014ª SESSÃO
SOLENE EM
COMEMORAÇÃO DA 3ª EDIÇÃO DO PRÊMIO BETH LOBO DE DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES
Presidentes: CLÉLIA GOMES e MARCIA LIA
RESUMO
1 - CLÉLIA GOMES
Assume a Presidência e abre a sessão.
Informa que a Presidência efetiva convocara a presente sessão solene em
"Comemoração da 3ª edição do Prêmio Beth Lobo de Direitos Humanos das
Mulheres", por solicitação do deputado Carlos Bezerra Jr. Anuncia a
composição da Mesa. Convida o público a ouvir, de pé, o "Hino Nacional
Brasileiro". Anuncia a exibição de vídeo sobre a vida de Beth Lobo. Presta
homenagem, com a entrega do Prêmio Beth Lobo, à
coronel PM Helena dos Santos Reis, secretária chefe da Casa Militar do Estado
de São Paulo.
2 - HELENA DOS
SANTOS REIS
Coronel e secretária chefe da Casa
Militar do Estado de São Paulo, alude a estatísticas
acerca da violência doméstica contra as mulheres. Julga tais dados muito
tristes. Explica que, diante da dificuldade que as forças policiais têm em
interferir na esfera privada, foi criado um programa pioneiro, em que é dado
destaque à intervenção comunitária em casos onde se nota a possibilidade de
agressão, mas para os quais não foi feita denúncia junto às autoridades.
3 - MARCIA LIA
Deputada estadual,
considera que a proposta de reforma previdenciária é prejudicial às
mulheres. Avalia como fundamental o trabalho desempenhado por entidades
feministas, no atual momento. Faz breve histórico da Marcha Mundial das
Mulheres, da qual participa a homenageada Sonia Coelho. Presta homenagem, com a
entrega do Prêmio Beth Lobo, à Sra. Sonia Coelho, da
Marcha Mundial das Mulheres.
4 - SÔNIA COELHO
Integrante da Marcha Mundial das
Mulheres, ressalta que esta premiação não é
individual. Argumenta que a luta das mulheres contra a opressão necessita de iniciativas
coletivas. Fala sobre o significado dos estudos feitos por Beth Lobo. Comenta
as dificuldades enfrentadas pelas mulheres da classe trabalhadora. Opõe-se à
reforma da Previdência. Diz que a efetivação de tal proposta seria uma das
maiores derrotas já sofridas pelas mulheres e pelos trabalhadores brasileiros.
5 - MARCIA LIA
Assume a Presidência.
6 - JOÃO PAULO RILLO
Deputado estadual,
declara que o Prêmio Beth Lobo foi uma conquista do ex-deputado estadual
Adriano Diogo, a quem tece elogios. Enaltece a homenageada Laura Capriglione, que criou a rede Jornalistas Livres. Realça a
relevância da iniciativa, a qual, acrescenta, desafia a narrativa propagada
pela grande mídia. Diz que são entidades como os Jornalistas Livres e a Marcha
das Mulheres que podem organizar o povo para resistir às mais diversas formas
de opressão. Presta homenagem, com a entrega do Prêmio Beth Lobo, à jornalista
Laura Capriglione.
7 - LAURA CAPRIGLIONE
Jornalista, lembra
que foi aluna de Beth Lobo. Considera que, hoje, as mulheres são as
protagonistas da resistência democrática e das lutas sociais no Brasil.
Descreve o encaixe dos Jornalistas Livres nesse contexto. Declara que um dos
objetivos da rede é dar visibilidade a movimentos sociais pouco conhecidos pela
sociedade e que são retratados de forma negativa ou ignorados pela grande
mídia.
8 - CLÉLIA GOMES
Deputada estadual,
relata sua trajetória até chegar a esta Casa. Declara ter aprendido
muito com a homenageada Roseli de Oliveira, a qual, adita, participa de
movimentos sociais de mulheres desde os anos 70. Manifesta sua esperança de que
todas as formas de intolerância serão superadas. Discorre sobre o papel das
mulheres em tal transformação. Presta homenagem, com a entrega do Prêmio Beth
Lobo, à Sra. Roseli de Oliveira, doutora em
Sociologia.
9 - ROSELI DE OLIVEIRA
Doutora em Sociologia, narra como foi
criticada por levar aos movimentos trabalhistas e feministas a discussão do
problema do racismo. Afirma que os movimentos negros e de mulheres negras
trouxeram vitalidade às lutas sociais. Combate o preconceito contra as
religiões de matriz africana. Cita exemplos de atitudes discriminatórias.
Defende a laicidade do Estado.
10 - PRESIDENTE MARCIA LIA
Faz agradecimentos gerais. Encerra a
sessão.
* * *
- Assume a Presidência e abre a sessão a Sra. Clélia Gomes.
* * *
A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Boa noite a todas e a todos. Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
Com base nos termos da XIV Consolidação do Regimento Interno, e com a aquiescência dos líderes de bancadas presentes em plenário, está dispensada a leitura da Ata.
Sras. Deputadas, Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores, esta sessão solene foi convocada pela Presidência desta Casa, atendendo a solicitação do deputado Carlos Bezerra Jr., coma finalidade de comemorar a 3ª Edição do Prêmio Beth Lobo de Direitos Humanos das Mulheres.
Compondo esta Mesa a deputada estadual Marcia Lia, o deputado estadual João Paulo Rillo e eu, a deputada estadual Clélia Gomes.
Convido a todos os presentes para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, executado pela Camerata da Polícia Militar do Estado de São Paulo, sob a regência do sargento Gleidson Azevedo.
* * *
- É executado o Hino Nacional Brasileiro.
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A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Esta Presidência agradece a Camerata da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Comunicamos aos presentes que esta sessão solene será transmitida pela TV Assembleia no sábado, dia primeiro de abril, às 21 horas pela NET - canal 7; Vivo - canal 9 e TV Digital Aberta - canal 61.2.
Agradeço a presença da Clara Charf, ex-deputada e diretora da Associação Mulheres pela Paz, que foi casada com Carlos Marighella; da coronel PM Helena dos Santos Reis, secretária-chefe da Casa Militar do Palácio do Governo; da jornalista Laura Capriglione; da Roseli de Oliveira, socióloga mestre em Sociologia Urbana e especialista em Saúde Pública; da Sônia Coelho, da Marcha Mundial das Mulheres; do tenente coronel Wagner Tadeu Silva Prado, diretor do Departamento de Administração da Casa Militar do Palácio do Governo; da Rosangela Aparecida Assorino, presidente da Consciência Negra de Mongaguá; Marcelo Zelic, diretor do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo.
Vamos assistir ao vídeo, com um breve histórico sobre Beth Lobo.
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- É exibido o vídeo.
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A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Esta Presidência convida a Dra. Melina Lourenço, que está representando o deputado Coronel Telhada, para homenagear a Cel. PM Helena dos Santos Reis, secretária-chefe da Casa Militar do Estado de São Paulo, com a entrega do Prêmio Beth Lobo.
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- É feita a homenagem.
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A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Esta Presidência concede a palavra à Cel. PM Helena dos Santos Reis.
A SRA. HELENA DOS SANTOS REIS - Boa noite, senhoras e senhores. Quero inicialmente saudar a presidente
desta sessão, a Excelentíssima Sra. Deputada Clélia
Gomes, muito obrigada. Saúdo a deputada Marcia Lia,
obrigada por também prestigiar nosso evento. Deputado João Paulo Rillo, meu conterrâneo, obrigada e uma boa noite para o
senhor. E quero saudar também as demais agraciadas que subirão aqui nesta
tribuna: a Sra. Roseli, a Laura e a Sônia Coelho. Parabéns a todos.
Senhoras e
senhores, é uma honra para mim receber esta premiação
em nome da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Hoje exerço a função de
secretária-chefe da Casa Militar por indicação do
nosso governador Geraldo Alckmin, mas ela deu-se em razão de 28 anos de serviços
prestados à comunidade do estado de São Paulo, onde desenvolvemos um trabalho
bem gratificante.
Nós identificamos o problema, até o Fórum de Segurança Pública divulgou seus resultados no dia oito de março e trouxe estatísticas que já conhecemos de cor: 29% das mulheres entrevistadas declararam ter sido vítimas de violência, e 61% dos agressores são pessoas do seu relacionamento íntimo. Esse é um dado muito triste, quando aquele que tem o dever divino e legal de proteger se torna o principal agressor. Então temos que estar atentos. A esfera privada é de difícil intervenção por parte das forças policiais, e em razão disso criamos um programa pioneiro no estado de São Paulo e até no Brasil, que é um programa de mediação comunitária.
É um programa através do qual, a partir do conhecimento de uma agressão ou ameaça, nós buscamos uma intervenção chamando essas pessoas para as sessões de mediação, onde nos aprofundamos nos problemas e buscamos conjuntamente uma solução, incentivando essas mulheres para que denunciem. Cinquenta e dois por cento das mulheres não denunciam as agressões sofridas e muitas delas sequer sabem que estão sendo vítimas de agressão, quando são psicológicas e verbais.
Por meio desse trabalho a Polícia Militar busca fazer uma intervenção primária nesse contexto privado, porque briga de marido e mulher nós metemos a colher sim, e tentamos fazer esse trabalho preventivo evitando que essas situações se agravem, para situações mais graves de agressões físicas e até de mortes, que é o que infelizmente acontece em muitos casos.
Meus agradecimentos ao Coronel Telhada pela indicação, e a equipe pela concessão desta homenagem. Senhores, meu muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Muito obrigada. Esta Presidência concede a palavra à deputada Marcia Lia, que irá homenagear a Sra. Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, com o Prêmio Beth Lobo.
A SRA. MARCIA LIA - PT - Boa
noite a todos e todas, é um prazer enorme estar aqui homenageando uma mulher
feminista e ativista do Movimento de Mulheres, coordenadora nacional da Marcha
Mundial de Mulheres. Uma militante que não mede seus esforços no sentido de
estar presente em todas as lutas das mulheres. Sônia, neste momento em que nós
mulheres estamos à mercê de sofrermos um golpe, também por conta das reformas
que estão propostas, seu papel e da marcha na sociedade.
A SOF - Sempreviva
Organização Feminista, da qual você é uma das coordenadoras, precisamos pensar
e refletir de fato no que significam essas mudanças e reformas, que
prejudicarão as mulheres. Vão fazer com que nós mulheres, que já temos uma
condição muito pior do que a dos homens, que sejamos as mais sacrificadas.
Nossas mulheres perderão muito, se essas reformas forem aprovadas. A luta das
mulheres feministas, a luta das organizações e da Marcha Mundial das Mulheres são fundamentais neste momento.
Eu acredito que esta premiação e
homenagem que a Assembleia faz para uma mulher lutadora como você, é muito importante, é significativo e temos todo o orgulho de termos
indicado você como uma das mulheres a receber o Prêmio Beth Lobo. Uma guerreira
e ativista, uma mulher que conhece o que de fato as mulheres precisam,
que conhece de fato a luta das mulheres, e que é uma das mulheres que está
junto conosco nesta luta pela defesa dos direitos das mulheres. É muito
importante. Sinto-me muito feliz neste momento, de poder homenagear você.
Eu gostaria de fazer uma fala
rápida sobre a Marcha Mundial das Mulheres, porque é fundamental que as pessoas que ainda não a conhecem possam conhecer um pouco do
que é, do que foi e do que será essa marcha. A história dela começou
como um movimento internacional em 1995, na cidade de Quebec, no Canadá, quando
800 mulheres marcharam 200 quilômetros pedindo simbolicamente por pães e rosas.
O protesto conseguiu o aumento do salário mínimo, mais direitos para as
mulheres imigrantes e apoio à economia solidária praticada por mulheres.
Três anos depois o grupo realizou
o primeiro encontro internacional no Canadá, com 145 mulheres de 65 países e
territórios. No Brasil a Marcha Mundial chegou por meio da CUT - Central Única
dos Trabalhadores e Trabalhadoras. Atualmente o movimento está presente em
diferentes estados brasileiros, fazendo o enfrentamento pela garantia dos
direitos humanos das mulheres, contra a violência às mulheres, contra a
opressão racial e contra a discriminação da sexualidade. Então de fato, uma
mulher que representa essa luta merece ser homenageada pela Assembleia
Legislativa. Venha receber seu prêmio, Sônia.
Eu quero aproveitar enquanto a Sônia vem, para agradecer a presença da Clara Charf, uma mulher que é também militante do movimento feminista do PT, presidente da Associação Mulheres pela Paz, membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, membro do Conselho Nacional de Direitos das Mulheres, e viúva do saudoso Carlos Marighella. Quero também homenagear a companheira Vera Machado, também coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres. Em nome das nossas mulheres militantes, quero saudar a Milena, que representa todas as mulheres do Movimento de Moradias. Muito obrigada.
* * *
- É feita a homenagem.
* * *
A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Esta Presidência concede a palavra à Sra. Sônia Coelho.
A SRA. SÔNIA COELHO - Boa noite a todas e todos. Estou um pouco
rouca, então me desculpem. Agradeço à deputada Marcia
Lia por esta premiação. Também cumprimento o deputado Rillo
e a deputada Clélia. Esta premiação não é individual, acho que a minha atuação
e a de muitas companheiras da Marcha Mundial tem a ver com nossa ideia de que é
preciso construir movimento e ter coletivos para que as mulheres possam romper
e lutar contra a opressão na sociedade.
Para nós da
Marcha Mundial e da SOF é um orgulho muito grande termos sido lembradas aqui no
Prêmio Beth Lobo, pelo o que significou Beth Lobo para nós. Companheiras da SOF
como a Nalu, que militou junto. A Beth Lobo deixou um
legado muito importante para nós, primeiro porque ela foi uma das primeiras
estudiosas da Organização das Mulheres Metalúrgicas, no novo sindicalismo dos
anos 70 e 80. Ela trouxe esses elementos do conceito de gênero, da divisão
sexual do trabalho, e como essas desigualdades afetam nossas vidas. Como há uma
desigualdade mesmo dentro da classe trabalhadora, que não é homogênea.
Portanto, as mulheres dessa classe precisam se auto-organizar e lutar contra a
desigualdade.
Hoje quando
vemos esse estudo que a Beth Lobo fez, e trouxe também essa questão de como as
mulheres exercem mais trabalho, de como elas têm uma dupla jornada na
sociedade, da sobrecarga de trabalho que vivemos. A Beth Lobo fazia toda essa
discussão, e hoje ela é muito vigente no momento que discutimos a reforma da
Previdência. Está em discussão a jornada de trabalho, querendo se igualar
aquilo que é desigual na sociedade. As mulheres trabalham mais e são
responsáveis por um trabalho muito importante; o trabalho de cuidado, de
reprodução da casa, que é tão importante que não deveria ser só de
responsabilidade das mulheres. Deveria ser de responsabilidade de toda a
sociedade, e das pessoas de dentro da casa.
Hoje nós
vemos com essa reforma, a discussão da dupla jornada, o que as mulheres
enfrentam na sociedade, fingem que a dupla jornada não existe mais. Nós da
Marcha Mundial estamos no Brasil inteiro organizadas. Claro, fazendo a luta
contra a violência, contra o racismo, a luta pela liberdade sexual das
mulheres, pelas lésbicas. Mas estamos no Brasil todo colocando como prioridade
absoluta neste momento a derrota dessa reforma da Previdência. Será na história
da classe trabalhadora aqui no Brasil, e das mulheres, a pior derrota que se
pode colocar sobre nós. O maior retrocesso de direitos que as mulheres, a
classe trabalhadora e principalmente as mulheres negras vão sofrer nesse País.
Muito
obrigada. Agradeço mais uma vez a deputada Marcia
Lia, porque sabemos de sua luta e de sua força. Ela também é uma mulher
feminista que luta ao nosso lado, e por isso ela merece inclusive estar nos
espaços de poder. É outro espaço que nós mulheres precisamos conquistar.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE - CLÉLIA GOMES - PHS - Neste momento passo a Presidência para a deputada Marcia Lia.
* * *
- Assume a Presidência a Sra. Marcia Lia.
* * *
A SRA. PRESIDENTE - MARCIA LIA - PT - Esta Presidência concede a palavra ao deputado João Paulo Rillo, que fará a entrega do Prêmio Beth Lobo à jornalista Laura Capriglione.
O SR. JOÃO PAULO RILLO - PT - Boa noite companheiras e companheiros de luta, pessoas que vieram aqui
acompanhar a premiação de direitos humanos, o Prêmio Beth Lobo. Cumprimento
minhas queridas colegas de Parlamento, a deputada Marcia
Lia e a deputada Clélia. Cumprimento também as
homenageadas: Roseli; cel. Helena, minha conterrânea de São José do Rio Preto;
minha grande companheira Sônia Coelho e a Laura Capriglione,
de quem vou falar um pouco e apresentá-la, como minha indicação de homenageada.
E gostaria de cumprimentar todas as mulheres que lutam por um Brasil mais
justo, e minha querida companheira Clara Charf.
Conversando com ela agora há pouco, sobre a conjuntura do País, e também sobre São
Paulo, sobre as dificuldades que a democracia do País passa, a Clara fez uma
pergunta para mim, como é típico de sua personalidade precisa, se vale a pena
ser deputado na situação a qual vivemos. Minha resposta para ela foi uma
resposta da própria Clara, em um documentário que assisti sobre a vida de
Carlos Marighella, de quem ela foi companheira num
período importante de sua história, e principalmente do País. Ela dizia que o Marighella quando foi deputado federal, fez do mandato uma
trincheira de luta, uma grande tribuna das discussões mais necessárias e
profundas que o Brasil precisava fazer.
Hoje aqui fazemos uma homenagem,
e de certa forma um diálogo que é fruto de um desses mandatos que tivemos no
Brasil e aqui no estado de São Paulo, que fez do seu mandato uma grande
trincheira de lutas, sincera e intensa, que foi o deputado Adriano Diogo. Ele
presidiu a Comissão da Verdade e a Comissão de Direitos Humanos. Essa conquista
de todos nós, foi uma luta especial do deputado
Adriano Diogo, para que tivesse o Prêmio Beth Lobo para que fosse uma forma de
jogar luz na discussão e na luta das mulheres que vão para as ruas, das
mulheres com dupla jornada, que cuidam de seus lares e suas famílias, mas que
cuidam do Brasil e da democracia, que cuidam de valores importantes para nossa
luta.
Eu tive a oportunidade de fazer
uma indicação do Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos para o Adriano Diogo
quando ele já não era mais deputado. Agora faço minha segunda indicação à minha
querida Laura Capriglione. Ainda falou há pouco a
Sônia Coelho representando a Marcha das Mulheres. Sônia, em 1994, há 23 anos, a
jornalista Laura Capriglione recebia um dos prêmios
mais importantes de jornalismo - o Prêmio Esso de Reportagem; o título era
“Mulher - A Grande Mudança do Brasil”.
Que coincidência interessante
hoje! A Laura sempre se colocou à frente do seu tempo. Aliás, o mundo só muda e
se transforma porque tem pessoas que se colocam à frente do seu tempo, assim
como fez Marighella. Resumo sua luta quando ele
dizia: “Eu não tenho tempo para ter medo.” Talvez tenha sido um dos militantes
socialistas mais corajosos e audaciosos de esquerda brasileira que tivemos. A
Laura também é uma pessoa que está à frente do seu tempo, que poderia muito
bem, mesmo mantendo sua integridade ideológica e sua concepção de mundo, estar
numa posição confortável dentro de uma das grandes redações do País, da grande
mídia privada, e se mantendo íntegra, como já fez.
Mas em algum momento da história
a Laura fez uma opção, a de dar voz e disputar a democracia brasileira. Dar voz
àqueles que lutam pela democracia brasileira. Aqui está um de seus
companheiros, o Sato, a Cátia, entre outros, uma rede
chamada Jornalistas Livres. A meu ver, tem uma de suas funções algo muito
importante, que é disputar a narrativa da democracia brasileira, que está em
disputa. Que é contar a história de um viés íntegro e verdadeiro, que é colocar
a própria pele em risco para cobrir os momentos mais tensos, que muitas vezes
não aparecem na grande mídia.
Conflitos de interesses e
econômicos, que são reproduzidos na disputa por moradia, na disputa pela terra
e por educação, nas ocupações em espaços públicos, nos enfrentamentos de ruas,
nos guetos - onde ninguém muitas vezes chega. Lá tem
um jornalista livre fazendo seu registro. Laura, fui
um admirador do Paulo Freire, a quem tive um bom contato com sua obra, mas tive
um contato maior ainda com Augusto Boal, que disse
ter bebido muito da Pedagogia do Oprimido para construir o Teatro do Oprimido.
Ele foi um diretor fantástico, e também poderia encerrar sua vida de maneira
cômoda, no ponto de vista material. Mas preferiu a trincheira e a luta, que era
tirar o espectador da passividade e colocá-lo como protagonista da sua própria
história.
Laura, eu percebo que os
Jornalistas Livres é a comunicação do oprimido. É uma
rede que diz assim para o cidadão: “Todo mundo pode ser jornalista, até os
profissionais”. O Boal falava uma coisa que mexia com
o orgulho e a vaidade do ator. Ele dizia para o povo: “Todo mundo pode fazer
teatro, até os atores”. O que ele queria dizer é que isso não é propriedade
específica de quem especializou, a arte de fazer o teatro é pelo diálogo, assim
como a comunicação não pode ser propriedade privada do especialista, e pior, do
dono das grandes redes de comunicação.
Quando tem um conflito numa
habitação, numa ocupação de moradia de um prédio privado que estava abandonado, a versão da grande mídia é sempre aquela. Coloca
a ficha corrida dos líderes, tenta criminalizar o movimento, os trata como
violentos e coloca a outra parte, o direito à propriedade privada, como se a Constituição
terminasse aí. Vem o Jornalistas Livres e não conversa
nem com a liderança, não porque não quer ou não a considera, e também não
conversa com o dono da comunidade privada. Resolve falar com as crianças.
Por trás dessa luta suja que
vocês estão vendendo, como se fossem criminosos, aqui está o resultado dessa
luta que vocês os tratam como criminosos. Essas crianças que falam da sua
própria vida, que estão estudando aqui perto, que frequentam os aparelhos públicos
de saúde e sociais aqui perto. Se não fosse essa luta, estariam debaixo da
ponte. Essa é uma narrativa a ser disputada. Estou falando isso e me alongando
para justificar, acho que um prêmio que leva o nome da Beth Lobo, que tem como
pioneiro da luta o Adriano Diogo, não pode jamais ser um prêmio por um prêmio.
Laura, aqui não é um prêmio para
dizer: “Parabéns pelo o que você já fez.” Não, eu lamento por não ser isso,
você não vai descansar. Este prêmio é para dizer para você e para todas as
mulheres que estão aqui, se muito vale o já feito, mais vale o que será feito.
Esse prêmio é para dizer: “Laura, continue. Nós, a democracia brasileira, o
povo que luta precisa de você e de seus companheiros construindo outra
história”. Para encerrar, eu sei qual é a luta que vocês fazem, é para que
daqui a 20 anos o Jornalistas Livres não só registre a
história, mas dispute a história.
Nossa luta é para que daqui a 20
anos esteja assim na história: “O Brasil teve um golpe e uma mexida, mas o povo
conseguiu reverter”. Se não tem Jornalistas Livres e Marcha das Mulheres, o que
daqui a 20 anos vamos ler é que esse País é de golpistas mesmo, porque deram e
consumaram o golpe. Nós estamos aqui para resistir ao golpe. Que esse prêmio
seja uma gota singela em nossa luta pela democracia e contra a opressão de
todas as formas, e contra o golpe e os golpistas que se dão de várias formas
todos os dias.
Parabéns Laura e Jornalistas
Livres, é uma honra homenageá-los aqui na Assembleia.
Muito obrigado.
* * *
- É feita a homenagem.
* * *
A SRA. LAURA CAPRIGLIONE - Eu queria agradecer imensamente as palavras do deputado João Paulo Rillo, as pessoas que estão aqui e a Mesa. É uma honra muito grande para nós Jornalistas Livres estarmos nesta Casa, recebendo esse prêmio. A Beth Lobo foi minha professora de Ciências Sociais, portanto é uma honra estar aqui recebendo um prêmio que foi proposto por meu amigo Adriano Diogo, um cara que gosto muito e a quem sempre rendo minhas homenagens, pela integridade e coerência dele na luta.
Queria dizer que acho que nós temos mesmo uma grande missão, todos os movimentos sociais aqui. Eu rendo minha homenagem a todos eles, porque são movimentos que conseguiram fazer essa maravilha que é colocar a mulherada num protagonismo inacreditável para quem viveu e acompanha o movimento social há muitos anos. Quer dizer que o que as mulheres estão fazendo hoje no Brasil é impressionante, a grande parte da resistência democrática, quem consegue fazer são as mulheres do Brasil. São essas mulheres que no dia oito de março agora fizeram um dia de luta e resistência, chamando os homens para se unir.
As mulheres são as principais lideranças das ocupações. Vejo aqui tantos companheiros de ocupações. Eram as mulheres que estavam nas escolas ocupadas, lutando contra a reorganização escolar, que pretendia fechar salas de aula, meninas e mulheres de luta que garantem para nós que o dia de amanhã será mais potente ainda. Não só teremos homens de luta, mas um monte de mulheres que hoje em dia se sentem poderosas e empoderadas para enfrentar o machismo e a opressão patriarcal.
Portanto, acho que o Jornalistas Livres tem tudo a ver com essa luta toda, porque estamos falando de visibilizar movimentos sociais que nunca foram visibilizados, movimentos que sempre foram tratados muito mal pela mídia que temos no Brasil. É uma mídia controlada por seis famílias, que sempre tratou os movimentos sociais nessa base que o deputado falou: criminalizando, quando não inviabilizando pura e simplesmente. Foi triste assistirmos a cobertura da grande mídia no grande ato que houve no dia 15 de março contra a reforma da Previdência. Tudo virou um problema de trânsito, não tinha luta. A cidade estava travada. Hoje provavelmente a narrativa vai ser essa mesmo.
Eu acho que essa briga que compramos todos os dias para viabilizar o invisível, para mostrar a luta das mulheres que a grande mídia simplesmente ignora, finge que não vê o heroísmo dessas meninas e mulheres. Acho que é nossa principal luta, e por isso tudo está valendo muito a pena estarmos nessa campanha. Os Jornalistas Livres não recebem nenhum tipo de financiamento, somos apenas voluntários e vivemos disso. Tem alguns Jornalistas Livres aqui que estão fazendo a cobertura disso voluntariamente, porque amam fazer a contranarrativa.
Eu queria agradecer aos meus camaradas e companheiros Jornalistas Livres, a Cátia que estou vendo aqui, todas as mulheres dos movimentos sociais. Vamos para cima, porque não resta outra alternativa. O mundo é nosso, e será melhor se as mulheres forem mais poderosas e influentes nos rumos do País. Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE - MARCIA LIA - PT - Esta Presidência concede a palavra à deputada Clélia Gomes, que fará a entrega do Prêmio Beth Lobo à Sra. Roseli de Oliveira, socióloga mestre em Sociologia Urbana e especialista em Saúde Pública.
A SRA. CLÉLIA GOMES - PHS - Boa noite a todos e todas, vou falar da Roseli. Como todos sabem, estou
no poder há dois anos. Sou uma mulher que sempre se
intitulo como negra, de periferia e matrizes africanas. Assim que entrei nesta
Casa eu disse a todos que acreditava e acredito na importância da mulher no
poder e nos movimentos. A Dra. Roseli me fez aprender muito mais com essa forma
de ensinar, uma mulher que participa dos movimentos sociais, desde a década de
70. É socióloga, participa de movimentos de mulheres no estado de São Paulo,
ativista e fundadora de movimentos negros no estado, atuando em várias áreas da
sociedade civil. É a primeira coordenadora de políticas para a população negra
e indígena. Principalmente para mim, que me intitulo e tenho certeza do que digo, a primeira mãe de santo eleita no País.
Ela representa minha religião,
uma mulher digna de receber o Prêmio Beth Lobo. Uma mulher que representa um
movimento de uma religião que ainda sofre muito preconceito neste País. Mas
tenho certeza que com todos esses nossos movimentos contra a intolerância
religiosa, contra todos os tipos de intolerância venceremos. Como disse meu
amigo Rillo e minha amiga Marcia
Lia, são as mulheres que farão uma diferença em nosso País. São as mulheres que
mostrarão que podemos sim viver numa sociedade de igualdade e humanismo. É isso
que espero para todos.
Muito obrigada Roseli por ter me ensinado. É uma honra estar aqui falando um pouquinho de você. Muito obrigada por tudo. Gostaria que você viesse aqui receber seu prêmio.
* * *
- É feita a homenagem.
* * *
A SRA. PRESIDENTE - MARCIA LIA - PT - Esta Presidência concede a palavra à Roseli para que possa fazer os agradecimentos.
A SRA. ROSELI
DE OLIVEIRA - Boa noite a todos e todas. Estou
emocionadíssima por essa honraria. Ganhar um prêmio com nome de uma socióloga
como Beth Lobo não é brincadeira. Quero saudar a Comissão de Defesa dos
Direitos da Mulher e Questões Sociais, agradecer a deputada e
irmã de axé Clélia Gomes, a deputada Marcia, o
deputado Paulo. Quero saudar minhas companheiras homenageadas também e pedir a
benção à minha mãe de santo Iraci d’Oxum, minha madrinha Cida do Primado de
Umbanda e saudar amigos aqui presentes.
Vou roubar
um pouquinho do tempo. A religiosidade na minha história sempre entra no plano
privado. Quando algumas pessoas perguntam de que tempo eu sou, digo que venho
da década de 70. Quero saudar minhas tias que estão lá no
fundo, muito obrigada pela presença de ambas. A religiosidade sempre foi
uma questão de natureza privada, mas hoje fiz questão de vir paramentada com o
traje tradicional das religiões de matriz africana e afro-brasileira, por uma
questão concreta. Eu venho da década de 70 e dos movimentos sociais, sou
fundadora do Grupo Negro da PUC-SP ao final da década de 70.
Quando
tratávamos de racismo algumas pessoas nos acusavam, achando que estávamos
fazendo uma divisão do movimento dos trabalhadores. Quando estivemos em
Petrópolis nas reuniões das mulheres, achavam que nós mulheres negras estaríamos
fazendo a divisão sobre a questão das mulheres no Brasil. Isso não aconteceu, muito pelo contrário, desculpe a falta de
modéstia, mas acho que o Movimento de Mulheres Negras empoderou,
mas trouxe vitalidade para as lutas sociais. Penso que se as especificidades
não forem tratadas, nossa cidadania estará restringida a de todos. Se as
singularidades humanas, sejam elas de natureza de gêneros ou questão
geracional, seja a questão da deficiência e especialmente hoje, falando da
questão da intolerância religiosa.
Nós estamos
vivendo um momento de repressão ao Estado laico. Nós temos hoje bancadas
organizadas em criar legislação para ferir as religiões de matriz africana.
Então estou aqui e vim paramentada para fazer esse enfrentamento. Saiu do fórum
pessoal e interno para se transformar também numa luta política, que já faço
parte. Fui a primeira coordenadora do Fórum Inter-religioso para uma
Cultura de Paz e Liberdade de Crença do Estado de São Paulo.
Coordenei
isso e depois, por outras questões, em cargo e comissão, você está sempre de
plantão, às vezes 24 horas, seis meses, quatro anos dependendo, coordenei esse
fórum em que nossa luta era o Estado laico e o respeito às diferenças.
Hoje paramentada venho de dois momentos
específicos que a cidade e o estado de São Paulo vivenciaram. Um
especificamente uma Ialorixá, no aeroporto, foi
humilhada por estar paramentada com seus instrumentos de sua religião. Foi
ofendida e desmoralizada aqui em nosso aeroporto. Não viajou, não pôde fazer a
sua viagem, porque estava paramentada. É muito comum exigir que tiremos nossos
turbantes, nossas correntes, como se isso ofendesse a segurança ou gerasse
algum problema.
E no
interior do estado há campanhas promovidas por bancadas, chamando inclusive
médicos veterinários para fazerem parte, dizendo que promovemos matança.
Primeiro que não somos frigoríficos, então não promovemos matança, nós fazemos
a sacralização de animais. Esse alimento que faz parte do nosso ritual é
distribuído entre nós. Então não admitimos mais ser chamados de macumbeiros,
não admitimos mais que digam que promovemos matança, não admitimos sermos
desrespeitados nas ruas com pedradas ou palavras. Não admitimos mais grupos
religiosos, principalmente os neopentecostais que vêm às nossas portas gritar e
ofender. Esses não permitem que nosso culto se realize de forma respeitosa e
plena.
Olhando
para a coronel, que não pude estar lá na sua posse,
mas a Polícia Militar tem que nos garantir essa condição de realização. Não é
possível, nós termos chamado e às vezes, encontramos abafar a situação. Então
hoje o estado de São Paulo, e falo isso porque estive na minha gestão como
coordenadora estadual de políticas para a população negra e indígena, criamos a
Lei 14.187. Essa lei pune administrativamente todos os atos de discriminação no
estado de São Paulo. É uma lei que está sendo copiada em tantos outros estados.
Não
queremos que abafe mais. A hora que venho paramentada estou
pronta para uma guerra, estou pronta para enfrentar essa discussão de forma
plena. Não estarei mais como civil, num terno ou tailleur, mas estarei
paramentada para dizer que exijo respeito porque sou uma cidadã que cumpro meus
direitos, tenho meus deveres e principalmente quero um Estado democrático,
justo, equânime e livre. Livre como jornalistas, forte e firme como a marcha,
como tantos outros exemplos que tivemos aqui, como a nossa grande mestra que
está ali observando, a nossa Clara.
Então é
disso que estamos falando, do respeito às diferenças e singularidades humanas.
O povo religioso e o candomblé trouxeram para a história do Brasil alguns
princípios que hoje são tratados como questão diferencial, como por exemplo, a
sustentabilidade humana. Hoje as pessoas falam de sustentabilidade como se
fosse um princípio novo, e isso está dado dentro de nossas religiões. Falam em
liberdade e isso está dado dentro de nossas religiões. Falam em respeito às
diferenças e isso está dado dentro de nossas religiões. Faz parte, é do
cotidiano. A divisão fraterna e comunitária é princípio da nossa religião.
Nós, humildemente,
colocando agora, temos muito para oferecer para o conjunto da sociedade se
formos respeitados como devemos ser. É só isso para esta noite, muito obrigada
por este momento. Estou vendo meu tio representando meu pai ali atrás. Muito
obrigada a todos vocês.
A SRA. PRESIDENTE -
MARCIA LIA - PT - Neste momento eu
quero agradecer a presença de todas as pessoas que puderam prestigiar essa
premiação Beth Lobo. Dizer da importância deste momento para esta Casa,
agradecer a presença do meu companheiro - Dr. Nicolino, muito obrigada por ter
me acompanhado de Araraquara até aqui.
Esgotado o objeto da presente sessão a Presidência agradece a todos, minha equipe, aos funcionários dos serviços de Som, de Taquigrafia, de Atas, do Cerimonial, da Imprensa da Casa, da TV Assembleia, e a todos que com suas presenças colaboraram para o êxito e beleza desta solenidade. Uma boa noite a todos.
Está encerrada a presente sessão.
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- Encerra-se a sessão às 21 horas e 11 minutos.
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