LEI N. 24, DE 30 DE MARÇO DE 1838.

O Dr.Venancio José Lisboa, Presidente etc. 

Art. 1.º - Fica auctorisado o presidente da provincia a conceder carta de previlegio exclusivo á companhia de Aguiar viuva, filhos, e companhia, e a Platte Reid para factura de uma estrada de ferro com as seguintes condições : - A companhia fará estradas de ferro, ou outras de mais perfeita e moderna invenção, ou canaes,e uma ou outra cousa, apropriados ao tranzito de carros de vapor, ou sem vapor puchados por animaes, e barcos de vapor,ou sem vapor puchados porem por barco de vapor, para o transporte dos generos e viajantes desde as villas de Santos até as de S. Carlos, Constituição,Itú ou Porto-feliz, ou para todas estas, como tambem desde a villa de Santos athé a de Mogy-das cruzes, podendo juntar o rio Parahyba ao do Tieté no primeiro ponto mais perto d'esta villa em que a companhia julgar possivel para a navegação de seus barcos, e a fim de poder a companhia dar transportes entre esta villa, a cidade de S. Paulo, e mais villas acima declaradas por canaes, rio, ou estradas : promptificando em primeiro lugar a communicação entre a cidade de S. Paulo e a villa de Santos, começando as resdectivas obras dentro do praso de tres annos, e neste mesmo declarando ao governo da provincia qual a direcção total das obras da empreza : estes tres annos se contarão da data da lei da assembléa geral que sanccionar as disposições desta, que dependerão da sua approvação, e a companhia continuará no andamento das ob as até se concluirem, de sorte que no prazo de sete annos da data da mencionada lei estará a estrada prompta, e o transito para o publico realisado entre a cidade de S. Paulo e a villa de Santos, sem com tudo ficar a companhia privada de ir fasendo ao mesmo tempo as outras vias de communicações: ficando porem ella obrigada a carregar para o publico de todos os outros pontos acima declarados dentro do prazo de doze annos, contados tambem da data da referida lei. Poderá contudo a companhia abreviar taes prazos; mas nunca espaçal-os ; e não estando começada a obra dentro do ditos tres annos, ou não estando concluida a estrada e realisado o transporte pata o publico da villa de Santos para a cidade de S. Paulo dentro dos sete, e em todos os outros pontos designados dentro dos doze annos, ficaráõ em qualquer destes casos sem of- feito as concessões auctorisadas pela presente lei; e não poderá neste caso a companhia exigir indemnisação alguma pelas despesas que tiver feito.
A estrada que a companhia fizer enfre a cidade de S. Paulo e o pico da serra que desce para Santos será sempre para carros de vapor; do pico da serra até abaixo da serra, e vice-versa, os transportes serão feitos por meio do machinas destinadas a fazel-os subir o descer ; o de baixo da serra até Santos por meio de carros de vapor, ou barcos de vapor, ou sem elle, puxados porem por barcos de vapor.
Nos mais pontos porem poderá a companhia deixar de uza carros de vapor; e não lhe fica nelles prohibido faser em conformidade com o que acima fica dito em qualquer outro período de seu privilegio, mudança no seu systema de caminhos, mas somente para dar transporte entre a cidade de S. Paulo e villas expressamente marcadas neste artigo, sendo-lhe licito fazer estradas para vapor onde no principio fizer estrada de ferro para carros puxados por animaes ; e mudar o transito que principiar por terra para rio ou canal, e destes para terra.
Art. 2.º - A companhia franqueará o conhecimento de todas e quaesquer machina de que se servir, processo de quaesquer trabalhos que verificar, e modelos de seus utensílios e ferramentas ás pessoas que o governo da provincia ordenar, as quaes poderão assistir a todos os trabalhos para a factura da estrada pelo tempo que o mesmo governo determinar.
Art. 3.º - A companhia se obriga a conduzir a sua custa nos primeiros dez annos, depois da concessão do privilegio, ao menos tres mil colonos trabalhadores morigerados.
Art. 4.º - A companhia terá o privilegio exclusivo desta empreza pelo espaço de quarenta annos contados do dia em que dér começo a transportes para o publico da cidade de S. Paulo por suas vias de communicação para qualquer das villas de S. Carlos, Constituição, Itú, e Porto-feliz. Durante os ditos quarenta annos não terá o governo ingerencia alguma em materias da companhia ; findo porem este prazo pertencerão ao mesmo governo todas as estradas e outras vias de transportes da companhia; bem como as maquinas estacionadas que lhes estiverem annexas destinadas para faser subir e descer, ou puxar os transportes de um para outro ponto, os carros de va- por e seus pertences ; os carros e barcos sem vapor : devendo nessa epocha achar-se tudo isto em estado de continuar bem no mesmo transporte como d'antes, pena ele responder a companhia por seus bens.
Art. 5.º - Findo tambem o sobredito prazo de quarenta annos terá tambem o governo a faculdade de comprar tudo ou parte dos demais pertences da companhia empregados no manejo dos transportes não incluidos no art. precedente, e que o governo julgar conveniente ; pagando este o importe á vista, ou em letras sobre o thesouro provincial a 12, 24, 36, e 48 mezes com juros de 6 por cento ao anno. A avaliação de taes objectos será feita sem recurso por arbritros nomeados a aprazimento do governo e da companhia.
Art. 6.º - Se a assemblèa legislativa da provincia vir que não comem á provincia a acquisição da empreza naquella epocha, declarará isto a companhia dois annos antes da expiração de seu privilegio, c em tal caso se prolongará o mesmo por mais seis annos sem nova convenção, e somente com o onus que determina o art. seguinte :
Art. 7.º - Passados vinte annos contados do primeiro transporte para o publico, será a companhia obrigada a pagar annualmente ao governo 10 por cento elo rendimento liquido que ella perceber desta empreza até verificar-se o primeiro transporte para o publico por vias de communicações que tenha estabelecido para qualquer das villas de S. Carlos, Constituição, Itú, e Porto-feliz; e d'ahi em diante, e por todo o tempo que durar o seu privilegio, será ella obrigada a pagar annualmente 20 por cento do dito rendimento liquido, o qual será empregado em beneficio das estradas adjacentes, e não se poderá dar outra aplicação a este redito sempre que as mesmas estradas delle precisem.
Este pagamento terá lugar pela mesma forma e tempo em que se pagarem os dividendos aos accionistas da companhia. Tambem será a companhia obrigada a condusir gratuitamente e debaixo da sua responsabilidade as maltas do correio e fundos do governo, quando este o exigir, e igualmente cargas, mas que não excedão em tudo a dez arrobas e duas pessoas por viagem para os pontos que estiverem nas linhas das suas operações, mas isto só uma vez por dia, e quando a companhia tranportar por estes pontos outras cargas ou pessoas. As cargas acima mencionadas só poderão ter de effeitos publicos, e as pessoas as que forem mandadas em serviço publico.
Art. 8.º - Será permittido a companhia por todo o tempo que durar o seu privilegio tirar toda a pedra de ferro que precisar para a execução de suas obras onde ella for encontrada, levantando para isso as fabricas que quizer, mesmo em terreno dos particulares, indemnisando-os pelas pedras de ferro que tirar de seus terrenos, e pelos mais prejuízos que soffrerem.
Art. 9.º - Será licito a companhia entrar, salvas as formalidades das leis, em todos os terrenos e aguas que se acharem nas linhas de suas operações, e aproveital-os para poder verificar os seus transportes, bem como poderá servir-se das madeiras, pedra, ou cal que cxtrahir do terreno que, sendo de particulares por titulo ou posse, dará lugar a competente indemnisação.
Art. 10. - Os possuidores e cultivadores de todos os terrenos cedidos por esta lei á companhia ficão livres uma vez que se prove serem colonos introduzidos pela companhia na povincia do pagamento dos dizimos e mais impostos de producção pelo espaço de vinte annos contados do dia em que a companhia principiar a transportar pelo caminho de S. Paulo para qualquer das villas de S. Carlos, Constituição, Itú, e Porto-feliz ; findo porem este praso, ficarão subjeitos á todos os impostos como os mais lavradores da provincia.
Art. 11. - Alem de poder a companhia occupar terrenos de particulares para a construcção de estradas, pontes, canaes, e diques, terá tambem igual direito para o estabelecimento de armazens de depositos, trapiches, e outros quaesquer edificios a bem de suas obras. O processo de indemnisação por motivos deste e outros artigos desta lei regular-se-ha pelas leis existentes.
Art. 12. - Se os caminhos ou canaes da companhia impedirem caminhos ou canaes de serventia publica ou particular, deverá ella substitnil-os por outros caminhos ou canaes de igual perfeição, quando não quizer franquear os seus, os quaes com tudo será obrigada a franquear em quanto não fizer a substituição. Quando for necessario que uma estrada publica ou canal publico atravesse a da companhia, esta não poderá obstar, com tanto que o seu transito não fique impedido por tempo algum. Sendo porem a obra no ponto do cruzamento das estradas ou canaes da companhia, e do governo, feita pela maneira que indicar o principal engenheiro della, mas sempre no logar que o governo designar: sendo ella obrigada a executar a obra se o governo quizer, o qual a indemnisará logo depois de concluida a obra; e não se effeituando tal pagamento, ella se indemnisará por meio do tributo estabelecido no art. 7.º desta lei, vencendo juros compostos na razão de 6 por cento ao anno, da quantia que se lhe estiver devendo. Qualquer municipio ou particular terá tambem direito de cruzar as estradas e canaes da companhia com os seus caminhos e canaes, e de exigir que ella execute a obra na forma acima : esta porem poderá exigir, a fim de segurar o seu embolço, que previamente se deposite nas mãos do seu thesoureiro o dinheiro, que pelo calculo de seu engenheiro se houver de díspender, ou se afiance ideneamente o seu pagamento.
Art. 13. - Um anno antes de se achar concluida a estrada de S. Paulo a Santos, a companhia, sob pena de perder o teu privilegio, organisará publicará pela imprensa a tabella dos preços das conduções e das passagens entre aquelles dois pontos ; os quaes jamais poderá augmentar alem do mínimo que em qualquer tempo existir, mas sim diminuir ; ficando ella obrigada a conduzir os generos, e franquear passagem entre S. Paulo e qualquer das outras villas designadas no art. 1.º pelo menor preço porque por igual distancia em qualquer tempo fizer entre S. Paulo e Santos, podendo porem a companhia estabelecer as barreiras que julgar convenientes para suas cobranças, e requisitar o auxilio da força armada, caso seja preciso, para fazer respeitar o seu privilegio, a qual será paga á sua custa. A indemnisação terá logar se por lei, acto, ou omissão do governo se não verificar a cobrança estipulada. Os preços de que trata a tabella acima serão marcados em moeda brasileira de prata, na qual deveráõ ser pagos por quem exigir o transporte ou passagem, sondo com tudo licito a estes pagarem-o em qualquer outra moeda brasileira, que pela lei corra nesta provincia, porem segundo o agio que houver entre esta, e aquella: agio que será indicado em uma tabella que a companhia fica obrigada a apresentar no principio de cada mez, e que terá vigor por todo elle, e será verificado por dois arbitros, um do governo, e outro da com- panhia, que para isso tomarão o termo medio do agio das sob editas moedas nos primeiros quinze dias do mez preterito.
Art. 14. - O governo franqueará á companhia copia dos mappas, informações, e mais esclarecimentos que tiver, e ella exigir a bem dos trabalhos da empreza; e tambem a companhia, exigido que seja pelo governo, prestará a copia dos mappas, e plantas que tiver levantado dos sertões, onde fizer quaesquer explorações em beneficio da mesma empreza.
Art. 15. - No caso cm que por motivo de guerra externa, ou commoções na provincia se interrompão os precisos trabalhos da companhia, não correrá contra esta o prazo marcado no artigo 1.º por todo o tempo, em que esses obstaculos perdurarem.
Art. 16. - O governo garante á companhia, e a todos os colonos que ella importar para esta provincia, a sua liberdade civil e religiosa, e especial protecção não só a elles, como ás suas famílias.
Art. 17. - A companhia não poderá possuir escravos,nem empregar africanos livres, mas poderá alugar escravos.
Art. 18. - Ficão revogadas todas as leis, e disposições em contrario.