LEI N.32,  DE 18 DE MARÇO DE 1836

José Cesario de Miranda Ribeiro, Presidente etc.
Art. 1.° - Fica autorisado o presidente da provincia a conceder carta de privilegio exclusivo á companhia de Aguiar Viuva e filhos, Platt e Reidd, e em falta delles a outrem, para a factura de uma estrada de ferro debaixo das seguintes condições.
A companhia fará estradas de ferro, ou outras de mais moderna e perfeita invenção, ou canaes, ou uma e outra cousa apropriadas ao transito, de carros de vapor e barcos de vapor, ou outras maquinas igualmente de mais mederna e perfeita invenção para o transporte dos generos desde a villa de Santos até a villa da Constituição, Itú, ou Porto Feliz, "promptificando" em primeiro logar a communicação pela sobredicta maneira entre a cidade de S. Paulo e a villa de Santos, começando as precisas obras dentro do prazo de dois annos, e nesse mesmo declarando ao governo qual a direcção total da obra: os dois annos se contaráõ da data da lei da assembléa geral, que sanccionar as estipulações que dependem da approvação da mesma assembléa, e a companhia continuará no andamento das obras sem suspensão até se concluirem; de sorte que no prazo de seis annos da data da mencionada lei estará o transito prompto e verificado de Santos até S. Paulo, sem com tudo ficar privada a companhia de ir fazendo ao mesmo tempo as outras estradas para a villa da Constituição, Itú, ou Porto Feliz, a ficarem porem todas promptas dentro do prazo de dez annos contados da data da lei acima mencionada. Poderá com tudo a companhia abreviar este prazo, mas nunca espaçal-o. Não estando começada a obra dentro dos dois annos, ou não estando concluída até a cidade de S. Paulo dentro dos seis, ou até o ultimo ponto designado dentro dos dez annos, ficarão sem effeito as concessões autorisadas pela presente lei; o não poderá nesse caso exigir a companhia indemnisação alguma pelas despezas que tiver feito.
Art. 2.° - A companhia franqueará o conhecimento de todas e quaesquer maquinas de que se servir, processo de quaesquer trabalhos que verificar, e modelos de seus utencilios e ferramentas ás pessoas, que o governo da provincia ordenar, as quaes poderáõ assistir a todos os trabalhos para a factura da estrada pelo tempo que o mesmo governo determinar.
Art. 3.° - A companhia se obriga a conduzir á sua custa para esta provincia nos primeiros tres annos depois da concessão do privilegio ao menos tres mil colonos trabalhadores morigerados.
Art. 4.° - A companhia terá o privilegio exclusivo da empreza pelo espaço do quarenta annos, contados do dia em que ella der começo ao transporte dos generos desde a cidade de S. Paulo para o interior. Durante os quarenta annos do privilegio, não terá o governo ingerencia alguma em materias da companhia; findo porém aquelle prazo pertenceráõ ao mesmo governo todas as obras, e melhoramentos das vias de transporte, carros de vapor, e seus pertences, os edificios indispensaveis para o deposito dos generos, e administração dos transportes, devendo nessa época achar-se tudo em estado de continuar o mesmo transporte como dantes; pena de responder a companhia por seus bens.
Art. 5.° - Findo o sobredicto prazo de quarenta annos terá o governo a faculdade de comprar os barcos de vapor, fabricas, e mais pertences, que a companhia tiver, não incluidos no artigo antecedente, o que o governo julgar convenientes, pagando o importe á vista, ou em lettras sobre-o thesouro provincial a 12, 24, 36, e 48 mezes com o juro de 6 por cento ao anno. A avaliação será neste caso feita sem recurso por arbitros nomeados a aprasimento do governo, e da companhia.
Art. 6.° - Se a assembléa legislativa da provincia vir, que não convem á provincia a acquisição da empreza naquella época, declarará isso á companhia dois annos antes da espiração do seu privilegio; e em tal caso se prolongará o mesmo por mais três annos sem nova convenção, e somente com o onus que determina o art. 7.
Art. 7.° - Passados vinte annos, contados do primeiro transporte de generos, será a companhia obrigada a pagar annualmente ao governo por todo o tempo que durar o privilegio 20 por cento do rendimento liquido que ella perceber, o qual será empregado em beneficio das estradas adjacentes, o não se poderá dar outra applicaçâo á este redito sempre que as mesmas estradas delle precisem: este pagamento terá logar pela mesma fórma e tempo, em que se pagarem os dividendos aos accionistas. Tambem será a companhia obrigada a conduzir gratuitamente, e debaixo de sua responsabilidade as mallas do correio, e os fundos do governo, quando este exigir, e igualmente cargas que não excedão a dez arrobas, e duas pessoas por viagem, para os pontos que estiverem nas linhas de suas operações, mas isto só uma vez por dia. As cargas acima mencionadas só poderáõ ser de effeitos publicos, e as pessoas que forem mandadas em serviço publico.
Art. 8.° - Será permittido á companhia por todo o tempo que durar o seu privilegio, tirar dos terrenos particulares toda a pedra de ferro, que precisar para suas obras, levantando para isso as fabricas que quizer, indemnisando aos proprietarios pelas pedras de ferro de que se utilisar, e por todo e qualquer outro prejuizo que lhes causar.
Art. 9.° - Será licito á companhia entrar, salvas as formalidades das leis, em todos os terrenos, e agoas que forem de particulares por titulo, ou posse, e que se acharem na linha de suas operações, aproveital-os para o transito dos carros, e barcos de vapor, bem como poderá servir- se das madeiras, pedras, terra, ou cal, indemnisando aos proprietario. na fórma das leis.
Art. 10. - Os possuidores, e cultivadores dos terrenos, que forem concedidos á companhia, ficão livres do pagamento de dizimos, o mais impostos de producções pelo tempo de dez annos, a contar do dia em que se principie a transportar pelo novo caminho de S. Paulo a Santos: findo porém o mencionado prazo de dez annos, ficarão sugeitos nos impostos que pagão, ou pagarem os mais lavradores da provincia.
Art. 11. - Além de poder a companhia occupar terrenos de particulares para a construcção de estradas pontes, canaes, e diques, terá tambem igual direito para o estabelecimento de armazens de deposito, trapiches, e outros quaesquer edificios a bem de suas obras. O processo de indemnisação por motivo deste, e outros artigos desta lei, regular-se-ha pelas leis existentes.
Art. 12. - Ficaráõ pertencendo á companhia os mineraes ou producdos, que se acharem nas escavações, que fizerem por motivo das estradas, ou canaes, salvas as leis do imperio.
Art. 13. - Se os caminhos, ou canaes da companhia impedirem caminhos, ou canaes de serventia publica, ou particular, deverá ella substituil-os por outros caminhos, ou canaes de igual perfeição, quando não queira franquear os seus, os quaes será com tudo obrigada a franquer em quanto não fizer a substituição, Quando for necessario que uma estrada publica atravesse a da companhia, esta não o poderá obstar, com tanto que o seu transito não fique impedido.
Art. 14. - Um anno antes de se achar concluida a estrada de S. Paulo a Santos, a companhia, sob pena de perder o seu privilegio, organisará e publicará pela imprensa a tabella dos preços das conducções, e taxa de passagens entre aquelles dois pontos; os quaes jámais poderá augmentar além do minimo que cm qualquer tempo existir, mas sim diminuir: ficando ella obrigada a conduzir os generos, e franquear passagem entre S. Paulo, e qualquer das villas acima mencionadas, pelo menor preço por que, por igual distancia, em qualquer tempo o fizer entre S. Paulo e Santos; podendo porém a companhia estabelecer as barreiras, que julgar convenientes pala as suas cobranças, e requisitar o auxilio da força armada (caso seja preciso) para fazer respeitar o seu privilegio, a qual será paga á sua custa. A indemnisação terá logar, se por lei, acto, ou omissão do governo se não verificar a cobrança estipulada.
Art. 15. - O governo franqueará á companhia copia dos mappas, informações, e mais esclarecimentos que tiver, e ella exigir a bem dos trabalhos da empreza; e tambem a companhia, exigido que seja pelo governo, prestará a copia dos mappas, e plantas que tiver levantado dos sertões onde fizer quaesquer explorações em beneficio da mesma empreza.
Art. 16. - No caso em que por motivo de guerra externa, ou commoções na provincia se interrompão os precisos trabalhos da companhia, não correrá contra esta o prazo marcado no art. 1.° por todo o tempo em que esse obstaculo perdurar.
Art. 17. - O governo garante á companhia, e á todos os colonos, que ella importar para esta provincia, a sua liberdade civil e religiosa, e especial protecção não só á elles, como ás suas familias.
Art. 18. - A companhia não poderá possuir escravos, nem empregar em seus trabalhos africanos livres.
Art. 19. - Ficão revogadas todas as leis e disposições em contrario.