1

15  DE  MAIO  DE 2000

11ª SESSÃO SOLENE DE LANÇAMENTO, NO ESTADO DE SÃO PAULO, DA CAMPANHA INTERNACIONAL PELA CULTURA DE PAZ  e  NÃO VIOLÊNCIA  DA UNESCO

 

Presidência: ROBERTO GOUVEIA

 

Secretário: JOSÉ ZICO PRADO

 

DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA

Data: 15/05/2000 - Sessão 11ª S. Solene  Publ. DOE:

Presidente: ROBERTO GOUVEIA

 

LANÇAMENTO, NO ESTADO DE SÃO PAULO,  DA CAMPANHA INTERNACIONAL PELA CULTURA DE PAZ E NÃO VIOLÊNCIA DA UNESCO

001 - ROBERTO GOUVEIA

Assume a Presidência e abre a sessão.  Anuncia que a sessão foi convocada pela Presidência da Casa, atendendo à solicitação do Deputado ora na Presidência, com a finalidade de promover o lançamento, no Estado de São Paulo, da Campanha pela "Cultura da Paz" e não violência da Unesco. Convida todos a ouvirem a execução do Hino Nacional.

 

002 - GEORGE WERTHEIN

Representante da Unesco, cumprimenta todas as autoridades presentes. Fala da parceria do Poder Legislativo com a Unesco, cujo apoio garante, na mobilização pelo Ano Internacional da Cultura de Paz. Seu objetivo é contribuir para um processo de transformação de uma cultura de violência para uma cultura de paz.

 

003 - ROBERTO GOUVEIA

Anuncia um número de arte e, em seguida, uma cerimônia inter-religiosa.

 

004 - ZULMIRA ALVARENGA

Agradece o convite. Historia seu trabalho, na Zona Leste da Capital, por melhores condições de vida e saúde.

 

005 - EDUARDO CAPOBIANCO

Na qualidade de Diretor do Instituto São Paulo Contra a Violência, Diretor do "Transparência Brasil" e Vice-Presidente do Sinduscon, cumprimenta todos os presentes e disserta sobre seu trabalho visando "rejeitar a violência".

 

006 - MARCOS TERENA

Como Coordenador-geral dos Direitos Indígenas da Funai; Coordenador da Conferência Mundial dos Povos Indígenas-Rio 92 e Membro do Grupo de Trabalho sobre Povos Indígenas da ONU, cumprimenta os presentes e disserta sobre o tema: "Ser generoso".

 

007 - HERÓDOTO BARBEIRO

Na qualidade de jornalista da Rádio CBN São Paulo e da TV Cultura São Paulo, fala de sua satisfação em participar da solenidade, com manifestações tão diferentes. Desenvolve o tema: "Ouvir para comprender".

 

008 - MÁRIO MANTOVANI

Como ambientalista e Diretor do SOS Mata Atlântica, registra sua satisfação em estar participando da solenidade, uma das aspirações do movimento ambientalista. Disserta sobre o tema: "Preservar o Planeta".

 

009 - MAYARA ANTUNES NORBIN

Bacharel em Direito, Funcionária da Justiça do Trabalho - Assistente de juiz, Membro do Cladem - Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher, agradece a atenção de todos e discorre sobre o tema:  "Redescobrir a Solidariedade".

 

010 - ROBERTO GOUVEIA

Anuncia um número de arte.

 

011 - JOSÉ ROMÃO TRIGO AGUIAR

Lê o documento: "O que é o Manifesto 2000?".

 

012 - ROBERTO GOUVEIA

Anuncia um número de arte. Encerra a sessão.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos. Convido o Sr. Deputado José Zico Prado para, como  2º Secretário “ad hoc”, proceder à leitura da Ata da sessão anterior. 

                                              

O  SR. 2º SECRETÁRIO -  JOSÉ ZICO PRADO - PT  -  Procede à leitura da Ata da sessão anterior, que é considerada aprovada.

 

*    *    *

 

            O SR. PRESIDENTE ROBERTO GOUVEIA - PT - Esta sessão solene foi convocada pelo Presidente desta Casa, Deputado Vanderlei Macris, atendendo solicitação deste Deputado, com a finalidade de promover o lançamento, no Estado de São Paulo, da Campanha pela “Cultura de Paz e não Violência” da Unesco.

            Convido a todos os presentes para, de pé, ouvir o Hino Nacional.

 

*               *     *

 

-         É executado o Hino Nacional.

 

*               *     *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT -  Convido o Sr. Jorge Werthein, que nos dá a honra da sua presença e representa a Unesco, para que possa compor a Mesa juntamente conosco e com o Deputado Federal Eduardo Jorge. (Palmas.)

Como proponente desta sessão, como primeiro secretário, e fazendo as honras da Casa, gostaria de dizer da imensa alegria de podermos, na noite de hoje, nos colocar como colaboradores, cooperando e nos somando a este processo tão importante e bonito que estaremos construindo e colorindo,  a partir desta noite, com o lançamento desta campanha.

Em primeiro lugar, a ONU declarou 2000 como o ano da Campanha da Paz e não Violência, e a década de 2001 a 2010 como a década da cultura de paz e não violência para as crianças de todo o  mundo.

Normalmente as sessões solenes são presididas de outra mesa. Para demonstrar que estamos todos aqui como cidadãos, fizemos questão de cultivar a horizontalidade para que todos possamos nos engajar como cidadãos, como homens e mulheres livres nesta grande campanha.

Gostaria de cumprimentar e nomear as entidades componentes do Comitê Coordenador do Manifesto 2000: Associação Palas Athena, Associação Paulista de Saúde Pública, Broto Brasilis, Faculdade de Saúde Pública da USP, Gabinete do Deputado Federal Eduardo Jorge, Gabinete do Vereador Adriano Diogo, Gabinete do Deputado Estadual Roberto Gouveia, Instituto de Estudos do Futuro, Observatório Internacional para Assuntos Humanitários, Rede de Educação pela Paz e Voto Consciente.

Quero agradecer a presença dos senhores e dizer que não tenho dúvida de que este é o ato da maior pluralidade que já conseguimos realizar nesta Assembléia Legislativa.

É importante dizer que estaremos, pela primeira vez nesta Casa, transmitindo o nosso evento ao vivo pela TV Assembléia. Para aqueles que não conseguiram adentrar o plenário nós providenciamos um telão no 1º andar para que possam acompanhar os nossos trabalhos, esta nossa solenidade. Neste momento, passo a palavra ao representante da Unesco, Jorge Werthein, para sua exposição.

 

O SR. JORGE WERTHEIN - Boa-noite a todos. Obrigado pela presença tão grande na noite de hoje. Na pessoa do Sr. Presidente cumprimento todas as autoridades presentes.

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer o convite recebido da Assembléia Legislativa de São Paulo para o Lançamento da Mobilização pelo Ano Internacional de Cultura de Paz.

A contribuição do Estado de São Paulo é realmente valiosa, demonstrando, com esta presença, o compromisso que tem o Estado com esta nobre causa.

Gostaria muito de agradecer também ao Comitê Organizador da Cultura de Paz em São Paulo pelo magnífico trabalho que vem desenvolvendo.

 

(Entra leitura do Sr. Jorge Werthein - 05 fls. - “Em primeiro...”)

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA -  Dando continuidade aos trabalhos, assistiremos à apresentação do maestro Toninho Macedo, regente do Grupo Abaçaí.

 

O SR. TONINHO MACEDO - O nosso fraternal abraço às autoridades civis e religiosas e aos nossos irmãos paulistanos de várias procedências.

A Abaçaí Cultura e Arte existe há 27 anos e no momento estamos no Parque da Água Branca. Trouxemos nesta noite uma pequena parcela do trabalho de ação cultural que vimos realizando com crianças sem adjetivação de várias procedências da cidade de São Paulo.

Com uma parte das crianças, apresentaremos “ Maculelê”, e  na seqüência o trabalho que vem sendo coordenado pelo Décio, pela Neuza e pela Mazé da percussão, com as latinhas de sucata.

 

*     *     *

 

- É feita a apresentação.

 

*      *     *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Nossos agradecimentos ao Grupo Abaçaí.

Anunciamos a presença do Deputado Estadual Jilmar Tatto, Deputado Estadual Conte Lopes, Vereador Carlos Néder e do Exmo. Sr. José da Silva Guedes, nosso Secretário de Estado da Saúde de São Paulo.

Vamos passar para a cerimônia intercultural e inter-religiosa. Vou chamar para nos ajudar o professor Nestor Reinoldo Müller.

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - Muitos homens e muitas mulheres sonharam que um dia a humanidade pudesse se unir e todas as tradições religiosas pudessem se encontrar em paz. Muitas mulheres e muitos homens deram a vida por este sonhos, mártires da paz. Aqui estamos hoje, 13 diferentes tradições religiosas porque cremos na paz e assumimos a responsabilidade de educar para a paz. Queremos dar corpo e prática a este sonho. Estas 13 diferentes tradições vão proferir suas preces pela paz e, ao mesmo tempo, um grupo de crianças do Colégio Maria Imaculada estará colocando este texto numa árvore simbolizando a nossa vontade de que a prece seja fruto para os nossos filhos e as nossas gerações futuras. Vamos obedecer aqui a ordem histórica e os mais antigos entre nós são aqueles que chamamos de indígenas brasileiros.

Kaka Werá Jecupê, um índio txucarramãe, abre a roda dos oficiantes desta cerimônia inter-religiosa e, junto a ele está José Duarte, um xamã brasileiro.

 

O SR. KAKA WERÁ JECUPÊ - Os povos indígenas têm acalentado em seus sonhos, há muito tempo, a chegada dos guerreiros do arco-íris. Os guerreiros do arco-íris são aqueles que têm como escudo para combate o coração, como flecha a sabedoria e como arco o amor. Para nós, os representantes de cada tradição sagrada existente na humanidade, podem ser a própria manifestação desse sonho. O grande desafio é o respeito ao propósito particular de cada tradição e o abraço conjunto dos valores sagrados caminhando unidos.

Mas qual a meta? A paz. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLD MÜLLER - Ouviremos agora Iyá Sandra Medeiros, Mãe da Casa de Orixá, membro do Instituto Nacional de Tradição e Cultura Afro-Brasileiro, membro do Conselho da Comunidade Negra e do Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo. Traz a presença da religião africana e seus orixás, através da antiga oração A Oba Talá. Ao seu lado, Mãe Liliana de Oxum, e Mãe Caiandivá.

 

A SRª IYÁ SANDRA MEDEIROS - Ake te Oba, Oba se ni ye / Ake ta Oba, Oba se ni ye / Baba joko dara, Obania esse, Obanla esse, Baba fun mi laiye.

Arugbo, arugbo Baba/ Baba arugbo, oni Orixá.

Eeeepa o, Obatala epa o! Eeeepa o, onilaja epa o! / Eeeepa o, Obatala epa o! Eeeepa o Orixá funfun epa o! Essa língua que nós, tradicionalistas afrodescendentes, usamos hoje, é o ‘Iorubá’.

“Invocamos os seguidores do Rei, aquele Rei que fez o mundo. O Pai senta e tudo o que faz é perfeito. Ó grande Rei da Ordem, dê e faça o mundo para mim. Pai muito velho e perfeito, aquele que possui os orixás. Que espírito magnificente.  Obatalá é um espírito magnificente; o fazedor da paz é um espírito magnificente, orixá que veste branco é um espírito magnificente. Axé, Axé, Axé.” (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - Teremos agora Pai Jamil Rashid, Babalorixá da União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil, uma das casas mais antigas de umbanda de São Paulo, conhecido por sua ação constante, buscando aproximar as diferentes tradições brasileiras. Ele nos traz a Saudação a Ogum e com ele está Pai Dalmo de Oxalá.

 

O SR. JAMIL RACHID  - Meus irmãos,  que a paz dos orixás esteja com todos nós. Com essa prece, dirigida às Américas, nós, no dia 30 de abril passado, no Ginásio do Ibirapuera, comemorávamos 43 anos em homenagem a São Jorge Orixá Ogu. Essa prece, como em todos os anos, é rezada em árabe, pelo Sheik Mohamed Benizan, e também em africano. Em português é rezada por mim, que agora vou fazer a prece.

“Glorioso São Jorge Ogum, cavaleiro de Cristo Jesus Nosso Senhor, humildemente vos imploramos que a graça de zelar pela nossa querida pátria, o Brasil, que tanto amamos, para que vossa ajuda volte a progredir, volte a crescer, favorecendo esse nosso povo e nos livrando da fome, da peste e da miséria, fazendo com que nossos dirigentes se conscientizem que tudo é povo - governantes, governados, patrões e empregados -, do mais poderoso ao mais humilde. Somos todos filhos do mesmo Deus. Tenha a nossa veneração. Damos-lhe o mesmo carinhoso nome, como seja Oxalá, Jesus, Alá, Jeová, Buda e outros mais, que representam sempre o mesmo Deus, por ser uno e indivisível.

A vós, glorioso São Jorge, ajude-nos na solução de nossos problemas, orientando nossos mandatários da nação, que sabemos estarem tentando a melhor maneira de dirigir o nosso imenso e querido Brasil. Nós, umbandistas, vossos devotos de todo o Brasil, aqui presentes, rendemos a vós essa homenagem como patrono da nossa querida Umbanda. A vós, Ogum, pedimos a todo o nosso exército de brancos, constituído por pais e mães espirituais e corpo mediúnico. Ao nosso grande país muita vibração de fé, amor e prosperidade mediúnica. Viva o Brasil, viva a América e viva São Jorge Ogum.

Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLD MÜLLER  -  O Sr. Swami Nirmalat  Mananda, do Ramakrishma Vedanta Ashrama, escola que prossegue a antiquíssima linhagem do hinduísmo, em sânscrito, a antiga língua sagrada dos Vedas, o Mantra da Paz. Ao seu lado o Prof. Eduardo Chofi .

 

 O SR. SWAMI NIRMALAT MANANDA  - Vou dizer minha oração antes de dizer a prece dos antigos Vedas. Gostaria que todos se sentassem, eretos, inspirassem e expirassem duas vezes, em paz. Inspirem paz e expirem paz.

“A paz não é encontrada nos livros nem nas igrejas, nem nos templos nem nas mesquitas, ou nas normas e regras das assembléias. Ela é encontrada no coração dos homens, no mais profundo coração dos seres humanos ela é encontrada. E antes que a gente possa falar sobre paz fora de nós, podemos encontrá-la dentro de nossos corações. Violência pessoal, violência coletiva pode ser resolvida desde o indivíduo. O indivíduo tem que conquistar a paz e você vai encontrar que você pode dar paz para os outros, com isso chego a preces dos Vedas OM, paz, paz, paz.

O irreal conduz-me ao real. Da escuridão conduza-me para a luz. Da morte conduza-me para a imortalidade. OM, paz, paz, paz.

Ó Deuses, possamos nós ouvir com nossos ouvidos aquilo que é auspicioso. Possamos cantar louvores a vós. Desfrutar com membros e corpos fortes a vida a nós concedida pelos Deuses. Então vamos resolver ter paz conosco mesmos e ir além do indivíduo estreito para um sentido mais real e coletivo. Tudo que nos liga, ligados à formação genética, pela nação, pela religião e por qualquer coisa que nos ligue além disto, encontrar paz em todos os seres. Muito Obrigado! (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER -  A Reverenda Cláudia Souza Murayama, Monja Coen, Presidente do Conselho Superior da Comunidade Budista Soto Zenshu da América Latina, superiora do Templo Bu Sem Shi, de São Paulo, apresenta a sua oração.

 

A REVERENDA CLÁUDIA SOUZA MURAYAMA - Que todos os Budas e Seres iluminados, através do espaço e do templo, abençoem, protejam e guiem nosso encontro de hoje, aqui, no Plenário da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, quando é lançada a Campanha Internacional pela Cultura de Paz e Não Violência da Unesco, e que esta campanha possa transformar a todos nós.

Que fiquemos atentos às nossas palavras, pensamentos e ações, para que sejam de respeito, generosidade, compreensão e ajuda. Temos de nos tornar a paz e a não violência que propomos, respeitando todos os seres, todas as formas de vida, a grande natureza que é a nossa própria natureza.

Que a luz da grande sabedoria e da infinita compaixão esteja conosco, a fim de que possamos unir os nossos esforços sociais, políticos, religiosos e filosóficos, na construção de uma sociedade estável, harmoniosa, justa e inclusiva.

Que os erros dos nossos antepassados e nossos próprios erros possam ser perdoados e se tornem fontes de ensinamento para que jamais se repitam. Por favor, unidos em nossas diversas tradições, pelo laço comum da fé, na transformação, vamos praticar em cada simples ato, pensamento e palavra, a não violência. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - Professor Alexandre Leone, da Comunidade Judaica, da Congregação Israelita Paulista, não está presente, pois teve que acompanhar uma cerimônia litúrgica de uma morte que aconteceu à tarde.

Solicito ao Professor Daniel Kalmanovis, de origem judaica, que leia a oração preparada pelo Professor Alexandre.  

Professor Daniel Kalmanovis é budista de tradição tibetana do Centro Darma do Centro para a Paz e do Instituto Lama, uma Fundação Internacional que busca a união de todas as tradições religiosas, constituindo um fórum ligado à ONU.  Muitos dos senhores já ouviram falar do Lama Michel, jovem brasileiro que foi reconhecido como um lama da tradição budista tibetana e filho do professor Daniel.

 

O SR. DANIEL KALMANOVIS - Que o eterno te abençoe e te guarde. Que o eterno faça brilhar sobre ti a sua presença e te seja clemente. Que o eterno se volte para ti com sua presença e te conceda a paz. Aquele que faz a paz nas alturas celestiais, derramará a paz sobre todos nós e toda humanidade e digamos todos juntos amém. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - O Reverendo padre Sérgio Lucas representa o Padre José Bizon, responsável pelo setor de ecumenismo e diálogo religioso da Arquidiocese de São Paulo, está acompanhado da Reverenda Martha Cecília Yepes Restrepo, da Assembléia do Povo de Deus, movimento de macroecumenismo, que une comunidades cristãs de toda América Latina, dentro do espírito da Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2000, que une sete igrejas cristãs, em torno de uma reflexão sobre a dignidade, a paz por um novo milênio sem exclusões.

           

O REVERENDO PADRE LUCAS - Palavra do nosso mestre Jesus de Nazaré ao povo pela paz. “Eu deixo para vocês a paz. Eu lhes dou a minha paz. A paz que dou para vocês não é a paz que o mundo dá. Não fiquem perturbados, nem tenham medo. A paz esteja convosco”. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - O Reverendo Elias de Andrade Pinto, Pastor da Igreja Presbiteriana Unida, nos traz um texto de Martin Luther King, pastor da Igreja Batista, do último sermão que ele proferiu em sua comunidade poucos dias antes de morrer como mártir da não violência ativa.

Está conosco também Dom Joseph Mafhuz, Bispo da Igreja Maronita no Brasil.

 

O SR. ELIAS DE ANDRADE PINTO - Martin Luther King sonhou toda a sua vida com a paz.

No domingo que antecedeu a sua morte, diante de sua comunidade ele disse, dentre outras palavras, estas que foram as últimas de sua despedida diante de sua grande família de fé, discípulos de Jesus Cristo:

“Eu quero que digam que eu tentei ser direito e caminhar ao lado do próximo.

Eu quero que vocês mencionem o dia em que eu tentei vestir o mendigo, tentei visitar os que estavam na prisão, tentei amar e servir à humanidade.

Sim, se quiserem dizer algo digam que eu fui um arauto. Um arauto da justiça, um arauto da paz, um arauto do direito. Todas as outras coisas são triviais, não têm importância, porque eu não quero deixar para trás nenhum dinheiro.

Eu só quero deixar para trás a minha vida, a vida de dedicação.

E é isto tudo o que eu tenho a dizer.

Se eu puder ajudar alguém a seguir adiante,

Se eu puder animar alguém com uma canção,

Se eu puder mostrar a alguém o caminho certo,

Se eu puder cumprir o meu dever de discípulo de Jesus Cristo,

Se eu puder levar a salvação para alguém,

Se eu puder divulgar a mensagem da paz do meu Senhor,

Então a minha vida não terá sido em vão.”

Sonhou, viveu e morreu pela paz. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - Mestre Kasuko Abe Kurita, da religião Oomoto no Brasil. A religião Oomoto, fundada em 1892 no Japão, segue a antiga tradição da religião tradicional do Japão, xintoísmo.

 

A SRA. KASUKO ABE KURITA - Boa-noite. Nós vamos fazer uma oração pela paz - Uamatsu Norito.

O verdadeiro Deus absoluto, o Criador, impregna eternamente com sua virtude este grande universo.

Ele domina todas as divindades na preservação do universo.

A ação do seu espírito e do seu corpo manifestou-se como Deus Izanagui.

E este deus atua incessantemente na purificação da natureza universal.

Assim, pois, as divindades de Raraido, que segundo a vontade de deus dividem entre si as funções metabólicas do universo, queiram purificar todas as coisas contrárias a deus: pecados, máculas etc.

E também todas divindades celestes e terrenas queiram colaborar.

Suplicamos”. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - O Sheik Muhammad Ragip, representa a Ordem Sufi Halveti Jerrahi no Brasil, nos traz a oração do Islã.

 

O SR. MUHAMMAD RAGIP - Boa-noite a todos.

Gostaríamos de ler um texto especial para esta ocasião que fala a respeito do Islã.

No Islã nós cremos em Deus, Alá uno e único.

No caminho do sufismo, buscamos conhecer Alá através do amor.

Aprendemos que a paz começa em nosso interior, pelo reconhecimento de que toda criação, inclusive nós mesmos, somos manifestação de sua vontade infinita.

Lembrar de Alá e de sua constante presença conduz à harmonia com suas divinas leis, à consciência da comunhão entre tudo e todas as coisas.

Em conseqüência, a verdadeira paz, coroada pela atitude de amor e respeito à natureza, à vida, ao ser humano.

Para lembrar de Alá, um capítulo do sagrado Alcorão:

“Em nome de Deus, o beneficentíssimo, o misericordiosíssimo

Diga, Ele, Alá, o único.

Alá o eterno, o absoluto.

Jamais gerou, nem foi gerado.

Não há nada que se lhe compare.”

Muito obrigado. A paz esteja com todos. (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - A Sra. Fariba Shaikzadeh Vahdat, da Comunidade da Fé Bahá’i, de São Paulo, lerá um extrato  dos escritos sagrados do fundador da Fé Bahá’i, Bahá’u’llah, que datam de 1844, aproximadamente.

 

A SRA. FARIBA SHAIKHZADEH VAHDAT - “Ó, bem amados! Ergueu-se o tabernáculo da unidade: não vos considerei uns aos outros como estranhos. Sois os frutos de uma só arvore e as folhas do mesmo ramo... O bem-estar da humanidade, sua paz e segurança são irrealizáveis a não ser que primeiro sua unidade seja firmemente estabelecida. Tratai uns aos outros com o maior amor e harmonia em espírito amigável e fraternal. Ó povos e raças da terra que estais em contenda! Tão potente é a luz da unidade que pode iluminar toda a terra. Uni-vos por amor a Deus. Resolvei extirpar  qualquer coisa que motive contendas entre vós. Que não se vanglorie quem ama seu próprio país mas sim quem ama o mundo inteiro. A Terra é um só país e a humanidade seus cidadãos. Bahá’u’llah.” (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER  - Luciana Ferraz, responsável pela Organização Bhrama Kumaris para a América Latina. Bhrama Kumaris foi fundada em 1936, dedicada ao regaste dos valores humanos que é levar a paz a todos através do ensino da meditação.

 

A SRA. LUCIANA FERRAZ - Um convite a todos para que durante esses momentos possamos experimentar e irradiar a paz. Aqueles que quiserem podem fechar seus olhos e todos convidados a manter uma atitude relaxada, levando a sua atenção ao centro da sua testa onde a energia viva, a alma, o ser de paz, irradia as suas qualidades e em silêncio experimentar:

 “Eu sou Paz, minha natureza original é paz. Minha essência é de um ser pacífico. É nesse estado de paz que me sinto verdadeiramente bem, completo e digno. Com meus pensamentos e sentimentos de paz, posso unir-me à fonte de paz, Deus, o oceano de paz. aquele a quem unidos podemos experimentar tanta força e poder e dessa maneira irradiar paz e contaminar outros com a nossa presença. Espalhar paz e experimentar ser um farol de paz onde mesmo as pessoas mais perturbadas possam experimentar um alívio, possam experimentar a sua verdadeira natureza. Podemos sentir os nossos pensamentos e sentimentos agora que irradiam paz. Sou Paz.” (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER  - Paulo Sérgio dos Santos, que é um dos dirigentes da Unisois - União de Sociedades Espiritualistas em São Paulo e do Movimento Amigos do Pacto Roerich, e da Bandeira da Paz, que nos traz a grande evocação formulada por Alice  A. Bailey, como uma prece que não é propriedade de nenhum indivíduo ou grupo em especial, mas pertence à toda a humanidade.

 

O SR. PAULO SÉRGIO DOS SANTOS - Peço a todos que se levantem. Nessa atmosfera, vou pronunciar e vou pedir para que vocês repitam para que a humanidade possa usufruir desses benefícios :

“Do ponto de luz  da Mente de Deus

Flua a Luz às mentes dos homens.

Que a luz desça à Terra.

Do ponto de Amor do coração de Deus

Flua Amor aos corações dos homens.

Que o amor retorne à Terra.

Do centro onde a vontade de Deus é conhecida

Guie o propósito às pequenas vontades dos homens.

O propósito que os homens conhecem e ao qual servem.

Do centro a que chamamos raça dos homens

Cumpra-se o plano de amor e luz

E que ele cerre a porta onde mora o mal.

Que a luz, o Amor, o Poder e a Paz restabeleça o plano na terra.

Que assim seja.” (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER  - Após  todas essas antigas tradições, nos sentimos honrados e felizes porque Stefanie Lombardi, uma aluna da 4ª série do Colégio Maria Imaculada, que representa aqui uma voz de todas as crianças e de todos os jovens, nossos parceiros queridos na missão de construir um ano de cultura de paz e um milênio sem violência, lerá a oração que o colégio preparou para esta noite.

 

 A SRTA. STEFANIE LOMBARDI - “Em nome de todas as crianças da Terra, nossa mensagem de paz.

Povo africano, povo indígena, povo americano, povo brasileiro, tem tanta gente diferente e isso é genial. Na adversidade, paz a todos; violência a ninguém.

A violência não é só brigar, é também destruir a natureza cortando árvores e soltando balões perto das matas. As pessoas matam árvores, gente matando gente.

Ô gente, acorda! Não destrua a floresta, ela é o sangue do mundo. Com dignidade e com a verdade, a paz renasce nos corações de todos. Sabemos que há muita violência na Terra, mas nós crianças estamos assumindo o compromisso com o amor. Do respeito ás individualidades geram a paz. Deixe a paz agir em você.” (Palmas.)

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - Nosso sonho é que as religiões, as artes e as ciências estejam sentados juntos construindo a paz.

Queremos convidar os monges da Abadia de Nossa Senhora da Assunção para encerrar esta roda de preces com o canto gregoriano. (Palmas.)

 

O SR. REPRESENTANTE DOS MONGES -  Vamos cantar duas orações devotando a Deus o louvor de oração que Lhe é devido. Vamos invocar com esta primeira oração o Seu Santo Espírito a fim de que oriente as nossas mentes, os nossos corações e que possamos, a partir disso, agir conforme os Seus preceitos. Creio que não há lugar mais apropriado do que este, esta Assembléia que é onde estão os nossos governantes e que aqui são decididas importantes determinações que vão influir na vida de muitas pessoas do nosso Estado.

*     *     *

-         É feita a oração.

*     *     *

 

O SR. REPRESENTANTE DOS MONGES - Esta curta, porém muito profunda oração, é aquela que foi ensinada pelo próprio Senhor Jesus, é a oração do Pai Nosso que é conhecida de todos.

 

*     *     *

-         É feita a oração.

 

*     *     *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Queremos agradecer ao professor Nestor Reinoldo Müller por esta roda de preces.

O sinal da nossa televisão vai sair do ar às 10 horas da noite, mas continuaremos documentando e teremos toda a cerimônia.

Gostaria também de anunciar a presença do Vereador Adriano Diogo. Vamos passar agora a uma fase que será uma mesa redonda. Antes, porém, rapidamente, gostaria de retomar as palavras do Jorge, o nosso consultor da Unesco, quando, de forma muito feliz, incorporou a todos - foi assim que entendi - desde já, demonstrando que às vezes mesmo inconscientemente nós já estamos fazendo parte do espírito e do esforço pela cultura de paz, às vezes até sem sabermos. Isto porque todo este movimento já existe e é exatamente para ter esta compreensão que faremos esta parte da cerimônia, para que possamos ter claro que todo o nosso esforço que vínhamos realizando, mesmo que isolado, neste momento pode se unificar rompendo com o isolamento, nos fortalecendo a todos neste processo de construção desta defesa da paz e da não violência. Mesmo as nossas ações, por vezes mais pequenas, a partir deste nosso esforço, devem se unificar. E assim seremos mais fortes e teremos condições de também trazer novos grupos, cidadãos e cidadãs, para junto conosco responder positivamente a este chamado da ONU e da Unesco.

Chamaremos - e temos certeza de que todos irão compreender e se encontrar desde já neste processo - seis pessoas que estarão desenvolvendo alguns temas importantes que constam do manifesto, que nos reúne a todos e que potencializa a nossa ação a partir de agora: respeitar a vida, rejeitar a violência, ser generoso, ouvir para compreender, preservar o planeta, redescobrir a solidariedade.

Vamos chamar, para desenvolver “respeitar a vida”, Zulmira Alvarenga, líder comunitária do Movimento de Saúde da zona leste, em São Paulo.

 

            A SRA. ZULMIRA ALVARENGA - Quero agradecer o convite e agradecer também por estar presente em uma cerimônia tão bonita, com orações que tanto tocam os nossos corações. Sou uma dona-de-casa e uma líder comunitária. Dediquei mais de três décadas de minha vida à construção do movimento, por melhores condições de vida e saúde.

Moro na periferia da Zona Leste há 40 anos. Lá criei meus filhos. Foi uma vida muito dura, não só minha, mas de todas as pessoas que moravam naquela região - e que ainda moram. Na época de 70 achamos importante - eu e mais algumas pessoas da região - nos unirmos com o intuito de batalharmos algumas melhorias para a região. Não tínhamos direito nem de vacinar nossos filhos. Epidemias de sarampo, tudo isso era muito difícil para trazermos saúde para as nossas crianças e para todos os que lá moravam. Esse movimento a que dediquei uma boa parte da minha vida,  não só eu, mas várias companheiras e vários companheiros que estão presentes, assim como profissionais de Saúde também dedicaram-se a essa luta. E também, por que não dizer, alguns homens, os funcionários da área da Saúde. Todos foram desenvolvendo uma mudança na região, até que perceberam como estavam crescendo as nossas crianças, o nosso amor pelas pessoas, o nosso modo de vida. Tudo isso foi mudando e valia a pena fazermos aquele trabalho. Era uma época muito difícil. Estávamos vivendo a época da ditadura no país e isso trouxe problemas enormes. Não foi uma época fácil. Foi difícil mas conseguimos transformar a questão em boa parte da região. Lutávamos em nível de região e de bairro, mas conseguimos mudar aquele quadro de não ausência da saúde.

Desenvolvemos também várias outras comissões de saúde entre as mulheres, como o saneamento básico e a questão do corpo comunitário, que eram as grandes necessidades que víamos naquele momento. Outra questão que foi muito importante e pela qual lutamos muito, principalmente em discussões com autoridades, foi a criação dos conselhos. Essa idéia de conselhos era extremamente importante para a população, não só em termos de conquistas, como equipamento de saúde, equipamento para melhor atendimento, maior número de funcionários e médicos. Além dessas conquistas queríamos também participar da questão das decisões, no que tínhamos conquistado, e principalmente na questão da Saúde. Elegemos vários conselhos. A  idéia foi muito importante e cresceu tanto que hoje, na cidade de São Paulo, se não houver o Conselho de Mulheres, não se recebe o dinheiro do SUS.

O Estado de São Paulo tem seu conselho, assim como o Governo Federal. E foram conquistas da população, feitas através da organização. Hoje temos nossos amigos de luta - que sempre o foram - na questão da Saúde. Eles hoje estão batalhando no Legislativo e conquistando várias leis, como a questão do SUS, por exemplo. Essas pessoas batalharam muito, foram nossas companheiras, juntamente com as donas-de-casa e as pessoas que moravam na região.

Para terminar quero falar sobre a importância do valor da vida. Sempre temos que lutar por isso, porque é muito duro você ter um filho e não ter condições de dar a ele um mínimo de atendimento. Nós também temos direito a viver, e viver bem.

Era o que tinha a colocar. Sei que vimos há muito tempo lutando por melhores condições de vida, saúde e tudo o que necessitamos, como justiça e liberdade. Obrigada. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT- Ouviremos agora o ‘Registrar a Violência’, pelo Sr. Eduardo, Diretor do Instituto São Paulo Contra a Violência, Diretor do ‘Transparência Brasil’ e Vice-Presidente do Sinduscom.

 

O SR. EDUARDO CAPOBIANCO  - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sras. e Srs., sinto-me muito honrado em participar dessa belíssima cerimônia de lançamento da Campanha Internacional pela Cultura da Paz e Não Violência da Unesco.

Vou transmitir a minha visão sobre a epidemia de violência que atinge a sociedade brasileira.

A violência possui conotação claramente multidisciplinar. Podemos separar a sua causa em quatro grupos principais: aspectos sócio-econômicos, funcionamento do sistema processual e penal e a organização do Poder Judiciário, incluindo o Ministério Público, sistema prisional e dos organismos policiais, federais e estaduais. Esses quatro grupos de causas da violência agem de forma integrada. São causas e conseqüências, estabelecendo um circulo vicioso extremamente prejudicial à nossa sociedade. Esse quadro é agravado pela forma como a sociedade civil tem reagido, fruto de duas visões que pouco contribuem para obtenção de soluções, ou seja, a visão do exclusivismo e a visão da cidadania como protesto.

A visão dos exclusivismos reduz, equivocadamente, o combate à violência, uma entre duas possibilidades, deixando portanto de reconhecer o aspecto fundamental de sua multidimensionalidade ou exclusivamente ao combate das causas sócio-econômicas: pobreza, analfabetismo, desemprego, marginalização social ou exclusivamente aumentos de recursos, financeiros e reaparelhamento da polícia.

Por outro lado, a visão da cidadania como protesto decorre de uma visão equivocada de que o principal, até mesmo o único responsável pelo bem ou pelo mal que acontece no País é o estado, por tal razão, exercer, neste caso, a cidadania é apenas criticar o Estado. Para o melhor entendimento desse circulo vicioso - vou me estender um pouco  sobre uma das causas citadas - o inadequado funcionamento do sistema prisional. Como deve ser a missão do sistema prisional?

Primeiro, manter os presos encarcerados, conforme determinam as decisões judiciais. Segundo, devolver os presos ao convívio na sociedade, após o cumprimento da pena, preparado para esse convívio. A sociedade civil como cliente o sistema prisional deveria exigir, cobrar em função dessas missões. A sociedade não cobra, não exige e não colabora com o Estado. Segmentos importantes possuem profundo desprezo pelo preso.

O Estado está sendo ineficaz no cumprimento dessa missão. Alguns números nos proporcionam melhor entendimento do tema. Os números que vou analisar são obtidos pelo censo. O sistema prisional não possui dados individualizados dos presos. Como é possível preparar um trabalho de recuperação com os presos se não temos dados individualizados, possibilitando que se faça trabalhos específicos de acordo com a população cliente que temos que atender?

Voltando ao censo, temos o de 96 e os números são impressionantes: temos 32% da população carcerária no Estado de São Paulo, com idade entre 18 a 25 anos; 26% de 26 a 30 anos. Isto quer dizer o seguinte: que 58% da população encarcerada no Estado de São Paulo tem de 18  a 30 anos.

Por outro lado, tamanho das penas: apenas 18% das penas têm mais de 20 anos. O que isso quer dizer? Quer dizer que o preso vai voltar a conviver em sociedade e o sistema penitenciário tem sido totalmente incapaz de fazer com que o preso se recupere e esteja em condições de conviver com a sociedade e os dados são impressionantes.

Em 96, 47% da população carcerária era de reincidentes. Tinha sido preso, libertado e voltado a ser preso outra vez. Isso provoca estresse, um supercongestionamento no sistema   carcerário do Estado, que se torna cada vez mais incapaz de recuperar esse preso.

O sistema penitenciário não contém o criminoso, não promove a sua recuperação e só agrava  violência. É causa de mais violência e conseqüência, à medida em que tem que manter um grande número de reincidentes, que superlota o sistema de presídios e dificulta  a recuperação dos encarcerados.

Por outro lado, a violência eleva o custo Brasil, a ponto de o BID estimar em 55 bilhões de dólares o custo com a polícia,  segurança privada,  prisões e tribunais no Brasil. Só com internações de vítimas de criminalidade gastamos 15 bilhões de dólares, que representa 1,9% do PIB.

As transportadoras elevaram, na última década, de dois para 12% seus gastos sobre faturamento em gestão de risco. Conclusão: o custo da violência reduz a capacidade de competir, a fugir dos investimentos e como conseqüência piora as condições de vida da população e aumenta a violência. É o ciclo que se mantém.

Precisamos quebrar esse circulo vicioso, o que será possível com a mudança de atitude do estado e da sociedade. Mudança de postura que incorpore essa visão multidisciplinar, que abre espaço para criação de fortes parcerias de público e privado. Que transforma o cidadão de um simples crítico em um demandante consciente e parceiro.

Tenho insistido junto ao Governo do Estado de São Paulo, para estabelecer um plano estadual de combate à violência que, incorporando essa visão multidisciplinar, envolva todas secretarias estaduais, Prefeituras, entidades de sociedade civil, um trabalho articulado, planejado, que ataque o circulo vicioso e estabeleça clima de tranqüilidade que todos almejamos.

Senhoras e senhores, a violência não atinge apenas o patrimônio das empresas e dos cidadãos, mas principalmente aquilo que temos de mais valioso, que são as vidas de nossos filhos, parentes e amigos. Não é assunto que deve ficar na mão do Estado, apenas. O Estado como organização burocrática, sofre pressões.

            O crime organizado sabe o que quer, tem recursos, pressiona todos os níveis das instituições públicas. Temos que reagir, demandar corretamente, influir, colaborar e neutralizar a ação do crime organizado, enfim assumir o papel de cidadão. Quando alguma decisão beneficia um determinado grupo, esse grupo se mobiliza, faz “lobby” para conseguir atender os seus interesses.

            O combate à violência beneficia a todos e assim cada um deve contribuir de acordo com a sua capacidade para que a cultura de paz se espalhe em todo nosso País. Muito obrigado! (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Tem a palavra o Sr. Marcos Terena, Coordenador Geral dos Direitos Indígenas da Funai, Coordenador da Conferência Mundial dos Povos Indígenas-Rio 92, membro do grupo de trabalho sobre povos indígenas das Organização das Nações Unidas, com o tema Ser generoso.

 

O SR. MARCOS TERENA - Sr. Presidente, Srs. Deputados, obrigado por terem me convidado a participar desta solenidade e aos senhores que estão aqui até esta hora, buscando algumas linhas de pensamento sobre a paz. Nós, os índios,  sempre sofremos todo o tipo de opressão, em nome da civilização por um lado, em nome do desenvolvimento e em nome da paz. Ao longo do tempo mais de cinco milhões de indígenas que aqui viviam ficaram entre a cruz e a espada. Naquele tempo o Brasil era 100% indígena e hoje apenas 11%. Somos em torno de 350 mil índios. O Brasil, por ocasião dos 500 anos, ainda não soube como descobrir esses valores e riquezas, por isso consideramos muito importante estar aqui nesta noite.

Sou um índio do Pantanal do Mato Grosso do Sul, nasci numa pequena aldeia chamada Toné e, quando criança, senti o sabor de ser criança. Hoje de manhã, em Brasília, onde  trabalho, conversei com aproximadamente  21 pajés. Por coincidência eles falaram da preocupação que têm com o homem branco, porque a estrada do homem branco é muito perigosa. Mas estamos no Brasil e uma solenidade como esta, em algum lugar da Europa, África, Ásia e América do Norte, as pessoas estariam com suas bombas, com seus revólveres e metralhadoras, atirando umas nas outras, em nome da religião e  da paz. Não é esta paz que nós, os índios, sonhamos para o Brasil. Por isso nossos pajés estão sempre cantando, tocando suas maracás. Muita gente olhou para aquele índio que cantava e trouxe a cruz. Disse, vocês estão errados, vocês precisam conhecer a verdade, porque a verdade os libertará.          Mas, ninguém perguntou qual era a verdade do índio. Inclusive, não sabíamos que éramos índios.

Eu me considero um do povo indígena chamado Terena, como os Guaranis de São Paulo e assim sucessivamente. Mais de mil povos. Hoje, somos só 200. Mas para nós é muito importante ouvir as preces que vocês fizeram. Ouvir os cantos. Hoje de manhã, numa reunião de pajés, um pajé da Amazônia tocou sua flauta e assoprou sua fumaça. Na Universidade de Brasília uma senhora tocou sua flauta também.

E nós pudemos vivenciar alguns minutos de paz, porque era música. A música falou muito mais para mim do que muitas palavras. Nós, os índios, respeitamos muito o Grande Criador. O Grande Criador está olhando este lugar. Nós estamos inclusive falando ao Grande Criador para ajudar o Brasil, a ter bons Deputados, a ter bons caciques, chefes que cuidem com dignidade, com generosidade, não com paternalismo, como o sacolão, por exemplo, da dignidade do seu povo. Nós, os índios, respeitamos muito as crianças.

Eu estava olhando, enquanto alguns falavam, as crianças com aqueles pássaros de papel. Eu fiquei olhando para aquela árvore, uma árvore que está triste porque ela não esta na terra dela. Eu olhei para os pássaros: os pássaros não voam, não cantam. Mas eu ouvi um passarinho cantando lá fora enquanto se falava aqui. Então procurei entender o que vocês querem quando falam de paz, quando falam de generosidade. Porque lá em Brasília um Deputado Federal, do Paraná, falou “Vamos destruir a floresta”. Para nós, os índios, a floresta é a morada do Grande Criador. Por isto a gente protege a floresta. Nós não temos religião, nós não temos igreja. Nós nunca tivemos pastores ou padres ou monges. Nós tivemos muita força espiritual. Basta olhar onde estão as águas, os animais, os campos, as aves, onde estão as matas, onde está a terra, onde está a vida.

O homem branco tem uma ambição muito grande, que vocês, que são homens brancos de bom coração, precisam frear, porque ela vai destruir os índios, vai destruir a floresta e vocês também. Então estamos orando, usando uma palavra em português, por vocês também. Estas crianças para nós são muito importante, porque elas deram um pouco da sua generosidade. Elas levantaram os passarinhos. Muita gente não olhou para os passarinhos quando elas os levantaram.

Eu quero dizer para todos vocês que nós, os índios, os povos indígenas, olhamos para o futuro. Nós acreditamos no futuro por causa da força espiritual. Força espiritual não é religião. É por isto que eu posso olhar para a cor do seu cabelo, dos seus olhos, mas não posso ver o seu coração. Posso ver o brilho dos olhos das crianças, posso ver a força física do homem, da mulher, posso ver também, com muito brilho, a sabedoria dos velhos. É por isto que quando olhamos para o futuro não podemos deixar de olhar para o passado, para as nossas raízes, para os nossos ancestrais.

Para terminar, eu queria dizer para todos vocês: se vocês buscam a paz, vocês têm de fazer parte desse processo. Não nas igrejas somente, mas no dia-a-dia. Vocês têm de estar preparados. Não a paz que é imposta, que produz mais guerras, mas a paz verdadeira, que a gente não enxerga. A gente não enxerga a paz. A gente precisa sentir e viver a paz, a verdadeira paz, a dignidade, o respeito mútuo. Respeito à criança abandonada, que não tem o que comer hoje, que não tem onde dormir hoje. Os velhos que estão jogados por aí. Tudo isto nós, os índios, todos os nossos pajés, estamos olhando por vocês, para que vocês possam viver o verdadeiro sentido da vida, da generosidade, da grandeza, que significa respeitar o outro e ser respeitado.

Que o Grande Criador ilumine a cabeça de vocês, toque o coração de vocês, para que vocês sejam grandes mensageiros da paz, grandes profetas, para que o Brasil possa continuar a ter essa força espiritual que tem graças aos nossos antepassados e que agora a gente quer compartilhar com os 160 milhões de pessoas o único caminho na direção do futuro no rastro dos antepassados.

Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - Para desenvolver o tema  “Ouvir e compreender”, passo a palavra a Hérodoto Barbeiro, Jornalista da Rádio CBN-São Paulo e da TV Cultura-São Paulo.

 

O SR. HERÓDOTO BARBEIRO - Boa-noite. Inicialmente gostaria de dizer da imensa satisfação de pertencer ao povo que tem manifestações tão diferentes quanto estas que acabei de ouvir. Estas três manifestações diferentes, de origem diferentes, me encheram de orgulho. Dentre as manifestações religiosas aqui apresentadas, eu me considerei representado por uma delas, a da Reverenda Cláudia, superiora do templo do budismo, minha porta de entrada no budismo.

O tema que me passaram “Ouvir e compreender”, creio ser extremamente ingrato para mim, porque sou um jornalista de veículo de comunicação eletrônica, onde a notícia é passada pela voz. Então, vejam: estão me pedindo para que eu ouça mais do que fale, o que é quase impossível. Mas, tenho algumas idéias que gostaria de passar aos senhores.

 

“OUVIR PARA COMPREENDER

 

Heródoto Barbeiro

 

Os meios de comunicação se pautam pelos princípios éticos de respeito ao ser humano, a defesa da liberdade de expressão, o respeito à diversidade cultural e a tolerância em todos os níveis. Para isto ser possível é preciso o jornalista primeiro aprender a ouvir para depois falar. É a partir dessas premissas que se dá a contribuição para a construção de uma sociedade humana generosa, solidária onde pontifica acima de tudo a paz entre os homens, cidades, regiões, países, continentes e etnias.

 Baseados nesses princípios os jornalistas precisam praticar, antes mesmo de veicular uma notícia,  arte de ouvir em parte ou no todo o conjunto da sociedade. É preciso refrear o desejo de preencher todos os espaços com suas idéias e visão do mundo. É preciso entender que ninguém é dono da verdade e, para isso, basta não se afastar jamais dos princípios éticos da profissão, o que leva, muitas vezes, ao embate com grupos política e economicamente poderosos, onde muitas vezes se joga o emprego e, em algumas vezes, a vida.

 Há que se entender que imprensa pretende representar toda a sociedade e, portanto, é preciso considerar as adversidades que ela contém e, mais do que permitir, respeitar as características dessas frações da opinião pública, sejam elas quais forem. É o direito universal da liberdade de opinião que se expressa no direito de ocupar o espaço informático. É a democratização dos veículos de comunicação abertos a todas as correntes sociais de opinião. Isto vai além das palavras do filósofo Voltaire que disse certa vez que não concordava com nenhuma palavra que seu opositor dizia, mas que dava a vida pelo direito dele dizê-las. Trata-se da preservação da universalidade do controle editorial, que possibilita a todos terem suas idéias e visões do mundo divulgadas, sem qualquer tipo de censura, seja ela do Estado, dos anunciantes, dos veículos ou da auto-censura.

 O jornalista deve entender o caráter social do seu trabalho e a melhor forma de exercer a tolerância de idéias é lembrar o dito popular que diz que temos uma boca e duas orelhas, e devemos falar na mesma proporção. Para tanto, é preciso combater a soberba e praticar a humildade. É preciso entender que se deve combater todos os preconceitos e procurar com o maior esforço possível a objetividade, dentro de uma atividade que todos sabem que carrega uma alta dose de subjetividade. É um esforço imenso que precisa ser realizado diariamente pois tanto uma como outra são dinâmicas e exigem ações concretas, sob a pena de se querer impor sua opinião aos demais.

A isenção no tratamento das notícias é uma boa contribuição para a pluralidade de idéias. Mas ela também é uma busca constante, uma vez que não é estática, e sim dinâmica como a própria sociedade que o jornalista pretende retratar. A busca da verdade tem que ter a fiscalização constante do cidadão e da sociedade. É preciso entender que a imparcialidade não existe, por isso só a transparência total pode permitir que as pessoas acompanhem e julguem o trabalho dos jornalistas e dos meios de comunicação. A democracia é mais do que o direito de opinar livremente, é o direito de divulgar o que se pensa. As contradições internas da sociedade provocam algumas divergências entre os oligopólios de comunicação, abrindo espaços para o contraditório, mas isto não é suficiente para sociedade democrática. É necessário o livre acesso social ao meios de comunicação.

A busca constante da informação correta é o melhor caminho para a informação humanística, com profundidade, lógica e isenta. Para isto o jornalista deve exercitar a prudência, a exatidão e ao mesmo tempo combater a arrogância e o prejulgamento, o sensacionalismo e a invasão da privacidade. Isto não quer dizer que informar com convicção seja demonstração de intolerância. Há quem cultue o personalismo sem entender que o jornalismo é cada vez mais difuso quanto mais aberta e democrática for a sociedade. Há que se prevenir a espetacularização da notícia, com a eleição discricionária de heróis e bandidos, que transforma setores sociais desprivilegiados em alvo de jornalismo que exerce o assassínio de personagens.

 Os valores éticos devem permear, os veículos de informação. A ética não é uma Lei. É um compromisso com as questões perenes que a humanidade vem desenvolvendo ao longo dos séculos. O jornalista não é um formador de opinião, não é um líder messiânico, ou um condutor de povos. É apenas o informador para uma parte da sociedade o que a outra parte está fazendo. A missão da imprensa é ajudar a sociedade a ser mais feliz através da transparência dos seus atos. E isto se consegue com a livre divulgação. A sociedade democrática é a senhora da comunicação. A ética, segundo Aristóteles, não é uma contemplação abstrata. A ética não é natural. É uma construção humana cultural. Ela não é absoluta, mas relativa ao ambiente cultural onde se processa. Mas alguns princípios se universalizaram   com o desenvolvimento da história, como o respeito pela vida humana em qualquer quadrante do planeta, ainda que até recentemente alguns afirmavam que a ética acabou no campo de concentração de Auschwitz.

A ética jornalística se estende do conteúdo das reportagens à manchete. Não se pode anunciar algo que uma matéria jornalística não contém. Não basta o jornalista, se armar da boa fé no seu trabalho. Errar de boa fé ou de má fé ainda produz vítimas. É preciso ir além, ter sempre em mente os limites éticos dessa atividade social, quando não se sabe quem escreve o quê, o veículo de comunicação tem que ser responsabilizado legal, social e eticamente dos abusos que comete.  

A comunicação espelha o espectro social por inteiro, não pode excluir este ou aquele segmento social seja qual for o motivo. Ela pertence ao ser humano e é um de seus direitos fundamentais desenvolvidos com o aprimoramento tecnológico da sociedade humana.

A imprensa tem uma imensa contribuição para dar na construção da sociedade humanística democrática. Basta perseguir a isenção, a verdade, a tolerância, respeitar os limites éticos e o acesso democrático à difusão de idéias. De qualquer idéia. Mas cabe a sociedade a imensa tarefa de exigir que esses parâmetros sejam seguidos para se evitar os erros do passado quando o racismo, o ódio entre povos, o belicismo, o imperialismo, a exclusão social, a superioridade de etnias e de povos foram responsáveis pela dor e a miséria de milhões de pessoas em todo o mundo.

A sociedade tem que estar atenta para que campanhas jornalísticas que insuflaram a guerra, o nacionalismo exarcebado, o massacre, a inferioridade de povos, as conquistas predatórias, a eliminação dos divergentes e opositores, o fechamento de organizações sociais representativas não volte da forma clara ou sub-reptícia. Há inúmeros e dolorosos exemplos ao longo do Século XX para quem quiser reavivar a memória. É bom dar uma olhada nos erros do passado para não estarmos condenados a repetí-los no presente.

 

Heródoto Barbeiro é jornalista, âncora do Jornal da TV Cultura, do Jornal da CBN, articulista da America On Line, Super Onze Ponto Net e Diário Popular.”

 

 O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Muito obrigado, Heródoto Barbeiro. Para desenvolver e preservar o planeta, Mário Mantovani, ambientalista e diretor do SOS Mata Atlântica.

 

O SR. MÁRIO MANTOVANI - Quero agradecer ao comitê coordenador do Manifesto 2000 e dizer da nossa imensa satisfação de poder estar participando dessa solenidade, que é uma das grandes aspirações do movimento ambientalista. Esse movimento que surge como a manifestação do movimento pacifista, assim como o movimento ambientalista é reconhecido no seu  primeiro momento e que busca nada mais e nada menos do que mostrar que todas formas de vida são instrumentos  da paz. Temos que estar construindo essa paz a todo o momento. Talvez fui atraído por esse movimento pensando na paz e pensando na forma de poder deixar esse mundo um pouco melhor do que encontramos. Depois tive respostas quando vi que esse nosso esforço todo não seria para o nosso benefício, mas para as futuras gerações e para garantir que esse planeta continue ainda por muito tempo.

            É impressionante, porque mesmo hoje quando temos esse esforço de estarmos ouvindo falar da globalização como uma coisa que atinge a todos, podemos perceber uma coisa interessante que a questão ambiental não precisou de leis para que tivéssemos um respeito á natureza. Ela está presente em cada ação. Estava vendo cada religião que aqui falou, lembrando de séculos de tradição, que um dos elementos comuns a todos eles é a relação com a natureza. Essa relação que passa na oração e passa naquilo que se busca. Muitas das coisas que as religiões puderam cometer, como disse Terena, foi por esta questão humana de acharmos que sabemos mais do que a realidade. Mas a realidade está se manifestando num rio limpo, numa árvore que está crescendo, numa floresta que consegue manter a condição do clima, está naqueles lugares onde percebemos a criação de Deus, onde percebemos que ali o ser humano foi colocado para viver em paz e harmonia.    Isso vem sendo quebrado ao longo desse tempo em que pensávamos que a natureza era para ser conquistada. Por causa disso talvez cometemos tantos erros com a natureza e com as pessoas que vivem no planeta.

Eu gostaria de lembrar aqui de alguns momentos importantes, principalmente quando falamos da ONU, da Unesco - eu, que participei da década da água como talvez uma das grandes manifestações que conseguimos fazer através da Unesco, chamando a participação da sociedade para um tema tão importante, tão universal como a questão da água - vemos que em 72, quando tem a primeira conferência que fala de meio ambiente, percebíamos ali, naquele momento, e eu aqui no Brasil começava a militar na mão de algumas pessoas que tomamos a consciência naquele momento que vivíamos num planeta único.

E aí, resgatou-se aquelas coisas “o que acontecer à Terra acontecerá aos filhos da Terra”. Em 88, aqui em São Paulo, tivemos a oportunidade de ler o relatório Brundnans que dizia da sustentabilidade, da importância de buscar fazer coisas responsáveis para que pudesse ter garantias de vida neste planeta. E a paz era uma das coisas mais importantes, aquilo que mais chamava a atenção. E vimos ver isso em 92, quando o Dalai Lama faz na Eco 92 uma das maiores manifestações que mais me tocou, chamando a atenção de que estávamos na busca dessa sustentabilidade a partir do momento em que cada cidadão vivesse plenamente sua cidadania, que ele conseguisse lutar pelos valores, exigisse responsabilidade, exigisse boas leis, exigisse que todos os atos da humanidade fossem valorizados. E aí percebemos que estamos hoje com o meio ambiente numa situação difícil, se formos pensar, mas num momento importantíssimo: é possível reverter este quadro de degradação, é possível que percebamos que, quando você tem a dúvida no caso dos transgênicos não deve fazer uma aventura sem volta. É importante percebermos que no caso da água, se não cuidarmos agora - nós, que acostumamos com a abundância que existe água por todos os lados e aqui nos falta água em São Paulo; hoje estamos falando de um rodízio para poder ter água daqui a um tempo - é importante que percebamos que temos que manter a floresta em pé, como disse o Terena, num ato de irresponsabilidade do Governo hoje, se conseguiu colocar a floresta como uma moeda de troca de qualquer barganha que se fizesse num púlpito como este ou num lugar como este lá em Brasília. Não podemos admitir isso. Talvez domingo vamos estar chamando os cidadãos para se manifestarem e dizerem “não destruam mais a Amazônia porque a Amazônia não é só nossa.” (Palmas.) Esta Amazônia é do planeta, esta Amazônia é daquelas crianças que colocaram aquelas árvores que talvez vão voar, pelo menos na sua imaginação, vão conseguir estar voando e que levamos mais de 120 mil desenhos há dois meses atrás em Brasília chamando a atenção para isso, que tínhamos que manter em pé esta floresta.

O que estamos fazendo, lutando por isso é conquistar a paz. E esta paz é uma coisa que vamos estar construindo a partir do momento que tenhamos talvez - eu penso - naquelas diferenças que foram acentuadas pelas guerras inter-religiosas, pelas diferenças que foram colocadas pelas lutas de poder, pelas diferenças que tivemos pelo esforço de comunicação e de realidade, acho que a questão ambiental pode ser um elo que consiga unir novamente a humanidade, que consiga ser o caldo de cultura da paz, ser aquele lugar onde a paz possa ser construída, ser o terreno neutro dessa busca que temos da paz, dessa busca permanente dessa necessidade que temos.

Em nome do Movimento Ecológico, fico muito feliz porque acho que vimos fazendo a nossa parte; acho que para quem era até um tempo atrás visto como diferença, pessoas que só sonhavam e hoje conseguir estar sintonizado com este grande desejo da humanidade, fico feliz de poder ser um porta-voz desses que deram as suas vidas para poder falar de meio ambiente, para proteger a água, para proteger as árvores, para proteger o ar, para proteger coisas que às vezes achávamos que não tinham o menor valor e que isso devia que ser trocado por desenvolvimento. Hoje percebemos que isso manteve exclusão, que isso conseguiu manter foram muitas pessoas daquilo que lutávamos pela qualidade de vida e pela melhoria da situação de cada um de nós. Então, hoje eu aqui exorto a paz a partir da natureza e garantir a sustentabilidade do planeta e uma vida melhor para as futuras gerações. Obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Obrigado Mário Mantovani. Para desenvolver “Redescobrir a solidariedade”, Mayara Antunes Norbim, bacharel em Direito, funcionária da Justiça do Trabalho, assistente do juiz, membro do Cladem - Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher.

 

A SRA. MAYARA ANTUNES NORBIN - Boa noite a todos. Quero agradecer a imensa generosidade da presença e da atenção de todos aqui, quero agradecer ao comitê organizador do Manifesto 2000. Vamos adentrar ao tema “Pequenas reflexões” que a mim coube fazer.

Redescobrir a solidariedade. Ao iniciarmos esta reflexão sobre redescobrir a solidariedade, parecem-nos necessárias algumas considerações prévias. A globalização do mundo contemporâneo colocou-nos face a face com a patente diversidade resultante dos inúmeros e diferentes grupos humanos que habitam este planeta.

A diversidade, qualidade daquilo ou daquele que é diferente, trouxe à tona por sua vez a nossa tão inequívoca quanto arraigada intolerância. Nas palavras de Eli Wiesel, a intolerância não é apenas o melhor instrumento do inimigo, ela é o inimigo. A intolerância tem como linguagem a violência que, por sua vez, engendra o ódio. Que atitude então poderemos adotar como opção à intolerância, geradora da violência e do ódio para chegarmos por fim à solidariedade?

Poderemos então adotar a tolerância como caminho. Para Paul Ricouer a tolerância é uma conquista histórica embora não universal. Busca-se compreender as convicções adversas sem entretanto necessariamente a elas aderir. A tolerância suscita uma certa suspensão da violência. A suspensão da violência pode ocorrer através de um procedimento argumentativo. Para Habermas o procedimento argumentativo supõe necessariamente o reconhecimento da figura do outro enquanto diferente. Este procedimento argumentativo mais do que assegurar a formação de um consenso, pretende fixar as regrar através das quais se institui o dissenso de modo a gerar a solidariedade entre estranhos.

Prosseguindo em nosso caminho, nós poderemos ainda nos valer do pensamento de François de Ritier, para quem tolerar é então aceitar a idéia de que os seres humanos não são definidos simplesmente como ‘livres e iguais em direito’, mas que todos os seres humanos, sem exceção, são definidos como ‘seres humanos’. Essa idéia fundamenta uma hipotética ética universal, sob a condição de que haja uma tomada de consciência individual e, a partir daí, coletiva, em uma vontade política internacional, e a criação de sistemas educativos que, por fim, ensinem a não odiar - sistemas educativos que ensinem a não odiar.

Para Joseph Campbell e Bill Moyers ninguém incorporou melhor tal ética do que o Chefe Seattle. Por volta de 1852, quando o Governo dos Estados Unidos fez um inquérito sobre a aquisição de terras tribais para os imigrantes que chegavam ao país, o Chefe Seattle, em resposta, escreveu uma carta, da qual selecionamos alguns trechos e, juntos, gostaríamos de compartilhar:

“O Presidente, em Washington, informa que deseja comprar a nossa terra. Mas como é que se pode vender o céu ou a Terra? Essa idéia nos parece estranha. Cada parte da terra é sagrada para meu povo. Conhecemos a seiva que circula nas árvores, assim como conhecemos o sangue que circula em nossas veias. Somos parte da terra e ela é parte de nós. O topo das montanhas, o húmus das colinas, o calor do corpo do pônei e o homem são todos da mesma família. A água brilhante, que se move, nos rios e riachos, não é apenas a água, mas o sangue dos nossos ancestrais. O murmúrio das águas é a voz do pai do meu pai do meu pai do meu pai... Se lhes vendermos a nossa terra, lembrem-se de que o ar é precioso para nós. O ar partilha o espírito da vida que o ampara. O vento, que deu ao nosso avô o seu primeiro alento também recebe o seu último suspiro.

Ensinarão vocês às suas crianças o que ensinamos às nossas - que a terra é a nossa mãe? O que acontece à terra acontece aos filhos da terra. O que sabemos é isso: a terra não pertence ao homem, o homem pertence à terra. Todas as coisas estão ligadas, assim como o sangue nos une a todos. O homem não teceu a rede da vida - o homem é apenas um dos fios da rede da vida. O que quer que ele faça à rede, fará a si mesmo.

Amamos esta terra como o recém-nascido ama as batidas do coração da mãe. Assim, se lhes vendermos a nossa terra, amem-na como a temos amado. Preservem a terra para todas as crianças e amem-na como Deus ama a todos. Assim como somos parte da terra vocês também são parte da terra. Esta terra é preciosa para nós e também é preciosa para vocês. Uma coisa sabemos: existe apenas um Deus. Nenhum homem, vermelho ou branco, pode viver à parte. Afinal, somos todos, absolutamente todos, irmãos.” Com esta carta gostaríamos de terminar, ou quem sabe iniciar nossas reflexões acerca da solidariedade, da paz, do respeito, da justiça, do amor, da compaixão. Quero apenas pedir licença para utilizar-me de uma imagem, segundo a qual “as pessoas são como velas”.

 

*   *   *

 

-              Uma vela é acesa na outra.

 

*   *   *

 

A SRA. MAYARA ANTUNES NORBIN - Que essa vela nos ilumine a todos.   

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Quero agradecer as palavras da Sra. Mayara Antunes Norbin e fazer alguns outros agradecimentos. Agradeço ao Sr. Sebastião Salgado, fotógrafo, e Danilo Santos Miranda, Diretor Regional do SESC São Paulo pela cessão dos pôsteres da exposição ‘Exodus’.

Quero agradecer também ao Sr. Sérgio Kobayashi, Diretor-Presidente, e Selma Arruda, Gerente de Vendas da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, pela impressão do material de divulgação. Agora faremos uma homenagem especial. Gostaria de chamar o Prof. Nestor Reinoldo Müller.

 

O SR. NESTOR REINOLDO MÜLLER - É uma cerimônia que já vai longa, mas que tem seus momentos de novidades que aparecem. Um grupo pensou que ‘Os mais antigos da Terra’ aqui presentes devem receber uma última homenagem. Enfim, foram eles que começaram uma roda de orações e podem terminar a noite.

Gostaria de pedir que Marcos Terena descesse ao centro do plenário, assim como Kaka Werá Jecupé e José Duarte Filho.

Como um símbolo muito humilde e simples desses brancos que estão na terra de vocês há muito tempo, as crianças gostariam de trazer uma pequena homenagem.

 

*   *   *

 

-              É feita a homenagem, através de flores.

 

*   *   *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Dando continuidade à nossa solenidade, já encaminhando para o encerramento, solicito ao Sr. José Romão Trigo de Aguiar que faça a leitura do nosso Manifesto 2000.

 

O SR. JOSÉ ROMÃO TRIGO AGUIAR -

 

(ENTRA LEITURA  2 folhas - “O Que é...”)

 

O SR. PRESIDENTE ROBERTO GOUVEIA - PT - Agradeço ao Cerimonial, à Comunicação, Serviços Gerais da área Parlamentar e todos que colaboraram com este ato. Para que possamos dar continuidade e cada vez nos irmanando mais, darei os endereços onde irão as assinaturas. Aliás o endereço os senhores receberam no material que foi distribuído.

Estaremos encaminhando o Manifesto, suas assinaturas à Associação Palas Atena, Rua Leôncio Carvalho, 99 - Paraíso, próximo ao Metrô Brigadeiro- São Paulo - Telefone: 3266-6188.

Faculdade de Saúde Pública da USP: Av. Dr. Arnaldo, 715 - Pinheiros, próximo ao Metrô Clínicas, São Paulo.

Registro a presença do diretor da Faculdade de Saúde Pública, Professor Jair Licio Ferreira Santos.

Contamos com a participação intensa de todos na próxima reunião, que será realizada no dia 23, às 18 horas, na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

Teremos, agora, a apresentação do Coral Resistência, sob a regência do Maestro Moisés da Rocha.

 

*              *      *

 

-           É feita a apresentação do coral.

 

*          *          *

 

O SR. MOISÉS DA ROCHA - Neste instante rogamos a Deus, cada um na sua crença, para que o compromisso firmado neste noite com os homens e mulheres de boa vontade seja realmente cumprido, que não aconteça como os compromissos internacionais desrespeitados.             Para termos a paz é necessário que haja tolerância, para termos a paz tem de haver diálogo, para termos a paz tem de haver compreensão.

Estamos felizes nesta noite.

Agradecemos esta comunhão da qual desfrutamos nesta noite, esta empatia que vem de vocês, este calor, esta vibração que vem de vocês. Por isto cantamos neste instante - e vocês podem participar ficando de pé ou batendo palmas - “Oh, Dia Feliz”.

 

+   +   +

 

- É executado o número musical.

 

+   +   +

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO GOUVEIA - PT - Agradecemos ao Coral Resistência do Maestro Moisés da Rocha.

Teremos a repetição de atos como este nas cidades de Santos, Ribeirão Preto e Araçatuba. Para maiores informações, o telefone da Palas Atena é 3266-6188.

            Boa noite.

            Está encerrada a sessão.

 

+   +   +

 

- Encerra-se a sessão às 22 horas e 29 minutos.

 

+   +   +