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21 DE JUNHO DE 2004

33ª SESSÃO SOLENE EM HOMENAGEM AO “DIA DO ORGULHO GAY”

 

Presidência: ÍTALO CARDOSO

 

Secretário: SEBASTIÃO ARCANJO

 

DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA

Data: 21/06/2004 - Sessão 33ª S. SOLENE  Publ. DOE:

Presidente: ÍTALO CARDOSO

 

HOMENAGEM AO "DIA DO ORGULHO GAY"

001 - ÍTALO CARDOSO

Assume a Presidência e abre a sessão. Nomeia as autoridades. Informa que a presente sessão foi convocada pelo Presidente efetivo da Casa, Deputado Sidney Beraldo, a pedido do Deputado ora na condução dos trabalhos, com a finalidade de comemorar o Dia do Orgulho Gay. Convida todos para, de pé, ouvirem o Hino Nacional Brasileiro. Anuncia a execução de número musical.

 

002 - SEBASTIÃO ARCANJO

Afirma que esta sessão se constitui num marco histórico para a Assembléia Legislativa. Entende serem necessários mecanismos mais eficazes para o exercício completo da cidadania e dos direitos de todos no Estado de São Paulo, especialmente dos homossexuais. Lê carta sobre o assunto.

 

003 - JANAÍNA LIMA

Coordenadora de Travesti do Identidade - Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual, de Campinas, sustenta que começa a ser reconhecida a identidade de gênero, considerando-se todos igualmente cidadãos.

 

004 - RITA QUADROS

Presidente da Comissão Organizadora do 5º Seminário Nacional de Lésbicas, membro do grupo Umas e Outras e da organização das Caminhadas de Lésbicas e Simpatizantes de São Paulo, fala da questão da visibilidade e do espaço a ser ocupados pelas lésbicas.

 

005 - BÁRBARA GRANER

Militante do Casvi - Centro de Apoio e Solidariedade à Vida e do Movimento de Transexuais, conclama todos a mostrarem que têm consciência de que fazem parte da sociedade e que reivindicam, de forma política e organizada, o seu direito à igualdade.

 

006 - NELSON MATIAS PEREIRA

Coordenador Político da Associação Parada do Orgulho GLBT de  São Paulo, reflete sobre a necessidade de leis e políticas públicas que coíbam o preconceito e permitam a extensão de todos os benefícios sociais aos homossexuais.

 

007 - CARLOS CARDOSO DE OLIVEIRA JÚNIOR

Promotor Especial de Direitos Humanos do Ministério Público, declara que os direitos listados na Constituição ainda não são efetivos para uma parcela significativa da população brasileira, os homossexuais. Aborda o papel do Ministério Público na luta contra a discriminação sexual.

 

008 - Presidente ÍTALO CARDOSO

Lê documento da Frente Parlamentar Estadual pela Livre Expressão Sexual, desta Casa, sobre o respeito aos homossexuais e as ações da referida frente pelos direitos dos mesmos. Discorre sobre as dificuldades para realizar esta sessão solene e sua importância. Agradece a todos que colaboraram para o êxito da solenidade. Encerra a sessão.

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos. Convido o Sr. Deputado Sebastião Arcanjo para, como 2º Secretário “ad hoc”, proceder à leitura da Ata da sessão anterior.

 

O SR. 2º SECRETÁRIO - SEBASTIÃO ARCANJO - PT - Procede à leitura da Ata da sessão anterior, que é considerada aprovada.

 

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O SR. MESTRE DE CERIMÔNIAS - HUGO DANIEL ROTSCHILD - Senhoras e senhores, temos a honra de chamar, para compor a Mesa da Sessão Solene em comemoração ao “Dia do Orgulho Gay”, a Sra. Janaína Lima, coordenadora de Travesti do Identidade - Grupo de Ação Pela Cidadania Homossexual de Campinas; Sra. Bárbara Graner, militante do Casvi - Centro de Apoio e Solidariedade à Vida e do Movimento de Transexuais; Sr. Reinaldo Pereira Damião, Presidente da Associação Parada do Orgulho GLBT/SP; Dr. Carlos Cardoso, Promotor Especial de Direitos Humanos do Ministério Público.

Vamos receber, com uma calorosa salva de palmas, o Deputado Estadual Ítalo Cardoso, proponente e Presidente da Sessão Solene para homenagear o “Dia do Orgulho Gay”. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores, esta Sessão Solene foi convocada pelo Presidente desta Casa, Deputado Sidney Beraldo, atendendo solicitação deste Deputado, com a finalidade de comemorar o “Dia do Orgulho Gay”.

Convido todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, executado pela Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo, sob a regência do Maestro PM Músico, 2o Tenente Luiz Ricardo Gomes.

 

* * *

- É executado o Hino Nacional Brasileiro pela Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

 

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O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Esta Presidência agradece à Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Gostaríamos de anunciar o nobre Deputado Renato Simões, representado pela chefe de Gabinete, Sra. Márcia; Sr. José Reinaldo Aroldo, do Sindalesp; Sr. Leão Lobo, jornalista; Sra. Rita Quadros, Presidente da Comissão Organizadora do 5ª Seminário Nacional de Lésbicas, membro do grupo Umas e Outras e da organização das Caminhadas de Lésbicas e Simpatizantes de São Paulo; Sr. Nelson Matias Pereira, coordenador político da Associação Parada do Orgulho GLBT de São Paulo.

Também anunciar e agradecer a presença entre nós do Dr. Carlos Cardoso, Promotor Especial de Direitos Humanos do Ministério Público; Sr. Reinaldo Pereira Damião, Presidente da Associação Parada do Orgulho GLBT de São Paulo; Sra. Bárbara Graner, Militante do Casvi, Centro de Apoio e Solidariedade à Vida e do Movimento de Transexuais; Janaína Lima, coordenadora de Travesti do Identidade - Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual de Campinas.

Esta Presidência concede agora a palavra ao nobre Deputado Sebastião Arcanjo.

 

O SR. SEBASTIÃO ARCANJO - PT - Sr. Presidente, nobre Deputado Ítalo Cardoso, em nome do qual quero saudar os assessores e assessoras dos Deputados que estão presentes nesta sessão solene, quero aproveitar a oportunidade também para cumprimentar o Dr. Carlos Cardoso, nosso amigo Reinaldo Damião, a Bárbara Graner, Janaína Lima, e também saudar todos os ativistas, militantes que se fazem presentes nesta nossa sessão solene.

Confesso que esta sessão se constitui num marco histórico para a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Nós, com o nobre Deputado Ítalo Cardoso, que é o proponente desta sessão solene, travamos nesta Casa um intenso debate, que começou nos corredores, nos bastidores, chegou à Presidência da Assembléia Legislativa e na véspera do feriado próximo passado veio para o plenário desta Casa, às vésperas inclusive da Parada do Orgulho Gay, que mobilizou mais de um milhão e meio de pessoas aproximadamente na Cidade de São Paulo.

Tínhamos a convicção de que esta era uma medida necessária. Por mais que seja um gesto simbólico uma sessão solene, é um instrumento que a Assembléia Legislativa possui para prestar homenagem, se solidarizar com acontecimentos que têm repercussão na vida das pessoas e que podem, algum desses fatos, de maneira positiva, outros de maneira negativa, mostrar a nossa indignação e ao mesmo tempo externar a nossa solidariedade.

Mas no caso desta sessão solene confesso que me surpreendi com a intensidade das discussões que aqui foram travadas. Aquilo que era uma simples atividade passou a ser centro de um grande debate político acerca da oportunidade, da conveniência de a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, uma das principais Casas de Leis desse país, abrir suas portas para que os cidadãos e cidadãs paulistanos pudessem também aqui fazer o seu exercício de cidadania homossexual.

Por isso para nós é um momento importante e queremos aqui, na condição de primeiro orador da noite, dar as boas-vindas e dizer que esta Casa está de maneira legítima e legal ocupada por todos vocês que se fazem presentes nesta noite.

Esperamos que este acontecimento não se encerre nesta data e que possamos continuar travando intensos debates, porque precisamos avançar na implementação e consolidação de legislações que assegurem o exercício, de fato e de direito, da cidadania homossexual no Estado de São Paulo.

Estou também com a incumbência de fazer a leitura de um documento que, emna minha opinião, dialoga muito bem com a necessidade de criarmos mecanismos mais eficazes para o exercício completo da cidadania daqueles e daquelas que lutam por direitos no Estado de São Paulo.

Peço licença para ler uma carta, porque ela tem a ver com esta Sessão Solene e com os debates que estamos travando, já que os eventos que marcaram os acontecimentos do mês de junho estavam relacionados com o debate sobre família e diversidade,. Portanto, é importante registrar essa carta, que tem a ver com o assunto que vou abordar logo em seguida:

“Estou aqui novamente, nesta casa de leis, não mais para trazer ou buscar minha companheira de vida, a falecida assessora procuradora aposentada Regina Stella. Venho falar de sonhos e esperança de pessoas que se unem por amor e que, ao compartilhar a vida, constroem um lar. Os tijolos deste lar são feitos do mesmo material de qualquer outra casa, são feitos de afeto, de deveres, com muito carinho e muitas responsabilidades.

Nos nossos 21 anos de companheirismo, eu e Regina Stella estivemos juntas nas muitas batalhas que enfrentamos, como a luta contra as desigualdades sociais do nosso povo, pela igualdade entre homens e mulheres e pela ecologia. Regina Stella, sabendo da sua morte iminente, ergueu sua última bandeira, providenciou para que eu fosse beneficiária da sua pensão. Mas as leis do nosso Estado não vêem esta bandeira da mesma forma.

Nossa bandeira é formada por diferentes cores, que representam as pessoas como elas são, diferentes. Entendemos que as leis devem evoluir para acompanhar o nosso tempo e que os anseios e necessidades de uma parcela do nosso povo, os homossexuais, precisam ser respaldados.

O preconceito só nos afasta, mas a compreensão e o respeito à diversidade, nos une, solidariza e fortalece. Somente com diferentes cores, como na nossa bandeira, é possível formar a beleza de um arco íris ou de uma sociedade igualitária.

São Paulo, junho de 2004.

Elisabete Mattos Feijó”

(Palmas.)

A Elisabete, que está presente entre nós, deu-nos a honra de fazer a leitura deste documento. Acredito que ele se insere no contexto atual de lutas em que todos estamos envolvidos: a luta pela constituição efetiva de um Estado com direitos.

Tenho dito isso porque a letra fria das nossas Cartas, das Leis Orgânicas e da nossa Constituição não expressam esse sentimento no dia-a-dia. O fato de reivindicar o direito a uma pensão significa que o Instituto de Previdência dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo não reconhece aquilo que já é objeto, inclusive, de decisão em vários tribunais, em várias Leis Orgânicas do nosso país e que precisamos escrever, também, de maneira afirmativa, na Constituição do Estado de São Paulo.

Para isso, é preciso sensibilizar o Governador do nosso Estado, é preciso trazer esse debate para esta Casa de Leis, para que este acontecimento possa continuar repercutindo nos corredores, nas comissões e, quem sabe, possamos, em breve, estar novamente aqui reunidos para aprovar mais um conjunto de concepções e de estruturas jurídicas que assegurem o efetivo exercício dos direitos.

Da mesma forma, o mesmo Estado de São Paulo - no qual a cidade de São Paulo abre as portas para que milhões se reúnam na Parada do Orgulho Gay - vê a violência se multiplicar contra os homossexuais, em particular contra os travestis, que são vítimas de forma arbitrária tanto da violência policial como de grupos nazi-fascistas que se articulam por esta cidade e por este Estado, num movimento que é contraditório.

Comemoramos a disposição, a energia e a vibração positiva que a Parada nos oferece e, no dia seguinte, quarteirões após a Parada, as pessoas têm de criar mecanismos quase que de autodefesa para se livrar daqueles que não conseguem compreender a necessidade das pessoas, por serem diferentes, de terem o direito de conviver com a diferença e exercerem plenamente os seus direitos.

Sr. Presidente, nós aprendemos muitas coisas juntos. Vossa Excelência e eu tivemos oportunidade de compartilhar várias legislações em nossos municípios, eu na cidade de Campinas e V. Exa. aqui na cidade de São Paulo. Algumas dessas leis inspiraram outras nesta Casa, como a lei do Deputado Renato Simões, que se inspirou também na lei que instituímos em Campinas. Vossa Excelência aqui na cidade de São Paulo criou um instrumento que visa a assegurar e punir, na forma da lei, com restrição de funcionamento e aplicação de multa, a chamada lei que combate os crimes de discriminação a homossexuais que eram muitos comuns. Vocês tiveram oportunidade aqui em São Paulo de testar na prática essa idéia de que algumas leis não servem e não devem ser aplicadas, como se existissem leis que devam funcionar ou não no nosso País.

Também quero aproveitar a oportunidade, uma vez que podemos compartilhar deste momento com vocês, para anunciar que vamos realizar também a nossa marcha na cidade de Campinas, que já virou um acontecimento histórico na cidade. No próximo final de semana também vamos fazer a Parada do Orgulho Gay em nossa cidade. Trata-se de uma ação que estamos desenvolvendo e, portanto, queremos contar também com a presença de todos.

É provável que vocês não tenham a dimensão histórica deste acontecimento, mas tenho a dizer que esta sessão solene nos dá condições de travar um longo e bom debate nesta Casa, não para criar uma polarização equivocada como alguns querem criar. Nós precisamos dizer a todos nesta Casa de Leis, aos Deputados, desde o mais simples funcionário até ao nosso Presidente, que não se trata de fazer um movimento de ruptura de relações, até porque do ponto de vista da cidadania todos são portadores de direitos. Alguns dizem que quando vamos fazer alguma compra, ou vamos ao supermercado, ninguém pergunta a nossa identidade sexual. Mas quando é para entrar nesta Casa para exercer a cidadania ou quando é para enfrentar os Palácios, as pessoas colocam uma série de barreiras, que precisam ser vencidas uma a uma.

Tenho certeza de que a partir das situações que foram criadas nesta Casa, as necessidades e os debates que se abrem a partir desta sessão solene, teremos condições de afirmar nesta Casa de Leis, que está bonita, toda enfeitada de maneira muito criativa, que nós chegamos para ficar. Esta Casa se abriu hoje de maneira muito generosa para esta sessão solene, mas não queremos apenas uma sessão solene. Queremos escrever na Constituição, escrever nas legislações e nas leis ordinárias do Estado de São Paulo, um conjunto de direitos que permitam as pessoas viverem com liberdade e exercitarem da maneira mais feliz possível a sua diferença, a sua diversidade.

Parabéns a todos! Felicidades! Parabéns Deputado Ítalo pela brilhante iniciativa! (Palmas).

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Não poderei ler todas as cartas, mas recebemos cumprimentos de vários Deputados: da Deputada Beth Sahão, do Partido dos Trabalhadores; do Deputado Mário Reali, também da Bancada do PT; da Deputada Ana Martins, do PCdoB; do Sr. João Lima Filho, Chefe de Gabinete do Deputado Roberto Felício; do Deputado Nivaldo Santana, do PcdoB, e da Deputada Maria Lúcia Prandi, do Partido dos Trabalhadores.

Também quero anunciar a presença importante do Prof. Walmir Siqueira, da Apeoesp; do Sr. Marcos de Abreu Freire, coordenador do Setorial de Gays e Lésbicas, Bissexuais e Transexuais do PT; da Sra. Yáscara Guelpa, do Coletivo de Feministas Lésbicas; Paulo Tavares Mariante, coordenador do Identidade - Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual; Sr. Fernando Quaresma, da Defensoria Homossexual; Sr. Beto de Jesus, Presidente do Instituto Edson Neris; Sr. Luiz Ramirez, Presidente do grupo Corsa; Sra. Flávia Anciani, do Moleca (Lésbicas de Campinas); Sr. Roberto Oliveira, paisagista e militante do movimento homossexual; Sr. Edson de Azevedo Pontes, do grupo GLBT Ser Humano; Sr. Rick Ferreira, do grupo Prisma, da USP; Sra. Cláudia Regina Garcia, da Coordenadoria de Lésbicas da Parada do Orgulho GLBT; Sr. Paulo Reis, coordenador do Centro de Referência GLTTB, de Campinas.

Quero também anunciar a presença da nossa Maria Stella Moreira Pires, a Mana, da Associação de Mulheres que Amam Mulheres, que deixou esta Casa muito mais bonita hoje, fazendo essa decoração. Peço uma salva de palmas à nossa companheira Mana, agradecendo a toda a sua equipe e às companheiras do Amam, que fizeram esta Casa mais bonita e tranqüila. (Palmas.)

Quero convidar para fazer parte da nossa Mesa o Sr. José Luiz Penna, Presidente Nacional do PV.

Tem a palavra a Sra. Janaína Lima, coordenadora de Travesti do Identidade, Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual, de Campinas.

 

A SRA. JANAÍNA LIMA - Boa-noite para todas e todos, para os Srs. e Sras. Deputadas presentes. Quero agradecer desde já a Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual por esta Sessão Solene.

Quando eu estava vindo para cá, o pessoal estava todo preocupado: “Janaína, mas o que você vai falar? Qual a sua fala? Você não escreveu nada. Você está com tudo na cabeça?” Gente, não estou com nada na cabeça, não pensei em fala nenhuma, porque, na verdade, este momento, como o nobre Deputado Sebastião Arcanjo falou, é um momento histórico, um momento único.

Não é a Janaína que está aqui, mas as travestis estão aqui em cima, as travestis estão aqui presentes. (Palmas.) Acho então que eu não tenho de falar, mas estar aqui dividindo esta emoção com todos os presentes, porque neste momento fico sem palavras para falar. Acho que este é o pontapé inicial: começar a ser reconhecida a nossa identidade de gênero, deixando de ser diferente. O Sebastião falou: “Você é diferente.” Não, aqui, neste momento, você não é mais diferente, você passa a ser igual a todos, você passa a ser a travesti, a cidadã.

Acho que o que tenho a dizer é isso. Quero agradecer ao nobre Deputado Ítalo Cardoso. Minha fala se encerra aqui. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Obrigado, Janaína. Passo então a palavra agora para a Sra. Rita Quadros, Presidente da Comissão Organizadora do 5º Seminário Nacional de Lésbicas e membro do grupo Umas e Outras e da organização das caminhadas de lésbicas e simpatizantes de São Paulo.

 

A SRA. RITA QUADROS - Boa-noite. Janaína, eu também estava padecendo do mesmo mal que você. Estava vindo de uma outra situação, de uma outra reunião, totalmente diferente, e vinha tentando ordenar as idéias.

Acho que uma coisa que não dá para deixar de reconhecer, como diz o Tiãozinho, é a importância de uma Sessão Solene num espaço como este, um espaço legislativo, que reconhece essa parcela de cidadãos. É muito importante. Acho então que os nobres Deputados Ítalo Cardoso, Tiãozinho e Renato Simões, que são parceiros históricos desse segmento de gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais são importantes. Eles demonstram essa parceira na medida em que promovem este tipo de atividade.

Representar as lésbicas é uma tarefa difícil porque tem uma questão que permeia o tempo inteiro a nossa vida, que é a questão da visibilidade. Vivemos numa sociedade de homens brancos e classe média. São essas pessoas que determinam as regras e estabelecem as relações de poder, e as pessoas que são negras têm uma trajetória mais longa do que a nossa. São mulheres na luta pela descriminalização do aborto, por jornada de trabalho.

E nós, lésbicas, estamos numa luta há pelo menos 25 anos e a Mana deve saber disso melhor do que eu, que há um grande número de mulheres que fazem parte da história dessa luta. Estamos crescendo nos espaços, mas temos muito a fazer, porque quando discutimos dentro de um movimento, lésbicas não são gays, não são travestis, não são transexuais, então temos a questão da visibilidade. Para nós são importantes os espaços a serem ocupados.

E quando fizemos pelo segundo ano consecutivo uma caminhada, algumas pessoas chegaram a perguntar se estávamos disputando o espaço com o pessoal da parada. Respondemos que a nossa questão não era essa, que tínhamos um espaço a ocupar, uma forma de olhar e precisávamos colocar isso na rua. Tivemos parceiros e parceiras importantes. Algumas parcerias preferiram não se manifestar, não ficando visível, e optou-se pela invisibilidade para dar visibilidade às lésbicas. Temos, por isso, um imenso agradecimento por essa parceria, da mesma forma como agradecemos as pessoas como o pessoal do Moleca, de Campinas, o pessoal do Grupo Prisma e outros grupos que se propuseram, e o pessoal do Corsa também, que nos ajudou muito nesse processo da construção de espaços de conquista da cidadania, que é uma tarefa difícil e que fazemos todo o dia. Esse espaço aqui hoje é importante por isso.

Começamos a fazer uma discussão na Câmara Municipal a esse respeito. Este é um ano de final de legislatura e então achamos não ser conveniente criar esse espaço na Câmara, mas estamos num processo de discussão e construção disso na Câmara Municipal de São Paulo.

Quero encerrar agradecendo a oportunidade de estarmos aqui, quero cumprimentar o Deputado Ítalo Cardoso pela iniciativa e dizer que somos parceiros, que precisamos trabalhar para a conquista de construção de parceria pela igualdade, pelo direito de cidadania e pela igualdade que respeite a nossa vivência diferente: o direito de ser diferente. Obrigada e boa noite. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - Obrigado, Rita. Quero anunciar também a presença da Sra. Paula Gindri Baes, representando a liderança do PCdoB; Sr. Rafael Pinto da Afubesp - Associação dos Funcionários do Grupo Santander, Banespa, Banesprevi e Cabesp; Sra. Márcia Aparecida Souza, representando o Deputado Simão Pedro; Sr. Beto Volpi, do Grupo Hipu Piara, de São Vicente; Sr. Marco Antonio Mróz, da Executiva Nacional do PV; Sr. Marco Antonio Carlos, representando o Deputado Sebastião Almeida.

Passamos a palavra à Sra. Bárbara Graner, militante do CASVI - Centro de Apoio e Solidariedade à Vida e do Movimento de Transexuais.

 

A SRA. BARBARA GRANER - Primeiramente, boa noite a todas as senhoras e senhores presentes; cumprimento o Exmo. Sr. Deputado Estadual Ítalo Cardoso por essa iniciativa e o Exmo. Sr. Deputado Estadual Sebastião Arcanjo pela parceria de longa data.

Compartilho muito com a visão da nossa querida amiga Janaína Lima. É hora de quebrarmos certos protocolos, de pararmos com contextos feitos. Não estamos mais no nosso movimento, nessa altura, para virmos com falas feitas de muitos anos atrás. Nossa maior fala, nesse exato momento, é mostrar a nossa cara na rua, não só no dia da parada, não só quando estamos juntos, mais de um milhão e meio, na Avenida Paulista, mas sim no dia-a-dia.

Mostrar para todas as pessoas, em especial para os legisladores desta Casa, que cidadãos de primeira ordem - homossexuais, lésbicas, travestis e transexuais - estão acordando para o fato de que são cidadãos, têm a consciência de que fazem parte desta sociedade e que estão, de forma política e organizada, reivindicando o seu direito no cumprimento da lei máxima do nosso país. Todos nós somos iguais perante a lei, em direito, em conquistas, em espaço social. (Palmas.)

Estamos aqui, através de nossas múltiplas cores, mostrando exatamente isso, que somos belos e temos o direito de ser o estereótipo. E sendo estereótipo ou não, somos cidadãos. Estamos aqui mostrando que de fato viemos para ocupar, de forma política e construtiva, esta Casa que nos é de direito.

Mostrar que no Estado de São Paulo nós existimos. Mostrar para nossas cidades que nós existimos. E mostrar para ao Brasil que sabemos exatamente qual é o nosso espaço nesse território verde-amarelo. Não só verde-amarelo, mas em todas as cores do prisma que nós irradiamos nesta sociedade.

Viemos para mostrar não só que temos consciência do nosso poder político, mas também um repensar profundo para a sociedade, de quem é quem, de o que é realmente importante, o que é fundamental para todos nós, seres humanos.

A luta do Movimento Arco-íris, a luta do movimento de Gays, Lésbicas, Travestis, Transexuais, Bissexuais e Simpatizantes não pertence apenas a eles. Pertence a todos os cidadãos. Todos nós devemos nos unir em nossas diferenças e devemos mostrar para os legisladores do nosso país que temos consciência do espaço que estamos ocupando, e que vamos continuar a ocupá-lo, porque isto, mais uma vez reforço, é de nosso direito.

Parabéns a todos pela visibilidade máxima representada nesta Casa. Quero, acima de tudo, dar os parabéns aos legisladores parceiros nessa iniciativa tão ousada. Tenho a certeza de que este é o primeiro passo para que possamos, definitivamente, ver as leis que queremos tanto que sejam aprovadas e que amparam a nossa comunidade GLBT nos seus direitos mínimos.

Vamos, com certeza, construir essa nova realidade no nosso país e mostrar que somos um arco-íris construtivo, positivo, e que estamos aqui para nos unir com toda a sociedade brasileira, para fazer deste país um país muito melhor.

Muito obrigada. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Agradecemos ao nosso amigo José Luiz Penna, Presidente Nacional do PV, que pede licença porque tem que se retirar. Obrigado.

Anunciamos a presença de Pai Cido de Iemanjá, da Nação Oxumaré; Sr. Wallan Rodrigues, da Secretaria de Religião da Associação Parada GLBT; Sr. Deco Ribeiro, do Grupo E-Jovem, Adolescentes Homossexuais de Campinas.

Passo a palavra agora para o Sr. Nelson Matias Pereira, coordenador político da Associação Parada do Orgulho GLBT de São Paulo.

 

O SR. NELSON MATIAS PEREIRA - Boa-noite a todos e a todas, ao Exmo. Deputado Estadual Ítalo Cardoso. Quero agradecer à Frente Parlamentar pela Livre Expressão Sexual pelo convite e pela oportunidade de estar aqui, neste dia tão importante para todos nós: gays, lésbicas, transgêneros, travestis e bissexuais.

Quero registrar minha gratidão a tão nobre atitude para com a comunidade homossexual de São Paulo. Sabemos que não foi fácil a realização desta sessão solene. Foi uma batalha árdua que se estendeu nos últimos dias. Foi uma luta contra o que há de mais nefasto na sociedade atual: o preconceito. Foi preciso quase um mês para que esta Casa aprovasse esta sessão solene, o que é vergonhoso. Felizmente, o bom senso prevaleceu em detrimento do preconceito. A não-aprovação desta sessão solene seria um retrocesso sem precedentes na história desta Casa de tantas conquistas e de tantas lutas.

A atitude da Frente Parlamentar merece moção de aplauso por nobre atitude. Sinto orgulho de representantes como vocês, que cumprem o papel que lhes foi delegado quando eleitos Deputados do Estado de São Paulo: o papel de serem porta-vozes da sociedade, sem distinção de credo, cor, sexo, como reza o Art. 5º da Carta Magna da nossa nação. Orgulho: este é o sentimento que alimenta a nossa auto-estima.

Neste mês, tivemos vários eventos importantes em comemoração ao mês do Orgulho GLBT, dentre eles, este ato em que aqui estamos. Na semana passada, o mundo e a sociedade brasileira assistiram a um dos maiores eventos já realizados pela sociedade civil organizada, que foi a 8ª Parada do Orgulho GLBT. As Avenidas Paulista e Consolação foram tomadas por uma massa humana, que somou um milhão e oitocentas mil pessoas, uma massa composta por cidadãos e cidadãs que exibiram o orgulho de serem o que são: gays, lésbicas, travestis, transgêneros e bissexuais.

Com o tema ‘Temos família e orgulho’, fomos às ruas clamar por respeito e cidadania. Fazendo coro ao nosso grito, milhares de heterossexuais que desejam uma sociedade mais tolerante juntaram-se a esta luta.

Com a visibilidade como arma e instrumento contra o preconceito, a pergunta é: o que querem os gays? Segundo o GGB, Grupo Gay da Bahia, através do trabalho árduo do Professor Luis Moti, chegou-se à triste conclusão: a cada três dias, um homossexual é morto de forma violenta, vítima da homofobia da sociedade brasileira. Da violência explícita à violência velada, é comum recebermos na associação o pedido de ajuda de adultos e adolescentes que sofreram discriminação por conta da sua orientação sexual.

Na semana passada fomos procurados por um jovem adolescente - que não é o primeiro, nem será o último - que foi expulso de casa quando os pais descobriram que ele era homossexual. Desempregado e acolhido provisoriamente por uma amiga, procurava um lugar para morar.

É comum nos espaços onde freqüentamos, ouvir xingamentos - às vezes jocosos - em altos brados ou em formas de brincadeira, sempre com expressões humilhantes contra homossexuais. E há os jornais, sempre com notícias de violência contra homossexuais ou declarações homofóbicas de líderes religiosos ou políticos. Além da mídia, que ridiculariza a nossa condição homossexual e, de forma premeditada, nos mostram para a sociedade sempre de forma caricata, promíscua, sem família e assexuados. Nos programas humorísticos e telenovelas, somos tratados como os ‘bobos da corte’, para deleite da família brasileira no seu horário nobre.

Em março deste ano, a Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - lançou uma pesquisa inédita sobre juventudes e sexualidade, realizada em treze capitais. Chama a atenção à postura de discriminação aos homossexuais. Cerca de ¼ dos alunos afirmam que não gostariam de ter um colega homossexual. Os homens têm mais preconceitos que as mulheres. Quando perguntados se não gostariam de ter como colegas homossexuais, o percentual das respostas afirmativas varia de 45% em Vitória a 34% em Belém, para os meninos, e entre 22% em Recife e 10% no Rio de Janeiro, para as meninas.

O estudo mostra que o exemplo da intolerância pode vir de casa. Entre os pais ouvidos, o índice dos que preferem que os filhos não tenham colegas gays em sala de aula chega a 45% em Fortaleza e 46,6% em Recife. A pesquisa comprova: as piadas sobre gays continuam se fazendo presentes na escola.

Alguns acham presunçoso quando clamamos por orgulho, deixam de lado a análise de que esse orgulho nada mais é do que o chamado de volta para a auto-estima que foi perdida, diante do massacre diário da sociedade heterossexual machista, preconceituosa e homofóbica. Enquanto levantamos a bandeira do orgulho, do respeito, da diversidade, da cidadania e do amor, evangélicos, católicos carismáticos e da TFP, skin-heads levantam bandeiras do ódio e da intolerância contra nós, homossexuais.

Hoje, as paradas no Brasil somam um total de mais de trinta e oito, que juntas somam mais de três milhões de participantes. O Brasil que produziu a maior e mais vibrante marcha do Orgulho e marchas quase simultâneas em diferentes capitais é também um dos lugares mais intolerantes com a população GLBT. É campeão mundial de assassinatos homofóbicos. A realidade mostra uma sociedade defrontada com a sua triste contradição: a de agredir e discriminar aqueles que não escondem a sua orientação sexual.

Nas últimas duas décadas, foram documentados mais de dois mil e quinhentos assassinatos, colocando o Brasil na condição de campeão mundial. Diante dos fatos, a pergunta que não quer calar: qual é o medo que essa sociedade tem da homossexualidade? Qual é o medo que justifica tanta violência? É por isso que aclamamos por orgulho. É por isso que estamos aqui hoje.

Neste mês, vão acontecer paradas no mundo todo, inclusive em várias cidades, como já foi dito aqui. Um milhão e oitocentas mil pessoas que compareceram à Avenida Paulista significaram a visibilidade de um amor legítimo como o nosso, o amor que ousa dizer o seu nome.

Parafraseando o nosso Presidente, espero que a esperança vença o medo. Há uma luz no fim do túnel. Leis antidiscriminação pipocaram por vários municípios. Aqui, no Estado de São Paulo, temos a Lei 10.948, do nobre Deputado Renato Simões, que pune a discriminação por orientação sexual.

Tivemos, em maio deste ano, dentro das novas políticas nacionais do Governo Federal, anunciado o Programa do Brasil Sem Homofobia, que foi construído em conjunto com o movimento homossexual brasileiro. O programa promete ações afirmativas em todos os níveis ao alcance do governo. Seus órgãos e ministérios, na Justiça, na saúde, na educação, na cultura, nas comunicações e nos direitos humanos.

Hoje, a Justiça tem visto a questão como direito de fato, dando a guarda a pais e mães gays, gerando assim jurisprudência por todo o Brasil. Sim, temos família e orgulho, a questão é que não podemos viver da boa vontade da Justiça, torcendo para que o processo vá parar na mão de juízes liberais, ao invés de juízes conservadores. Além do que, nessa situação, as pessoas envolvidas acabam tendo que se expor publicamente, para garantir o direito inalienável.

A Constituição garante que todos somos iguais perante a lei, mas, na prática, não é bem assim que as coisas funcionam. É por isso que precisamos de políticas públicas. É preciso que exista uma lei que caracterize o crime de ódio matar alguém pelo simples fato de ser homossexual, que já vitimou milhares de pessoas, como já foi dito aqui por mim.

É preciso políticas que olhem para as questões trabalhistas, que coíbam o preconceito. É preciso políticas que coloquem em prática o código de ética nos meios de comunicação, a fim de pôr um fim na difusão do estereótipo anti-GLBT.

É preciso políticas que permitam a extensão de todos os benefícios sociais concedidos aos casais heterossexuais, como contrato de união civil, previdência social, herança, partilha de bens, extensão de seguros, férias, enfim, aos casais gays e lésbicas que vivem em uma situação parecida de relacionamento homo-afetivo.

É preciso políticas públicas que acabem com as normas, regulamentos internos de qualquer instituição, particularmente das Forças Armadas, que impeçam o livre ingresso de homossexuais devido a sua orientação sexual.

É preciso políticas que incluam a disciplina da educação sexual nos currículos escolares, incluindo a discussão sobre a diversidade existente quanto à orientação e gênero, a necessidade de se respeitar a homossexualidade como sendo apenas uma dentre elas.

Poderia apontar mais uma dúzia de reivindicações de inclusões políticas, importantes para a comunidade a GLBT, mas as que já foram mencionadas deixam claro o porquê da necessidade de se construir políticas para os homossexuais e quais as prerrogativas da sua falta para todos nós.

As mulheres, negros, índios, idosos e adolescentes, como nós, GLTBS, têm em comum o fato de serem cidadãos. Incluindo, nós homossexuais, todos os demais possuem políticas específicas para garantia de seus direitos.

É por isso, senhores, respondendo a pergunta, o que querem os gays quando ocupam as principais avenidas do mundo? É o respeito, a cidadania, o direito de igualdade. É por isso que estamos aqui, hoje, neste importante evento de visibilidade. No dia em que nos tratarem com respeito e dignidade, não vamos mais tomar as principais avenidas do mundo. Não precisaremos ocupar espaços como este aqui, para gritar por respeito e gritar que temos orgulho, sim.

Para terminar, quero ler um trecho do brilhante artigo escrito pela jornalista de Porto Alegre, Ida Freire: “O bom sinal é que na celebração do orgulho gay, a festa não é só dela. Participa cada vez mais quem respeita e usufrui o prazer da diferença, que iguala todos na avenida. Crianças, casais heteros e gente idosa. Todo mundo vai à parada. É um jeito de mostrar que a cara hetero e conservadora que o país privilegia não passa de uma tranca no grande armário em que a alma brasileira, diversa por natureza, se esconde.”

A nossa luta, senhores, é revolucionária. É muito mais que política. É revolucionária porque queremos mudar corações e mentes. É preciso que todos saiam daqui hoje sabendo que o preconceito tem cura e o antídoto é o amor e o respeito.

 

O SR. PRESIDENTE - ÍTALO CARDOSO - PT - Recebemos também um fax enviado pelo Dr. Luis Roberto Barradas, da Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo, do Sr. Engenheiro Roberto Bortolotto, Secretário de Infra-Estrutura Urbana da cidade de São Paulo; do Vereador Toninho Campanha, da Câmara Municipal de São Paulo. Anunciamos a presença de Erick Galdino, do Grupo Mix Brasil.

Tem a palavra o Dr. Carlos Cardoso de Oliveira Júnior, promotor especial de direitos humanos do Ministério Público.

 

O SR. CARLOS CARDOSO DE OLIVEIRA JÚNIOR - Ilustres Deputados Ítalo Cardoso, Sebastião Arcanjo, lideranças, representantes de entidades, militantes, ativistas, cidadãos que aqui se encontram para prestar sua solidariedade a esta data, o Dia Internacional do Orgulho Gay.

É impossível comparecer a esta cerimônia sem que venha à mente o evento marcante, a Parada do Orgulho GLBT na cidade de São Paulo, que contou com a participação de mais de um milhão e meio de pessoas. Não me recordo, nos últimos anos, de um evento como esse. Duvido que qualquer partido político brasileiro consiga hoje reunir, nas ruas e nas praças de qualquer cidade do país, um número tão expressivo e significativo de cidadãos e cidadãs em torno de uma questão que diz respeito ao resgate da cidadania de uma parcela expressiva da população brasileira.

Há uma estimativa aceita internacionalmente de que 10% da população mundial é constituída por homossexuais de ambos os sexos. Se de fato esse número corresponder à realidade, é certo que temos no Brasil hoje por volta de 17 milhões de cidadãos homossexuais de ambos os sexos, que ainda não alcançaram um patamar minimamente aceitável de respeito a sua dignidade como seres humanos.

A despeito de contarmos com uma Constituição Federal aprovada no dia 5 de outubro de 1998, que coroou a luta contra a ditadura militar e inaugurou, esperamos que definitivamente, um novo ciclo absolutamente democrático no Brasil, a despeito dessa conquista jurídica e política, não há como deixar de reconhecer que os direitos listados nessa Constituição para uma parcela talvez majoritária da população brasileira ainda estão longe de se transformar em realidade. O que coloca na ordem do dia a luta pela concretização de todos aqueles direitos individuais e coletivos consagrados pela nossa Constituição.

Essa Constituição expressa de maneira literal a proibição à discriminação sexual. Dentre as diversas modalidades de discriminação existentes na sociedade brasileira, talvez a discriminação sexual seja aquela que se encontra em pior situação. Talvez em relação à discriminação sexual estejamos diante de algo em relação ao qual pouco se avançou.

Isso mostra a atualidade, a oportunidade e a urgência com que essa questão tem que ser tratada por todos aqueles que compõem essa imensa comunidade homossexual brasileira, mas, sobretudo, é chegado o momento de fortalecermos e incrementarmos os movimentos sociais como esse que se expressou na Parada GLBT, para cobrar dos nossos governantes, dos nossos parlamentares, das nossas instituições públicas que têm a ver com a questão da cidadania uma atitude mais decidida, mais presente, mais forte e mais determinada, para que possamos antecipar e abreviar, o quanto for possível, o resgate da cidadania homossexual.

E o Ministério Público de São Paulo, que eu aqui hoje represento, está entre essas instituições que precisam ser demandadas, solicitadas e cobradas pelo povo em geral, e pela comunidade homossexual em particular, para que utilize, de maneira mais eficiente, mais ágil e mais presente, os instrumentos legais que estão à sua disposição para combater a discriminação, sobretudo a violência que se abate sobre uma parcela da comunidade homossexual.

Há poucos dias fizemos uma reunião com a presença do Procurador-Geral da Justiça do Estado de São Paulo, com alguns representantes da Assembléia Legislativa, representantes dos organizadores da Parada GLBT, exatamente para agendarmos reuniões de trabalho, no bojo das quais, em conjunto, pretendemos melhor definir ações mais específicas, mais concretas, para avançarmos nessa luta, que não é uma luta apenas de vocês, mas é uma luta de todos os cidadãos e cidadãs brasileiras comprometidos com a construção de uma sociedade democrática, humana, solidária e justa.

É disso que se trata, porque enquanto uma parcela tão expressiva da sociedade brasileira como a comunidade homossexual estiver sendo vítima de “n” manifestações discriminatórias, da violência, estiver à margem do amparo que o Estado deve proporcionar a todos os cidadãos indistintamente, não poderemos afirmar que estaremos vivendo numa democracia efetivamente participativa e de todos.

Era este o registro que gostaria de deixar. Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ITALO CARDOSO - PT - Obrigado, Dr. Carlos Cardoso. Partindo já para o encerramento desta sessão solene, passo a ler o texto enviado pela Frente Parlamentar Estadual pela Livre Expressão Sexual, desta Casa:

“A celebração do orgulho de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros, cuja data internacional é o dia 28 de junho, representa acima de tudo o reconhecimento de que este segmento de nossa população não mais aceita viver oprimido por uma moral heterossexista que, além de recriminar suas manifestações de afetividade, limita seus direitos civis em comparação com as demais pessoas.

Com muita alegria, mas ao mesmo tempo com muita consciência deste desafio, mais de 1,5 milhão de pessoas foram às ruas de São Paulo na VIII Parada do Orgulho GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros), realizada no último dia 13, dizer que só haverá realmente urna democracia em nosso país quando os direitos de todos: de lésbicas, gays, travestis, transexuais, bissexuais e heterossexuais forem efetivamente respeitados.

A luta pela cidadania GLBT passa por todos os espaços sociais, desde a família, escola, trabalho, e nas ruas, através destas grandes marchas do orgulho. Mas o espaço do Poder Público não pode ficar alheio às demandas deste movimento, sob pena de não cumprir sua função definida na Constituição da República Federativa.

Na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, seguindo o exemplo do Congresso Nacional, constituímos a Frente Parlamentar Estadual Pela Livre Expressão Sexual, com a finalidade tanto de trazer este debate a esta Casa de Leis, quanto de elaborar e aprovar proposições voltadas ao reconhecimento dos direitos de lésbicas, gays, travestis, transexuais e bissexuais.

já realizamos alguns eventos desde a criação da Frente e, além das iniciativas individuais dos Deputados e das Deputadas que a compõem, temos em andamento um Projeto de Lei, de autoria coletiva destes parlamentares, que institui junto à Secretaria Estadual da Justiça e da Cidadania o Núcleo de Estudos e Proteção à Cidadania Homossexual, para reunir dados sobre violências praticadas contra pessoas homossexuais, bissexuais e transgêneros, assim como atos discriminatórios, para a composição de estudos, e proposição de soluções para estas causas.

A dívida social do Brasil com a comunidade GLBT é enorme, e o movimento já compreendeu que somente sua luta e sua organização poderão superar a homofobia que ainda hoje perdura em nossa sociedade. Mas a atuação nos espaços institucionais pode também ajudar nesse processo. E é para isso que a Frente Parlamentar Estadual Pela Livre Expressão Sexual se propõe a contribuir.

Nesta histórica Sessão Solene em Comemoração ao Orgulho GLBT, queremos saudar a todas e todos, sejam lésbicas, gays, travestis, transexuais e bissexuais, ou heterossexuais, que ao longo destes anos vêm dedicando o melhor de suas vidas pela construção de um Brasil sem homofobia.

Frente Parlamentar Estadual pela Livre Expressão Sexual.”

Senhoras e senhores, a força da sessão solene faz com que eu chame vocês de senhoras e senhores. E é bem neste contexto mesmo que fizemos a máxima questão de realizar aqui hoje uma sessão, dentro dos conformes e parâmetros legais estabelecidos pela Constituição do Estado que dizem respeito a uma sessão solene.

A sessão solene é realizada nesta Casa para homenagear, para saudar, para tratar de segmentos, de grupos, de ações, de fatos especiais que ocorrem na vida deste Estado e desta cidade.

É comum nesta Casa a realização de sessões como esta. Constantemente Deputados ou grupos de Deputados se reúnem para chamar uma sessão solene para tratar de um assunto especial. Especial para aquele grupo de Deputados, mas especial para esta Casa, que tem por obrigação constitucional olhar a todos de forma igual, sem discriminação, de forma que não possa dividir os cidadãos deste Estado em cidadãos de primeira ou de segunda, porque a rigor são todos eleitores, são todos pagadores de impostos, são todos formadores de opinião, são cidadãos que pertencem a um segmento da sociedade em que vivemos, que há vários anos vêm lutando com todas as forças para romper, seja em casa, na escola, no trabalho, em todos os cantos da sua atuação, com esse fantasma, com esse monstro, que é o preconceito, a discriminação.

Não poderíamos aceitar que exatamente na Casa de Leis, que exatamente na Assembléia Legislativa do maior Estado, da maior cidade deste país, não fosse tratado de forma igual. Não poderíamos aceitar, como já disse aqui o nobre Deputado Sebastião Arcanjo, que, ao invés de sessão solene, como proposto no requerimento, fosse realizado um ato.

Um ato se realiza em qualquer canto: na rua, na praça. Um ato é muito importante, mas não queríamos realizar um ato, porque o ato já foi realizado na Av. Paulista. Lá estiveram mais de um milhão e meio de cidadãos de várias partes do mundo, para participar da chamada Parada do Orgulho GLBT e as entidades que fazem essas ações todos os anos. Queríamos realizar nesta Casa uma sessão solene, com toda a pompa, com todo o direito constitucional, com toda a legitimidade que este segmento tem na sociedade.

Acho que foi importante, Tiãozinho, ter sido duro da forma que foi. Não fosse daquela forma, talvez não tivesse surgido o debate necessário nesta Casa, que foi levado ao ar pelo nosso canal de televisão, porque o preconceito muitas vezes também é silencioso. E isso é mais perverso às vezes, porque esse muitas vezes não se denuncia, esse às vezes não dá chance para a reação.

Portanto, o debate travado nesta Casa, para que pudesse ser realizada esta Sessão Solene, foi educativo. Foi importante e acho que qualificou muito mais esta Sessão Solene. A beleza das pessoas que estão aqui hoje, fazendo sua manifestação da forma que uma sessão solene permite, ouvindo lideranças chamadas e convidadas para falar sobre o assunto, engrandece.

Quero falar em nome da minha bancada, falar em nome da Frente Parlamentar Estadual pela Livre Expressão Sexual e, também, dizer sobre algumas entidades que têm sido muito importantes, que, desde o mês de novembro de 2003, têm se reunido constantemente nesta Casa para que seja, de fato, uma frente constituída por entidades, por pessoas e por parlamentares para que a sociedade civil tenha cada vez mais espaço nesta Casa.

Quero falar, então, de algumas entidades, correndo o risco, inclusive, de ser injusto com alguma que porventura não seja citada. Quero agradecer e louvar o grande trabalho da Coordenadoria dos Transgêneros da Parada do Orgulho GLBT; Coordenadoria de Lésbicas da Parada do Orgulho GLBT; Identidade - Grupo de Ação pela Cidadania Homossexual; Grupo Prisma, da USP; Grupo Corsa; Grupo Umas e Outras; Apeoesp; Setorial GLBT, do PT; Sindalesp; Rede Um Outro Olhar; Coletivo de Femininas Lésbicas; Defensoria Homossexual; União de Mulheres de São Paulo e Promotoras Legais Populares; Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa; Grupo GLBT Ser Humano; CUT Nacional; CUT São Paulo; Gapa São Paulo; Fala Preto Organização de Mulheres Negras; Centro de Justiça Global; Movimento Diversidade; Moleca Lésbicas de Campinas; Sindicato dos Artistas de São Paulo; Instituto Edson Neris; Amam, como já disse aqui, Mulheres que Amam Mulheres.

Quero também destacar - e aí cometendo mais ainda o risco de injustiça com pessoas, porque muitos têm sido os ativistas e militantes que têm passado por aqui nas nossas reuniões, nas nossas manifestações - e saudar aqui Reinaldo Pereira Damião, Presidente da Parada do Orgulho Gay; Marcos de Abreu Freire; Paulo Tavares Mariante; Renato Baudin; Prof. Walmir; Fernando Scheller; Antônio Carlos, da Apeoesp; Áurea Celeste Abadd; Cláudio Roberto da Silva; Cláudia Regina Garcia; Yáscara Guelpa; Rick Ferreira; Fernando Quaresma; Jaime Camargo Pai; André Fischer; Luiz Ramirez; Tomazo e Ailton Calderã; Maria Amélia Teles; Maria Stella Moreira Pires; Deise Benedito; Maciel Nascimento; José Reinaldo Aroldo; Marisa Fernandes; Edson de Azevedo Pontes; Paula Gindri Baes; Beto de Jesus; Maria Isabel de Sá; Viviane Diniz, e garanto que tantas outras pessoas importantes que aqui estão e que, com certeza, participam desse processo.

Quero destacar o trabalho da assessoria da Bancada do Partido dos Trabalhadores, da Bancada do PCdoB, a assessoria individual de cada Deputado e a assessora de todos nós, a Mana, que brigou para que esta Sessão Solene pudesse acontecer.

Quero saudar todos vocês que aqui não foram citados, mas que são muito importantes, na pessoa de uma figura ilustre, o nosso jornalista Leão Lobo, que empresta o seu brilho, a sua profissão na luta de muitos anos para defender os direitos de cidadania de todos nós. Quero saudar e abraçar os mais humildes, os mais simples cidadãos que prezam pelo direito à adversidade. Esses, inclusive, sofrem muito mais, porque, às vezes, não têm um microfone, a possibilidade de responder. Muitas vezes recebemos aqui queixas de que entram numa delegacia como vítima e saem de lá acusados de crime que nunca cometeram. O único crime que tentaram cometer foi o de ser feliz, o direito de andar, o direito de ir e vir.

Portanto, companheiros e companheiras, um grande abraço a todos vocês. Viva à adversidade, viva ao direito à diferença! Que possamos, no ano que vem, realizar outra Sessão Solene nesta Casa, com o plenário lotado e com a presença de mais Deputados, para que possamos, então, de fato, exercer o direito e exercer aquilo que esta Casa tem de cumprir, que é o direito à cidadania, o compromisso de defender todos os cidadãos e cidadãs deste Estado.

Agradeço aos assessores, que possibilitaram esta Sessão Solene, e aos funcionários desta Casa. Srs. Deputados, esgotado o objeto da presente sessão, esta Presidência dá por encerrada. Está encerrada a sessão.

 

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-         Encerra-se a sessão às 21 horas e 39 minutos.

 

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