DECRETO N.1.079, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1902
Manda observar o regulamento do Instituto Disciplinar
O Presidente do Estado, nos termos do
artigo 36, § 2.°, da Constituição, e para execução da lei n. 844, de 10
de Outubro findo, resolve que se observe o seguinte :
Regulamento do Instituto Disciplinar
CAPITULO 1.°
DO ESTABELECIMENTO E DOS MENORES
Artigo 1.º - O Instituto Disciplinar, com séde na Capital do
Estado, subordinado ao secretario do Interior e da Justiça, sob a
immediata inspecção do chefe de polícia, destina se a incutir habitos
de trabalho, a educar e a fornecer instrucção litteraria e
profissional, esta ultima de preferencia agricola :
a) a maiores de 9 annos e menores de 14, no caso do artigo 30 do Codigo Penal;
b) a maiores de 14 annos e menores de 21, condemnados por infracção do
artigo 399 do Codigo Penal e do artigo 2.° do decreto federal n. 145,
de 11 de Julho de 1893;
c) a pequenos mendigos, vadios, viciosos, abandonados, maiores de 9 annos e menores de 14.
Artigo 2.º - O Instituto Disciplinar comprehenderá duas secções.
Artigo 3.º - A' primeira secção serão admittidos os menores a
que se referem as lettras a e b do artigo 1.°, á vista de sentença da
auctoridade judiciaria.
Artigo 4.º - A' segunda secção serão admittidos os menores de
que trata a lettra c do artigo 1.°, em virtude de ordem do chefe de
policia e auctorização do juiz competente, pela seguinte fórma :
1.° No caso de menoros abandonados, só poderá ter logar o recolhimento
depois de colligidas, pela auctoridade policial, as provas de que se
achem elles vagando pelas ruas, praças e logares publicos, em absoluto
desamparo, isto é de que não têm parentes, ou qualquer pessôa que lhes
proveja a subsistencia ;
2.° Com relação aos pequenos mendigoss, vadios e viciosos, a
auctoridade policial a que forem presentes os menores, ordenará a
abertura de rigoroso inquerito, para verificar si procedem as
allegações a respeito da sua conducta, ouvindo, para esse fim, em
numero de dois, pelo menos. cidadãos qualificados, que confirmem a
procedencia de taes allegações. e obtendo informações do inspector do
quarteirão, da auctoridade policial da circumscripção respectiva e do
juiz de paz do districto.
Sómente á vista desses esclarecimentos é que se requisitará a
auctorização do juiz competente, fazendo se lhe subir o inquerito,
sempre distincto para cada menor, com todas as suas peças.
Artigo 5.º - Os menores que derem entrada na 1.ª secção ficarão
no estabelecimento durante o tempo marcado na setença da auctoridade
judiciaria, prevalecendo, quanto aos condemnados como vadios e
vagabundos, a disposição do artigo 401 do Codigo Penal.
Artigo 6.º - Os menores classificados na 2.ª
secção, permanecerão no Instituto até
completarem a edade de 21 annos, podendo sahir antes :
a) mediante proposta fundamentada do director. quando se hajam
recommendado por boa conducta e notavel applicação durante dois annos
consecutivos, pelo menos ;
b) quando se apresentarem pessoas idoneas quo os queiram
receber, estando no caso do merecer confiança, e de por elles assumirem
a devida responsabilidade.
§ unico. - Em qualquer das hypotheses, se requisitará, por
intermedio de chefe de polícia, a licença do juiz competente, que
providenciará sobre a nomeação do tutor.
Artigo 7.º - Aos menores que se houverem recommendado por sua
conducta e aproveitamento, serão concedidos pelo director, ao sahirem
do Instituto, um certificado e um premio, que não excederá de cem mil
réis.
Artigo 8.º - O director procurará uma collocação para todos os
menores que deixarem o estabelecimento, empregando os seus bons
offícios junto aos particulares e ás associações, e continuando a
dispensar-lhes o seu patrocinio, emquanto merecerem.
Artigo 9.º - Os menores da 1.ª e da 2.ª
secção ficarão sempre separados e formarão
dois grupos á parte.
Artigo 10. - Na instrucção que se lhes fornecer e nos trabalhos
em que hajam de ser aproveitados, o director dividirá os menores de
cada secção, por classes, conforme a edade, robustez physica e aptidão
de cada um.
Artigo 11. - Dever-se-á tambem levar em conta para o fim de que trata a disposição precedente:
a) o que constar, com relação aos menores, antes de darem entrada no Instituto;
b) o logar em que forem educados, si na cidade ou no campo;
c) a condição e profissão de seus paes ;
d) a situação em que se devem achar quando sahirem do estabelecimento.
Artigo 12. - A divisão em classes, para ambas as secções,
far-se-á, annualmente, de modo que, por occasião da entrada de um
menor, possa ser-lhe designada de prompto aquella a que tiver de
pertencer.
Nesse serviço o director, que deverá proceder com o maximo escrupulo,
ouvirá sempre o professor, o mestre de cultura e os medicos incumbidos
da visita ao estabelecimento, além de procurar colher outras
informações a respeito.
CAPITULO 2.°
DO REGIMENTO INTERNO
Artigo 13. - Por occasião de ser admittido cada menor ao
Instituto, lavrar-se-ão os assentamentos respectivos, no livro da
matricula geral, e proceder se á ao interrogatorio, que ficará sob a
guarda do director do estabelecimento, mantendo-se a respeito inteiro
sigillo. Terá logar, em seguida, a visita medica, finda a qual vestirá
o menor o uniforme do Instituto, sendo depois photographado, e
conservando-se-lhe, em reserva, o retrato, para ulterior verificação de
identidade.
Artigo 14. - Divididos os menores em classes, segundo o disposto
no artigo 10, caberá aos mais distinctos de cada turma, conforme a
designação do director, o encargo de vigiar a conducta de seus
companheiros, de admoestal-os, de transmittir-lhes as ordens ou
instrucções da auctoridade superior, e de levar ao conhecimento desta
as faltas commettidas, para a necessaria repressão.
Artigo 15. - O alumno que zelar das diversas peças do seu
vestuario, conservando as em bom estado, até depois de findo o prazo de
sua duração, receberá um premio em dinheiro, não excedente da quantia
de dez mil réis, e o qual será concedido pelo Governo do Estado,
mediante proposta do director do Instituto.
Artigo 16. - A alimentação poderá ser
melhorada, para todos os alumnos, nos dias em que assim o determinar o
director do Instituto.
Em caso algum se permittirá aos menores o uso do vinho ou de quaesquer
outras bebidas alcoolicas, salvo aos doentes, e quando houver
prescripção medica.
Artigo 17. - E' inteiramente prohibido aos menores o uso do fumo.
Aos empregados só é permittido, fóra do serviço.
Artigo 18. - Os menores receberão instrucção primaria, nos
termos do artigo 25, e serão empregados na agricultura, sobretudo, na
horticultura, floricultura, arboricultura, bem assim na criação do
gado, de aves domesticas, e nos demais trabalhos congeneres.
§ 1.º - O director do Instituto creará as officinas necessarias,
mediante auctorização do Governo do Estado, para o ensino das artes e
officios, tendo em vista as vantagens economicas do estabelecimento e
as conveniencias do aproveitamento dos alumnos.
§ 2.º - Os menores serão tambem empregados nos serviços da lavanderia e cosinha do estabelecimento.
Artigo 19. - Os trabalhos do Instituto serão suspensos nos domingos e dias feriados
Artigo 20. - O periodo das férias começará a 15 de Dezembro e terminará a 15 de Janeiro.
§ unico. - Durante esse tempo ficarão os menores dispensados das
aulas de instrucção primaria, sendo diminuidos os trabalhos de
agricultura e os demais serviços, tendo se em consideração a conducta
de cada um.
Artigo 21. - O horario do estabelecimento, com discriminação das
horas de trabalho, de refeição, de descanço e de somno, será organizado
pelo director, com approvação do chefe de polícia.
Artigo 22. - Nos domingos e dias feriados, os menores farão
exercicios militares, de gymnastica, de cantos coraes, e darão licções
de musica vocal e instrumental.
Artigo 23. - Facultar-se-ão sempre aos menores as praticas da religião que professarem.
Artigo 24. - A instrucção, fornecida diariamente aos alumnos,
pelo professor do estabelecimento, comprehenderá as seguintes materias:
Leitura, principios de grammatica, escripta e calligraphia;
Calculo arithmetico sobre os numeros inteiros, fracções e systema metrico decimal;
Rudimentos de sciencias physicas, chimicas e naturaes, applicaveis á agricultura;
Moral pratica e educação civica;
Desenho a mão livre.
Artigo 25. - A aula de musica vocal e instrumental será regida
por um professor contractado pelo Governo do Estado, por prazo nunca
maior de dois annos.
Artigo 26. - As recompensas auctorizadas são:
a) A inscripção no quadro de honra ;
b) Os lugares de honra na mesa;
c) O supprimento de fructas;
d) Os bons pontos;
e) As insignias de distincção ;
f) Os empregos de confiança;
g) Os passeios especiaes;
h) Os elogios em particular ou em público;
i) Os premios de qualquer natureza ou em dinheiro;
j) As cadernetas da Caixa Economica.
Artigo 27. - As unicas punições auctorizadas são as seguintes:
a) A advertencia ou reprehensão, em particular ou em classe ;
b) A privação do recreio ;
c) Os maus pontos, que determinam a perda dos bons anteriormente conquistados ;
d) O isolamento durante as refeições, em virtude do qual o
alumno castigado come numa mesa à parte, e ás mesmas horas que os
outros:
e) A perda definitiva ou temporaria das insignias de distincção e dos empregos de confiança ;
f) A cellula clara com trabalho;
g) A cellula escura, mas sómente para as faltas de extrema gravidade.
Artigo 28. - Para as recompensas de que tratam as lettras i e j
do artigo 26, deverá proceder auctorização do
chefe de policia.
Quanto às punições, só o director as pode impôr.
Artigo 29. - Os medicos da Força Publica revesar-se-ão, todos os
mezes, conforme a escala, mandada organizar pelo secretario de Estado
dos Negócios do Interior e da Jústiça, afim de proceder á visita diaria
do Instituto, attender aos chamados urgentes e executar os demais
serviços profissionaes, de accôrdo com as instrucções do chefe de
policia.
Artigo 30. - Haverá no estabelecimtnto uma pequena ambulancia para os casos urgentes.
Artigo 31. - As visitas ao Instituto poderão ser permittidas,
salvo o caso do artigo 34, aos domingos e nas horas estabelecidas,
sendo prohibido aos visitantes conversar com os alumnos, e dar-lhes
dinheiro ou quaesquer objectos.
Artigo 32. - Os visitantes serão sempre acompanhados pelo director ou por um empregado do estabelecimento, por elle designado.
Artigo 33. - Em horas estabelecidas pelo director e na sala
destinada a esse fim, poderão os menores receber seus parentes ou
tutores, falando-lhes estes sempre na presença de um empregado do
Instituto.
Artigo 34. - O director poderá conceder licenças
extraordinarias, para a visita aos menores recolhidos á enfermaria, com
as cautelas, reclamadas pela ordem do estabelecimento.
Artigo 35. - Os objectos destinados aos menores, por seus
parentes ou tutores ou por outras pessoas, serão guardados pelo escrivão
almoxarife, que passará o competente recibo, realizando-se a entrega
conforme determinar o director.
Artigo 36. - Os menores não poderão receber nem dirigir cartas
ou escriptos de qualquer natureza,sem que primeiro os leia o director,
lançando-lhes o seu visto.
Artigo 37. - A correspondencia é permittido sómente com os parentes ou tutores, e uma vez em cada 15 dias.
Artigo 38. - Para a correspondencia,deverão os menores servir-se
de papel e envelloppe, timbrados segundo o modelo que o adoptar o
director.
Artigo 39. - Não poderão os menores na correspondencia,empregar
palavras ou phrases convencionaes, escrever em linguagem menos
respeitosa, e tratar de assumptos que não lhes digam respeito, e aos
seus parentes ou tutores.
Artigo 40. - Os menores escreverão, no local que lhes fôr designado, e sempre com assistencia do professor do instituto.
Artigo 41. - Haverá no Instituto uma bibliotheca, cujos volumes
serão entregues aos menores, nas horas estabelecidas, na sala de
leitura, e, em casos especiaes, com auctorização do director, no
recreio.
Artigo 42. - Na bibliotheca deverão todos observar completo
silencio, durante o tempo da leitura, cingindo se rigorosamente ás
instrucções do director.
Artigo 43. - O director adquirirá para a bibliotheca tão sómente
os livros cuja leitura fôr compatível com a educação moral e
intellectual dos alumnos.
Artigo 44. - No caso de estrago dos objectos que lhes forem
confiados, ou damnos produzidos nos que pertençam ao Instituto,
descontar-se-á a importancia respectiva do peculio a que se refere o
artigo 59, sem prejuizo da punição em que incorrerem os menores por
aquellas faltas.
Artigo 45. - No dia 15 de Dezembro de cada anno, terá logar a
festa do Instituto, tomando parte os alumnos em exercícios militares,
de gymnastica, de canto, e nas diversões que o director indicar, sendo
lhes, então, entregues os premios, para os quaes convenha haver uma
distribuição especial e solemne. "
CAPÍTULO 3.º
DA ADMINISTRAÇÃO
Artigo 46. - O pessoal do instituto se comporá de:
Um director;
Um escrivão-almoxarife;
Um mestre de cultura ;
Um professor e
Vigilantes.
Artigo 47. - O director, o escrivão almoxarife e o professor, o
qual deverá ser diplomado pelas escholas normaes ou complementares do
Estado, serão nomeados e demittidos por decreto do presidente do
Estado, sob proposta do chefe de policia vigorando quanto a elles, na
parte applicavel, as disposições dos regulamentos da Secretaria dos
Negócios do Interior e da Justiça e da Repartição de Policia.
Artigo 48. - Os vigilantes serão contractados por prazo
nunca maior de um anno, por acto do director e com
approvação do chefe de policia.
Artigo 49. - Os vencimentos desse pessoal serão os da tabella, annexa ao presente regulamento.
Artigo 50. - Incubirá ao director:
1.º Executar as leis,regulamentos,instrucções e ordens,referentes ao
Instituto, por cuja administração será o principal responsavel;
2.º Inventariar os objectos e moveis,fiscalizando a carga e descarga do material;
3.º Cuidar da disciplina e policia do estabelecimento, superintendendo todos os trabalhos nelle executados;
4.º Exercer rigorosa vigilancia sobre a conducta dos alumnos e empregados;
5.º Impôr a estes ultimos as penas disciplinares de
advertencia, reprehensão e suspensão até oito
dias;
6.º Guial-os no cumprimento de seus deveres;
7.º Visitar, pelo menos duas vezes por dia os menores enfermos, ou recolhidos ás cellulas;
8.º Aconselhar os que houverem soffrido qualquer punição ou que procedam mal;
9.° Informar se assiduamente do que succeder com relação a cada um dos alumnos;
10. Interessar-se pela sorte e condição de todos elles, fazendo quanto
estiver ao seu alcance para que adquiram o sentimento de amor ao
trabalho e uma conveniente educação moral;
11. Apresentar ao secretário de Estado dos Negocios do Interior e da
Justiça por intermedio do chefe de policia,até o dia 21 de Dezembro de
cada anno,um minucioso relatorio sobre o andamento dos trabalhos do
Instituto e sobre as suas necessidades mais urgentes.
Artigo 51. - O director será substituido, nas suas faltas ou impedimentos, por quem o Governo do Estado designar.
Artigo 52. - Ao escrivão almoxarife e aos vigilantes incumbirão
os serviços que lhes forem determinados pelo director,de accôrdo com as
instrucções do chefe de policia.
Artigo 53. - Ao professor incumbirá ministrar o ensino
primario aos alumnos, esforçando-se pelo seu adeantamento
intellectual e moral.
Artigo 54. - Nas suas faltas ou impedimentos, serão substituidos
o escrivão-almoxarife e o professor por quem o director designar,
quando taes faltas não excedam de oito dias, caso em que a substituição
será regulada por acto do Governo do Estado.
Artigo 55. - Os vigilantes serão substituidos uns pelos outros, conforme resolver o director.
Artigo 56. - Ao mestre de cultura incumbirão os serviços que
entenderem com os trabalhos de agricultura e os congeneres, sendo elle
substituido, nas suas faltas ou impedimentos, por quem o Governo do
Estado designar.
Artigo 57. - O director e os vigilantes serão obrigados a
residir no estabelecimento, permanecendo os outros empregados no
instituto durante as horas marcadas no regimento interno.
Artigo 58. - O director e os demais empregados terão
direito, no estabelecimento, a alimentação egual á
fornecida aos menores.
CAPÍTULO 4.º
DISPOSIÇÕES GERAES
Artigo 59. - O producto do trabalho executado no Instituto será
dividido em duas partes, uma das quaes constituirá renda do Estado,
sendo a outra distribuida proporcionalmente entre os menores, como
peculio, quando sahirem do estabelecimento.
§ Unico. - A quota dos menores será mensalmente recolhida á Caixa Economica, em caderneta especial para cada um.
Artigo 60. - O director, em casos excepcionaes, e quando não
haja tempo de obter a auctorização superior, póde determinar
providencias urgentes, sujeitando, porém, o seu acto á immediata
approvação da auctoridade competente.
Artigo 61. - Para o consumo dos objectos inserviveis, pedirá o
director a necessaria licença ao Governo do Estado, procedendo na fórma
por este determinada.
Artigo 62. - Mensalmente procederão os dois promotores publicos
e o curador-geral de orphams da Capital, alternando-se, a rigorosa
inspecção no Instituto Disciplinar, informando ao Governo, em relatorio
reservado, o que observarem.
Artigo 63. - O Governo do Estado fará publicar o regimento
interno do Instituto, cujas disposições mais importantes serão
affixadas nas salas de trabalho e em outras onde o director julgar
conveniente.
Artigo 64. - O secretario de Estado dos Negócios do Interior e
da Justiça, ouvindo o chefe de policia e o director do Instituto,
expedirá instrucções para regular os casos omissos no presente
regulamento.
Palacio do Governo do Estado de São Paulo, 30 de Dezembro de 1902.
BERNARDINO DE CAMPOS.
BENTO BUENO.
Tabella a que se refere o Regulamento n. 1079 da presente data.
Palacio do Governo do Estado de São Paulo, 30 de Dezembro de 1902.
BERNARDINO DE CAMPOS.
BENTO BUENO.