DECRETO N.1.504, DE 26 DE AGOSTO DE 1907

Dá regulamento para o Hospicio e Colonia Agricola de Alienados de Juquery

O presidente do Estado de São Paulo, usando da attribuição que lhe confere o artigo 36 n. 2.° da Constituição, manda que seja observado o seguinte

REGULAMENTO

Do Hospicio e Colonia Agricola de Alienados de Juquery

CAPITULO I

DO HOSPICIO E COLONIA AGRICOLA

Artigo 1.º - O hospicio de Juquery, com a Colonia Agricola que o completa, destina-se a soccorrer os habitantes do Estado de São Paulo, que, por motivo de alienação mental, carecerem de tratamento.
Artigo 2.º - O estabelecimento de Juquery é immediatamente subordinado ao secretario de Estado dos Negocios do Interior e a sua superintendencia administrativa e scientifica, confiada a um medico especialista com o titulo do doutor.

CAPITULO II

DO PESSOAL

Artigo 3.º - O Hospicio e Colonia, Agricola terá o seguinte pessoal, nomeado por decreto do Governo :
Um director, medico especialista, sob cuja auctoridade estarão todos os funccionarios e empregados do estabelecimento ;
Um auxiliar do director ;
Um medico interno :
Um medico operador e gynecologista ;
Os medicos necessarios ao serviço na razão de um por 200 doentes ;
Um pharmaceutico ;
Um escrivão ;
Um amanuense ;
Um porteiro.

Paragrapho unico. - Terá tambem os seguintes empregados, contratados pelo director :
Um enfermeiro chefe ;
Uma enfermeira chefe ;
Um correio ;
Os enfermeiros, guardas, chefes de officinas, cosinheiros, serventes e jardineiros que forem necessarios ao serviço.

Artigo 4.º - O director, o auxiliar do director, o medico interno e o pharmaceutico deverão residir no estabelecimento. 
Tambem nelle residirão os empregado inferiores, excepto aquelles que apenas tiverem serviço durante o dia. Ao medico interno será permittido ausentar-se do estabelecimento um dia e uma noite por semana.

Secção I

DO DIRECTOR

Artigo 5.º - Ao director compete :

§ 1.º - Superintender administrativa e scientificamente todos os serviços do estabelecimento.

§ 1.º - Propor ao Governo a nomeação e exoneração do pessoal.

§ 3.º - Contractar o pessoal referido no artigo 3.° paragrapho unico.

§ 4.º - Assignar toda a correspondencia do estabelecimento.

§ 5.º - Rubricar todos os livros de escripturação do Hospicio e de suas dependencias.

§ 6.º - Resolver sobre a admissão dos enfermos e mandar proceder á matricula delles depois de satisfeitas as exigencias regulamentares, assim como determinar a distribuição delles pelas secções do Hospicio e a sua baixa quando curados ou removidos.

§ 7.º - Distribuir o serviço entre os empregados do Hospicio e suas dependencias e determinar-lhes as substituições nos casos de impedimentos temporarios.

§ 8.º - Cuidar dos fornecimentos ao Hospicio, examinando-os pessoalmente sob o ponto de vista das qualidades, assim como dos preços e do consumo.

§ 9.º - Providenciar sobre o enterramento dos enfermos fallecidos no Hospicio e na Colonia, de accôrdo com o disposto nos artigos 28 e 30 deste regulamento.

§ 10. - Prestar ás familias dos enfermos as informações por ellas solicitadas ou que forem de mistér e participar ás dos pensionistas o que de importante occorrer quanto a estes.

§ 11. - Organizar o orçamento annual das despesas e requisitar do Governo opportunamente as quantias destinadas á manutenção do estabelecimento, assim como recolher ao Thesouro do Estado a renda do estabelecimento, quando a houver.

§ 12. - Deteterminar, de accôrdo com as leis e com as ordens, do Governo, as despesas auctorizadas, fiscalizando o emprego das quantias recebidas e prestando dellas a devida conta.

§ 13. - Assignar as folhas de pagamento do pessoal, bem como os registros, certidões e demais documentos do Hospicio.

§ 14. - Encerrar diariamente o livro do ponto dos medicos e demais empregados.

§ 15. - Apresentar annualmente ao secretario de Estado dos Negocios do Interior, um relatorio scientifico e administrativo em que constem os factos mais importantes do estabelecimento, a receita e a despesa, os meios therapeuticos de melhores resultados verificados e os casos clínicos mais notaveis.

§ 16. - Velar pela observancia deste regulamento e propor ao governo tudo quanto se fizer necessario para o aperfeiçoamento do estabelecimento, não só na parte adminstrativa como na scientifica.

Secção II

DO AUXILIAR DO DIRECTOR

Artigo 6.º - Ao auxiliar do director compete :

§ 1.º - Zelar da dependencia colonial do Hospicio e dos doentes a elles confiados, distnbuindo-os no trabalho e cuidando de sua guarda, alimentação e vestuario, segundo as informações do director.

§ 2.º - Apresentar mensalmente ao director uma relação dos factos mães importantes da Colonia e dar-lhe parte immediata dos factos urgentes ocorridos na mesma.

§ 3.º - Manter em perfeita ordem os assentamentos da Colonia.

Secção III

DO ESCRIVÃO, AMANUENSE E PORTEIRO

Artigo 7.° - Ao escrivão compete :

§ 1º - Fazer com auxilio do amanuense toda a escripturação e correspondencia do estabelecimento, de accôrdo com as ordens do director.

§ 2.º - Processar as contas do estabelecimento e apresental-as ao director para serem remettidas á Secretaria do Interior.

§ 3.º - Guardar os livros e todos os documentos referentes ao estabelecimento.

§ 4.º - Passar certidões e mais documentos ordenados pelo director.

Artigo 8.º - O amanuense auxiliará o escrivão e executará os serviços de escripta que lhe forem determinados.
Artigo 9.º - O escrivão e o amanuense funccionarão diariamente das 10 horas da manhan ás 3 horas da tarde, salvo necessidade de maior serviço, reconhecida pelo director.
Artigo 10. - Ao porteiro incumbe expedir a correspondencia, fiscalizar a entrada e sahida do Hospício e manter a ordem no locutorio e nos corredores, de accôrdo com as instrucções do director.

Seçcão IV

DOS MEDICOS

Artigo 11.  - Aos medicos compete :

§ 1.º - Visitar todos os dias as respectivas secções e prescrever o tratamento a que devam ser submettidos os enfermos.

§ 2.º - Tomar, em livro especial, as notas clinicas referentes a cada doente

§ 3.º - Indicar, por escripto, ao director os doentes que careçam de cuidados cirurgicos bem como os que devam ser mudados de secção e o os que possam ter baixa do Hospicio.

§ 4.º - Examinar os doentes em observação e dar, no prazo de 15 dias, ao director, parecer escripto e circumstanciado sobre o estado dos mesmos, afim de serem ou não admittidos á matricula.

§ 5.º - Passar os attestados referentes aos doentes das respectivas secções e autopsiar-lhes os cadaveres, quando necessario. remettendo incontinenti ao director o competente relatorio para ser registrado.

§ 6.º - Colligir elementos para o relatorio annual do director e solicitar deste o que necessitarem para o bom desempenho dos seus deveres.

Artigo 12. - As analyses bio-chimicos exigidas para os diagnosticos serão feitas pelo medico que tiver os respectivos doentes a seu cuidado.
Artigo 13. - O medico cirurgião deverá visitar as enfermarias do Hospicio quatro vezes por semana e sempre que fôr exigido pelo serviço, effectuando as operações que se fizerem necessarias.
Artigo 14. - Ao medico interno incumbe fazer todo o serviço que se apresente em qualquer das secções do estabelecimento, quando o medico respectivo estiver ausente ; alem disso, terá uma secção do Hospício effectivamente sob seus cuidados medicos.

Secção V

DO PHARMACEUTICO

Artigo 15. - Ao pharmaceutico compete :

§ 1.º - Manter perfeito asseio e ordem na pharmacia.

§ 2.º - Preparar, com auxilio de um servente, todo o receituario do Hospício e auxiliar os medicos nas analyses do laboratorio.

§ 3.º - Apresentar ao director os pedidos de drogas e demais objectos para pharmacia.

§ 4.º - Receber e verificar o fornecimento para pharmacia e fazer o respectivo lançamento em livro especial.

DOS ENFERMEIROS CHEFES

Artigo 16. - Aos enfermeiros chefes incumbe :

§ 1.º - Observar continuamente os doentes á seu cargo, tomando nota de tudo que interesse ao tratamento dos mesmos.

§ 2.º - Assistir á distribuição dos remedios e das refeições.

§ 3.º - Soccorrer os enfermos que careçam de cuidados immediatos, recorrendo aos medicos ou director nos casos graves.

§ 4.º - Applicar o tratamento hydrotherapico prescripto pelos medicos, bem como os meios coercitivos permittidos.

§ 5.º - Apresentar diariamente ao director o numero de doentes em dieta, declarando as dietas indicadas pelos medicos.

§ 6.º - Prover a rouparia da secção a seu cargo, fiscalizando-lhe as entradas e sahidas.

§ 7.º - Manter inteira disciplina entre os enfermeiros e guardas do estabelecimento e absoluto asseio nas dependencias a seu cargo.

§ 8.º - Executar promptamente as instrucções que receberem dos medicos das secções e do director, para o bom desempenho dos seus deveres.

Secção VII

DOS EMPREGADOS INFERIORES

Artigo 17. - Os empregados inferiores cumprirão as ordens e executarão os serviços que lhes forem determinados pelos superiores.

Paragrapho unico. - Taes empregados usarão, quando em serviço, o uniforme que o director determinar.

CAPITULO III

DA ADMISSÃO DOS ENFERMOS

Artigo 18. - Todos os individuos que, por actos indicativos de alienação mental, tiverem de ser recolhidos ao Hospicio ahi darão entrada provisoria até ser verificada a alienação. A matricula será feita 15 dias depois da entrada, salvo caso de duvida ainda existente.
Artigo 19. - A admissão dos enfermos indigentes se dará por ordem do Secretario do interior ou á requisição do Secretario da Justiça e da Segurança Publica.
Artigo 20. - O doente deverá ser acompanhado de uma guia contendo o nome, edade, estado, sexo, filiação, côr, naturalidade e procedencia do mesmo, assim como de um attestado medico com a firma reconhecida.

Paragrapho unico. - Além dessa guia e do attestado medico, dependerá a admissão de um attestado da auctoridade local do doente provando a indigencia deste e a sua residencia no Estado de S. Paulo por seis mezes, pelo menos.

Artigo 21. - No caso de ser criminoso o doente a internar-se, deverá ser tambem acompanhado de uma guia da auctoridade competente, declarando a condição do mesmo.

Secção I

DOS ENFERMOS PENSIONISTAS

Artigo 22. - A admissão dos enfermos pensionistas será dada pelo director mediante requerimento com firma reconhecida, contendo o nome, edade, estado, sexo, filiação, côr, naturalidade, residencia e caracter physico dos mesmos.

Paragrapho unico. - Esse requerimento deverá ser acompanhado de um parecer, com firmas reconhecidas, assignado por dois medicos que houverem examinado o doente 15 dias, no maximo, antes da data da petição, bem como do recibo do pagamento no Thesouro do Estado correspondente á classe em que houver de ser admittido o enfermo.

Artigo 23. - São competentes para requerer a admissão de enfermos pensionistas :
a) O ascendente ou descendente ;
b) O conjuge ou irmão ;
c) O tutor ou curador
d) O chefe da corporação beneficente on religiosa a que o enfermo pertença.
Artigo 24. - Os enfermos pensionistas serão divididos em duas classes : na primeira pagarão a diaria de 10$000 e na segunda, a de 5$000.
Artigo 25. - Os enfermos de primeira classe terão quartos de dois leitos e alimentação especial ; os de segunda classe terão dormitorio commum e alimentação diversa da dos indigentes.
Artigo 26. - As diarias serão pagas no Thesouro do Estado, atecipadamente, por um ou mais trimestres.
Artigo 27. - O enfermo pensionista, cujo pagamento do diarias não for opportunamente, renovado no Thesouro do Estado, com a apresentação do respectivo recibo ao director do Hospicio, será desde logo tratado como indigente, com aviso á familia e á auctoridade policial da respectiva localidade, afim de ser por esta enviado o attestado de pobreza, que será archivado no Hospicio.

Paragrapho unico. - Caso o doente não seja indegente, o diretor do Hospicio officiará ao secretario do Interior, dando conta desse facto, afim de ser pelo Thesouro cobrada a respectiva pensão.

Artigo 28. - Para as despesas funerarias e embarque dos enfermos que fallecerem no Hospicio e suas dependencias, poderão os interessados, depositar previamente a quantia necessaria, da qual dará recibo o director do estabelecimento.

 Secção II

DA SAHIDA DOS EMFERMOS

Artigo 29. - A sabida dos enfermos, salvo os casos de alta ou fallecimento, dar-se-á á requisição das, auctoridades ou por pedido das pessoas competentes. A pessoa ou pessoas a quem for o enfermo restituido passarão delle ao director recibo circumstanciado.
Artigo 30. - Não havendo providencias em contrario, todos os enfermos fallecidos no Hospicio e suas dependencias serão enterrados no cemiterio particular do estabelecimento.

CAPITULO IV

DISPOSIÇÕES DIVERSAS

Artigo 31. - As visitas aos enfermos pensionistas serão permittidas todos os domingos e aos indigentes no primeiro domingo de cada mez, podendo o director vedar as visitas quando prejudiciaes aos doentes.

Paragrapho unico. - Não serão permitidas visitas ao estabelecimento sem consentimento especial do director.

Artigo 32. - Nenhuma correspondencia será permitida com os enfermos sem licença do director.
Artigo 33. - Haverá ho Hospicio e na Colonia Agricola trabalhos adequados á oftidão e ao tratamento de cada enfermo.
Artigo 34. - Os vencimentos dos empregados do Hospicio e Colonia Agricola de Alienados de Juquery serão os estabelecidos em lei.
Artigo 35. - Revogam-se as disposições em contrario.
Palacio do Governo do Estado de S. Paulo, 26 de Agosto do 1907.
JORGE TIBIRIÇÁ
GUSTAVO DE OLIVEIRA GODOY