09  DE  JULHO DE 2000

21ª SESSÃO SOLENE  EM COMEMORAÇÃO DO 68º ANIVERSÁRIO DA REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA DE 1932

 

Presidência:  NEWTON BRANDÃO

 

DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA

Data: 09/07/2000 - Sessão 21ª S. Solene  Publ. DOE:

Presidente: NEWTON BRANDÃO

 

COMEMORAÇÃO DO 68º ANIVERSÁRIO DA REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA DE 1932

001 - NEWTON BRANDÃO

Assume a Presidência e abre a sessão. Anuncia as autoridades presentes. Informa que esta sessão solene destina-se a comemorar o 68º Aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932. Convida  todos para ouvirem a execução do Hino Nacional Brasileiro e do Hino do Estado de São Paulo pela Banda da Polícia Militar.

 

002 - ISRAEL DIAS NOVAES

Como Secretário-Executivo da Comissão da Medalha da Constituição, lembra que foi autor, em 1962, da lei que criava a Medalha Constitucionalista. Homenageia todos os que lutaram na Revolução de 1932, destacando a atuação de Pedro de Toledo.

 

003 - LUIZ EDUARDO PESCE DE ARRUDA

Representante da Sociedade Veterana de 32 MMDC, recorda episódios do movimento cívico-militar de 32.

 

004 - ORLANDO MONELLO

Lê as poesias de sua autoria "Paulista de Fibra" e "São Paulo, Meu Amor", alusivas à data.

 

005 - Presidente NEWTON BRANDÃO

Anuncia um Toque de Silêncio.

 

006 - MÁRIO BONFIM

Lê poema de sua autoria em homenagem aos jovens de 32.

 

007 - RUI CODO

Ex-Deputado, recorda que foi autor da lei que criou o Hino do Estado de São Paulo, declama sua letra e expressa satisfação com sua execução, pela primeira vez, no dia de hoje.

 

008 - ISRAEL DIA NOVAES

Procede à entrega de medalhas comemorativas aos homenageados e à Mesa Diretora da Casa.

 

009 - Presidente NEWTON BRANDÃO

Em nome do Presidente efetivo, agradece a homenagem. Anuncia a execução, pela Banda da Polícia Militar, do hino Paris Belfort. Encerra a sessão.

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

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            - É dada como lida a Ata da sessão anterior.

 

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            O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - É com imenso prazer e incontestável satisfação que quero nomear os presentes: nosso Exmo. Deputado Israel Dias Novaes, que está aqui ao nosso lado. Vamos saudá-lo com uma grande salva de palmas, para mostrar a nossa alegria. O nobre Deputado Israel Dias Novaes é Secretário da Comissão da Medalha, e daqui em instantes, S. Exa. terá a oportunidade de falar sobre o tema. (Palmas.) Ao nosso lado direito - e esta é uma apresentação formal - está uma das pessoas mais conhecidas e queridas do Estado de São Paulo, o ilustre acadêmico e poeta e que está neste instante representando o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Refiro-me ao nosso querido Deputado de todos os paulistas e brasileiros, Paulo Bonfim, a quem também devemos saudar com uma salva de palmas. (Palmas.) Também quero ter o prazer que me outorgaram de citar o nome dos presentes. É evidente que gostaríamos de citar todos e não deixar de nomear ninguém. No entanto, como tenho esta relação, vamos logo: Exmo. Sr. Deputado Rui Codo, a nossa alegria em tê-lo conosco. (Palmas.) Sr. José Palma, representando o Exmo. Sr. Deputado Roberto Gouveia, 1º Secretário desta Casa, e que tem o prazer de substitui-lo nesta sessão. (Palmas.) Cônsul Honorário da Itália em Guaratinguetá, Sr. Giampaolo Bonora. (Palmas.) Como estava conversando com ele, vamos prestigiar esta sessão. Sr. Cônsul, sou um Cavallieri da República Italiana e quero dizer que fizemos um monumento em Santo André, quando era Prefeito. Levamos para construi-lo um arquiteto da nossa USP, como ele era um cidadão italiano, o monumento tem características italianas muito fortes. Ele fez com que esse monumento fosse o primeiro realizado por uma entidade estatal. Achei interessante e deram então o título de Cavallieri. Estávamos lá demonstrando a nossa alegria de recepcioná-lo e à sua senhora.  Sra. Maria Augusta Raimundo, da Conseg da Vila Gumercindo. (Palmas.) Esse coronel, meu colega da cavalaria, é uma figura extraordinária, Tenente Coronel da PM, Ary Faria Machado Filho, representando o Comandante Geral da Polícia Militar, Coronel Rui Cesar Melo (Palmas.); Coronel Mário Fonseca Ventura. (Palmas.) Coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, representando a Sociedade MMDC. (Palmas.) Para nós é uma honra muito grande estarmos apresentando o Exmo. Coronel Atiliano Martins Corrêa, que é Conselheiro do MMDC e é o último que temos, que foi comandante das forças de 32. Ele tem 91 anos, fato que é uma maravilha! Gostaria também de chegar lá, a gente precisaria conversar com ele permanentemente, pois ele é uma enciclopédia, uma história viva do nosso Estado e dos acontecimentos que pretendemos hoje nesta sessão comemorar. Muito obrigado. (Palmas.) Sr. Geraldo Faria Marcondes, Presidente da Sociedade Veteranos de 32 - MMDC. (Palmas.)   

Srs. Deputados presentes, senhoras e senhores, esta reunião solene tem como finalidade homenagear e agraciar aqueles que tomaram parte da Revolução Constitucionalista de 1932 e comemorar o 68º aniversário da Revolução.

            Temos uma profunda satisfação, através desta Casa, de apresentar a nossa homenagem àqueles que lutaram por uma verdade, por um ideal, por um desejo e que esta luta não foi em vão, porque ela sempre será lembrada como um movimento que desejou e que deseja, para o nosso Estado e para a nossa pátria, o melhor. Grandes homens deste Estado e alguns deste País têm mencionado este fato com uma realidade sensível e permanente no nosso ideário político de democracia, de condições de democracia digna para o nosso povo, de paz para todos que vêm para São Paulo trabalhar e aqui, junto com suas famílias, tratar da nossa economia e também que o nosso Estado seja cada vez mais progressista para que, através do seu trabalho, se expandam este Estado e este País, para que sejamos sempre essa Pátria querida, unida e cheia de progresso, aquela que todos desejamos. Convido todos os presentes para, de pé, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro e o Hino do Estado de São Paulo, executados pela Banda da Polícia Militar.

 

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- São executados o Hino Nacional Brasileiro e o Hino do Estado de São Paulo, pela Banda da Polícia Militar.

 

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O SR.  PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB  -  A Presidência quer agradecer profundamente à Banda da Polícia Militar e, através dela, estender os agradecimentos a toda a nossa Corporação.

A nossa Polícia Militar tem uma história muito bonita, que precisa ser melhor divulgada. O povo precisa conhecer os seus feitos, as suas realizações, a sua origem e, sobretudo, a sua finalidade tão importante. Por isto nós, através desse cumprimento à Banda, queremos cumprimentar todas as autoridades. A história desta Polícia tem sido, para São Paulo, uma coisa memorável. Em todas as oportunidades devemos manifestar nossa gratidão por tê-los na alegria deste convívio. Neste instante, com a maior emoção e contentamento, passamos a palavra ao nobre Deputado Israel Dias Novaes, membro e Secretário Executivo da Comissão da Medalha da Constituição.

 

O SR. ISRAEL DIAS NOVAES - Sr. Presidente, nobre Deputado Newton Brandão, senhores integrantes da Mesa, minhas senhoras, meus senhores, estou recordando algo muito antigo, que foi o impulso do então jovem Deputado estadual desta Casa em afervorar o sentimento de 1932. Eu ia dizer que em 1962 comemorava-se 30 anos da Revolução de 32, mas não se comemorava coisa nenhuma. Arrefecia-se o espírito revolucionário paulista. E eu, então, atendendo a minha primeira promoção na atividade parlamentar, resolvi restabelecer a Revolução de 32, através da homenagem aos últimos sobreviventes do grande movimento.

Então o Projeto de Resolução 330, de 25 de junho de 1962, criava a Medalha Constitucionalista destinada a condecorar todos quanto direta ou indiretamente houvessem contribuído para a grande jornada paulista.

A Assembléia aprovou a matéria e de para , anualmente neste dia, reunimo-nos para agraciar os remanescentes dessa jornada heróica. São poucos, vêm diminuindo com o tempo. Em 62 eram muitos, lotavam o plenário da Assembléia, à época no Palácio das Indústrias, todos eles ainda tomados daquela emoção antiga. Não se falava quase em 32. Então esta Medalha Constitucionalista, atribuída a milhares de paulistas, fez com que se estabelecesse um vínculo entre o herói de ontem e o fiel de hoje. Alguns que estão aqui hoje vieram representando seus maiores, aqueles que foram para a frente de luta e que não retornaram, mas a sua memória permanece. De 1964 para os tristes tempos seguintes tivemos uma espécie de cautela federal contra a Revolução de 32. Mas eu, que teimo em celebrar este movimento, eu que acho que devo ser o mais leal a esta Medalha, vinha de Brasília para fazer a comemoração na rua defronte ao prédio da Assembléia, já que a Assembléia estava fechada. Então nós nos levantávamos ali, ao relento, para saudar aquele magote de paulistas saudosos do dia de heroísmo. Com o correr do tempo verificamos que a mobilização vinha sendo feita. Todos os heróis ostentavam, no dia 9 de julho, a Medalha altamente nobilitante de 32. Agora posso dizer aos senhores que nós precisamos recordar permanentemente o espírito de 32, porque o espírito de 32 é o espírito da liberdade, é o espírito da democracia. Não contenta a muitos, mas a esses descontentes nós relegamos ao esquecimento. Trinta e dois não foi apenas uma grande guerra paulista e uma notável guerra brasileira, mas também um exemplo histórico que não pode ser esquecido. Perdemos, é verdade, aqueles milhares de paulistas jovens que foram para a frente de luta, que foram morrer nas trincheiras, mas a memória deles não pode ir junto. Temos de mantê-la viva em homenagem ao seu ideal, que sempre foi o nosso. Eu vi a revolução, não tinha então idade, infelizmente, para ir à frente de luta, mas vi sobrevoarem a minha cidade e bombardeá-la os famosos vermelhinhos da ditadura. De sorte que o nosso voto é este: não esquecer o exemplo dos que partiram, daqueles jovens bulhentos, entusiasmados, que iam para a frente da luta e não voltavam. Lembro-me de um que fui retirar da ambulância, em Avaré, que tinha morrido nos limites do nosso Estado, em Itaporanga. Vi aquele jovem morrer na minha presença, um jovem santista, de bigodinho, com uma enorme cavidade no corpo. Aquela imagem me acompanha. De certa forma, para mim, aquele era o paulista representativo, capaz de legar um grande exemplo para nós todos, qual seja, a obrigação de jamais esquecermos desses heróis. Devo dizer que algumas figuras não têm sido lembradas e isto constitui uma gravíssima injustiça.

 A revolução foi um movimento chefiado por militares, mas erguido, sobretudo, pelos civis. Dentre os civis havia um que era formidável, faz com que estufemos o nosso peito, era um homem muito velho, chamava-se Pedro de Toledo.   Se havia os militares comandando a tropa, este era o civil comandando o Estado inteiro. Um homem de 70 e tantos anos, alto, paulista, brioso, cuja história muito breve deveser recordada. Quando passo pela rua Pedro de Toledo, aquela simplicíssima rua periférica de São Paulo, acho que ali não está a memória do Pedro de Toledo, porque o seu espírito domina o nosso Estado e se nós o esquecermos, estaremos cometendo um grave ato de ingratidão para com um herói.

 Quem era esse Pedro Manuel de Toledo? Ninguém sabia em São Paulo. Por quê? Porque quando veio a famosa revolução reacionária de 30, São Paulo sofreu uma invasão demorada, ninguém mais suportava; era uma terra rendida, era uma terra derrotada. Então sucediam-se os interventores. E quando os paulistas acordaram - não acordaram tarde, acordaram na hora certa - lançaram um movimento para o governo de São Paulo: chega desses heróis fardados que não são daqui e que temos todos os motivos para desprezá-los. Foi isso o que dissemos. Então criamos um caso grave para a ditadura. Mas havia aqui em São Paulo uma luta pelos despojos paulistas. Urubus que andavam chafurdando o sangue dos paulistas. Apresentamos vários nomes, mas todos eram vetados. Afinal, depois de muitos meses de expectativa, quando tínhamos formado a frente única de todos os paulistas democratas e peerrepistas, quando São Paulo era um homem e um espírito , alguém do meio federal veio a São Paulo e verificou o que ele pretendia. Voltou ao ditador e disse: querem um civil e um paulista e nenhum dos civis que estão consegue se impor como governador.

 Então temos um paulista fora de São Paulo. Queríamos saber quem era esse paulista distante e longínquo que seria capaz de conciliar a sua terra e os seus conterrâneos. Quem seria ele?

Os tenentes de 32, que eram os mesmos tenentes de 24 e 30, conheciam bem o paulista exilado. Pedro de Toledo fora Deputado, Ministro da Agricultura e depois, como criava casos para o Governo de Hermes da Fonseca, porque não levava ao Presidente a sua subserviência, mas sua altivez, Diplomata. Foi Embaixador na Itália e plenipotenciário. , estabeleceu e restaurou a imigração italiana para nós. Depois de anos em Roma, foi transferido para Madri e ficou por algum tempo. E, finalmente, foi nomeado Embaixador na Argentina.

Quero que os senhores, a partir deste instante, possam sopesar o talento, a energia, a coragem e o desprendimento pessoal deste paulista.

 Nomeado para a Argentina, de repente começaram  a afluir para a Embaixada aqueles veteranos da famosa Coluna Prestes de 1924, os revolucionários em geral foragidos em Buenos Aires e passavam fome, sofriam ao relento nas praças públicas de Buenos Aires, não tinham o que comer e não tinham onde dormir. Aqueles revolucionários brasileiros que haviam passado pelo País inteiro e, afinal, de dispersaram pela fronteira da Bolívia e estavam exilados, famintos e sonolentos em Buenos Aires.  Que fez o Embaixador Pedro de Toledo? Informado de que aqueles brasileiros tão testados da sua valentia sofriam a intempérie e a fome numa cidade estrangeira, sendo eles tão merecedores, tivessem as idéias que tivesse, o Embaixador brasileiro Pedro Manoel de Toledo acolheu os na Embaixada e deu-lhes pouso e de comer.

 Ora, quem era o Presidente da República? O Presidente era um homem marcado por várias qualidades de cultura etc., mas era sobretudo notório pelo rancor: chamava-se Arthur da Silva Bernardes. Não admitia adversários, fossem de que natureza fossem. Adversário dele era inimigo, e se não era apenas inimigo dele era inimigo do Brasil,  a ver dele. Informado de que o Embaixador brasileiro recolhia sob a bandeira do Brasil os inimigos dele, Arthur Bernardes, o que fez o Presidente da  República? Demitiu o Embaixador, recolheu-o, colocou-o em disponibilidade. Então aquele brasileiro altivo, corajoso  e como os que mais o fossem, foi devolvido ao seu País, à pobreza e à ignorância. Fixou-se no Rio de Janeiro, em 1930. Quando não havia paulista que servisse em 1932, um daqueles  recolhidos e socorridos por Pedro de Toledo reuniu-se com os outros, esses foram ao Getúlio e disseram: “Presidente, paulista e civil, está aí um velho que nos abrigou na Embaixada e por isto foi demitido. Esses veteranos todos de 1924, de 1930, de 1932, do movimento ditatorial, esses todos só não morreram de fome e de frio em Buenos Aires, porque esse velho os salvou.”  Deram o endereço de Pedro de Toledo no Rio de Janeiro, homem que estava lá há quase dez anos na total ignorância geral, e ele então recebeu um convite surpreendente, e daquele anonimato dele deveria se excluir para assumir  o Governo de São Paulo. Quando chegou a notícia em São Paulo de que havia um interventor aqui de nome Pedro de Toledo, os paulistas se entreolharam e acharam que quem sabe seria mais um agente da ditadura. Quando ele desembarcou no dia 7 de março de 1932 na estação do Norte, nem os carregadores quiseram carregar-lhe as malas. Teve dificuldades para chegar à casa da filha e depois ao Palácio. ninguém tomou conhecimento dele, mas ele assumiu com pertinácia, com obstinação, e foi se impondo com o correr dos dias. Dele São Paulo conseguiu tudo.

            A Frente única adveio e se consolidou graças aos esforços dele. Aquela primeira denominação de “Frente Única” era  meramente fantasmagórica, mas Pedro de Toledo transformou-a em realidade. Então, esse paulista, com pertinácia, com humildade, foi-se impondo à coletividade paulista e em pouco era ídolo da nossa gente, sempre diplomático, muito alto, muito claro, encanecido, um velho marcado pelo sofrimento de anos de opróbrio e perseguição, aquele velho só faltou explicar a origem antiga dele em São Paulo, o seu paulistanismo de muitos séculos, neto de Joaquim Floriano de Toledo, que tem aquela grande via no Itaim e que por sete vezes governou São Paulo no tempo do Império. Joaquim Floriano de Toledo era avô dele e hoje tem uma prima que é simplesmente a Rainha Silvia da Suécia, Silvia de Toledo, sobrinha chegada do Pedro de Toledo. Então, é um paulista de alta origem, de alta dignidade, antiquíssima, dos velhos brasões da terra.  Pedro de Toledo ficou sendo uma espécie de esperança de São Paulo, porque ele encarnava os nossos sentimentos, as nossas aspirações, nossas frustrações e nossa revolta, e não pedia nada, pedia apenas compreensão e a  possibilidade dele, velho, prestar um último serviço à liberdade e à democracia neste País. De sorte que esse homem foi a grande figura agregadora de São Paulo. Acompanhou a revolução. Era o mais entusiasta deles. Ia à frente de luta para falar aos soldados, para contar a emoção dele, paulista velho, voltando à terra  para presidir a um movimento heróico. Tudo isto Pedro de Toledo dizia aos soldados, andando  pelos centros de combate. Quando sobreveio a derrota em setembro final, não foi ele que hasteou a bandeira branca. Essa bandeira branca ele nunca havia hasteado na vida; a bandeira dele era a bandeira brasileira e também às vezes a bandeira de sangue. Não era a bandeira branca da rendição e da covardia. Então ele ficou revoltado com aquela decisão  isolada dos militares, sem consultar ninguém. Fizeram um acordo na frente de combate, segundo o qual  nenhum dos signatários seria perseguido e daí por diante. Então o Pedro de Toledo se dispunha  a empunhar um fuzil e ir até Campinas para levantar aquela cidade para restabelecer a revolução. Mas o que ele obteve? Foi a perseguição mais tenaz: o opróbrio, o abandono, a mesquinharia, o abandono dos amigos, daqueles sujeitos que são os habitantes dos palácios. Preso durante três meses no Rio de Janeiro.

            Quero que os senhores guardem este aspecto da coisa: não foi preso sozinho. Num cárcere pequeno a ditadura botou com ele quem: Arthur Bernardes, que o havia demitido, que o havia perseguido a vida inteira. A ditadura além de cruel era covarde, era ignominiosa, era pequenina, e também o Borges de Medeiros. Os três, inimizados entre si, a ditadura  botou na mesma cela, no mesmo cárcere, na mesma idéia de perseguição e na mesma revolta. Embarcado para Lisboa no exílio fui visitar o hotel em que sua pobreza permaneceu durante um ano inteiro. Um hotel modestíssimo em Lisboa, mais ainda os gerentes, administradores mostraram-me o quarto habitado pelo paulista Pedro de Toledo. Era o último dos quartos nos fundos. Perguntado em São Paulo porque havia escolhido um quarto tão humilde e de certa forma tão desvantajoso quanto aos outros, ele disse: “Por duas razões, em primeiro lugar porque é muito barato e em segundo, sendo dos fundos dá de frente para o Estado de São Paulo”.  No exílio, era este homem. Quero lhes revelar apenas isto: quem mantinha Pedro de Toledo no exílio naquele hotel modestíssimo, eram as senhoras paulistas, que mensalmente lhe mandavam o suficiente para dormir e comer.

            Quando afinal chegou a primavera e os outros exilados todos debandaram Paris em busca de melhores climas alguém chegou a ele e perguntou: “Dr. Pedro, o senhor vai conosco?”. Ele falou: “Não vou, porque não  tenho um tostão para nada. O que recebo do Brasil dá para sobreviver apenas. Boa viagem para o senhor”. Este era o homem. Um ano. De volta ao País, afinal, 74 anos de idade, muito mais envelhecido e alquebrado, mas com olhar de muita coragem e muito brilho, que seria o velho olhar dos Bandeirantes, Pedro de Toledo teve uma chegada consagradora. Nós todos fomos à Estação do Norte para recebê-lo, para carregá-lo, para mostrar a ele que se ele tinha amigos que não o esqueceram jamais, que transformavam no ídolo da nossa paulistanidade, do nosso heroísmo tradicional, esses eram os paulistas que lhe conheciam o exemplo. Foi carregado na Estação do Norte,  foi levado até a Av. Angélica, onde morava a sua filha.  Ali ficou muito tempo e, por fim, visitando a outra filha no Rio, lá ele numa madrugada, ele que nascera no dia 29 de junho de 1860, era o dia 29 de julho. De madrugada, ele chamou os parentes presentes e disse: estou me despedindo. Eu estou me despedindo e  devo dizer a vocês que com muita tranqüilidade, porque acho que se algo consegui da minha vida, foi cumprir a minha obrigação, expondo-me quando era necessário e lutando quando se fazia mister. Quatro horas e 10 minutos da madrugada do dia 29, morreu e foi trazido para cá e está no mausoléu.

            Em todo Nove de Julho, vamos - os meus amigos e eu - visitar o mausoléu em geral, mas, sobretudo, aquela tumba em que repousa aquele maior entre nós todos, aquele soldado de alma civil, foi visitá-lo, e dizer que temos aqui, um exemplo permanente e uma obrigação para com ele, sempre que tivermos dificuldades, como agora acontece, com essa confusão nacional, precisamos lembrar que foi no nosso solo que nasceu o herói civil como aquele, herói sem nenhuma experiência militar e que, no entanto, revelou eu para ser militar não precisa farda, basta o heroísmo quando é civil.             Então, quando vejo os senhores reunidos aqui, e tenho a oportunidade de recordar essa figura, este paulista de um metro e oitenta de altura, cabelo branco, um ar gentilíssimo, mas atrás vemos que bravura, que energia, que grandeza, que homem. Sorte que transformamos o dia de hoje e esta festa, os senhores todos, paulistas voltados para a nossa história, recordemos, coloquemos de novo no nosso coração, esta figura singular, esta figura isolada, individual, que soube fazer tudo sozinho, e que não arrefeceu e não esmoreceu nunca. Dá a impressão de que o Pedro de Toledo e os paulistas em geral, em 32, receberam de repente, nas suas veias, o sangue total dos bandeirantes. 

  Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB -  Esta Presidência concede com prazer a palavra ao capitão Luiz Eduardo Pesce de Arruda, representante da Sociedade MMDC.

 

O SR. LUIZ EDUARDO PESCE DE ARRUDA - Exmo. Sr. Deputado Newton Brandão, Presidente da Mesa, ilustríssimo Sr. Tenente-Coronel Ary Machado Faria Filho, representando o nosso Comandante Geral, senhores e senhoras, depois de ouvir as palavras comoventes do nosso mestre, Deputado Israel Dias Novaes, realmente faltam palavras para complementar esta magnífica aula de história paulista, que nos foi oferecida.

            Sinto-me muito honrado de ter sido indicado pela Sociedade Veterana de 32. MMDC, para lembrar alguns episódios referentes a este magnífico movimento cívico-militar, que foi o primeiro e maior exemplo de convocação de massas de mobilização de opinião pública na história do Brasil. Após a humilhação imposta pela Revolução de 30, quando São Paulo se fez terra ocupada, quando as obras de arte paulistas estavam sendo saqueadas e levadas embora de São Paulo, quando os nossos animais de reprodução estavam sendo churrasqueados para comemorar a vitória de 30, quando as nossas massas populares queriam trabalho, queriam alimento e não tinham, quando se esperava finalmente que o Brasil viveria uma modernização no seu modelo político - e o que víamos era um retrocesso - São Paulo, a começar pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, a começar pelos jovens que se reuniam na liga paulista pró-constituinte, inicialmente de uma forma muito respeitosa e que depois foi se acelerando a partir de 30, passou a pleitear o retorno do Brasil à legalidade e à ordem democrática. Uma série de manifestações públicas começou a mobilizar a população de São Paulo pedindo o retorno da democracia, a primeira delas a 25 de janeiro de 32, quando pela primeira vez, dentre as torres em construção da Catedral da Sé, estendeu-se uma bandeira que havia sido desenhada por Júlio Ribeiro para ser a bandeira do Brasil Republicano e que não foi usada para tal após 19 de novembro, quando consagrou-se a velha bandeira do Império, apenas trocando o Brasão de Armas do Império pela foto da Capital Federal - Rio de Janeiro - na noite da Proclamação da República. Aquela velha bandeira que havia sido projetada para ser a bandeira do Brasil e que passou lentamente a ser usada como símbolo de São Paulo inicialmente nas sacarias de café, nas ruas bancárias de São Paulo, foi a 25 de janeiro de 32 hasteada dentre as torres em construção da Catedral da Sé. A esse primeiro evento, seguiu-se a comemoração do aniversário da Constituição de 1891, em fevereiro, aquela constituição que havia sido esbulhada, posto que o Brasil vivia um período de exceção à ordem democrática. Nesse evento, já não foram apenas os jovens estudantes que mobilizaram a população. Noventa e cinco entidades assinaram, juntamente com os jovens, uma conclamação e o comércio cerrou as portas. Já víamos bandeiras e faixas, já víamos oradores dispersos pela Praça da Sé. Em abril, mais uma vez, o povo foi para as ruas comemorar um ano da tentativa frustrada do levante, quando os jovens oficiais da Força Pública, hoje Polícia Militar de São Paulo, tentaram, através das armas, derrubar o governo da ditadura.

Treze de maio, temos a comemoração da Lei Áurea e, mais uma vez, o povo paulista vai às ruas e desta vez se quer em ordem de marcha. Os líderes da resistência democrática paulista pedem para que isso não aconteça porque apenas excitaria o ânimo da ditadura. Essa comemoração, com característica de resistência armada, foi transformada numa manifestação ginástica, mas onde os oradores já diziam: “Temos de agir, se necessário for, com armas na mão contra essa ditadura que nos oprime.”

Finalmente 23 de maio: posse do novo secretariado. A população está excitada, vai às ruas, pensa-se em fazer do ministro da Justiça, que representava Vargas naquele episódio, um refém, um prisioneiro do povo. Mas ele chega doente em São Paulo, não pôde participar do evento. Vai para a casa da irmã e o povo se frustra. Onde está aquele ministro que deveria presidir o evento? Então ao sair da posse do secretariado, no Pátio do Colégio, a massa humana começa a arrancar todas as placas que simbolizam a ditadura; arrancam as placas que dão o nome dos próceres da revolução de 30 pela cidade, invadem lojas de armas no centro de São Paulo e se dirige então à Praça da República com a finalidade de invadir a sede da legião revolucionária que era o grupo armado que sustentava a ditadura em São Paulo. Ao tentar invadir a sede da legião revolucionária, a reação armada não se faz esperar. Tiros, rajadas e quatro jovens tombam mortos ali: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. Um quinto, Alvarenga, morre tempos depois. E do nome desses quatro jovens surge a sigla MMDC, que se transformou num grupo articulador do movimento armado. A intenção era a revolução estourar no final do ano, mas a revolução acabou eclodindo mais cedo. Em razão de episódios do cenário político nacional ela acabou eclodindo a 9 de julho. E a 9 de julho São Paulo não tinha armas, São Paulo não tinha um grande efetivo militar para promover uma luta daquele porte. Mas São Paulo iniciou a luta já sabendo que se tratava de uma causa terrivelmente difícil, nós enfrentaríamos não apenas as armas da ditadura, mas a força da ditadura nas Embaixadas, porque a ditadura promoveu uma ampla mobilização nas Embaixadas brasileiras, embora grande parte do corpo diplomático reconhecesse a legitimidade da causa paulista e fosse simpático a ela. A ditadura impediu imediatamente que São Paulo comprasse armas no exterior. A ditadura fechou São Paulo com anel de fogo e de aço, a ditadura prendeu imediatamente todos os articuladores revolucionários que se espalhavam por esse Brasil afora. Houve atos heróicos de resistência espalhados pelo Brasil. No Amazonas, na fortaleza de Óbidos, a guarnição foi massacrada e aqueles que conseguiram escapar ao fogo foram metralhados ou afogados no Rio Amazonas. Houve a resistência do Ginásio do Pará, quando ginasianos pegaram em armas para protestar em favor de São Paulo. Um desses ginasianos foi o ex-Ministro, ex-Senador Jarbas Passarinho. Houve a resistência da Faculdade de Medicina da Bahia; houve resistência no Rio Grande do Sul, quando o Coronel Claudino Nunes Pereira, Comandante Geral da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, disse “Eu não pego em armas contra São Paulo. Nós temos compromisso com São Paulo”. Ele foi destituído.

Enfim, a despeito de toda essa resistência, a luta se mostrou muito difícil. São Paulo mobilizou toda a alma dessa grande terra de bandeirantes. O clero se mobilizou, a Igreja contribuiu generosamente com a causa, as colônias estrangeiras tiveram a grande oportunidade de, com seu próprio sangue, dos seus bens, da sua alma, mostrar que na verdade eram paulistas.

Quando vamos ao Instituto Brasileiro da Universidade de São Paulo e lá compulsamos documentos depositados, vemos que a colônia japonesa, que tinha vinte e quatro anos de Brasil, uma colônia muito pobre e que pouco podia contribuir, ofereceu bananas e arroz para alimentar os nossos soldados. Os canadenses ofereceram pepitas de ouro, que garimparam nas minas de Klondike, próximo ao Alasca. Pela colônia italiana temos uma carta que diz o seguinte: “Sou italiano, nasci na Itália, fiz a guerra pela Itália. Fui mecânico de submarinos, mas emigrei para o Brasil e aqui me casei, aqui tenho meus filhos. Eu agora sou paulista, sou brasileiro e quero lutar por São Paulo e pelo Brasil”. Pela colônia russa, muito oficiais do exército do czar que tiveram de fugir da Rússia depois da revolução comunista, aqui se apresentaram para lutar por São Paulo. Pela colônia árabe, as  senhoras costuravam e preparavam curativos para os soldados paulistas, sem falar dos jovens, o movimento dos escoteiros. O mais jovem mártir da revolução, Aldo Chiorato, um escoteiro de dez anos de idade, que durante um bombardeio na cidade de Campinas por aviões da ditadura estava fazendo a ligação entre os quartéis constitucionalistas, acabou morrendo quando da explosão de uma bomba na praça da estação ferroviária de Campinas. É o mais jovem herói da nossa revolução. Com relação à indústria paulista - nós não tínhamos experiência bélica nenhuma - em poucas horas mobilizamos toda a indústria. Disse um dos engenheiros, Ronald Maclin, um engenheiro escocês da Escola Politécnica: “Essa guerra será uma guerra de trincheiras, os soldados serão feridos na cabeça, não adianta mandá-los para a frente de batalha com bibico. Eles têm de ir de capacete”. Mas como fazer capacete, perguntavam. Ele disse: “Eu sei, porque sou engenheiro e ajudei a fazer capacetes na Inglaterra, na I Guerra Mundial”. Então ele improvisou máquinas e em poucas horas Ronald Douglas Maclin apresentou o capacete modelo britânico da I Guerra Mundial, que foi usado em São Paulo em 32. Pela primeira vez se fabricou capacete de combate no Brasil. Fabricou-se pára-quedas, instrumentos ópticos. Ronald Maclin acabou morrendo testando armamentos por São Paulo. Enfim, todos ofereceram seu quinhão. São Paulo mobilizou em poucos dias cerca de 75 mil voluntários. E algumas pessoas dizem que a revolução não teve caráter popular. Como não teve caráter popular?! Setenta e cinco mil pessoas saíram de casa, abandonaram suas famílias, abandonaram seus trabalhos, abandonaram suas escolas, deixaram tudo para trás, sem receber vencimentos, para defender uma causa que julgavam justa! Foram 75 mil pessoas numa população de seis milhões de habitantes. Multipliquem isso por seis que é mais ou menos a população de São Paulo hoje e veremos que teríamos de mobilizar em duas semanas 450 mil pessoas para ir para a guerra. Isso foi 32. Seiscentos e vinte e quatro paulistas catalogados morreram em 32; mais de 2.500 brasileiros que lutavam contra São Paulo também tombaram à frente da batalha. Paulistas que nasceram em São Paulo, que nasceram no Nordeste, que nasceram no Sul, que nasceram em outros países, em três meses de luta morreram lutando por São Paulo 624 pessoas. Em dois anos de campanha na Itália, 425 brasileiros morreram lutando contra o nazi-fascismo na Itália. Por aí é possível ver como foi brutal essa guerra. São Paulo não pôde resistir à imensa superioridade de armamentos e de efetivos que a ditadura mobilizou. Utilizou-se para isso de todos os recursos da propaganda dizendo que a revolução era comunista, que a revolução era fascista, que se estava tentando impor aqui um governo fascista sob as ordens de um italiano chamado Matarazzo. A ditadura dizia que a revolução era separatista, que São Paulo queria se separar do Brasil. E a esses argumentos mentirosos São Paulo reagia se utilizando do que possuía: a alma e o rádio, que à época emergia. O rádio foi muito usado para difundir que a revolução era nacionalista e não internacionalista, que a revolução era pela unidade nacional e pela dignidade do Brasil.

Vencida a luta armada pela ditadura, remetidos ao exílio os principais líderes dessa luta, dentre os quais destacamos Pedro de Toledo, que foi tão bem historiado pelo Deputado Israel Dias Novais, vimos a vitória moral da causa em 34, quando finalmente uma constituição democrática é outorgada ao Brasil e chega ao Governo de São Paulo Armando Sales de Oliveira, um paulista de não menos méritos que todos esses grandes nomes que citamos e que fundou a Universidade do Estado de São Paulo.

Em 34 nós vimos a vitória moral da causa que São Paulo defendeu em armas entre julho e outubro de 1932. Os ecos de 32 estão presentes até hoje. São Paulo ainda é muito daquilo que foi em 32. A alma paulista sobrevive, aquela alma que vem do tempo do Brasil-Colônia, aquela capacidade que nós temos de nos auto-sugestionar, aquela capacidade que temos de não esperar favores de ninguém, pois nós provemos nossas próprias necessidades. Esse orgulho de ser paulista, que vem da época das bandeiras, está presente até hoje na alma paulista e nos nossos símbolos maiores. Observem, por exemplo, o Brasão de Armas do Estado de São Paulo, este que está exposto aqui. O Brasão de Armas do Estado de São Paulo tem uma espada no seu centro, que lembra cinco vezes em que a espada foi importante para a vida de São Paulo.

            A Espada de Paulo Apóstolo, decapitado pela espada, que no dia de sua conversão viu ser fundada a Vila de São Paulo de Piratininga, 25 de janeiro. A Espada de Amador Bueno, a espada da fidelidade. A Espada de D. Pedro I, que desembainhou sua espada em território paulista para proclamar a Independência do Brasil. A Espada dos Bandeiras, a espada do arrojo.             Finalmente, a quinta Espada, a Espada que São Paulo desembainhou para lutar pela legalidade, pela liberdade e pela democracia no Brasil. Este brasão, que foi desenhado em pleno movimento constitucionalista, em agosto de 1932, José Wash Rodrigues para Pedro de Toledo, estava escrito “Pro São Paulo Fiant Eximia” no seu dístico, “Por São Paulo Sejam Feitas Grandes Coisas”. E, Pedro de Toledo manda mudar. Fala, “Não, não é por São Paulo que estamos lutando, nós estamos lutando pelo Brasil.

            Então, nosso brasão, por ordem de Pedro de Toledo, é alterado para “Pro Brasilia Fiant Eximia”.

            A nossa Bandeira, que não foi uma bandeira desenhada pelo governo para ser imposta à população, foi uma bandeira que nasceu nas oficinas domésticas, que as mães, que as esposas, que as namoradas, que as esposas mandavam para seus soldados que iam para a frente de batalha, e anotavam à lápis “Vá com Deus”, “Volte, estou lhe aguardando” “Rezo por você”, que nos comove até hoje quando pegamos estas bandeiras nas mãos, muitas delas ainda manchadas de sangue, e vemos as mensagens deixadas pelos familiares nas bandeiras. Esta bandeira, que foi costurada em 32 com sete listas, nove listas, 11 listas, 15 listas, não importava, porque ela surgiu da alma popular. E, que finalmente esta Casa, em 1948, esta Assembléia Legislativa que tinha restaurado a legalidade democrática em São Paulo no dia 9 de Julho de 1947, pela edição de uma nova Constituição Paulista, em 1948 esta Casa, finalmente editou aquela legislação maior de São Paulo que consolidou a nossa Bandeira com as 13 listas. Uma bandeira que tem preto e tem branco. O preto da noite, o branco do dia.      Uma bandeira que tem quatro estrelas amarelas lembrando os pontos cardeais. Uma bandeira que tem um círculo branco lembrando a proteção. E, uma bandeira que tem no seu interior o mapa do Brasil. Uma bandeira que tem o vermelho, dia e noite, os paulistas defendem o Brasil em todas as direções, se preciso com o sacrifício da própria vida. É a única bandeira estadual que ainda temos no Brasil que tem no seu interior o mapa do Brasil, lembrando o nosso compromisso com a unidade nacional.

            O tempo passa, a vida é um curso, os nossos veteranos aqui estão, hoje com o mesmo espírito que os animou em 1932. Eu encerro, então, estas palavras, pedindo naturalmente que esta Casa continue dispensando a esta causa a atenção que sempre dispensou, lembrando o bem-estar dos nossos veteranos para que continuem recebendo os benefícios da sua causa, porque eles foram verdadeiros heróis, eles foram puros, eles conceberam um alto ideal, e não mediram sacrifícios para que este ideal fosse atingido, se necessário oferecendo a própria vida, a saúde, para que pudessem alcançar este objetivo.

            Peço aos nossos lídimos representantes desta Casa para que continuem dando a eles cada vez mais atenção para que recebam benefícios dignos, para que percebam vencimentos dignos, para que a memória de 9 de Julho seja sempre cultuada em São Paulo, como tem sido, a partir de iniciativa desta Casa, quando transformou em feriado paulista o dia 9 de Julho. Esta Casa também se chama Palácio 9 de Julho, que é o pólo da democracia, é o sensório da democracia paulista, continue zelando pela memória deste movimento que é um movimento não só de São Paulo mas do Brasil.

            Gostaria de pedir a todos que transferissem aos nossos queridos veteranos aqui presentes a mais calorosa salva de palmas.

            Muito obrigado.

            (Palmas.)

 

            O SR. PRESIDENTE -  NEWTON BRANDÃO - PTB - Temos o prazer de dar a palavra ao querido veterano Orlando Monello para sua manifestação poética.

 

            O SR. ORLANDO MONELLO - Meus senhores, minhas senhoras, eu sou compositor da Velha Guarda, com centenas de músicas gravadas, e fui convidado para mostrar duas poesias que eu fiz. Uma lembrando os ex-combatentes, e outra falando de São Paulo.

 

(Entram leituras. Duas folhas.)

 

            O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Ouviremos agora o Toque de Silêncio.

 

*   *   *

 

- É executado o Toque de Silêncio.

 

*   *   *

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Esta Presidência, com grande satisfação e justo orgulho, passa a palavra ao nosso querido poeta Mário Bonfim.

           

O SR. MÁRIO BONFIM - Exmo. Sr. Deputado Newton Brandão, meu caro Israel Dias Novaes, Presidente da Academia Paulista de Letras e meus irmãos em 32, os jovens de 32:

“Onde estais com vossos ponchos,

Os fuzis sem munição,

Os capacetes de aço,

Os trilhos do trem blindado,

O lema de vossas vidas,

A saga de vossos passos,

Ó jovens de 32!

Em que ossário vossa audácia

Fala aos que dormem por fuga,

Em que campo vossa morte,

Clama aos que morrem em vida,

Em que luta vosso luto

Amortalha os tempos novos

Ó jovens de 32!

Voltai daquelas trincheiras,

Voltai de vosso martírio,

Voltai com vossos ideais,

Voltai com o sangue que destes,

Voltai com os brios de Julho,

Voltai ao chão ocupado,

Voltai à causa esquecida,

Voltai à terra traída,

Voltai, apenas voltai,

Ó jovens de 32!” (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Tem a palavra o nobre ex-Deputado Rui Codo.

 

O SR. RUI CODO -  Sr. Presidente e ilustre Deputado Newton Brandão, presidindo esta extraordinária festa de hoje, ilustre ex-colega e Deputado Israel Dias Novaes, ilustre poeta Paulo Bonfim, senhores da Mesa, minhas senhoras e meus senhores, quis Deus neste instante em que eu estava lembrando do meu pai, na época de 32. Nasci na roça, em Santa Gertrudes e num domingo de manhã - sou o quarto filho da família - trabalhando na enxada, meu pai foi surpreendido num domingo de manhã, quando  lá chegava um grupo do Exército de Caçapava e levava-o preso, porque ele não tinha se apresentado na época certa, para servir o Governo. Ele já era pai de quatro filhos naquela oportunidade. Surpreendida, minha mãe, chorando, via seu marido sair de casa, levado para Caçapava, para servir o Exército, cumprindo esta obrigação nacional, à distância. Depois começou a Revolução de 32, da qual ele também participou.  Eu era muito pequeno, ainda não tinha três anos de idade quando meu pai servia o seu Estado, saindo da roça, em 32. É um motivo de muita grandeza para mim, quando aqui chego e ouço tocar o Hino do Estado de São Paulo, o Hino dos Bandeirantes, pela Orquestra Sinfônica da nossa Polícia Militar. Era um orgulho para mim, porque eu apresentei o projeto de lei dando a São Paulo o que precisava: o Hino do Estado, porque o que existia pela Constituição eram apenas dois símbolos: a Bandeira e o Brasão. Faltava o Hino.

Na antiga Assembléia, sede da atual Prefeitura, alterei a Constituição dando o Hino como mais um símbolo.

Apresentei projeto de lei para que o Governo do Estado tornasse obrigatório o concurso para a música do Hino do Estado. Eu tornava pelo meu projeto, em seu Art. 3º, obrigatória a letra de Guilherme de Almeida, cuja música é do saudoso Spartaco Rossi.

            Se V.Sas. me permitirem, gostaria de declamá-lo: 

 

“Paulista para um só instante

dos teus quatro séculos ante

a tua terra sem fronteiras, 

o teu São Paulo das bandeiras!

Deixa atrás o presente:

Olha o passado à frente!

Vem com Martim Afonso a São Vicente!

Galga a Serra do Mar! Além, lá no alto,

Bartira sonha sossegadamente

na sua rede virgem do Planalto.

Espreita-a entre a folhagem de esmeralda:

beija-lhe a Cruz de Estrelas da grinalda!

Agora, escuta! Aí vem, moendo o cascalho,

botas-de-nove-léguas, João Ramalho.

Serra acima dos baixos da restinga,

vem subindo a roupeta de Nóbrega e de Anchieta.

Contempla os Campos de Piratininga!

Este é o Colégio. Adiante está o sertão.

Vai! Segue a entrada! Enfrenta! Avança! Investe!

Norte, Sul, Este, Oeste,

em bandeira ou monção

doma os índios bravios;

rompe a selva, abre as minas, vara rios;

no leito da jazida

acorda a pedraria adormecida;

retorce os braços rijos

e tira o ouro dos seus esconderijos!

Bateia, escorre a ganga, 

lavra, planta, povoa.

Depois volta à garoa!

E adivinha através dessa cortina,

na tardinha enfeitada de miçanga,

a Sagrada Colina,

ao Grito do Ipiranga!

Entreabre agora os véus!

Do Cafezal, Senhor dos Horizontes,

verás fluir por plainos,  vales, montes,

usinas, gares, silos, cais, arranha-céus!”

           

Este é o Hino do Estado de São Paulo, que todos ouviram pela primeira vez nesta Casa. Hoje é um dia histórico. O Hino foi tocado nesta Assembléia Legislativa no dia 9 de julho de 2000. Agradeço à Banda que tocou o Hino e ao Sr. Presidente por me permitir expressar, desta tribuna, meu sentimento, porque hoje São Paulo tem o Hino dos Bandeirantes, que declamei a vocês. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Com satisfação passamos a palavra ao nobre Deputado Israel Dias Novaes, que vai proceder à entrega dos Diplomas de preservação à memória da Revolução de 32.

 

O SR. ISRAEL DIAS NOVAES - Sr. Presidente, atendendo ao pedido de V. Exa.,  como proponente da outorga da Medalha Constitucionalista através da Resolução n.º 330, farei a entrega aos descendentes dos heróis de 32.

 

- Maria Delosis Arruda, representando Antônio Aranha Arruda.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

- Maria Thereza Tangary, representando José Tangary.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

Sou suspeito para chamar a família seguinte, porque o Dr. Cory Gomes de Amorim, grande Advogado, Professor de Direito, paulista eminentíssimo, já maduro incorporou-se às tropas de 32 e chegou a posições de comando. 

Está aqui sua filha, Consuelo Amorim, que convido a receber a Medalha em companhia do Sr. David Debes Neto.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

- Benedicto Pereira Cortez, representando seu pai Onésio da Motta Cortez

***

- É feita a entrega da medalha.

***

-                                             Júlio de Araújo Franco Filho, em memória de Júlio de Araújo Franco.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

Agora chamarei os veteranos de 32:

 

- Nelson Gioia Planet.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

- Oscar Delgado.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

Sr. Presidente, está encerrada a entrega das medalhas.

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Esta Presidência cumprimenta a todos os homenageados, aliás, com muita justiça e propriedade.

Essa nossa manifestação, além de pessoal, é a manifestação do Presidente efetivo desta Casa nobre Deputado Vanderlei Macris, que nos fez portador desses cumprimentos. A todos os homenageados os nossos parabéns.

Tem a palavra o nobre Deputado Israel Dias Novaes.

 

O SR. ISRAEL DIAS NOVAES - Sr. Presidente, de acordo com os estatutos da nossa Medalha, tenho a honra de entregar também a condecoração ao Presidente efetivo da Casa nobre Deputado Vanderlei Macris, na pessoa de V. Exa., que o representa neste ato.

    É feita a entrega da medalha.

Convido o Sr. João Palma para receber a medalha do 1º Secretário Deputado Roberto Gouveia.

***

- É feita a entrega da medalha.

***

Convido o Sr. Ney Alberto Viana Cardoso para receber a medalha do 2º Secretário Deputado Paschoal Thomeu

***

-                                             É feita a entrega da medalha.

-                                              

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Falando em nome do Presidente efetivo da Casa tenho certeza de que dentre as várias homenagens que recebeu, nenhuma outra tem, para ele, a grandeza desta de que sou portador. Amanhã estarei bem cedo aqui, porque é bom darmos as notícias boas o mais cedo possível; ele ficará muito feliz. Agradeço muito em nome do Presidente Vanderlei Macris, em nome doe doSecretários que também foram homenageados.  Fico feliz por saber que esta Casa mereceu dos ilustres Presidentes desse movimento uma homenagem tão extraordinária como esta.  Agora, depois de tanta poesia  bela e comovente, vamos ouvir o Hino Paris Belfort, pela Banda da Polícia Militar, que para os paulistas e para nós todos têm significado muito especial. É um hino muito alegre, de luta e de participação.

 

*              *      *

 

            - É executado o hino. (Palmas.)

 

*               *     *

 

O SR. PRESIDENTE - NEWTON BRANDÃO - PTB - Esgotado o objeto da presente sessão, esta Presidência e agradece às autoridades e a todas as pessoas que com a sua presença colaboraram para o êxito desta solenidade, e convida todos, inclusive a Banda da Polícia Militar, para um café aqui no salão dos espelhos. Assim teremos a oportunidade de uma confraternização maior. Mais uma vez, agradecendo as autoridades presentes e cumprimentando  efusivamente o nobre Deputado Israel Dias Novaes, os nossos queridos poetas Paulo Bonfim, que é tradição do nosso Estado, e inclusive esse poeta que fez essa poesia  tão linda e tão cheia de alma, a todos os senhores muito obrigado pela presença.

             Está encerrada a sessão.

 

*              *      *

 

- Encerra-se a sessão às 15 horas e quatro minutos.