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23 DE MARÇO DE 2018

015ª SESSÃO SOLENE DE ENTREGA DA MEDALHA THEODOSINA ROSÁRIO RIBEIRO

 

Presidente: LECI BRANDÃO

 

RESUMO

1 - LECI BRANDÃO

Assume a Presidência e abre a sessão.

 

2 - CLÁUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, anuncia a composição da Mesa.

 

3 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Informa que a Presidência efetiva convocara a presente sessão solene, a pedido desta deputada, na direção dos trabalhos, com a finalidade de realizar "Entrega da Medalha Theodosina Rosário Ribeiro". Convida os presentes a ouvirem, de pé, o "Hino Nacional Brasileiro", cantado à capela pela intérprete Grazzi Brasil. Discursa acerca da premiação proposta nesta solenidade. Exalta a diversidade representada pelas homenageadas. Fala a respeito do histórico político da ex-deputada Theodosina Ribeiro e de sua relevância para a promoção da igualdade racial. Discorre sobre as violências enfrentadas pela população negra no Brasil. Ressalta a resistência dessas pessoas e grupos. Enumera espaços de luta e representantes das mulheres negras no estado de São Paulo. Cita o caso da vereadora assassinada do Rio de Janeiro, Marielle Franco.

 

4 - MAYRA BELMONTE LANZA

Coordenadora do Departamento de Promoção da Igualdade Racial, representando a secretária Eloisa Arruda, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, defende o não silenciamento da população negra diante das violências enfrentadas por ela. Mostra-se emocionada com a solenidade.

 

5 - RENATA ROSA

Representante da direção do Diretório Estadual do PCdoB, situa o mandato político da deputada Leci Brandão como espaço de resistência desta Casa. Aponta que esta solenidade promove a cidadania. Fala acerca das lutas enfrentadas pelas mulheres negras, citando Marielle Franco. Faz votos de resistência do povo negro.

 

6 - MARIANA DELCHIARO

Defensora pública, representando a Defensoria Pública-Geral do Estado de São Paulo, faz saudações. Parabeniza as homenageadas deste evento. Lê mensagem da defensora pública-geral Juliana Belloque a respeito da relevância social deste ato, abordando o assassinato de Marielle Franco como exemplo da necessidade de enfrentamento da discriminação racial e da defesa dos direitos das mulheres, e demonstrando o apoio da Defensoria Pública a esse objetivo.

 

7 - ELISA LUCAS

Coordenadora da Coordenação de Políticas para População Negra e Indígena, cumprimenta os presentes. Frisa a importância das mulheres negras mobilizadas para a sociedade. Enumera avanços da política de promoção de igualdade racial no Brasil, destacando ações afirmativas promovidas no País. Salienta o apoio da deputada Leci Brandão à coordenadoria.

 

8 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Justifica a ausência da ex-deputada Theodosina Ribeiro.

 

9 - CLÁUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, lê mensagem enviada pela ex-deputada Theodosina Ribeiro, contendo saudações aos presentes, sobretudo à deputada Leci Brandão, e agradecimentos pela homenagem. Mostra impresso de homenagem a Theodosina entregue ao público presente à solenidade.

 

10 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Anuncia homenagem a mulheres que se destacaram na sociedade em razão da sua contribuição ao enfrentamento da discriminação racial e na defesa dos direitos das mulheres no estado de São Paulo.

 

11 - CLÁUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, lê breve currículo das homenageadas, que enumera.

 

12 - MARILÂNDIA FRAZÃO DE ESPINOSA

Psicopedagoga especialista em Educação para as Relações Etnico-raciais, ativista do Movimento Negro e representante do Conen - Coordenação Nacional das Entidades Negras e da Secretaria Municipal do Combate ao Racismo do Partido dos Trabalhadores, ressalta a importância das mulheres negras. Saúda Theodosina Ribeiro e Leci Brandão. Faz agradecimentos.

 

13 - RITA DE CÁSSIA SILVA MESQUITA

Fundadora do Grupo de Dança Afro II, tece agradecimentos pela homenagem recebida. Destaca a representatividade da premiação. Saúda José Galvão Mesquita e Tereza Santos, em memória.

 

14 - FABIANA DAL’MAS ROCHA PAES

Promotora do Ministério Público do Estado de São Paulo, agradece a premiação recebida. Discorre sobre suas ligações com os movimentos das mulheres e de moradia popular. Cita dificuldades do trabalho de promotoria. Mostra-se sensibilizada com a morte da vereadora Marielle Franco, com a qual conviveu no âmbito da luta por direitos reprodutivos. Lamenta o alto índice de assassinato de defensores de Direitos Humanos no Brasil. Frisa o protagonismo de mulheres no âmbito público e político. Faz defesa do respeito aos direitos das mulheres, sobretudo contra a violência.

 

15 - JOANA APARECIDA BARROS

Membro da Ala das Baianas da GRCSES Vai Vai, faz agradecimentos, sobretudo às baianas, mestre-sala e porta-bandeira com quem atua.

 

16 - MAGALI MENDES

Militante do Feconezu - Festival Comunitário Negro Zumbi, destaca a relevância da luta das mulheres negras. Reprova a intolerância às religiões afro-brasileiras. Oferece a homenagem recebida à mãe de Marielle Franco, às Mães de Maio a todas as mães de jovens assassinados no Brasil. Faz oração.

 

17 - DÉBORA GARCIA

Poetisa e idealizadora do Sarau das Pretas, felicita-se pela premiação recebida no dia de seu aniversário de 35 anos. Lamenta o alto índice de mortes de jovens negros e negras. Tece elogios à atuação política de Theodosina Ribeiro. Saúda as mulheres que enfrentam a heteronormatividade branca na política brasileira, lembrando a vereadora Marielle Franco. Situa a literatura produzida por mulheres como meio de empoderamento feminino. Declama poema em homenagem às mulheres negras.

 

18 - JENNY TEIXEIRA FRANCISCO

Membro da Pastoral Afro, agradece a todos.

 

19 - LAIS MOREIRA

Porta-bandeira do GRSCES Unidos de Vila Maria, faz agradecimentos. Aponta seu orgulho e felicidade pela homenagem recebida. Fala a respeito da relevância da luta das mulheres negras.

 

20 - MARIA PULQUERIA ALBUQUERQUE LIMA

Mãe Pulquéria, representando a Sra. Julita Lima da Silva, a mãe Manaundê, em memória, tece agradecimentos. Faz votos de continuidade do trabalho da mãe Manaundê, que traduz como luta.

 

21 - AMANDA CRISTINA SILVA DOS SANTOS

Rapper Amanda Negrasim, agradece pela premiação recebida, sobretudo à Casa Herdeiras de Aqualtune. Posiciona a arte como salvadora de vidas. Relata violência sexual sofrida na infância. Canta música de sua autoria. Saúda as mulheres negras e a ancestralidade.

 

22 - ÉRICA MALUNGUINHO

Ativista cultural, mulher trans e cofundadora do Aparelha Luzia, faz agradecimentos. Disserta sobre ancestralidade e diáspora africana, destacando as lutas dos negros durante a escravidão e após sua abolição. Discorre acerca da atuação movimento negro e suas relações com eurocentrismo e branquitude. Aponta que, a seu ver, a política institucional é um território importante de disputa que precisa ser ocupado com a corporeidade e a existência ancestral negra para promover conscientização sobre o racismo que construiu o Brasil. Defende a alternância de poder e o protagonismo político das mulheres negras.

 

23 - JOANA D’ARC FÉLIX DE SOUSA

Cientista e professora da Escola Técnica Professor Carmelino Corrêa Júnior, tece agradecimentos. Dedica o prêmio recebido a seus pais. Conta sua história de vida e profissão. Relata dificuldades enfrentadas em seu percurso de formação, sobretudo na universidade, destacando a fome, o racismo e as perdas familiares. Narra sua atuação em escola de Ensino Médio em Franca, com atividades de iniciação científica. Ressalta o sucesso internacional dos projetos científicos realizados com os jovens. Menciona adolescentes que deixaram a prostituição e o tráfico de drogas para se dedicarem à pesquisa científica e, recentemente, foram aprovados em vestibular da Unicamp. Frisa o trabalho promovido com alunos da Fundação Casa. Destaca o caráter transformador da educação transformadora. Mostra-se honrada com esta e outras homenagens recebidas.

 

24 - EDNA MARIA ANDRADE

Secretária da Mulher do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo, dedica a premiação recebida às trabalhadoras de transporte coletivo de São Paulo e às mulheres negras. Faz agradecimentos e elogios às demais homenageadas.

 

25 - MARIA BERNADETE RAIMUNDO

Intérprete e compositora do GRCSES Unidos do Peruche, tece agradecimentos. Realça a importância da atuação da deputada Leci Brandão para sua trajetória como sambista.

 

26 - MARIA CÍCERA MINEIRO DA SILVA

Líder comunitária, coordenadora do Projeto Diversidade Ética Cidadania, agradece a homenagem recebida, que dedica a todas as mulheres, vítimas do racismo e moradores das comunidades pobres da periferia. Relata sua atuação como alfabetizadora, mulher, militante do movimento negro e do PCdoB e líder comunitária. Fala sobre a fundação de Cohab na zona sul de São Paulo a partir de ocupação popular. Frisa a relevância da participação popular e da luta contra o machismo e o racismo. Narra caso de racismo vivido em Maceió, ocasião em que foi-lhe negado emprego nas Lojas Americanas, por ser negra. Felicita-se pelo crescimento do número de pessoas negras nas universidades e no mercado de trabalho, o que, segundo ela, é resultado das lutas dessa população. Homenageia a memória de Marielle Franco.

 

27 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Presta homenagem à memória da vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, e do Sr. Anderson Silva, seu motorista, com leitura de texto acerca da intensificação da luta pela construção de um mundo sem opressão. Discorre sobre sua atuação como parlamentar, que situa como missão e obrigação. Faz agradecimentos. Aponta o compromisso com as pessoas como fator de maior relevância em sua luta política. Faz críticas a esta Casa pela intolerância em relação à diversidade de gênero e de orientações sexuais e pela pouca presença de negros nos espaços de poder. Defende os direitos da população negra, sobretudo no campo político. Enfatiza a necessidade de atuação contra os movimentos políticos reacionários. Apresenta Marielle Franco como um exemplo de enfrentamento a essas tendências. Faz agradecimentos gerais. Encerra a sessão.

 


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- Assume a Presidência e abre a sessão a Sra. Leci Brandão.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Senhoras e senhores, bom dia a todos e a todas. Sejam bem-vindos à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, para a sessão solene com a finalidade de entregar a Medalha Theodosina Rosário Ribeiro.

Anunciamos, para compor a Mesa: a Exma. Sra. Deputada Leci Brandão, líder do PCdoB e proponente desta sessão solene; o deputado estadual Carlos Giannazi, que chegará um pouco mais tarde; a professora Elisa Lucas, presidente da Coordenadoria Estadual de Políticas para a População Negra e Indígena; Dra. Mariana Delchiaro, defensora pública, da Defensoria Pública-Geral do Estado de São Paulo; e Renata Rosa, representando o Diretório Estadual do PCdoB. A Exma. Sra. Theodosina Rosário Ribeiro, que foi deputada estadual nesta Casa de Leis, não estará presente no dia de hoje, em virtude de problemas de saúde.

Com a palavra, a nobre deputada Leci Brandão.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

Com base nos termos do Regimento Interno, e com a aquiescência dos líderes de bancadas presentes em plenário, está dispensada a leitura da ata.

Sras. Deputadas, Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores, esta sessão solene foi convocada pelo presidente desta Casa, deputado Cauê Macris, atendendo à solicitação desta deputada, com a finalidade de entregar a Medalha Theodosina Rosário Ribeiro.

Convido a todos os presentes para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, cantado pela intérprete Grazzy Brasil.

 

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- É feita a execução do Hino Nacional Brasileiro.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Este cerimonial anuncia algumas presenças ilustres nesta solenidade: Sr. Wander Geraldo, representando o deputado federal Orlando Silva; Gabriel Bittencourt Perez, 2º vice-presidente da Associação Paulista do Ministério Público; Alfredo José Rodrigues, coordenador da Ala das Baianas da Vai-Vai; comendador Adinei Araújo, presidente do Conepir de Piracicaba; Antônio Marcos Graciani, presidente da Fundação Clóvis Bevilaqua; Roberto Gil, diretor da Unidos de Vila Maria; Renato Venâncio, da Igreja Nossa Senhora de Rosário dos Homens Pretos; Dr. Reginaldo Batista, embaixador da paz na ONU; Juninho, presidente estadual do PSOL; Jânio Martins, representando o deputado estadual Antônio Salim Curiati; Sandra Mariano, da Conen; Mari Medeiros, presidente do Conselho Municipal da Promoção da Igualdade Racial de São Paulo.

Com a palavra, a nobre deputada Leci Brandão.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Que Deus abençoe, proteja e ilumine todos e todas que aqui estão. Antes de qualquer coisa, peço desculpas, porque estou um pouco contida. Estou extremamente emocionada e muito tocada com tudo o que tem acontecido. Peço perdão a vocês por isso.

Estamos aqui para a solenidade de entrega da Medalha Theodosina Rosário Ribeiro. Neste ano, cientistas, ativistas, líderes religiosas, cantoras, poetisas e líderes comunitárias serão homenageadas. Ou seja, a diversidade continua sendo a marca desta premiação.

A Dra. Theodosina Rosário Ribeiro é um exemplo de vida, dedicada ao trabalho ético e aguerrido em favor das minorias. Primeira mulher negra eleita deputada estadual por São Paulo, ela segue sendo uma luz inspiradora para que todas nós persigamos o ideal de vermos os espaços de poder sendo ocupados por aqueles e aquelas que, de fato, representam a maioria do nosso povo, com legitimidade.

A proposta da Medalha Theodosina Rosário Ribeiro, que está em sua sexta edição, é valorizar o trabalho de mulheres que dedicam suas vidas a melhorar a vida de outras pessoas, principalmente de mulheres negras e pobres que, como todos sabem, são o segmento mais vulnerável da nossa população.

Apesar de hoje ser um dia de celebrar a trajetória destas mulheres, este é um espaço político e de luta. Com a história de vida que tenho, e com os compromissos que assumi com este povo querido de São Paulo ao me eleger, não posso deixar de falar  sobre o momento grave que vivemos. Esta medalha é uma forma de reconhecimento da luta das mulheres negras, que todos os dias são obrigadas a transformar o luto pela morte dos seus filhos em luta. Todos os dias ouvimos relatos de pessoas agredidas de diversas formas, por defenderem ideais de liberdade. Agora, vivemos sob ameaça de tentarem calar a nossa voz, como fizeram com Marielle Franco.

Mas nós insistimos, porque foi assim que aprendemos com nossas mães, avós, e todas que vieram antes de nós. Os tempos nunca foram fáceis para nós, e não é de hoje que estamos na rua. Nossa resistência vem de longe, de quilombo, e permanece nas quebradas das favelas. Mas ela agora também está nas universidades, com a presença de cientistas, como a Dra. Joana D'Arc Félix. Está na presença da nova geração que se expressa em várias linguagens, como a poetisa Débora Garcia. Nossa luta de mulher negra continua parindo quilombos, seja no centro da cidade, como o Aparelha Luzia, da Erica Malunguinho, ou no Capão Redondo, com a Casa de Cultura Herdeiras de Aqualtun, fundada por Amanda Negrasim.

Nossa resistência continua nas escolas de samba, na garra de uma porta-bandeira, como Laís Moreira, ou de uma baiana, como dona Joana. Ela está no movimento comunitário, com a luta de Maria Cícera; está na música de Bernardete e nas coreografias de Rita Mesquita, que celebram nossa África ancestral. Nossa luta é repleta de exemplos de gente que insiste e resiste, como as guerreiras Marilândia Frazão, Magali Mendes e Edna Andrade. Ela também conta com a solidariedade de aliadas importantes, como a promotora Fabiana Dal'Mas.

Para finalizar, quero dizer que, para mim, é uma grande honra celebrar a história de vida de uma mulher como dona Geni Teixeira, que ajudou a criar um movimento tão lindo dentro da igreja: a Pastoral Afro. E a memória da grande ialorixá, mãe Manaundê. Que esta medalha continue sendo uma inspiração ainda maior para que continuemos na luta, mostrando que somos possíveis, e que, mesmo tentando nos calar de todas as formas, nós resistimos. Muito obrigada.

Comunicamos aos presentes que esta sessão solene está sendo transmitida ao vivo pela TV Web e será retransmitida pela TV Assembleia no próximo domingo, dia 25 de março, às 20 horas pela NET - canal 7; pela TV Aberta - canal 61.2; e pela Vivo - canal 9. Também pelo Facebook, em nossa página.

Com a palavra, Dra. Mayra Belmonte Lanza, coordenadora de Políticas para Promoção da Igualdade Racial, representando a secretária Eloísa Arruda, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.

 

A SRA. MAYRA BELMONTE LANZA - Bom dia a todos e a todas. Conforme foi dito, é uma data muito emocionante, que representa muita história. Não devemos nos calar. Nestes momentos, temos sempre que não nos silenciar e aproveitar para mostrar para o que viemos. Esta Casa nos deixa bem emocionadas com esta homenagem e com essa medalha. Muito obrigada a todos. Bom dia.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Com a palavra, Renata Rosa, representante da direção do Diretório Estadual do PCdoB.

 

A SRA. RENATA ROSA - Bom dia. Queria começar parabenizando a Leci pela construção desta atividade aqui hoje. Não é à toa que o gabinete da Leci é conhecido aqui como quilombo, o seu mandato é, de fato, um mandato de resistência e compromisso com a população do estado de São Paulo.

Acho que esta medalha é uma das muitas coisas que confirmam isto, Leci. Homenagear, nesta Casa, a primeira deputada negra do estado, e em nome dela homenagear mulheres lutadoras que dedicam suas vidas em prol do bem coletivo, é um ato de resistência e afirmação. Ocupar estas cadeiras com estas mulheres é dar para esta Casa a sua verdadeira vocação, que é de ser a Casa do Povo.

Eu acho que este ano, em especial, ganha ainda mais força esta medalha, com o que aconteceu recentemente com uma de nós, a Marielle. Vivemos tempos muito difíceis para aqueles que sonham com a construção de uma sociedade mais justa. O nosso povo tem sofrido duras penas nesta batalha de ódio, ganância, intolerância, violência e desigualdade. Mas a homenagem a estas lutadoras aqui hoje é uma demonstração de que nenhuma de nós está sozinha, que lutar vale a pena. É uma convocação também, Leci, para que esta nossa luta nunca cesse. Parabéns a todas as homenageadas e à Leci, por sua história de luta e por ser uma das melhores representantes do povo nesta Casa. É um orgulho imenso para mim ser representada por você aqui na Alesp.

Que a força dos nossos ancestrais se una com a força coletiva representada por cada uma de nós aqui hoje. Que possamos, com isto, conquistar felicidade, justiça e vida digna para nosso povo. Sigamos de mãos dadas.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Com a palavra, Dra. Mariana Delchiaro, defensora pública representando a Defensoria Pública-Geral do Estado de São Paulo.

 

A SRA MARIANA DELCHIARO - Bom dia a todas e a todos. Nesta brevíssima saudação, gostaria de cumprimentar a deputada Leci Brandão, que idealizou esta justa homenagem e que também preside esta sessão solene na data de hoje. Em sua pessoa, cumprimento também a todas as autoridades e pessoas, sobretudo todas as homenageadas presentes, dando já os meus parabéns. Saúdo a todas e a todos, trazendo uma mensagem da Dra. Juliana Belochi, que atualmente responde pela Defensoria Pública-Geral.

A cerimônia de hoje nos orgulha por levar o nome da primeira vereadora negra da Câmara Municipal do Estado de São Paulo e da primeira deputada negra da Assembleia Legislativa, Theodosina Rosário Ribeiro, cuja história de vida é um exemplo para todas as mulheres na política.

Neste ato, não há como não recordar de outra mulher militante e negra digna de homenagem nesta data: a vereadora Marielle Franco. Sua trajetória brutalmente interrompida nos mostra a importância da incessante luta em prol dos direitos da mulher e da população vulnerável. É uma honra para a Defensoria Pública comparecer e prestigiar esta tão importante homenagem a mulheres e entidades que se destacaram na sociedade, em razão de sua contribuição ao enfrentamento da discriminação racial e na defesa e promoção dos direitos das mulheres.

Estes objetivos são compartilhados pela Defensoria Pública, que possui a missão de lutar pelos direitos das pessoas carentes que sofrem das mais diversas formas de desigualdade e opressão. Por isto, parabenizo mais uma vez pela iniciativa, e agradeço a todos pela oportunidade de estar presente. Obrigada.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Com a palavra, Exma. Sra. Dra. Elisa Lucas, presidente da Coordenadoria Estadual de Políticas para a População Negra e Indígena.

 

A SRA. ELISA LUCAS - Bom dia a todos e todas. Quero cumprimentar a deputada Leci Brandão por esta iniciativa muito feliz e importante, que é a Medalha Theodosina Rosário Ribeiro.

Cumprimento a Mayra, da coordenação municipal, esta jovem aqui do lado. Como é bom vermos que a juventude e principalmente as mulheres negras sabem da missão que elas têm, e estão no caminho correto, quando vemos uma fala tão concisa e moderna, porque está ali no celular. Eu não dou conta de fazer assim.

Quero cumprimentar também os religiosos e religiosas das diferentes matrizes aqui presentes. Saúdo a todos, principalmente as homenageadas. Cada uma de vocês tem uma história forte e bonita de desapego, sem ambição, mas em prol do ser humano. Acho que isto é uma coisa que está faltando, muitas vezes.

Ontem estava na Fundação Casa, à tarde, fui falar com os professores e monitores, e o tema que me deram foi “Os 130 anos da Abolição”. O que mudou? Claro que temos muitas mazelas, um caminho longo a percorrer, mas quando vemos as cotas nas universidades federais e paulistas, coisa que pensei se estaria viva para ver acontecer, entrando em vigor; as cotas nos serviços públicos; a Escola da Família, um programa do Governo do Estado de São Paulo que dá bolsa de até 100% para os estudantes, que, em contrapartida, vão trabalhar nas escolas...

É claro que ficamos muito tristes quando vemos acontecimentos não só no Rio de Janeiro, onde parece que a coisa está bem pior do que em qualquer outro lugar do País, mas com nossas ações afirmativas, com as iniciativas que não têm apoio... Eu não vou deixar de citar que, em um dos momentos em que estávamos muito preocupadas, pensando que rumo tomar, numa época de crise e difícil, a deputada Leci esteve em nossa coordenação, e foi uma conversa muito prazerosa e de forte apoio. Aí entendemos o porquê da missão de cada um.

Então, sempre repito: 130 anos de abolição, o que mudou? Mudou muita coisa. Mudou quando vemos a presença das mulheres nas universidades, principalmente da juventude. Mudou quando paramos para pensar que existem pessoas resistentes que, às vezes, pagam com a própria vida, como foi o caso da Marielle, que é um exemplo. Eu tenho sido muito atacada no Facebook por conta de prestar homenagem a ela. As pessoas às vezes não mostram a cara ao público, mas vêm no inbox dizer: “O que você está pretendendo com isto? Você também é dos direitos humanos? Direitos humanos de quem? Vai dar florzinha para bandido também?”

Então, é em nome de todas estas falas e experiência que estou aqui no estado de São Paulo exclusivamente para tratar de ações afirmativas há 15 anos. É um bom tempo, já mereço uma aposentadoria. Mas sabemos que a missão é forte. Quando vejo um auditório desses, com tantas pessoas comprometidas numa sexta-feira de manhã, deputada, é sinal que não foi em vão a luta dos nossos antepassados, o pouco que temos contribuído, e a luta que está por vir.

Muito obrigada e parabéns pela iniciativa. Que possamos ver muitas vezes esta premiação da medalha para tantas outras pessoas.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Neste momento, a Dra. Cláudia Luna lerá o texto que Dra. Theodosina nos enviou. Ela está hospitalizada, queria vir, mas a família achou melhor que ela ficasse lá quietinha se recuperando. Que ela se reestabeleça rapidamente. Dra. Cláudia, muito obrigada.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Peço permissão para fazer a leitura das carinhosas palavras da Dra. Theodosina Ribeiro, encaminhadas para a sessão solene de hoje.

Exma. Deputada Estadual Leci Brandão, Srs. Deputados, componentes da Mesa, senhoras, senhores e jovens presentes, bom dia. Quero parabenizar V. Exa., mais uma vez, pela visibilidade em homenagear mulheres guerreiras de várias etnias, que, ao longo dos anos, têm se destacado junto à nossa sociedade, e alcançaram várias funções de relevância na sociedade brasileira. A partir, mais uma vez, da sensibilidade de V. Exa., esta Casa de Leis recebe novamente mulheres para receberem a Medalha Theodosina Ribeiro, que foi instituída e aprovada pela Mesa administrativa, com sua anuência, comemorada todo ano no mês de março.

Deputada Leci Brandão, sua atividade política tem sido observada por sua integridade não só na defesa da mulher brasileira, mas de todos aqueles que se sentem injustiçados.

Para finalizar, agradeço a Deus por ter sido a primeira vereadora negra do município de São Paulo, e primeira deputada estadual negra no estado de São Paulo, exercendo três mandatos nesta Casa de Leis. Parabéns às homenageadas, e que Deus abençoe a todos os presentes e vossas famílias.

Theodosina Rosário Ribeiro”.

 

Menciono também que o Conselho da Comunidade Negra de Piracicaba - Conepir - distribuiu a vocês esta singela homenagem dedicada à deputada Theodosina Ribeiro, que conta sua história. Vocês já devem ter recebido.

Anuncio também algumas presenças na sessão solene de hoje: Dra. Laila Shukair, promotora de Justiça, representando o Movimento do Ministério Público Democrático; ex-deputada estadual Ana Martins, que exerceu seu mandato nesta Casa no período de 2003 a 2007; a Escola de Samba Tom Maior; Juninho, presidente estadual do PSOL e militante do Círculo Palmarino; as queridas promotoras legais populares; os integrantes do Sindicato dos Condutores e Condutoras do Transporte Público; a Pastoral Afro; Ana Maria Isidoro, representando a Coordenação de Políticas para Mulheres; o Projeto Cisne do Amanhã, representado por Valdecine; Dr. Sinvaldo Firmo, do Instituto do Negro Padre Batista; a União Brasileira de Mulheres - UBM; a Afro Raízes; a União Jovem Socialista; a União Estadual de Estudantes; a Sra. Noêmia da Silva, embaixatriz da Escola de Samba Nenê de Vila Matilde; Estelita Márcia, presidente do Império das Baluartes do Samba do Estado de São Paulo; Apeoesp, dos bravos professores do estado e município de São Paulo; e Fundação Casa.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Neste momento, queremos homenagear mulheres que se destacaram na sociedade, em razão de suas contribuições, no enfrentamento da discriminação racial e na defesa dos direitos das mulheres no estado de São Paulo.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Chamamos para receber a homenagem das mãos da deputada Leci Brandão nossa primeira homenageada. Agora peço licença para falar um pouco dela. Ultrapassada a fase protocolar, vocês terão a honra de conhecer estas maravilhosas mulheres que compõem o time dos sonhos de mulheres valorosas que fazem uma grandiosa diferença na sociedade. Vou falar agora da nossa primeira homenageada.

É professora, pedagoga, psicopedagoga e especialista em Educação para Relações Étnico-raciais; pós-graduada em Educação e ativista do movimento negro. Atua na Secretaria Municipal do Combate ao Racismo, do Partido dos Trabalhadores. Estou falando de Marilândia Frazão, do Conen - Coordenação Nacional das Entidades Negras. Chamamos para receber a homenagem das mãos da deputada Leci Brandão.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. MARILÂNDIA FRAZÃO DE ESPINOSA - Bom dia a todas e a todos. Também estou emocionada. Acho que, em nossas vidas de mulheres negras, temos um ditado, uma paródia, algo que nos une. Nossos passos vêm de longe, uma sobe e puxa a outra. Receber esta medalha, que representa a história de uma mulher que todas nós nos espelhamos, que abriu o horizonte de tantas outras mulheres que aqui estão, é uma honra. E a recebo desta outra mulher que admiro, que me representa, e que tem uma luta incansável pelos direitos da população negra: a deputada Leci Brandão, que tem meu eterno agradecimento.

Acho que qualquer  um de nós seria merecedor de estar aqui, mas o ser humano tem algo que, às vezes, tem que acreditar que merece. E se ele merece, ele trabalhou. Então é agradecer pelo trabalho que executou, e pelo reconhecimento deste trabalho. Este agradecimento vai ser eterno. Agora, queria fazer outros agradecimentos também, porque não estamos . Não mexam comigo, porque não ando só. Queria agradecer a Deus, primeiramente, à minha família que está aqui, minha filha e netas, à família da minha ancestralidade que está aqui também, axé.

Enfim, agradecimento e gratidão eternos. Agradeço a presença desta plenária linda, como disse nossa MC, em uma sexta-feira de manhã. Quem está aqui é porque realmente acredita nesta Casa e nesta política desenvolvida por esta brilhante deputada, que merece todo o nosso respeito e admiração. E merece mais mandatos e medalhas que mais mulheres receberão.

Muito obrigada.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Esta foi a primeira. Vamos continuar agora, porque nossa segunda homenageada fundou o Grupo Cultura de Dança Afro II, em 1988. Em 90, criou a ONG Afro II, que tem como objetivo o resgate da cultura afro-brasileira; e, desde 2000, vem trabalhando na integração social de ex-presidiários negros e afrodescendentes. Ministra oficinas de dança afro e já desenvolveu trabalhos coreográficos para o carnaval nas escolas de samba Leandro de Itaquera, Rosas de Ouro, Tom Maior, Vai-Vai, Tatuapé e Unidos do Peruche. Estou falando de Rita Mesquita, que receberá da deputada Leci Brandão a Medalha Theodosina Ribeiro.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. RITA DE CÁSSIA SILVA MESQUITA - Bom dia a todos e a todas. Não esperava ser a segunda, estava preparando meu discurso. Mas é uma honra e prazer enorme estar aqui hoje. Nunca poderia imaginar que um dia receberia esta medalha, que representa, como dizem nossas companheiras, o resgate da cultura afro-brasileira. Primeiramente, quero agradecer a Deus, minha família e à grande amiga e deputada Leci Brandão, a qual me acompanhou nestes anos todos nos trabalhos que venho desenvolvendo; e aos grandes amigos que aqui estão presentes, não vou citar nomes para não me prejudicar.

Quero também deixar registrado que, em todos estes 30 anos de cultura que vim desenvolvendo no Grupo Afro na Zona Leste, há duas pessoas em especial que eu gostaria de ressaltar em memória: o José Galvão Mesquita, o Bola; e a grande amiga que me deu um prazer enorme, e hoje completa 30 anos de luta do desfile afro-brasileiro, que aconteceu em 1988 na fundação do meu grupo, que é a Teresa Santos.

Muito obrigada. Axé.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Agora vamos dar continuidade. Todo mundo com o coração batendo mais forte, é muita emoção, não é verdade? Pois vocês ainda não viram nada. Vamos lá. Nossa terceira homenageada desta manhã é uma mulher de grande luta, que faz uma grande diferença no campo das guerras travadas na Justiça. Ela é mestre em Direitos Humanos e Justiça Social pela Universidade de New South Wales, em Sidney, na Austrália, e pós-graduada em Ciências Jurídicas pela Universidade de Buenos Aires, na Argentina.

É promotora de Justiça, tendo publicado diversos artigos sobre assédio sexual, violência obstétrica e Lei Maria da Penha. Ela proferiu palestras em diversas localidades do Brasil e do exterior, sobre temas relacionados aos direitos humanos das mulheres, violência contra as mulheres e participação política das mulheres. Vencedora na categoria Ministério Público do Prêmio Innovare - Premiando boas práticas de 2014, é membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, e atua de maneira intensa e combativa na Promotoria de Justiça de Combate à Violência Doméstica, contra toda forma de violência contra as mulheres. Estou falando da Dra. Fabiana Dal’Mas Rocha Paes.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. FABIANA DAL’MAS ROCHA PAES - Gente, estou nervosa. Exma. Deputada Leci Brandão, é uma honra estar aqui com vocês nesta manhã. Queria muito agradecer por esta oportunidade. Sinto-me hoje voltando às origens do trabalho que venho desenvolvendo com direitos humanos. Há muitos anos, meu marido e eu nos casamos em um movimento de moradia, poucas pessoas sabem desta história, e nós temos uma ligação muito forte com o movimento de mulheres. Como promotora de Justiça, os desafios não são fáceis, o dia a dia não é fácil.

Ainda me sinto muito sensibilizada com o acontecimento no Rio de Janeiro. Conheci Marielle Franco no Rio, em um trabalho com direitos reprodutivos. Marielle era uma moça linda, inteligente e guerreira. Estas forças não querem calar apenas Marielle, mas sim o que ela representa, uma mulher negra, periférica e de luta. Estou muito lisonjeada e agradecida por esta homenagem, mas também temos que nos indignar e dar uma resposta muito séria para esta questão. O Brasil é um dos países que mais mata defensores de direitos humanos. Segundo a Anistia Internacional, só no ano passado, 58 pessoas morreram defendendo os direitos humanos. Isto não está certo, é indigno.

Fiquei me perguntando, quando recebi este convite da Dra. Cláudia Luna, para recebimento desta medalha, por que eu teria sido escolhida. E claro que, quando trabalhamos, não podemos deixar de saber que temos ao nosso lado pessoas queridas, como minha família, meu marido, meus filhos, pais, sogros, meus queridos companheiros de associação que estão aqui, Laila Shukair e Gabriel Bittencourt, que também estão na luta no Ministério Público, etc. Mas, no que diz respeito às mulheres, como nada é por acaso, me perguntei por que estou aqui hoje, por que teria sido escolhida para esta medalha. Acredito que as mulheres devam incluir, no centro das agendas de suas instituições, as políticas públicas para mulheres, porque acredito que seja certo que as mulheres devam sim participar das decisões políticas que impactam suas vidas e seus corpos. Acredito, sim, que as mulheres devam ter pleno acesso à informação sobre todos os tratamentos médicos que receberão, porque acredito que seja certo que as mulheres tomem decisões sobre seus próprios corpos. Porque acredito que todos os defensores de direitos humanos devam ser protegidos. O que nós queremos? Nenhuma mulher vítima de violência e sem direito à informação. Nenhuma mulher sem direito à autonomia. Nenhuma mulher sem direito à vida. Nenhuma morte evitável em nosso País. Senhores e senhoras, soltem suas vozes. Não vão nos calar jamais. Obrigada.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Continuando, tem mais emoção pela frente. Nossa próxima homenageada, será que vocês conhecem? Eu conheço. É daquelas pessoas que sempre acreditaram que ninguém está à toa neste grande cenário que é a vida. Ela é paulistana, filha de dona Edimeia e seu Alcides. Aprendeu com eles a treinar nos bons propósitos da vida. Um triste acidente, que tirou a vida da mais nova de suas três filhas e de sua mãe, mudou definitivamente sua trajetória.

Filha de Xangô Aganjú, ela renasceu quando encontrou a Escola de Samba Vai-Vai, onde desenvolveu a dança e elegância que a acompanha a cada gira de uma baiana. Logo depois, passou a ser chefe da ala, posto que ocupa na escola até hoje. Vou chamar a nossa guerreira e quarta homenageada, a Sra. Joana Aparecida Barros, baiana da Escola de Samba Vai-Vai.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. JOANA APARECIDA BARROS - Bom dia a todos. Queria agradecer por esta medalha, que não esperava. Para mim, é uma honra muito grande. Agradeço à dona Theodosina e à minha querida Leci Brandão. E quero agradecer à minha família, meus irmãos que estão aqui, e minha ala de baianas, porque sem elas não sou nada, e meu casal de mestre-sala e porta-bandeira. Muito obrigada mesmo.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Vamos lá, a emoção só vai crescendo. Agora, vamos falar da nossa quinta homenageada. Ela é moradora da ocupação do Complexo OMG - Oziel, Monte Cristo e Gleba B em Campinas, São Paulo. É feminista, negra, militante do Feconezu - Festival Comunitário Negro Zumbi.

É promotora legal popular e coordenadora de formação da Associação de Promotoras Legais Populares Cidade da Terra, de Campinas. Já vou abreviar o currículo e chamar a Magali Mendes, desde 2000 no Candomblé Da Nação Ketu, no Ilê Axé Oyá Dodê no Parque das Bandeiras, em São Vicente, São Paulo. Vem receber a homenagem Magali, é toda sua.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. MAGALI MENDES - Não vou chorar não, gente. Não é momento de chorar, mas de lutar. Queria pedir a benção às minhas mães velhas, meus pais velhos, e dizer que somos de uma religião que vem sendo muito sacrificada. Nós acreditamos na ancestralidade, e ela que nos coloca aqui de pé. Queria agradecer à Leci, e dizer que este prêmio não é meu, mas de nós mulheres que estamos todos os dias na batalha.

 Queria oferecê-lo à mãe de Marielle, e também às Mães de Maio e de Acari, às mães que perdem todos os dias seus filhos. Infelizmente, hoje ou amanhã, pode ser qualquer uma de nós, mulheres negras, pobres, de periferia.

Eu queria dizer que tudo termina em nós. Nós damos a vida, mas sofremos neste momento. Tudo termina em nós. Mas nós temos as iabás, que seguram as nossas vidas. E eu queria terminar este momento rezando. Queria pedir para que meus pais, mães, irmãs me ajudassem. Axé.

 

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- É feita uma oração.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - A nossa sexta homenageada é poetisa e gestora cultural com ampla experiência nas áreas dos livros e da literatura. É idealizadora e artista no Coletivo Sarau das Pretas, um sarau literário protagonizado por mulheres negras, que atua junto aos coletivos Quilombos de Literatura e Associação Cultural Literatura no Brasil, onde desenvolve saraus e projetos de incentivo à leitura e escrita.

Ela ministra palestras sobre literatura, políticas culturais, questões de gênero e cultura afro-brasileira, além de desenvolver projetos culturais que agregam a literatura, artes cênicas e música.

É autora do livro “Coroações Aurora De Poemas”, e também publicou seus textos em diversas antologias voltadas à literatura negra, feminina e periférica. É formada em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista. Chamamos agora Débora Garcia, de quem sou fã, para receber o prêmio de hoje.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. DÉBORA GARCIA - Bom dia a todos e a todas. Estou muito emocionada, porque hoje completo 35 anos de idade, contrariando as estatísticas. Para mim está sendo um grande presente e honra estar aqui hoje. Quero agradecer a deputada Theodosina Ribeiro. Fiquei pensando muito na sua história, que desconhecia. Este é o papel desta premiação: fazer com que conheçamos a história destas mulheres guerreiras que abriram caminho para que pudéssemos estar aqui hoje.

Esta foi uma mulher que, na década de 70, ousou se envolver com política. Agradeço a ela e a todas as mulheres que hoje ousam enfrentar este meio masculino e racista que é a política, dando sua cara à tapa, e, muitas vezes, sua própria vida, como aconteceu recentemente com a Marielle.

Também estou completando dez anos de caminhada na literatura. É com muita felicidade que digo que a literatura mudou a minha vida, graças às mulheres que ousaram escrever sua própria história. Hoje, posso escrever minha história também. Sou uma mulher empoderada, que usa sua própria literatura e experiência de vida para empoderar outras mulheres, para que possamos continuar transformando nossa realidade. Estou extremamente honrada e feliz.

Não somos muito habituados a receber homenagens, ficamos constrangidos, porque nossa batalha é muito árdua e difícil, então é bom se permitir receber um presente e carinho. É uma data que vou levar para sempre no meu coração. Como sou da literatura, quero deixar um poema para todas as mulheres negras. Escrevi este poema quando consegui me olhar no espelho e gostar desta pessoa que sou hoje.

“Sou negra! Negra da cor da noite. Negra como carvão. Negra sim! E não venha me dizer que isso é ruim. Porque, eu digo, é muito bom. Não é fácil. Mas o que é fácil nessa vida de cão? Sou negra. E a esperança em mim reluz como estrelas no breu. Como a lua e o sol imperam no céu. A luta em mim resiste como um diamante que não se quebra. Meu sangue é preto e vermelho pelo luto que guardo pelos meus ancestrais abatidos covardemente. O banzo às vezes me persegue. Mas resisto bravamente. Não vou ser derrotada novamente. Por isso, digo com alegria: Sou negra! Negra rainha. Negra mulher. Negra com orgulho. Sou negra nesta e serei, em todas as vidas!

Axé.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - A nossa próxima homenageada nasceu em Ribeirão Preto. É carinhosamente chamada pelo seu nome. Ela é tia de várias pessoas, e depois digo quem é esta tia maravilhosa. Foi a primeira pessoa que o padre Toninho convidou para participar de uma nova pastoral que iria iniciar. Os outros membros foi ela quem trouxe, chamando e conversando até formar um grupo interessado e comprometido.

Foi desta forma que, em 1988, foi criada a Pastoral Afro da Achiropita. Ao longo destes 30 anos, a pastoral tem desenvolvido e cumprido sua missão por meio de celebrações religiosas e atividades culturais diversas, resgatando as raízes e dignidade do povo brasileiro, e valorizando sua cultura.

A tia Geni Teixeira Francisco nos motiva a ter orgulho do nosso passado, viver a alegria do presente e esperança no futuro. A tia Geni Teixeira Francisco, da Pastoral Afro, é a nossa sétima homenageada, que receberá flores das mãos de Renata Rosa, e a medalha das mãos da deputada Leci Brandão.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. JENNY TEIXEIRA FRANCISCO - Só tenho que agradecer a vocês todos.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Nós é que agradecemos a senhora, por sua sabedoria, por tudo.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - E as homenagens continuam. Uma integrante do movimento feminista diz que não são homenagens, mas feminagens, porque são dedicadas às mulheres. É o feminino sendo feminageado no dia de hoje. Então, vamos continuar com nossas feminagens. Nossa próxima mulher maravilhosa deste time de mulheres que faz uma grande sociedade é nascida em Diadema, em São Paulo, é casada e mãe de duas filhas.

É formada em contabilidade e pós-graduada em gestão de negócios. É bailarina e empresária. É de uma linhagem de porta-bandeiras do carnaval. O talento para a dança ela herdou da avó Maria e da mãe Dora. Iniciou sua história no carnaval aos 15 anos de idade, tendo passado pelas escolas do Colorado do Brás e Unidos de São Lucas. Em 2002, passou a compor o quadro de casais da Águia de Ouro, onde fez um laboratório com o grande casal Selminha Sorriso e Claudinho, da Escola de Samba Beija-Flor.

Em 2003, passou a conduzir o pavilhão da Águia de Ouro como primeira porta-bandeira, posto em que permaneceu até 2011. Em 2012, conduziu o pavilhão da Império da Casa Verde; em 2014, o da X9 Paulistana; e em 2015, desfilou na Marquês de Sapucaí defendendo o pavilhão da Unidos de Bangu. Em 2016, Laís assumiu o pavilhão da Unidos de Vila Maria, onde, de maneira guerreira e grandiosa permanece até então.

Laís Moreira, venha receber a feminagem, representada pela Medalha Theodosina Rosário Ribeiro.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. LAÍS MOREIRA - Depois de tantas mulheres com dizeres poéticos, emocionados, estou eu aqui. Não imaginei representar nosso grupo de mestres-salas e porta-bandeiras em uma Casa tão importante como a Assembleia. É com muito orgulho que agradeço a você, madrinha, deputada Leci Brandão, por me escolher como representante do nosso quesito. Fiz um texto, porque estou um pouco nervosa, e acho que é até normal.

Agradeço por terem aceitado a indicação da deputada Leci Brandão para tal honraria. Agradeço ao Pai Maior pela oportunidade de estar aqui hoje, e poder falar para vocês, tamanha a felicidade;  à minha família, que me deu condições de estar aqui hoje, pois, sem eles, nada disto seria possível; e à minha escola de samba, que acredita no meu trabalho, Unidos de Vila Maria, representada pelo meu diretor Gil. Muito obrigada pela confiança.

E, mesmo com a saia caindo, hoje estou aqui firme e forte para dizer que a vida continua, com muito sorriso, e a luta muito mais.Ser condecorada com uma medalha que homenageia ativistas de direitos humanos, poetisas, cientistas, é de muita felicidade, porque representa muito para nós mulheres negras, tal honraria, pois, sem ela, nós hoje não estaríamos aqui tendo condições de falar sobre o tamanho da nossa força, o quanto nós representamos para esta sociedade.

Podemos sim fazer a diferença todos os dias, como todos vocês estão fazendo, lutando por nossa raça e pelo nosso empoderamento, pela nossa palavra. Então, com isto, agradeço a todos vocês pela oportunidade. Mais uma vez, muito obrigada. E o samba não pode morrer.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Agora, nossa nona homenageada vai receber a medalha em memória de Julita Lima da Silva, que nasceu na Bahia, em 26 de fevereiro de 1926, e faleceu na cidade de São Paulo, no dia 23 de agosto de 2004. Foi dirigente do território tradicional de matriz africana bantu, terreiro de candomblé Santa Bárbara, situado no bairro da Vila Brasilândia, na zona norte da Capital paulista, que teve seu processo de urbanização nos anos 70, exatamente no momento em que uma grande leva de migrantes se dirigiu para São Paulo.

No caso da Brasilândia, os migrantes, em sua maioria, vieram de Minas Gerais, e, em grande parte, afrodescendentes.

Esta sacerdotisa, filha de santo da Nanã de Aracaju, fixou-se em São Paulo a partir de 1958 e abriu seu terreiro em 1963. Atualmente, o terreiro de candomblé Santa Bárbara é dirigido por Mãe Pulchéria. Vamos homenagear Mãe Manaundê em memória, e quem irá representa-la é a Mãe Pulchéria, que também peço licença para ler um pouquinho de sua história. Mãe Pulquéria, Maria Pulqueria Albuquerque Lima, nasceu em Aracaju, cidade em que Mãe Manaundê se iniciou na tradição do candomblé. Ela fez parte do processo de fundação do terreiro, sendo sua atual dirigente. Mãe Pulquéria é voz ativa nas formulações de políticas públicas voltadas para os povos de terreiro, reivindicando a laicidade do Estado e denunciando o racismo que permeia as estruturas nacionais em relação às tradições afro-brasileiras.

Que venha a Mãe Pulquéria receber, em memória da Mãe Manaundê, a Medalha Theodosina Rosário Ribeiro.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. MARIA PULQUERIA ALBUQUERQUE LIMA - Fogem-me as palavras, mas obrigada Leci Brandão e dona Theodosina. Gostaria de dizer para todos vocês que estou em uma luta constante. Minha mãe Manaundê faleceu e continuo com seu terreiro na Vila Brasilândia, como ela citou. E está sendo uma luta, mas vou continuar. Obrigada. Nossa casa na Vila Brasilândia é a sua casa, doutora. É isto. Obrigada a todos vocês.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Citando as palavras da poetisa afro-americana Maya Angelou: “Não importam as iniquidades, não importam as injustiças, ainda assim eu me levanto”. E assim levantam, contra as injustiças, contra o racismo, contra as desigualdades, cada uma das mulheres homenageadas hoje pela Medalha Theodosina Ribeiro.

Para continuar, quero falar também agora de uma mulher que também tem seu nome como resistência. Através da música, dos seus protestos, esta mulher negra e periférica utiliza o rap como sua principal ferramenta de diálogo e reconstrução social.

Ela participa e contribui com a cultura hip hop há quase 20 anos. Em agosto de 2017, realizou sua primeira turnê internacional percorrendo as cidades de Benguela e Luanda, em Angola, onde produziu seu single “Conquista”. Artista plural, que transita entre o samba, maracatu, MPB e o rap, conectando diversas sonoridades e estéticas musicais. Em suas rimas, aborda temáticas da vida periférica, bem como estéticas e conceitos das religiões de matrizes africanas e afro-brasileiras. Protagonista da cena cultural de São Paulo, ela está presente nos principais eventos da cidade, como a Virada Cultural, Circuito Municipal de Cultura e Divas do Hip Hop.

Amanda também atua como coordenadora, gestora e produtora cultural de diversos projetos e coletivos, com ênfase nas ações e lutas da mulher negra, principalmente a Casa de Cultura Herdeiras de Aqualtune, no Grajaú, zona sul da Capital. Venha, Amanda Cristina Silva dos Santos, Amanda Negrasim.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. AMANDA CRISTINA SILVA DOS SANTOS - Axé, gente. Primeiramente, agradeço a Deus e meus orixás de cabeça, minha mãe Oxum e meu pai Oxumaré por estar aqui em pé, porque ser uma mulher negra dentro de uma periferia, para podermos salvar outras vidas, não é fácil. Agora estou fazendo quase 20 anos de carreira no movimento hip hop, canto rap, e agradeço de coração à minha mãe que está no céu, Lucila Fátima, que me fez e me ensinou toda minha ancestralidade; à Congada de São Benedito, de Cotia, que é minha família e meu ancestral; e à deputada Leci Brandão, de todo o coração e de toda a alma, saiba que amo a senhora de muito tempo.

Todos os dias temos que lutar e gritar. Todos os dias temos que tremer. Todos os dias temos que falar que a arte salva uma, duas, três, quatro, cinco vidas, como a arte me salvou. Aos sete anos de idade, eu sofri um estupro, e com esta idade eu tinha medo de tudo. Tinha medo de seguir a vida, de salvar outras vidas. E encontrei o movimento hip hop como minha fala e luta, para poder me expressar. Hoje, vou dar uma palinha para vocês, e cantar um pouco do meu rap, para vocês entenderem um pouco da minha ancestralidade.

 

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- É realizada apresentação musical.

 

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A SRA. AMANDA CRISTINA SILVA DOS SANTOS - Muito axé a todos. Muito axé a todas as mulheres negras. Marielle presente. Muito axé à minha mãe Lucila Fátima, presente também. E todos os meus ancestrais que me representam. Muito axé.

 

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Muita emoção. Como diria Audre Lorde: “Jamais serei livre enquanto outras mulheres permanecerem prisioneiras, ainda que suas correntes sejam diferentes das minhas”. A nossa próxima feminageada é de Pernambuco. Filha parida por Abigail e neta de José Antônio, veio de Pernambuco e mudou para São Paulo aos 19 anos. Negra, mulher, transexual e nordestina, o nome Malunguinho faz referência ao culto da Jurema Sagrada, e ao termo utilizado por povos africanos da família bantu, que significa camarada e companheiro. Era como os escravizados se referiam a alguém que, como eles, atravessou o mar e conseguiu renascer do outro lado.

Ativista, educadora e artista, é mestre em Estética e História da Arte. Trabalhou na educação por muitos anos, atuando na formação de professores com temas ligados à arte, cultura e política. Produziu também trabalhos de fotografia, performance escrita e desenhos. Idealizadora e gestora, cria o Aparelha Luzia em 2016, quilombo urbano de arte, cultura e política, aqui em São Paulo. Estamos falando da magnífica Érica Malunguinho.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. ÉRICA MALUNGUINHO - Bom dia para quem é de bom dia. Primeiramente, quero agradecer à Abigail, minha mãe que me pariu. Quero agradecer a Leci, que se morasse em minha vida durante toda minha vida, Abigail te ouvia, te cantava. Tu acalentasse nossa vida enquanto o genitor fugiu. Obrigada, irmã. Não estamos aqui sozinhas, nossos passos vêm de muito longe, muito antes da primeira diáspora. Nossos passos vêm de Áfricas. Os pretos de lá e os que já estavam cá nas Américas. Nossos passos vêm de muito longe, vêm dos navios negreiros também, das senzalas, do Quilombo dos Palmares, nosso único real e verdadeiro governo.

Nossos passos vêm de longe, vêm das mulheres negras, amas de leite, que nos fizeram assim existentes como somos. Mas o riachão já diria: “Esse negócio da mãe preta ser leiteira, não somos mamadeiras, vai mamar em outro lugar.” Nossos passos vêm de longe, vêm dos maracatus, maculelês, do semba ao samba. Nossos passos vêm de longe, vêm do emprego doméstico também, da luta pelas cotas, do movimento negro unificado, do teatro experimental do negro. Vêm da revolução haitiana, a maior revolução preta existente, vêm dos maleis, vêm da construção civil, vêm da moradia de rua, do cárcere, dos manicômios e do crack. Nossos passos vêm de muito longe.

Estes passos estão sendo trilhados desde sempre, e não há como voltar. Somos a força matriz e motriz, a raiz e agora diretriz. Somos esta força. Somos a força de Theodosina Ribeiro, que ocupou um lugar historicamente negado a nós, como todos os lugares desta construção ocidental branca e eurocêntrica. E quando falo de branquitude, não falo de um indivíduo branco, mas de um sistema branco. Mas aí tem uma questão: o sistema produz o indivíduo e tem indivíduo que produz o sistema. É isto que é a branquitude, e este território que habitamos agora, originado nesta pauliceia por Theodosina, mas que também é ocupado por tantas outras de nós - Benedita, Leci, Marielle, agora é nosso. Tem que ser e há de ser nosso.

A política institucional é um território de disputa importante dentro deste modelo de sociedade em que vivemos. Tem que ser o caminho. Ainda que está assim o caminho, é importante que ocupemos com nossa presença e corporeidade preta, com a existência ancestral preta. É fundamental, necessário e urgente. Enquanto não entendermos, não nos sensibilizarmos que o que constrói este modelo de sociedade - e todos os territórios que receberam a diáspora - é o racismo, não vamos avançar. Foi o racismo, a diferenciação entre pessoas pretas e brancas, que deram origem a este território. Foi pela diferenciação de pessoas pretas e brancas que o continente africano foi invadido, que as Américas foram invadidas.

Se não entendermos que é isto que fundamenta estes territórios, não avançamos. Racismo. Raça não é recorte, é fundamento. Não adianta falarmos que o problema está na Educação, na Saúde e na Habitação. Isto não funciona porque atende gente preta, logo, empobrecida. Raça é fundamento, não é recorte. É disto que estamos falando. E para modificar isto, precisamos de um processo muito simples, porque esta branquitude que construiu esta separação e desorganização entre raças está há milênios no poder, decidindo o que eu e você vamos fazer. Esta branquitude que só nos deixou como exemplo, como memória e legado a dor, a violência, a morte.

Esta branquitude nos deixou isto, que sabemos muito bem, é golpe sim. E não é este golpe de agora, são golpes constantes e sistemáticos que acontecem no decorrer desta historicidade. É por isso, por um princípio muito básico da democracia que todos clamam, que precisamos de uma alternância de poder. O novo marco civilizatório precisa acontecer, e tem que acontecer de mãos, mentes e corpos pretos. Precisamos recomeçar, porque nosso projeto é de amor, é fraterno, é humanizador. É disso que estamos falando: alternância de poder e reintegração de posse de todos os bens materiais e imateriais que nos foram saqueados. É disso que estamos falando. É sobre isto.

Vou terminar esta história, mas preciso aproveitar o momento. Esta história vai recomeçar exatamente por onde todo mundo achava que tudo iria terminar. Vai recomeçar pelas mulheres pretas. Recomeça por nós mulheres pretas, cisgêneros, travestis e transexuais, porque, como diria Angela Davis: “Quando as mulheres negras se movem, o mundo inteiro se move junto. Ou gira e deixa girar.” Axé.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - É verdade, Érica Malunguinho. E como diria Rosa Luxemburgo: “A revolução é certa, mas imprevisível.” Com certeza, a grande revolução deve vir das mãos das mulheres negras. E agora, continuando nosso time grandioso de mulheres que fazem a diferença, vou falar que esta mulher tem feito uma grande revolução no mundo da ciência.

É uma cientista nascida em Franca, formada em Química, com pós-doutorado pela Harvard University; graduação, mestrado e doutorado pela Universidade Estadual de Campinas; e especialista pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia – Inmetro, na área de sustentabilidade do processo produtivo de couros. Coordena e desenvolve projetos de pesquisa nas áreas de resíduos sólidos. Possui 15 patentes nacionais e internacionais.

Por suas atividades acadêmicas, já recebeu 73 prêmios e honrarias. Eu gostaria de chamar a cientista, Dra. Joana D’Arc Félix, para receber a Medalha Theodosina Ribeiro.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. JOANA D’ARC FÉLIX DE SOUSA - Que lindo, pessoal. Muito obrigada, Exma. Deputada Leci Brandão, que nos representa, e à Theodosina Ribeiro, que iniciou a luta e abriu portas para que avançássemos e seguíssemos por ela. Dedico esta medalha a todas nós mulheres negras, mas também, especialmente, aos meus pais, que mesmo sem estudos - meu pai estudou até a quinta série do ensino fundamental, minha mãe até a quarta série - sempre diziam: “Estude para você chegar lá.” Então vou falar rapidinho como todos nós podemos chegar lá.

Meu pai trabalhava em um curtume, sempre trabalhou, desde os 11 anos de idade. Era tão pobre que, quando foi casar, o patrão dele arrumou uma casa que ficava na área do curtume para ele morar. Minha mãe era empregada doméstica e me levava para o trabalho com ela e, para eu ficar quietinha, me ensinou a ler o jornal que chegava na casa, o “Estadão”. Eu aprendi a ler com três anos e oito meses.

Por sorte, graças a Deus, um dia, era até começo de ano, a patroa da minha mãe, que era diretora do Sesi na cidade de Franca, chegou, foi no quartinho do fundo e me viu com um lápis de cor, porque eu pintava as palavras parecidas com a mesma cor, para ficar decorando, e perguntou: “Você está pintando jornal?” E eu falei: “Não, estou lendo.” Ela ficou assustada e falou: “Então lê este texto para mim.” E eu li perfeitamente bem. Então, ela conversou com minha mãe e falou assim: “Posso levar a Joana por uma semana na escola, lá na primeira série do ensino fundamental, e, se ela acompanhar, a vaga é dela.

Graças a esta oportunidade, iniciei a primeira série do ensino fundamental com quatro anos. Com 14 anos, eu entrei na USP, na Unicamp e na Unesp. Com 17 anos terminei a graduação na Unicamp, fiz mestrado, e, com 19 anos, já era mestre. Fiz um doutorado de sanduíche, e graduação, mestrado e doutorado eu fiz na Unicamp.

Mas não foi fácil não, pessoal. Quando comecei a graduação na Unicamp, ainda estava construindo moradia, paguei um pensionato. Consegui só o valor, não tinha alimentação nem nada. Mas a universidade era o dia todo. Na primeira semana de aula, eu conversei com as tias do bandejão, perguntando se toda sexta elas me arrumavam um pãozinho para eu comer no final de semana. Então, toda sexta-feira, quando eu passava no bandejão, elas já vinham com a sacolinha, com sete, oito pãezinhos, e esta era a minha refeição nos finais de semana, e eu não via a hora de chegar segunda-feira para almoçar no bandejão. Foi luta, mas não desisti.

Um fato importante: durante o doutorado, fiquei um ano na Universidade de Clemson, nos Estados Unidos. Só que quando comecei o doutorado, o orientador falou: “De acordo com o andar do seu trabalho, tem condições de ficar lá.” Mas lá era Carolina do Sul, um reduto da Ku Klux Klan e um estado racista. Clemson era uma cidade pequenininha, com 30 mil habitantes, e super-racista. Ele me perguntou: “Você vai aceitar o desafio?” E eu falei: “Vou, porque vou adquirir conhecimento”. E fui. Porém, neste um ano, fui invisível.

Lá na Carolina do Sul, eu descobri a invisibilidade do negro, porque era uma cidade super-racista. Eu morei em um alojamento na universidade e, como o meu orientador tinha outros orientandos europeus, eles sempre me convidavam para ir à lanchonete. Eu acho que fui duas vezes em um ano que fiquei lá. Nestas duas vezes, os garçons vêm e servem os brancos, eu era invisível na mesa. Davam-me as costas porque eu era negra. Não serviam. Aí os meninos falavam: “Sirvam a Joana.” E, com muito custo, serviam.

Então, neste um ano, eu senti na pele o racismo e invisibilidade, mas não desisti, porque, graças a Deus, neste um ano, publicamos o trabalho nas melhores revistas americanas. Depois tive um convite para fazer o pós-doutorado em Harvard. Aí voltei para Campinas, para terminar o doutorado, e fui para Harvard fazer o pós-doutorado. A proposta era de dois anos de pesquisa, mas, infelizmente, quando eu estava com mais ou menos um ano e meio de pós-doutorado, fazendo a pesquisa, faleceram a minha irmã e meu pai.

Primeiro, faleceu a minha irmã de 35 anos. Ela estava dando de mamar para o bebê de dois meses, então vim ao Brasil e fiquei aqui por quase quatro semanas. Fui embora em um domingo, e quando chegou no sábado seguinte, minha mãe ligou de manhã informando sobre a morte do meu pai. Foi uma diferença de um mês e três dias. Aí voltei, fiquei aqui umas três semanas.Voltei para terminar o pós-doutorado. Minha irmã deixou quatro crianças, até pedimos para o pai dela deixar as crianças em casa para minha mãe ter uma ocupação. Quando estava terminando o pós-doutorado, minha mãe ficou muito doente e precisava de mim. Aí tive que voltar para cuidar da minha mãe, tomei esta decisão.

Engraçado, vocês veem como Deus escreve certo por linhas tortas? Eu voltei e pensei: “O que vou fazer em Franca?” Eu tinha proposta de continuar trabalhando nos Estados Unidos, mas voltei para Franca e, um ou dois meses depois, surgiu um concurso na escola técnica estadual. Fiz o concurso, passei, mas estava triste, não era aquilo que queria. Até liguei para meu orientador nos Estados Unidos e ele me deu um chacoalhão e falou assim: “Joana, você tem a faca e o queijo na mão, faz a diferença. Você tem uma bagagem muito grande.”.

E o que eu comecei a fazer? Esta escola era de periferia e a maioria dos alunos era de um nível social bem baixo, pessoas desmotivadas, evasão escolar muito grande. Comecei a trazer a iniciação científica, tradicional na graduação, para a educação básica na escola técnica. Consegui bolsas de iniciação científica com os meninos e começamos a desenvolver projetos excelentes. Para vocês terem ideia, já desenvolvemos a pele humana artificial para queimados; transplante de pele; cimento ósseo, para caso a pessoa sofra um acidente de moto e perca parte do osso, ficando com uma perna menor do que a outra, etc. Nós desenvolvemos um cimento ósseo em que o médico faz toda a remodelação e reconstrói aquela parte perdida do osso, fecha a cirurgia. Este cimento favorece o crescimento do músculo. Isto para vocês terem ideia.

Eu resgatei a autoestima daqueles alunos. Negro não tem futuro, discriminação, toda aquela historinha, mas nós resgatamos e hoje estamos indo apresentar trabalho nos Estados Unidos. Ano passado, nós participamos da olímpiada de gênios nos Estados Unidos, foram 75 países participantes e 39 estados americanos. Ficamos em quarto lugar. Nós temos 15 patentes que fizemos em outros 30 países, fazemos transferência de tecnologias e ganhamos royalties. Ganha a escola, aluno e professor. Então aquela mãe que ganhava cesta básica, hoje vem falar: “Joana, com o dinheiro do royaltie, hoje podemos fazer a compra do mês do supermercado.

Isto é muito gratificante. E só dois detalhes para mostrar a vocês e comprovar que a educação transforma vidas. Era isto que eu tinha que seguir: resgatar a autoestima deste jovem que está tão maltratado e desestimulado. Hoje me encontrei e sou a pessoa mais feliz do mundo, resgatando e fazendo esta transformação.

Um dia, veio um pai conversar comigo. Disse: “Joana, eu vim aqui te agradecer. Sou separado da minha esposa.” Eles moram em uma cidade próxima de Franca. “Minha filha, na separação, ficou com a mãe e, com 16 anos, é garota de programa. A mãe expulsou e ela foi morar comigo. E ela fica na praça da cidade a noite toda, fazendo programa. Então, ela começou a fazer projeto com você, está fazendo pesquisa e largou a vida da prostituição e disse que quer ser pesquisadora.” Isto em 2016.

No começo do ano passado, veio uma mãe falar comigo, que o filho de 16 anos saía da escola e ia para o tráfico, estava envolvido com traficantes. Começou a fazer projetos e desistiu desta vida. Ela disse que até mudou de bairro para ele não ter mais aquelas companhias. Estes dois alunos, no final do ano, entraram em Química na Universidade Federal do Triângulo Mineiro e serão químicos e futuros cientistas. Para vocês verem que a educação transforma vidas. Ano passado, acho que no mês de setembro, fui dar uma palestra na Fundação Casa, em Franca, e, de lá, tem quatro garotos que hoje são meus alunos, e fazem iniciação científica.

As pessoas falam que a educação no Brasil não tem futuro, que está uma porcaria. Não gente, eu acredito que a educação transforma vidas. Acho que nós, na condição de educadores, temos que procurar fazer a diferença e toda esta transformação. Estou me sentindo coroada com isto aqui. Duas coisas importantes que estão acontecendo ao mesmo tempo: esta medalha aqui e, na semana que vem, quando o jornal “O Globo”, do Rio de Janeiro, me elegerá como personalidade do ano de 2017. O prêmio chama “Faz Diferença”. Tem a personalidade do ano, que eles selecionam, e depois outras 16 categorias que entram para votação popular. A personalidade do ano foi eleita e eu vou ganhar o prêmio semana que vem.

Reforçando, mais uma vez: é através da educação que vamos recuperar e resgatar estes jovens desmotivados e perdidos. Nós conseguimos. Muito agradecida mais uma vez. Como falei, também estou dedicando aos meus pais. Deus sabe o caminho que temos que seguir.

Muito obrigada.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Uau, sensacional. Verdade: mulheres que fazem a diferença e transformam não apenas suas vidas, mas a realidade das localidades e pessoas que lá se encontram. Esta é a essência da Medalha Theodosina Ribeiro: reconhecer e valorizar o trabalho destas grandiosas mulheres e das grandiosas transformações que realizam.

Dando continuidade ao prêmio, vamos falar de mais mulheres grandiosas que realizam estas grandiosas transformações. Vou falar de mais uma. Vem mais uma de Pernambuco.

É uma mulher que fez e faz uma diferença em um território essencialmente machista, em que grandes lutas são travadas para a garantia dos direitos de trabalhadoras e trabalhadores. Esta mulher fez e faz esta grandiosa diferença no Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores do Transporte Urbano de São Paulo. Ela é ativista pelos direitos da mulher e também compôs a diretoria da União Brasileira de Mulheres do Estado de São Paulo.

Eu gostaria de chamar Edna Maria de Andrade, nossa sindicalista, que vai receber a Medalha Theodosina Ribeiro das mãos da deputada Leci Brandão.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. EDNA MARIA DE ANDRADE - Bom dia a todos e a todas. Em nome da deputada Leci Brandão, cumprimento a todas as nossas mulheres empoderadas. Quero dizer para vocês, companheiras de categoria, que representar o transporte coletivo de São Paulo não é fácil. Quero dedicar esta honraria, com muita emoção, a todas as trabalhadoras do transporte coletivo de São Paulo e a todas as Marielles do nosso País.

Obrigada, Leci, por esta oportunidade. Como sempre digo em minhas falas, não posso deixar de agradecer a minha amiga Rosina Conceição. E não vou ficar aqui repetindo todas as palavras que estas mulheres já falaram, fica difícil para mim chegar aos pés destas mulheres lindas e maravilhosas, de luta, que fazem a diferença dentro da sociedade. Muito obrigada e um abraço a todos vocês.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - É muita emoção, não é, gente? Pois é, mas ainda não acabou. Vamos falar de outra mulher poderosa, que, com sua voz de longo e grande alcance, toca não apenas o coração, mas a alma das pessoas e também faz uma grande diferença. Esta mulher maravilhosa iniciou sua carreira como fundadora intérprete da escola de samba Império Lapiano, na Vila Leopoldina. Em 1990, foi convidada pela diretoria da Escola de Samba Unidos do Peruche para fazer ensaios no lugar de Eliana de Lima, que estava grávida.

No Carnaval de 1991, foi escolhida para cantar o samba enredo da Peruche, assumindo então o lugar de intérprete até 1993. Em 94, foi contratada pela Escola de Samba Barroca Zona Sul e, em 95, pela Escola Império da Casa Verde, ficando como intérprete das duas agremiações por mais de cinco anos. Sinta o poder. Já cantou pelas escolas de samba União Independente da Zona Sul, Folha Azul dos Marujos, Estrela Dalva de Lorena, Mocidade Imperial de Santo André, Blocos Vem-Vem de Atibaia, Gregos e Troianos no Bom Retiro e Lapa. Atualmente, faz parte da ala de compositores intérpretes da ala show da Unidos do Peruche.

Venha Maria Bernardete Raimundo.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. MARIA BERNARDETE RAIMUNDO - Gente, estou perdida. Parece que estou na avenida.

Bom dia a todos, é um prazer enorme estar aqui com vocês. Sinto-me tão honrada. Leci, tenho você em minha vida desde 1991. Agradeço à Theodosina Ribeiro por esta grande oportunidade. Gente, canto em todas as escolas de samba e continuo na minha Unidos do Peruche. Agradeço a quem é da Peruche que está aqui, minha comunidade, minha ala de compositores, minha família, meu marido e meu filho que estão aqui comigo e são a minha base.

Hoje, se eu sou Bernardete, intérprete de samba enredo e da MBP, cantora de samba e da MPB, devo muito à deputada Leci Brandão, porque eu era uma ilustre desconhecida dentro da nossa Império Lapiano, escola que é minha paixão, da qual sou fundadora. E por ser escolhida no último ano da Tiradentes para cantar na minha escola Império Lapiano, gravaram uma fitinha, e na hora que a Unidos do Peruche estava precisando, por conta dos shows da Eliana e da gravidez, apresentaram esta fita. Ninguém me conhecia dentro de São Paulo e do samba. Eu não era uma frequentadora de escola de samba, apenas militava ali na minha pequena Império Lapiano.

Esta fita serviu de passaporte para o que sou hoje. Fui aceita na Unidos do Peruche. Estreei em 91, com um mês de ensaio, porque a Eliana teve neném no dia nove de fevereiro, que completou agora 28 anos. Para minha surpresa, e existe Deus na minha alma e no meu caminho, tive a Leci Brandão fazendo todos os comentários da minha trajetória naquela avenida naquela noite. E, até hoje, graças às suas palavras, estou aqui e continuo cantando e nas escolas de samba. Continuo na Unidos do Peruche e na música. Que Deus te abençoe, Leci, por tudo que você representa na minha vida.

Não tem um Carnaval que você não fale de mim, um show que eu faça que você não fale de mim. Sou muito grata por tudo a todos vocês, por me seguirem. Sou muito grata à minha família por estar comigo, e à minha ala de compositores musicais da Unidos do Peruche. Obrigada. Espera aí, vai ter uma surpresa. Só um minutinho.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Calma que ainda tem mais coisas, gente. A sempre oportuna e sábia filosofia africana diz: “Se sou, é porque somos. Se somos, é porque sou”. A nossa homenageada que encerra o grupo de hoje é nascida em Alagoas e vive no Jardim São Luís, zona sul da capital paulista, desde 1974. Ela é aposentada e, ao longo de mais de 40 anos, atuou como professora e liderança comunitária à frente da luta por moradia, infraestrutura e educação em seu bairro, onde também defendeu a valorização do idoso, a proteção e o resgate de crianças e adolescentes, e o empoderamento da mulher e da família.

Em Marsilac, lutou pelo atendimento de mais de 150 famílias com Bolsa Família e foi decisiva na implementação do Centro de Referência e Assistência Social. Atuou na entrega mensal de mais de cinco mil cestas básicas nos bairros de Parelheiros, Jardim São Luís, Parque Santo Antônio, Piraporinha, Jardim Ângela e Capão Redondo, garantindo segurança alimentar para mais de 20 mil pessoas. Promoveu a luta por moradia que contemplou mais de mil famílias no Programa Mutirão do CDHU. Homenageamos a liderança comunitária Maria Cícera Mineiro da Silva.

 

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- É feita a homenagem.

 

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A SRA. MARIA CÍCERA MINEIRO DA SILVA - Estou tão emocionada, não sei nem o que dizer, mas tudo bem. Vou só falar um pouquinho sobre minha vida e minha luta, já foi falado um pouco neste resumo feito aqui. Quero agradecer, de antemão, à deputada Leci Brandão e à Theodosina, por ter esta homenagem feita a todas nós mulheres que lutamos o tempo inteiro.

Hoje estou aqui recebendo esta medalha, e ela não é minha, é nossa, de todas as mulheres que estão na luta, que sofreram com racismo. Ela é das comunidades, do Jardim São Luís, das mulheres que sempre me acompanharam de Parelheiros, Parque Santo Antônio, Capão Redondo e Valo Velho.

Quero dizer também que nossa luta não é fácil, é dura e difícil. Muito embora hoje encontremos mais motivação e apoio, dos anos 1950 até os 1980 não era tão fácil, mas mesmo assim metíamos a cara. Eu lembro que com cinco anos de idade eu já lia, aos sete anos já ajudava o pessoal a escrever cartas para os filhos em São Paulo. Aí vem toda a história, fui alfabetizadora de uma colônia de pescadores. Eu achava muito triste ver aquele povo. Trabalhavam tanto, mas não reconhecia as pessoas que compravam, que pagavam. Reconheciam através de desenho ou símbolo. Muitas vezes saíamos da vila para pegar outra cidade com energia elétrica, porque onde eu morava não tinha. Seguíamos com lampião, andávamos uns 40 minutos, uma hora, caminhando com o lampião pelo mato afora até chegar à cidade que tinha energia.

Fui educadora e alfabetizadora por um programa chamado Rádio Fone. Não sei se alguém lembra disso, era um programa de alfabetização pelo rádio. Eu era facilitadora para os pescadores, eu com 14 anos. E aí fui crescendo, sonhando em ser professora, muito embora, na minha cidade, eu fosse uma professora porque sabia ler e escrever. Mas eu vim para São Paulo, e chegando aqui comecei minha militância em um partido de esquerda, vim para o PCdoB. Cheguei aqui em 1974, vim de uma ocupação que foi feita em 1980, que também não foi fácil, em uma ditadura forte.

A partir daí, nós tivemos a vitória, muito embora com muita luta, e fui ocupando meu espaço como mulher. Mas não foi fácil esse movimento, porque os homens eram machistas mesmo, não tinham jeito. Mas ocupamos nosso lugar, e hoje ainda moro neste espaço, no conjunto da Cohab, que conquistamos através dessa ocupação em 1980.

 Moro nesse espaço, mas abracei todas aquelas 703 famílias, mostrando para as pessoas que não tinha essa de homem ou mulher, todos tinham a mesma necessidade de melhorar aquele espaço, de ter escola, creche, comida na mesa para comer, de ter emprego, capacitação. E foi por aí que abraçamos a comunidade onde ainda permaneço. Tudo que se tem ali, desde asfalto, água, luz e telefone, creche, teve participação das pessoas, e a maioria eram mulheres. Elas me tinham como espelho.

Então o que quero dizer com isso? Ainda tem competitividade. Quando íamos disputar a união dos moradores, também tomávamos pancada e porrada dos homens, porque eles começavam a nos sufocar, esculhambar, a escrever ofensas no muro, e nós passamos por tudo isso.

Sobre o racismo, eu tenho um caso que não esqueço até hoje. Eu tinha meus 17 anos e ainda estava em Alagoas. Eu me achava inteligente sim, aprendi a ler com cinco anos de idade. Saí e fui para Maceió, onde falaram que uma loja nova estava empregando muita gente, então fui lá ver se conseguia um trabalho. Fui até essa loja, fizemos um teste, passamos por dois critérios de seleção.

Quando chegou a hora de apresentar as pessoas que tinham passado pela seleção ao gerente da empresa e à diretoria, chegou minha vez, e falaram para mim que infelizmente eu não tinha passado. Aí uma pessoa da seleção questionou: “Como não passou? Ela foi a melhor nos testes”. E o gerente falou em alto e bom som: “Mas ela é negra, não quero negro aqui”. 

Essa loja existe hoje, é a Lojas Americanas. Isso me marcou muito. Talvez tenha me marcado mais do que o próprio machismo do pessoal do conjunto em São Luís, nunca esqueci. Mesmo assim, isso nunca me fez me calar. Por isso, hoje, esta medalha vem fortalecer cada vez mais essa força da mulher e do negro, porque o sofrimento é dobrado. Também temos que ter força dobrada.

Quero agradecer também à minha família, que sempre me apoiou. O trabalho comunitário também exige esforço, dedicação e carinho, porque no trabalho comunitário não tem dinheiro, não se ganha salário. Seu coração tem que ser muito grande para abraçar essa causa. Quem está de fora pensa que você recebe, mas é uma coisa que gostamos de fazer e vemos retorno, porque cada mulher que vemos formada e com profissão, cada jovem negro que vemos em um emprego e em uma universidade, para nós, é muito mais que um salário.

Este ano estou completando 50 anos de trabalho comunitário, e vou me envolvendo cada vez mais. Este presente chegou em uma boa hora, é um incentivo. Quero agradecer a todas as mulheres vivas e que se foram, como a Marielle. Ela é cada uma de nós que estamos aqui, levando também este legado e força da Marielle. É nossa força, não vamos deixar a Marielle morrer. Ela vai continuar viva dentro de nós.

Então quero agradecer. Esta medalha é para todos, ela não é minha, mas nossa, é do Brasil, de São Paulo, das comunidades, da periferia e de todo mundo que está aqui presente. Muito obrigada, Leci, Rosina e vocês que estão aqui. Muito obrigada, minhas mulheres do Jardim São Luís e Parque Santo Antônio. Um grande abraço e um grande beijo. Este é um momento de muita emoção para mim, mas também de grande alegria. Isto é reconhecimento. Obrigada, deputada Leci. Amém.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLÁUDIA LUNA - Quero agora registrar algumas ilustres presentes nesta sessão de hoje: Tia Cida, dos Terreiros de São Mateus; Dr. Estevão Silva, representando a Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação dos Advogados Negros de São Paulo; Sra. Diva Zitto, presidente do Movimento da Mulher Negra Brasileiro, representando também a Dra. Carmem Dora Ferreira Freitas, presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB/SP; Ágata e Pingo, casal de mestre-sala e porta-bandeira da escola de samba Vai-Vai; Ana Almeida, vice-presidente estadual da Unegro - União de Negros e Negras pela Igualdade, de Ribeirão Preto; Luís Carlos Ribeirão, da Comissão de Igualdade Racial da OAB/SP; Dra. Lia Lopes, diretora-executiva da Elas por Elas - Vozes e Ações das Mulheres; Casa do Arco Íris Mãe Dango, Feconezu e trabalhadoras domésticas de Campinas e região; Nilda Neves, do Movimento pelo Direito à Moradia; Neonísia, do Orgulho Crespo; Vera de Lima, do Fórum de Mulheres Negras.

Com a palavra, a nobre deputada Leci Brandão, que prestará homenagem às memórias da vereadora Marielle Franco e do Sr. Anderson Gomes.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Vamos ler aqui um texto de Henrique Vieira.

“Semente pequena, frágil, levada pelo vento. Num primeiro momento, alguém poderia perguntar, para que serve uma semente? O que ela é capaz de gerar? Mas, jogada na terra, na escuridão e umidade, não é que ela vai se transformando e trazendo uma novidade? Sabe aquela farinha gostosa que ao corpo serve de alimentação? Já foi uma semente generosa, dando vida debaixo do chão.

Sabe aquela árvore verde com a sombra para nos proteger? Foi semente solitária que na terra precisou morrer. Porque a semente corrige o mundo de uma vã ilusão. Porque tem gente que acredita na bala, na arma, no canhão. Já eu prefiro apostar na sementinha e sua generosa doação, como Jesus, Luther King, Dorothy e Marielle. A morte não é capaz de silenciar a voz que só faz multiplicar o sonho de um mundo sem opressão, porque a palavra final é vida, semente e coração. Marielle Franco, presente.”

Quero agradecer a presença de todas as pessoas que aqui estão. Não falarei nomes, porque todos são importantíssimos e especiais, são pessoas que fortalecem a minha vida enquanto cidadã. Digo, com muito prazer, que me chamam de deputada, mas não sou deputada, estou deputada. Sou uma artista de 43 anos de caminhada, que fez da sua arte uma bandeira de luta para defender os excluídos e menos favorecidos, para defender cidadãos. Acho que na hora em que eu recebi o recado que deveria aceitar o desafio para cumprir a missão e estar dentro desta Casa Parlamentar, tenho certeza que meu orixá, que me deu esse recado, deve estar satisfeito comigo por causa deste dia de hoje.

Tudo o que foi dito aqui, todas as pessoas que passaram por aqui, todas essas vitórias, presenças e lutas, me fazem entender que tenho que acreditar na minha religião definitivamente, porque eu jamais poderia imaginar que iria ter a oportunidade e felicidade de ouvir tantas histórias de mulheres tão especiais, cada uma na sua caminhada e com sua responsabilidade, todas importantes. Muito obrigada, meu pai, minha mãe, e minha mãe carnal, dona Leci de Assunção Brandão, que também mandou suas bênçãos para todos que estão aqui. Ela só tem 95 anos, não pode estar aqui porque não há condição.

Não estou fazendo favor a quem quer que seja. As pessoas falam “muito obrigada” para mim, mas estou cumprindo missão e obrigação. Quem entra nesta Casa tem que entender que veio para cá fazer uma representação com compromisso. Não adianta só você ter a pele negra e não ter compromisso com as pessoas. Não adianta você ter religião, partido, se você não respeita a condição das outras pessoas. Todas as pessoas merecem respeito, independentemente de qualquer coisa, e, nesta Casa, temos que tomar cuidado, porque a palavra gênero não pode constar em nenhum projeto; temos que tomar cuidado, porque nem todas as orientações sexuais são aceitas; e temos que tomar muito mais cuidado, porque negros, infelizmente, ainda não fazem parte do poder.

Eu espero que todas as confissões e depoimentos que aconteceram aqui nesta tribuna sirvam de exemplo para que as pessoas entendam que, independentemente de sermos mais da metade da população deste país, nós temos direitos. Temos que ocupar os poderes deste país, seja ele Judiciário, Legislativo ou Executivo. Nós precisamos ter as negras e os negros, e os brancos que tenham os mesmos ideais que nós temos. Precisamos ter o povo dentro do Congresso Nacional e dos parlamentos, porque não mais para aturarmos tanta discriminação e coisa ruim, tanto retrocesso, tantos reacionários. Não dá mais.

Por favor, que este dia seja um marco, até porque é um dia em que homenageamos uma mulher que ousou, que não teve medo, que enfrentou, que faz parte da lista daqueles que são excluídos. Por tudo, por todas as marcas que ela teve e tem, tenho certeza que não só o Brasil, mas o mundo não vai esquecer essa mulher. Ela está aqui, Marielle Franco.

Esgotado o objeto da presente sessão, esta Presidência agradece às autoridades, à minha equipe, aos funcionários dos serviços de Som, da Taquigrafia, de Atas, do Cerimonial, da Secretaria-Geral Parlamentar, da Imprensa da Casa, da TV Alesp, e das assessorias policiais Civil e Militar, bem como a todos que, com suas presenças, colaboraram para o êxito desta solenidade.

Teremos agora uma ação cultural da Bernardete.

Está encerrada a presente sessão.

 

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- Encerra-se a sessão às 12 horas e 39 minutos.

 

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