Casa, o nobre Deputado Vanderlei Macris.  Da mesma forma, congratulamos também nossos irmãos espíritas que aqui compareceram.

Pedimos que todos os mentores do bem estejam aqui e que, quando forem para casa, que eles continuem com vocês todos os dias de suas vidas.

Obrigada.  (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ALBERTO CALVO - PSB - Esta Presidência concede a palavra ao Sr. Dr. Roberto Brolio, vice-Presidente da Associação Médico-Espírita do Brasil, representando aquela nobre entidade e a Dra. Marlene Nobre.

 

O SR. ROBERTO BROLIO - Queridos amigos, companheiros de doutrina e de ideais cristãos, é uma alegria estar aqui com vocês e poder transmitir-lhes algumas palavras.

Na verdade, não pensava ser honrado com esta oportunidade.  Mas, como médico formado por uma escola conceituada, nossa Faculdade de Medicina de São Paulo, em cuja Universidade tive a honra de galgar nas situações mais elevadas, como professor-adjunto, tenho tranqüilidade para falar de Allan Kardec, porque, como médico, aprendi muito com ele.  Sobre doenças aprendi muito com Allan Kardec, a ponto de ter escrito um livro sobre doenças da alma, de modo que tenho muita liberdade para falar sobre Kardec, esse ser extraordinário, que veio enriquecer nossos conhecimentos, abrir oportunidades para nossa reforma interior, e nos transmitir essa ciência e cultura espírita que enriquece nossas vidas.

Estudando o problema das doenças da alma, vi que há muitas doenças que nós, médicos, não conhecemos - são as doenças da alma.  Por exemplo, as doenças cármicas - doenças que aparecem na pessoa desde o nascimento ou em certa idade sem uma causa aparente.  Na verdade, nós, médicos, não conhecemos essas causas, mas elas existem, pois Kardec nos ensinou que para toda ação existe uma reação.  Nada acontece por acaso.  Se cometemos um mal, qualquer que seja, diz Allan Kardec, teremos de responder por esse mal através de uma resposta, que pode ser uma doença ou um problema físico ou um problema social que tenhamos de enfrentar.

A teoria de causa e efeito, ou da ação e reação, é uma realidade para nós, espíritas.  Sabemos que o acaso não existe.  Não existe o acaso, tudo tem uma razão de ser.  Esse florescimento da nossa doutrina neste final de século XX, diante dessa desarmonia social, desses entrechoques de gerações, tem uma razão de ser.  Ela nos traz o bálsamo da tranqüilidade, da esperança e da certeza de que Jesus está no leme do nosso barco, e que por isso ele não vai afundar.

Meus queridos, é uma alegria transmitir-lhes em nome da Associação Médico-Espírita de São Paulo esta mensagem de amor e de coragem.  Como lhes disse, aprendi muito sobre as curas espirituais, por exemplo, com Kardec  A imposição das mãos, que está lá no Evangelho quando Jesus diz aos seus discípulos: “Ponde a mão sobre seus doentes, e eles serão curados.”  E com Kardec a gente vem estudar a razão científica dessas curas, como elas se realizam.  De modo que nós, quando impomos as mãos sobre os doentes, temos a convicção do que estamos fazendo: uma mensagem de Jesus, explicada cientificamente em seus livros.

Outras modalidades de curas espirituais, como a cura pelo pensamento, a chamada cura quântica.  Há muitas modalidades de tratamentos que nós, médicos, precisamos aprender.  Precisamos ter a humildade de estudar a doutrina espírita, que hoje é uma grande honra, uma grande sabedoria para nossos corações.

Quero felicitar o nobre Deputado Alberto Calvo por essa liderança no movimento espírita de São Paulo e agradecer esta oportunidade de estar aqui com vocês.

Muito obrigado.  (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ALBERTO CALVO - PSB - Esta Presidência concede a palavra à Sra. Leile Cacacci, que foi a pessoa que nos procurou para que fosse organizada esta nossa reunião de hoje em homenagem a Allan Kardec.

 

A SRA. LEILE CACACCI - Em nome do centro espírita José Barroso, do qual faço parte, e através da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, esta Casa que nos acolhe, por intermédio do nobre Deputado Alberto Calvo, nos encontramos aqui hoje para relembrarmos nosso mestre Allan Kardec.

Pitágoras nos relembra que a Terra é a morada da opinião.  Por toda parte encontramos os que opinam, mas ele ouvia a música das esferas, dos mundos, rolando no infinito.  E sabia que as opiniões humanas são libélulas efêmeras que voam ao nosso redor e amanhã já não existem mais.

Amante da sabedoria, Pitágoras buscava a certeza.  Bertrand Russel o imaginava como um homem que tinha um pé no misticismo órfico e o outro no racionalismo do futuro. 

 Todos nós somos mais ou menos pitagóricos, ouvimos o zumbido permanente das opiniões humanas sem perder, nem de leve, a música celeste, mas procuramos firmar pelo menos o pé no estribo da razão para montarmos em Pégaso, o cavalo alado. Cavalgar no inefável é buscar a unidade perdida das coisas e dos seres. Do sangue de Medusa nasceu Pégaso, como do suor dos homens nasce na Terra a divina psiquê, mas, para vê-la e ouví-la, teremos que nos apoiar nos poderes da razão que nos dá medida inflexível da verdade.

Hoje, relembrando o desencarne do mestre lionês Allan Kardec, vamos acompanhar a trajetória da concepção histórico-social do espiritismo no mundo atual. Mais do que apresentar o nosso conferencista psicólogo clínico, filósofo, historiador, escritor renomado, articulista da imprensa internacional, professor catedrático da Universidade Central da Venezuela, quero ressaltar o homem Presidente da Confederação Espírita Panamericana, companheiro da tarefa de difusão da doutrina espírita, livre pensador por  excelência, trabalhador incansável que desenvolve suas atividades com dedicação e amor, constituindo-se na razão e na paixão de sua existência. Sentimo-nos felizes por  podemos compartilhar este convívio, unidos pela força e pelo desejo imenso de desenvolver um projeto histórico e espiritual nitidamente kardecista, decididamente progressista que impulsiona a todos nós a prosseguirmos sob a bandeira do amor e da verdade. Naturalmente, Jon Aizpúrua, através de sua vasta cultura,  agilidade reflexiva e acentuada posição de historiador, hoje, nos proporcionará recuperar, através da memória, a mensagem de Allan Kardec através dos tempos. Portanto, vamos aproveitar as palavras de Dr. Jon Aizpúrua para particularmente incursionarmos corajosamente nas melhores possibilidades de conhecimento que Alllan Kardec, através da doutrina espírita, nos  ofereceu em todos os campos das atividades humanas. Com todos, um amigo muito especial, Jon Aizpúrua. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE ALBERTO CALVO - PSB -  Esta Presidência concede a palavra ao Sr. Jon Aizpúrua, Presidente da Confederação Espírita Panamericana, que falará sobre  o tema: “Concepção Histórico-Social do Espiritismo”.

           

O SR. JON AIZPÚRUA -  Exmo. Sr. Dr. Alberto Calvo, Presidente desta memorável e histórica sessão da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo em homenagem ao codificador do espiritismo Allan Kardec; Exma. Dra. Edir Sales, Deputada desta Assembléia; Exmos. Deputados presentes; Dr. Roberto Broglio, representante da mui ilustre Associação Médico-Espírita de São Paulo; Dr. Paulo Toledo Machado, Presidente inspirador do Museu de Cultura Espírita  de São Paulo, queridíssimo companheiro Dr. Newton Rubem Medran, vice-Presidente da Confederação Espírita Panamericana; queridíssimo amigo Sr. Eden Dutra, Presidente de honra do Centro Espírita José Barroso; distintos dirigentes de Centros Espíritas paulistas, prezados amigos, queridos companheiros, amigos e irmãos, para mim é um motivo de imensa honra e de alegria poder estar presente, nesta noite, nesta sessão em que a máxima instância civil do povo paulista do Estado de São Paulo oferece esta homenagem a Allan Kardec. Para mim, como espírita, como latino-americano é motivo de imensa alegria poder compartilhar esta oportunidade de oferecer algumas palavras em homenagem ao filósofo e pedadogo Léon Hippolyte de Nizard Rivail, nosso Allan Kardec, nosso primeiro mestre, o homem que, no dia o 31 de março deste ano, lembraremos os 130 anos de sua passagem  para o mundo espiritual - sua desencarnação. Nossa alegria é imensa e vamos compartilhá-la com milhares de espíritas na América, na Europa e no mundo todo que, nestes dias, estão como nós unidos em pensamentos, rendendo esta homenagem sincera e afetiva a quem tanto ofereceu ao mundo com o conhecimento elaborado da doutrina dos espíritos.

A história da humanidade mostra um esforço imenso e intenso para compreender a realidade tanto para o ser humano como para o universo que o rodeia. Em todos os tempos, a criatura humana tentou encontrar respostas às perguntas  fundamentais: Quem sou?  De onde venho? Para onde vou? Qual é minha própria realidade?  Qual o sentido da vida e o porquê da existência? A estas perguntas sempre surgiram respostas em uma ou outra direção, que basicamente podem sintetizar as duas grandes concepções da vida e do universo que determinam a história do pensamento e todas as construções filosóficas e ideológicas que orientaram a humanidade. Por uma parte, há aqueles que pensaram e seguem pensando que o universo é apenas uma realidade do tipo material, física, tangível, autodinâmica que evolui constantemente por ensaio e erro, em uma mistura de azar e determinismo, que não existe nenhuma causa extramaterial criadora, que a vida é do tipo orgânica e material, que não há, portanto, nem Deus Criador e nem espírito que vitalize os  processos orgânicos.

               Esta resposta, podemos sintetizar no nome genérico de concepção materialista do homem, da vida e do universo. Em outro pólo de conhecimento histórico, aqueles que pensaram e  pensam que por trás da realidade material  existe outra realidade superior e espiritual.  Esse universo é o resultado de um processo inteligente cuja causa suprema e superior denominamos por comodidade de linguagem: Deus. A vida é resultante de um processo diretriz de uma força espiritual que comanda, dirige e organiza  esses processos.

               Esta resposta que admite  Deus como criador do universo, e o espírito como força inteligente da vida,  por comodidade de linguagem e de forma genérica denominamos de resposta espiritualista. Materialismo versus espiritualismo, é o grande debate da filosofia em todos os tempos.

 Na cultura helênica clássica, na Grécia antiga, já se debateram essas duas concepções com o fundamento de cada uma das idéias. Pensadores ilustres como Demócrito e Epicuro defendiam a visão materialista, mecanicista e atomicista da vida e do universo. Outros pensadores do outro lado da filosofia como Pitágoras ou Sócrates, o grande criador da antropologia filosófica e seu discípulo Platão, e mesmo Aristóteles defenderam a postura espiritualista.

               Este grande debate já aconteceu na Grécia clássica e continuou acompanhando durante 25 séculos,  2500 anos, a construção do pensamento humano. Na Grécia clássica foi afortunadamente determinante o pensamento espiritualista. Com o decorrer do tempo,  nessa longa,  larga e escura noite da Idade Média, quando a ciência foi escravizada aos pés da teologia, ali também predominava uma visão espiritualista mas envolvida em concepções nebulosas, e dentro de um sistema autoritário e teocrático que não permitia a liberdade de pensamento, ou a liberdade para a pesquisa filosófica ou científica. Afortunadamente, por essa lei de fluxo e refluxo histórico vimos no Renascimento o contato de novo com as fontes helênicas clássicas o retorno da liberdade criadora do home m para a compreensão da vida.

No Iluminismo apareceram manifestações criadoras nas artes, na ciência, na filosofia e na cultura em geral.  Esse grande processo  apareceu através da Revolução Francesa que, a partir de 1789 com o episódio da Queda da Bastilha, devolveu à humanidade o direito inalienável do ser humano a utilizar a razão  como guia para o conhecimento da realidade.

                  Foi particularmente no se´culo XIX, quando se  apresentou um momento histórico fundamental dentro de um debate entre  materialismo ou espiritualismo. No século XIX  as ciências naturais e as ciências sociais aqui tiveram um grande desenvolvimento. Lembremos que foi no século XIX, que em ciências naturais tão importantes como a Biologia, por exemplo, se estabeleceu um conceito fundamental: a célula, como a unidade anatômica, morfológica e fisiológica de todos os seres vivos, unificando um  conceito de vida. Foi nesse século XIX que  apareceu dentro da Biologia a doutrina evolucionista. Charles Darwin, superando os precedentes estudos de Lamarck,  logrou com as suas investigações e pesquisas  essa obra magistral “Origem das espécies por seleção natural”, colocar o processo evolutivo da humanidade desprovido de algumas mitologias criacionistas que haviam dado à criatura humana um lugar privilegiado, especial  na terra e no universo sem passado histórico e sem  relação com o resto, com os demais seres da criação.

O Darwinismo foi um processo extremamente importante na ciência e  na cultura. Lembremos que foi no século XIX, em 1875, que  Guilherme Gundt estabeleceu na universidade   de Leipzig, na  Alemanha, o primeiro laboratório de psicofisiologia experimentai, para dar  à psicologia uma orientação que alegara  ruir de sua própria etimologia. A psicologia criada na Grécia, da raiz psiqué, a  alma, para estudo da alma, estudo da vida e do ser humano, a psicologia, com Gundt, se fazia fisiológica, ia à sua própria etimologia e se convertia em uma ciência para estudar  a alma., em  uma ciência sem alma, em uma ciência  sem qualquer ideal de alma. Ciência da consciência, a chamou  Gundt, depois  Watson  e Pavlov,  e no outro século vem Skinner  a denominaria  Ciência do Comportamento e as teorias reflexológicas  e  behavioristas de condutismo na América e  na antiga União Soviética.

Foi nesse século XIX que as Ciências Sociais apontavam a uma direção materialista, foi no século XIX, que Augusto Comte estabeleceu em seu discurso positivista as regras básicas de conhecimento, determinando que a história evolutiva do conhecimento, tendo passado o estado mágico, teológico, metafísico só seria uma  disciplina positiva e científica quando seu objeto de estudo fosse acessível antologica   e  metologicamente fosse  acessível à experimentação e à comprovação.

Foi nesse século XIX que as ciências sociais, vinculadas aos  espaços políticos e de ação social, em 1848, especificamente Karl Marx e Frederic Hengel apresentaram o manifesto comunista, estabelecendo  que  a luta dos povos, particularmente do proletariado, para a sua liberação histórica, só  seria possível dentro de uma concepção materialista, onde a luta de  classes seria instrumento pela liberdade e para  o reino socialista da igualdade.

Nessa concepção de Comte, de Marx, de Darwin, de Gundt e de outros, qualquer idéia de Deus, qualquer noção do espírito era simples metafísica; inclusive de forma mais agressiva se dizia, com  que Deus está morto, e se dizia com Marx que qualquer idéia do espírito era ópio para adormecer a consciência dos povos.

            O desenvolvimento das ciências naturais e sociais no Século XIX produziam finalmente em síntese um resultado: ciência é igual a materialismo. Produzia-se uma equação de igualdade. Se uma disciplina era científica, deveria ser materialista.

            Parecia que havia triunfado o materialismo como concepção, como explicação da vida. Porque as doutrinas espiritualistas, especialmente as religiões  dominantes haviam esquecido seu papel filosófico na defesa do espiritualismo, e ainda haviam continuado a debater questões bizantinas.

 Realizavam-se ainda, no Século XIX, concílios para discutir se os anjos tinham sexo, ou quantos anjos cabiam na ponta de uma agulha, de um alfinete. E, naturalmente, disputando o controle dos bens materiais, disputando parcelas de poder, sustentando regimes autoritários, autocráticos, segundo os quais era Deus mesmo que colocava e apoiava os governantes monárquicos.

            Ante um materialismo dominante, ante uma ciência de braços com o materialismo, ante a decadência das religiões, parecia que a cultura filosófica da humanidade estava condenada a voltar-se a uma visão materialista, organicista, fisiologista e ateísta da vida.

            E, ali, meus queridos amigos, é ali quando como obedecendo a um projeto transcendental histórico e espiritual, aparece uma concepção nova como que dialeticamente se produzia uma síntese superior que fosse capaz de levantar-se sobre esta contradição de um espiritualismo dogmático e de um materialismo também dogmático.

            É ali, queridos amigos, que aparece historicamente a doutrina do espiritismo.

            O espiritismo é a recuperação do espiritualismo, de um espiritualismo teórico, metafísico, incapaz de unir-se com a ciência e com a razão, a um espiritualismo científico, racionalista e não dogmático. Foi frente a esta contradição de uma religião  que obedecia os seres humanos, crer sem entender, e de um materialismo que diz morre sem esperança aparece uma recuperação da esperança, um espiritualismo científico um espiritualismo científico, racionalista, altamente humanista, que resgata uma ética profunda para o ser humano, renovando as esperanças nos grandes valores transcendentes de Deus, da espiritualidade, da imortalidade e da evolução.

               Por isto estamos aqui, para render homenagem ao homem que foi capaz de colocar-se por cima desta falsa contradição e de entregar à humanidade uma bela doutrina científica, filosófica, humanista, sociológica, profundamente ética, de altíssimos valores em todas as suas direções.

               Quando nos Estado Unidos da América, no ano de 1848 se produziu aquela eclosão mediúnica de Hydesville, com as Irmãs Fox, o movimento que se organizou nos Estados Unidos da América viabiliziou o intercâmbio entre o mundo espiritual e o mundo corporal pela via mediúnica não foi capaz de concretizar uma doutrina coerente para explicar esses fatos, esses feitos e todas as suas conseqüências.

               Quando as mesas girantes foram conhecidas na Europa só serviam para um diletantismo, para uma distração da aristocracia. Depois de um jantar, à noite, os senhores se reuniam ao redor das mesas para interrogar essas mesas sobre questões pueris e insignificantes. Estes fenômenos, que obedeciam a um projeto espiritual para recuperar a consciência humana sobre a existência do espírito, não eram devidamente interpretados, pelo contrário, eram motivos pueris, fúteis, de distração.

               Foi, portanto, este pedagogo que hoje reconhecemos, este Leon Hippolyte Denizard Rivail, este magnífico discípulo de Pestallozzi, este grande estudioso pela pedagogia, que havia se inspirado em Comte para tomar o método positivo, este grande discípulo da ciência social e natural de seu tempo foi que soube interpretar este fenômeno aparentemente sensível das mesas girantes e soube desentranhar, soube extrair dali que ali estava o momento de partida, o ponto fundamental da elaboração de toda uma cosmovisão, de uma mundividência, de uma interpretação nova do ser humano, da vida e do universo.

               E, mudando o sentido daquelas reuniões, com as meninas Baldin, com o Sr. Fort Pierre, e com outros mais, este Leon Hippolyte Denizard Rivail, ainda não era Kardec, foi perguntando, obtendo respostas, anotando, observando, reperguntando, aplicando o método pedagógico a este diálogo com as mesas, com mediuns psicográficos e, apresentou em 18 de abril de 1857, o Livro dos Espíritos.

Esta Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo teve a virtude, o pioneirismo, no mundo. De haver criado o Dia dos Espíritas.

               E, eu me permito dizer, não só para o Brasil, mas para todos os espíritas do mundo, dos cinco continentes, que esta histórica decisão da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo  merece dos espíritas de todo o mundo uma salva palmas, palavras de saudação de carinho e de aprovação, por nos haver brindado com esta oportunidade de, neste cenário tão digno e de tanta tradição, ser colocado o surgimento do Livro dos Espíritos como a referência para que nós outros, os espíritas, tenhamos um dia no calendário.

            A doutrina codificada por Allan Kardec nos devolveu, à humanidade, o conhecimento racional e o sentimento e a esperança de querer um mundo melhor, que todos sonhamos.

            Kardec e os espíritos nos devolveram a idéia de Deus distante do antropomorfismo tradicional de Deus personalizado, do Jeová dos exércitos, colérico, que ora toma uma decisão e ora se arrepende, Deus como força universal, como causa primeira e criadora, como ser inteligente do universo; um Deus que não necessita templos, porque templos estão no coração dos ser humano, e que não necessita cultos ou rituais porque a melhor maneira de adorar a Deus, como ensinou Jesus, é em espírito e em verdade, com  pensamento saudável e com uma conduta de amor ao próximo.

            Não há maneira mais extraordinária de adorar a Deus do que a conduta fraterna e solidária na vida,  acima de rituais ou de cerimônias que obedecem a um culto exterior, sendo que o espiritismo privilegia e coloca em nível superior o culto interior.

            O espiritismo nos devolveu a convicção de que a vida não obedece a acasos, ao azar, à casualidade. Ela obedece a processo de causalidade. O espiritismo nos devolveu, nos recuperou uma idéia concreta de espírito, uma estrutura energética da vida. Porque o espiritualismo tradicional encontrava-se com uma grande dificuldade: se a alma existe, se a alma sobrevive à morte, se a alma transcende à morte, como é possível que pela natureza sublime da alma, o espírito, como  se pode vincular a natureza densa do corpo? Este era um problema insolúvel na metafísica espiritualista tradicional. Foi Kardec quem colocou uma tese magistral, a tese de fé e espírito, o corpo surgindo do espírito, estrutura que pode mediar, que facilita o processo de conexão entre a estrutura sublime do espírito e a realidade tão simples e densa do corpo físico. Foi Kardec que nos devolveu a idéia de que se o espírito sobrevive também deve preexistir. Porque não é possível entender um princípio espiritual que subsiste à morte e que  não preexiste ao nascimento. E colocou a tese de continuidade: o espírito era antes, é agora, e seguirá sempre sendo, existindo permanentemente.

            Foi Kardec, com a doutrina espírita, que recuperou para a humanidade e para a ciência o conhecimento do fenômeno mediúnico. Ensinou-nos a diferenciar mediunismo de espiritismo, fazendo-nos compreender que o mediunismo é a comunicação espiritual em todas as suas formas, é  um processo que acompanha o ser humano em todos os tempos e que tem sido indevidamente interpretado. Às vezes, se um fenômeno mediúnico ocorria no seio de uma igreja era divino, se ocorria fora da  igreja era um fenômeno demoníaco.

            Allan Kardec nos devolveu a compreensão da experiência mediúnica e nos ensinou, à luz do espiritismo, que a mediunidade é instrumento fundamental do conhecimento da realidade espiritual. E que a mediunidade é o laboratório para compreender e comprovar a existência do espírito, que sem mediunidade não há maneira de comprovar a existência espiritual e nos remetemos tão somente a um ato de fé. E nos ensinou que a mediunidade.

            E nos ensinou que a mediunidade deve ser a serviço do próximo; que deve ser direcionada em dois valores  fundamentais: o valor de bem e do amor. Dentro de uma  visão de cultura e  de ética da prática mediúnica que faz que nós, espíritas, tenhamos muita clareza  para diferenciar esses mediunismos sincréticos, que às vezes, indevidamente se fazem chamar espíritas, mas que não são espíritas  porque não  possuem o conteúdo doutrinário do ensinamento espírita.

            Foi Allan Kardec que nos devolveu uma visão da reencarnação. Uma visão do processo evolutivo do espírito, em múltiplas etapas, e uma visão evolucionista que começa o princípio espiritual desde  os protozoários  e se vai elaborando em toda a escola filogenética da evolução até produzir, em nossa etapa atual, esta criatura que somos, o homo sapiens, o ser humano.

            Com  Allan Kardec a reencarnação liberou-se dos velhos dogmas, de antigas crenças e superstições, como a meta psicose,  que afirma  as possibilidades de retornar no corpo de animais e mesmo de plantas. E nos ensinou que reencarnações são sempre progressos ascendentes do espírito; que é oportunidade para levantar-nos e retificar  e que todos nós, seres humanos, temos possibilidade  de avançar. E se  por nossa incapacidade moral, por nossa incompreensão, ou por nosso descuido não avançamos,  não iremos a infernos de castigo ou a céus de  prêmios;  estaremos sempre avançando, sendo nós mesmos os arquitetos  de nosso próprio destino. Construindo, responsavelmente, com nossos atos e ações,  pela lei de ação e reação teremos dela a conseqüência.

            Allan Kardec nos devolveu uma  visão cosmológica plena com  a ciência, deixou-nos a idéia geocêntria, antropocêntrica, no sentido de que somente na terra há uma forma de vida. Devolveu-nos a imagem cósmica, a paisagem  universal, onde a terra, nosso maravilhoso planeta é único dentro de um sistema solar, de uma galáxia, de um universo  infinito que mostra a grandeza do Criador. Mostra a vida, a pluralidade dos mundos habitados, como disse Camille Flammarion: “é uma tese importante para relacionar a nossa vida na terra com toda essa paisagem gigantesca, de caráter universal.

            Queridos  amigos, foi Allan Kardec, com seu trabalho extraordinário e com o assessoramento  positivo de espíritos elevados que nos deu essa doutrina maravilhosa, essa filosofia científica de amplas  conseqüências morais, éticas e humanas.

            A doutrina  espírita adota em suas vertentes muitas  direções em favor da humanidade.  Para o espiritismo não é alheio o problema humano e o social. Nós, os espíritas, não estamos interessados somente  na meditação, no conhecimento espiritual e na prática  mediúnica. Não, da visão espírita transcendemos à visão social. Preocupa-nos o drama humano. Nós espíritas sofremos com o sofrimento do próximo e fazemos algo, cada um, dentro das nossas possibilidades, para ajudar o ser humano, a humanidade global, a encontrar esse mundo melhor.

            Por isso, há uma atitude do espiritismo em favor dos  grandes valores históricos da criatura humana. O valor da liberdade, porque só na liberdade o pensamento é criador em pensamento é criador. Todos os seres humanos têm direito a uma vida digna, com igualdade e fraternidade. São grandes os valores que encontramos no espiritismo.

            Por isso queridos amigos, para concluir eu quero, em nome da instituição que com modéstia representamos, a Confederação Espírita Pan-Americana, em nome de milhões e milhões de espíritas que, desde o Canadá até a Argentina, Europa e outros continentes, no mundo inteiro, sentem-se animados e inspirados pela Doutrina Kardecista, dizer que nos sentimos, nesta noite, alegres, com entusiasmo, com esperança para ajudar a construir aquilo que Kardec e outros pensaram e sonharam: um mundo de fraternidade, um mundo de solidariedade, um mundo melhor.

            Permitam-me dizer, em nome de outros povos: Allan Kardec, “thank you very much”. Allan Kardec,  “merci beaucoup”. Allan Kardec, “muchas gracias”. Allan Kardec,  muito obrigado.  (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ALBERTO CALVO - PSB - Chegamos ao término da nossa festa espiritual. É realmente um verdadeiro banquete espiritual por uns breves instantes; seria ótimo se se perpetuasse.

Pudemos saborear dessa magnífica oratória e colocação do Dr. Jon Azpúrua, que expôs de forma magistral o trabalho de Allan Kardec, o trabalho de espírito de verdade.

            Esta Casa sente-se honrada por poder participar e propiciar esta festa espiritual, agradece a presença de todos e se congratula, em especial, com  D. Leile Cacacci, Dr. Jon Azpúrua, Dr. Roberto  Brólio, que também fez uma apresentação magnífica, e com  a Deputada Edir Sales, que secretariou a sessão.

            Não tenho nada a acrescentar em tudo que foi dito nesta noite. Nossos espíritos estão plenamente alimentados pelo maná que extraordinariamente desceu sobre esta Casa no plenário desta augusta Casa.

            Antes de encerrar, quero chamar a atenção de todos para os pioneiros do espiritismo, aqueles contemporâneos de Allan Kardec o auxiliaram não só na elaboração da compilação de tudo aquilo que se sabia em relação à comunicação, ao intercâmbio dos espíritos desencarnados com os encarnados,  e da lei de causa e efeito, a lei da reencarnação, que é o tripé onde se repousa a nossa sagrada e maravilhosa doutrina espírita, aqueles que vieram, que se seguiram a tantos estudiosos e cientistas que escreveram livros. Os espíritas também precisam ler aqueles  pioneiros que no Brasil sofreram perseguições, numa época em que o espiritismo era caso de polícia, onde as pessoas reunidas em centros espiritas de repente eram levadas  em um camburão como se fossem abjetos criminosos. Felizmente essa época passou, mas eu a alcancei nos meus primeiros 8 anos de idade.

            Tenho a oportunidade de poder presidir esta grande festa espiritual. Então,  em homenagem a todos estes que foram os pioneiros e àqueles que hoje estão levando a doutrina dos espíritos, o trabalho de Allan Kardec e todos aqueles que têm escrito sobre a doutrina para todos os quatro cantos do mundo, em especial para este nosso País, que sem dúvida alguma, será o celeiro e o coração do mundo e a pátria do verdadeiro evangelho, peço a todos para, em pé, fazerem um minuto de silêncio, principalmente em memória daqueles que já voltaram para o lado de lá, mas continuam o seu trabalho.

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            É feito um minuto de silêncio.

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Esgotado o objeto da presente sessão, agradeço, mais uma vez, todas as autoridades presentes e todos que vieram abrilhantar esta sessão.

O Dia dos Espíritas deve ser comemorado todos os anos e tem sido, desde a promulgação da lei que institui oficialmente no Estado de São Paulo o Dia dos Espíritas. Todos os anos, no dia 18 de abril, é comemorado o Dia dos Espíritas, mas como a Casa estará fechada neste dia, antecipamos para sexta-feira 16, onde teremos uma nova solenidade. Convidamos a todos os presentes para, se puderem, nos

Presidente

 

homenagear com suas presenças, porque, afinal a nossa doutrina é a doutrina dos espíritas!   

Muito obrigado a todos e está encerrada a sessão.

 

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- Encerra-se a sessão às 21 horas e 40 minutos.

 

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