DECRETO N. 6.022, DE 11 DE AGOSTO DE 1933

Revoga o decreto n. 5.886, de 20 de abril de 1933.

O GENERAL DE BRIGADA MANOEL DE CERQUEIRA DALTRO FILHO, Interventor Federal, Interin no Estado de São Paulo, usando das atribuições que lhe são conferidas pelo decreto federal n. 19.398, de 11 de novembro de 1930,

considerando que o decreto estadual n. 5.886, de 20 de abril do corrente ano, que modificou o decreto n. 5.797, de 11 de janeiro deste mesmo ano, autorizou os jogos de azar que enumera, - bacará, campista, cavalinhos, estrada de ferro, roleta (com 36 numeros um 0 e um 00) e trinta-quarenta, - em casinos de praias, de balnearios e de estações de aguas, desde que tais estabelecimentos satisfaçam os requisitos exigidos pelo referido decreto;

considerando, outrossim, que nele se permitiu o funcionamento de casas destinadas a jogos esportivos, patenteados até 0 de abril deste ano, limitadas as licenças ao maximo de seis nesta Capital, a uma unica nas demais cidades, excetuando-se a cidade de Santos, cujo numero fica a juizo do Chefe de Policia;

considerando que tambem esses jogos esportivos apenas disfarçam novas formas de jogos de azar, tanto mais perigosos, quanto, sob aparencias inocuas, proliferam no centro desta Capital, junto aos Bancos e aos grandes estabelecimentos comerciais;

considerando, pois, que tal decreto regulamenta jogos proibidos, o que equivale a reconhece-los como atos licitos;

considerando, porém, que o decreto nacional n. 19.398, de 11 de novembro de 1930, determina, no art. 4.°, que "continuam em vigor as Constituições Federal e Estaduais, as demais leis e decretos federais, assim como as posturas, deliberações e outros átos municipais, todos, porém, inclusive as proprias Constituições, sujeitos as modificações e restrições estabelecidas por esta lei ou por decretos ou átos ulteriores do Governo Provisorio ou de seus delegados na esfera de atribuições de cada um"; donde se segue que a Constituição Federal de 1891 se acha em vigor nas partes não alteradas pela legislação revolucionaria;

considerando que, entre os dispositivos não derrogados, figura o que atribue ao Congresso Nacional, cujas funções se acham, no regime ditatorial ora vigente, enfeixadas nas mãos do Chefe do Governo Provisorio, a competencia privativa para legislar sobre o direito civel, comercial e criminal da Republica; que, assim, o Codigo Penal continu'a a vigorar em todo o pais; e que, portanto, aos Governos dos Estados é vedado legislar contrariamente aos seus dispositivos; ora,

considerando que o Codigo Penal, nos arts. 369 e 370, define como contravenção, "ter casa de tavolagem, onde habitualmente se reunam pessoas, embora não paguem entrada, para jogar jogos de azar, ou estabelece-los em lugar frequentado pelo publico", e considera "jogos de azar aqueles em que o ganho e a perda dependem exclusivamente da sorte": e ;

considerando que o decreto estadual n. 5.886, de 20 de abril do corrente ano, é inconstitucional, devendo reputar-se, de acôrdo com os proprios termos que lhe servem de introdução, méra experiencia, que os fatos demonstraram ser profundamento nocivo aos bons costumes, á economia privada e ao desenvolvimento de virtudes de que depende o progresso individual, que é condição necessaria ao progresso coletivo;

considerando, com efeito, que o jogo produz o desenvolve o desamor ao trabalho, incita as más paixões e a preguiça, o espirito de aventura e os hábitos de dissipação; degrada o carater e enfraquece o lar, roubaiido-lho os chefes e os filhos, minando-lhe a economia;

Considerando, assim, que têm razão os que julgam de melhor alvitre combater sem éguas essa praga social; considerando que uma policia bem organizada e honesta póde perfeitamente reprimir com exito o jogo, maxlmé se for auxiliada por Uma campanha moral pela imprensa, pelas associações de fins religlosos - filantropicos, nas escolas, nos cinemas, nas conferencias publicas, etc;

considerando, portanto, que mais vale opor-se-lhe por todos oa modos do que entrar em composição legal com a corrupção, a pretexto de fiscaliza-la e circunscreve-la;
considerando ainda que, fundados em lei inquinada de vicio essencial, os atos governamentais expedidos em favor dos concessionarios de Jogos de azar são nulos pleno jure, nenhum direito conferem a este, pois não ha direitos adquiridos contra a Constituição, as leis e a conciencia jurídica da nação;

considerando que, por tudo o que acaba de ser sumariamente exposto, impõe-se, quanto antes, a revogação do decreto n. 5.886, passando a meteria de que se trata a ser disciplinada pela policia de costumes com o prudente arbitrio que as circunstancias aconselhem:

Decreta:

Artigo 1.º - Fica regovado o decreto n. 5.886, de 20 de abril do corrente ano.
Artigo 2.º - Este decreto entrará em vigor na data da sua publicação.
Palacio do Governo do Estado de São Paulo, 11 de agosto de 1933.

GENERAL MANOEL DE CERQUEIRA DALTRO FILHO

Carlos Villalva
José Mascarenha
A. Meirelles Reis Filho.

Publicado na Secretaria da Justiça e Segurança Publica em 11 de agosto de 1933.

Eurico M. Machado,
Diretor Geral substituto.