DECRETO Nº 57.439, DE 17 DE OUTUBRO DE 2011

Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem Patrimônio Cultural do Estado de São Paulo, cria o Programa Estadual do Patrimônio Imaterial e dá providências correlatas

GERALDO ALCKMIN, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no artigo 47, inciso III, e artigos 260 e 261 da Constituição do Estado de São Paulo, e artigo 23, incisos III a V da Constituição Federal, e tendo em vista a necessidade de especificar os procedimentos para identificação, reconhecimento e registro dos bens de natureza imaterial que compõem o patrimônio cultural paulista,
Decreta:

SEÇÃO I

Disposição Preliminar

Artigo 1º - Os bens de natureza imaterial que compõem o patrimônio cultural do Estado de São Paulo serão reconhecidos pelo Registro de Bens Culturais nos termos da legislação federal e estadual pertinentes, bem como na forma prevista neste decreto.
§ 1º - Constituem o patrimônio cultural imaterial do Estado de São Paulo, as formas de expressão e os modos de criar, fazer e viver, os conhecimentos e técnicas fundados na tradição, na transmissão entre gerações ou grupos, manifestadas individual ou coletivamente, portadores de referência à identidade, à ação, à memória como expressão de identidade cultural e social, tais como:
1. conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano de comunidades;
2. rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social;
3. manifestações orais, literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas;
4. espaços onde se concentrem e se reproduzem práticas culturais coletivas.
§ 2º - Os instrumentos, objetos, artefatos, lugares, elementos da natureza e demais suportes materiais que são associados às manifestações culturais imateriais paulistas, poderão ser objeto de registro desde que, obrigatoriamente, feito em conjunto com a prática cultural.

SEÇÃO II

Da Legitimidade para Solicitar

Artigo 2º - São legitimados para solicitar a instauração do processo de registro de bens de natureza imaterial:
I - os entes políticos, instituições ou entidades do Poder Público;
II - o Presidente ou os Conselheiros do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo - CONDEPHAAT;
III - as associações civis;
IV - os cidadãos.

SEÇÃO III

Do Procedimento Preliminar

Artigo 3º - A solicitação para início do procedimento preliminar para registro de bens culturais de natureza imaterial será dirigida ao Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT.
§ 1º - A solicitação será protocolada na Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico - UPPH, da Secretaria da Cultura, ou encaminhada por via postal a esse órgão.
§ 2º - Constituem informações que devem acompanhar a solicitação:
1. identificação do requerente;
2. justificativa do requerimento;
3. denominação e descrição sumária do bem proposto para Registro, com a indicação dos grupos sociais envolvidos, local, período e natureza da manifestação cultural;
4. informações históricas.
§ 3º - Constituem informações e documentos desejáveis para a instrução da solicitação:
1. documentação fotográfica e audiovisual disponível e adequada à natureza do bem;
2. referências documentais e bibliográficas disponíveis;
3. informação sobre a existência de proteção em nível federal ou municipal, se houver;
4. informações sobre a relevância do bem cultural para a memória estadual, identidade e formação da sociedade, sua continuidade histórica, seu enraizamento no cotidiano da comunidade e suas formas de transmissão direta ou indireta.
Artigo 4º - Recebida a solicitação, será proferida manifestação técnica que consiste na análise preliminar, não exaustiva, acerca da pertinência do registro do bem imaterial ou arquivamento da solicitação.
§ 1º - O legitimado poderá, se necessário, ser chamado para prestar informações para o desenvolvimento da manifestação técnica.
§ 2º - A manifestação técnica, nos casos de registro específico, previsto no inciso II do artigo 15 deste decreto, deverá incluir a obtenção de declaração formal dos representantes da comunidade produtora do bem ou de seus membros, expressando o interesse e anuência com a instauração do processo de Registro.
§ 3º - Constatada a não observância do § 2º do artigo 3º deste decreto, e a insuficiência dos elementos para conclusão da manifestação técnica, o legitimado será notificado a complementar a documentação no prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável mediante requerimento justificado, sob pena de arquivamento do pedido.
§ 4º - Após a manifestação técnica, o processo será encaminhado ao Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT.
Artigo 5º - O Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT encaminhará os autos ao Conselheiro Relator, que proferirá, no prazo de 30 (trinta) dias, voto sobre a abertura de processo de registro do bem imaterial ou arquivamento da solicitação.
§ 1º - O prazo estabelecido no “caput” deste decreto poderá ser prorrogado por igual período a critério do Presidente do CONDEPHAAT.
§ 2º - O voto será encaminhado ao Presidente do CONDEPHAAT, para inclusão em pauta, sem ultrapassar o mês subsequente, para deliberação sobre a abertura de processo de registro do bem imaterial ou de arquivamento da solicitação.
Artigo 6º - No caso de arquivamento, qualquer legitimado poderá solicitar nova manifestação técnica, desde que justificadamente e acompanhada de novos elementos de informação.
Parágrafo único - Requerido o desarquivamento e não se vislumbrando novos elementos, poderá a própria análise técnica decidir pela manutenção do arquivamento.
Artigo 7º - Constatada ao longo do processo que há interdependência entre o patrimônio cultural imaterial e o patrimônio cultural material e natural, poderá o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT decidir pela abertura de processo de estudo de tombamento visando conferir proteção a espaços, lugares, objetos, documentos e edificações onde se reproduzem ou que servem de suporte para as práticas culturais que se pretende o Registro.
Parágrafo único - Caso o processo de registro venha ser arquivado, e constatando-se que os bens ou áreas identificados no seu curso têm significado e relevância de forma independente, o processo de tombamento poderá ter prosseguimento.

SEÇÃO IV

Do Procedimento de Estudo de Registro

Artigo 8º - No caso de abertura de processo de registro, os autos serão submetidos à nova manifestação técnica, que emitirá parecer pelo registro do bem imaterial ou arquivamento do pedido.
Parágrafo único - Essa nova manifestação técnica será composta de estudo exaustivo, com descrição pormenorizada do bem imaterial que se pretende registrar, aprofundando os elementos revelados ao longo da fase preliminar, com parecer final indicando arquivamento ou registro, que poderá ser Universal ou Específico, conforme previsto no artigo 15 deste decreto.

Artigo 9º - O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT, através da Secretaria da Cultura, poderá contratar profissional ou entidade pública ou privada que detenha conhecimentos específicos sobre a matéria para auxiliar na instrução do processo de registro, obedecida a legislação de regência.
Artigo 10 - Os autos contendo manifestação técnica serão encaminhados ao Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT.
Artigo 11 - O Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT encaminhará os autos ao Conselheiro Relator que proferirá, no prazo de 30 (trinta) dias, voto sobre a conveniência do registro do bem imaterial ou o arquivamento da solicitação.
§ 1º - O prazo estabelecido no “caput” deste artigo poderá ser prorrogado por igual período a critério do Presidente do CONDEPHAAT.
§ 2º - O voto será encaminhado ao Presidente do CONDEPHAAT, para inclusão em pauta, sem ultrapassar o mês subsequente para deliberação final sobre a abertura de processo de registro do bem imaterial ou de arquivamento da solicitação.
§ 3º - A decisão do CONDEPHAAT será publicada no Diário Oficial do Estado e comunicada ao solicitante e demais interessados que vieram aos autos.
Artigo 12 - Qualquer interessado poderá oferecer recurso para o Secretário da Cultura, no prazo de 15 (quinze) dias contados da publicação no Diário Oficial do Estado, contra a decisão do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT.
Parágrafo único - O recurso deverá ser protocolado na Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico - UPPH, da Secretaria da Cultura, ou encaminhado, a esse órgão, por via postal com aviso de recebimento, sendo que, neste caso, será considerada a data de postagem para fins de verificação de tempestividade do pedido.
Artigo 13 - Decorrido o prazo de 15 (quinze) dias para recurso, os autos serão encaminhados ao Secretário da Cultura, que decidirá pelo registro do bem imaterial ou pelo indeferimento do pedido.

SEÇÃO V

Da Efetivação do Registro

Artigo 14 - O registro de bens culturais de natureza imaterial se efetiva por resolução do Secretário da Cultura publicada no Diário Oficial do Estado e posterior inscrição em um ou mais dos livros a que se refere o § 1º deste artigo contendo o processo a que se refere, breve descrição do bem e os instrumentos, artefatos e lugares que lhes estão associados.
§ 1º - Ficam criados os seguintes livros:
1. Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades;
2. Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social;
3. Livro de Registro das Formas de Expressão, onde serão inscritas manifestações orais, literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas;
4. Livro de Registro dos Lugares, onde serão inscritos os espaços onde se concentram e se reproduzem práticas culturais coletivas.
§ 2º - Será dada à inscrição do bem cultural ampla divulgação por meio impresso ou eletrônico a órgãos do poder público e entidades da sociedade civil que atuam na salvaguarda do patrimônio cultural imaterial, bem como àqueles indicados no § 3º do artigo 11 deste decreto.
§ 3º - A inscrição terá sempre como referência a continuidade histórica do bem e sua relevância para a memória estadual e para a identidade e a formação da sociedade.
§ 4º - Por determinação do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT outros livros de registro poderão ser abertos para a inscrição de bens culturais de natureza imaterial que constituam patrimônio cultural paulista e que não se enquadrem nos livros definidos no § 1º deste artigo.
§ 5º - Aos bens registrados será concedido o titulo de “Patrimônio Cultural do Estado de São Paulo”.
Artigo 15 - Dada a natureza difusa que o patrimônio cultural imaterial pode assumir serão admitidos dois tipos de registro:
I - Registro Universal: consiste no reconhecimento e valorização do bem cultural que se manifesta em diversos locais do Estado, com pequenas variações, mas com a mesma matriz;
II - Registro Específico: advém do Registro Universal e caracteriza-se pelo reconhecimento e valorização de manifestações específicas e particulares, por grupos ou indivíduos, do bem cultural universal.
Parágrafo único - Verificada a manifestação única do bem cultural, será admitido o Registro Específico sem a necessidade de haver o Registro Universal.

SEÇÃO VI

Da Guarda

Artigo 16 - Os processos de registro ficarão sob a guarda da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico - UPPH, da Secretaria da Cultura, permanecendo disponíveis para consulta.
Parágrafo único - Partes integrantes do processo de registro que sejam de interesse público, tais como manifestação técnica, estudos realizados, registros fotográficos, voto do Relator e outros, poderão ser disponibilizados no sítio do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT na rede mundial de computadores.

SEÇÃO VII

Da Proteção

Artigo 17 - Tendo conhecimento, a qualquer tempo, de indícios de exploração, utilização ou apropriação indevidos de elementos associados a bem cultural registrado, caberá ao Presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT dar ciência às partes, alertando sobre a necessidade de se observar a legislação aplicável à proteção dos direitos autorais e à propriedade intelectual.

SEÇÃO VIII

Da Reavaliação

Artigo 18 - O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT poderá, de ofício ou mediante solicitação de qualquer dos legitimados do artigo 2º deste decreto, fazer a reavaliação de bens registrados e decidir, motivadamente, pela revogação do título de “Patrimônio Cultural do Estado de São Paulo”.
§ 1º - Caberá ao Secretário Cultura a decisão final sobre a revogação do título “Patrimônio Cultural do Estado de São Paulo”.
§ 2º - Revogado o título, será mantido apenas o registro como referência cultural de seu tempo, com averbação da data de sua revogação.

SEÇÃO IX

Da Identificação de Bem Produzido Segundo Modo de Fazer Registrado

Artigo 19 - Fica instituído o selo de identificação, que indicará que determinado bem foi produzido de acordo com o modo de fazer registrado como bem cultural imaterial, visando a valorização e a proteção do conhecimento tradicional e manifestação cultural associados.
Parágrafo único - Resolução do Secretário da Cultura disporá sobre a criação e as hipóteses de utilização desse selo.

SEÇÃO X

Do Programa Estadual do Patrimônio Imaterial

Artigo 20 - Fica instituído, no âmbito da Secretaria da Cultura, o “Programa Estadual do Patrimônio Imaterial”, visando à implementação de política específica de inventário, referenciamento, valorização, plano de salvaguarda e estudo cientifico desse patrimônio.
Parágrafo único - Resolução do Secretário da Cultura estabelecerá as bases para o desenvolvimento do programa de que trata este artigo.

SEÇÃO XI

Do Título de “Mestre das Artes e Saberes da Cultura do Estado de São Paulo”

Artigo 21 - O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT recomendará ao Secretário Cultura a concessão do título de “Mestre das Artes e Saberes da Cultura do Estado de São Paulo” a personalidades consagradas por sua comunidade ou portadora de conhecimento excepcional e indispensável para a perpetuação da prática cultural.
Parágrafo único - O título a que se refere este artigo terá seu procedimento e requisitos para concessão regulamentados por Resolução do Secretário da Cultura.

SEÇÃO XII

Disposições Finais

Artigo 22 - Cabe à Secretaria Cultura e ao Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado - CONDEPHAAT promover a ampla divulgação e promoção do bem cultural registrado por meio de publicações impressas ou eletrônicas, exposições, vídeos e qualquer outro meio.
Artigo 23 - As despesas decorrentes da execução deste decreto correrão por conta de dotação orçamentária própria da Secretaria da Cultura.
Artigo 24 - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Palácio dos Bandeirantes, 17 de outubro de 2011
GERALDO ALCKMIN
Angelo Andréa Matarazzo
Secretário da Cultura
Sidney Estanislau Beraldo
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado na Casa Civil, aos 17 de outubro de 2011.