LEI N. 9

O Doutor João Theodoro Xavier, Presidente da Província de S. Paulo, etc., etc, etc. Faço saber a todos os seus habitantes, que a Assembléa Legislativa Provincial decretou, e eu sanccionei, a seguinte Lei:

SECÇÃO I

Art. 1.º - O ensino primario é obrigatorio para todos os menores de 7 a 14 annos do sexo masculino, e 7 a 11 do sexo feminino, que residirem dentro de Cidade ou Villa em que houver escola publica ou particular subsidiada, não tendo elles impossibilidade physica ou moral.
Art. 2.º - Antes da idade determinada nesta Lei, só poderão os menores deixar a escola se forem julgados habilitados em exame publico.
Art. 3.º - Fica creado em cada Municipio, onde fôr obrigatoria a instrucção primaria, um - Conselho de Instrucção- composto do inspector do Districto, Presidente da Camara Municipal e um cidadão nomeado pelo Presidente da Provincia, que tambem designara seu substituto.
Art. 4.º - Ao Conselho de Instrucção incumbe:
§ 1.º - Organisar uma lista de todos os menores (existentes dentro da Cidade ou Villa) nss condições do art. 1º, em declaração dos nomes, idades, nacionalidades, filiações, os graus de instrucção que possuem, escolas que frequentão, se orphãos pobres ou filhos de pais indigentes.
§ 2.º - Organisada a lista, affixar editaes nos lugares mais publicos da Cidade ou Villa e publical-os pela imprensa, se houver, por espaço de trinta dias, a contar de 1º de Dezembro de cada anno, para que os pais, tutores ou patronos cumprão o preceito do art. 1º.
§ 3.º - Impor aos pais, tutores ou patronos a multa de 10$000, podendo ser repetida e argumentada até 50$000 em caso de reincidencia, se findo o prazo do paragrapho antecedente, não mandarem á escola os menores sob sua guarda ou não ministrarem-lhes por qualquer modo a instrucção primaria, nem apresentarem razões justificativas da omissão.
Para a repetição da pena de multa ao mesmo infractor deve ser esperado o prazo de um mez, e da imposição da multa haverá recuso para o Presidente da Provincia, dentro dos dez dias da sua comminação,
§ 4.º - Julgar dos motivos das faltas dos alumnos, e, quando não julgal-as justificadas, admoestar aos pais, tutores ou patronos, impondo-lhes na reincidencia a multa de 500 réis a 1$000 por falta.
§ 5.º - Verificar o estado de pobreza dos menores, com recurso para o Presidente da Provincia.
§ 6.º - Inspecionar, por meio de seus membros, as aulas das escolas publicas e presidir nos exames finaes.
§ 7.º - Examinar o livro da matricula dos alumnos cargo dos Professores, impondo a estes a multa de 10$000 a 2$000, quando não conforme com o que preceitúa o Regulamento de 18 de Abril de 1869.
§ 8.º - Promover. por todos os modos, o desenvolvimento da instruccão primaria.
Art. 5.º - Os orphãos, ou filhos-familias pobres, reconhecidos como taes a juizo do Conselho de Instrucção, receberão do Governo Provicial, por intermedio do Inspector Geral. os objectos indispensaveis para o estudo, isto é, livros, papel, penna e tinta.
Art. 6.º - O ensino da religião catholica apostolica romana será obrigatorio, nas escolas publicas, para os menores cujos pais professarem essa religião.
Art. 7.º - O Presidente da Provincia providenciara sobre a arrecadação das multas impostas por esta Lei.

SECCÃO II

Art. 8.º - § 1.º - Fica creada, nesta Capital, uma Escola Normal, para o fim de habilitar os individuos que se destinarem ao magisterio da instrucção primaria.
§ 2.º - O curso da Escola Normal será de dous annos e illimitado o numero dos alumnos.
§ 3.º - Só poderão matricular-se nesta escola os individuos maiores de 16 annos, que saibão ler, escrever e contar, de moralidade notoria e que não soffrão molestias contagiosas, nem tenhão defeitos que os inhabilitem pora o magisterio.
§ 4.º - Abrir-se-ha a matricula no dia 1° de Janeiro, terminando no dia 15 do mesmo mez. Os candidatos á admissão que não forem professores Publicos ou reconhecidamente pobres, pagarão annualmente a quantia de 10$000 na Secretaria da Inspectoria Geral da Instrucção Publica, sendo o producto desta taxa recolhido ao Thesouro Provincial,
§ 5.º - As materias do ensino constarão do seguinte.
1º Cadeira: Linguas nacional e franceza, calligraphia, doutrina christã, arithmetica, inclusive systema metrico, methodica e pedagogia, com exercicos praticos nas escolas publicas da Capital.
2.º Cadeira: Elementos de cosmographia e geographia. especialmente do Brasil, e noções de historia sagrada e universal, especialmente do Brasil.
§ 6.º - Os trabalhos da Escola Normal começarão a 15 de Janeiro, finalisando a 15 de Novembro.
§ 7.º - Para cada cadeira da Escola Normal haverá um Professor, sendo o provimento feito pelo Presidente da Provincia, por concurso.
§ 8.º - São habilitações para o concurso de Professor da escola: os grãos scientifincos conferidos pelas faculdades de direito, de medicina, do mathematicas, de bellas-letras, pelo Imperial collegio de Pedro II, por quaesquer academias estrangeiras, ordens de presbytero ou approvações plenas das materias constitutivas do curso normal.
§ 9.º - A direcção superior da Escola Normal compete ao Inspector Geral da Instrucção Publica, que será o órgão de suas relações com o Presidente da Provincia, no que respeitar ao regimen do estabelecimento e regularidade do ensino.
§ 10. - No caso de vaga ou impedimentos dos Professores por qualquer motivo, as cadeiras da Escola Normal serão immediatamente preenchidas por nomeação provisoria do Presidente da Provincia. O substituto recebera dous terços dos vencimentos do Professor substituido.
§ 11. - Findos os dous annos de frequeneia no curso da Escola Normal, o alumno, que fôr approvado em todas as materias, recebera um diploma ou certificado de habilitação para professor publico, independentemente de concurso.Este certificado será assignado pelo Inspector Geral e pelos Professores da escola.
§ 12. - Os Professores da Escola Normal terão annualmente 1:000$000 de ordenado, e 500$000 de gratificação: esta só lhes será prestada quando em effectivo exercicio.
§ 13. - Ficão extensivos aos Professores da Escola Normal os mesmos direitos o vantagens concedidos aos Professores Publicos, bem assim sujeitos ás penas comnminadas a estes no Regulamento de 1869, com as restricções no mesmo declaradas.
§ 14. - Os Professores Publicos actuaes poderão matricular-se na Escola Normal, garantindo-lhes a Provincia os seus ordenados por dous annos.
§ 15. - O Professor Publico vitalicio, matriculado na Escola Normal, que não revelar aptidão para o magisterio, será jubilado na fórma da Lei, com os vencimentos correspondentes ao tempo de serviço; os interinos, porém, serão demittidos,salvo porém se contarem vinte annos de magisterio; neste caso, tambem terão a jubilação proporcional ao tempo do serviço.
Art. 9.º - Serão desde logo considerados vitalicios os alumnos da Escola Normal que, obtendo certificado de habilitação, forem providos nas cadeiras.
§ unico. - Estes Professores terão, além dos actuaes vencimentos, uma gratificação annual de 200$000.

SECÇAO III

Art. 10. - Fica revogado o art. 3° da Lei n. 34 de 16 de Março de 1816, e o Presidente da Provincia sem autorisação para crear provisoriamente escolas de primeiras letras.
Art. 11. - O Presidente da Provincia, na Capital, e os Inspectores de Districto, no interior, designarão os lugares em que os Professores Publicos funccionarão com suas escolas.
Art. 12. - Logo que funccionar a Escola Normal, só poderão ser providos nas cadeiras vagas e nas que forem creadas, os individuos que, em concurso, forem approvados nas materias ensinadas na dita escola, tendo frequentado pelo menos tres mezes suas aulas praticas.
Art. 13. - Os Professores Publicos apresentarão, no fim de cada mez, ao Inspector de Districto, um mappa dos alumnos matriculados em suas escolas, com declaração dos frequentes, suas idades, filiações, numero e faltas e a razão dellas, e só á vista deste mappa e abaixo delle, veriticada a frequencia de vinte alumnos, deverá o Inspector de Districto passar o respectivo attestado.
§ 1.º - Não é permittido ao Thesouro, Collectorias, Mesas de Rendas ou quaesquer outras repartições de fazenda, effectuar o pagamento dos Professores, sem que estes apresentem o attestado do Inspector do Districto sob o mappa a que se retire o artigo antecedente, do qual conste a frequencia de vinte almnnos
§ 2.º - Pela infracção do paragrapho antecedente, além de incorrer em responsabilidade, o exactor provincial perderá a quantia indevidamente paga, que não será abonada em suas contas.
Art. 14. - Os Professores particulares e os Directores de collegios, o bem da estatistica, são obrigados a remetter, no fim de cada anno, ao Inspector Geral da Instrução Publica, um mappa contendo o numero de alumnos matriculados e frequentes, suas idades, gráos de aproveitamento e materias que aprendem. Pela infracção incorrerão na multa de 50$000.
Art. 15. - Não e permittida a permuta de cadeiras entre os Professores Publicos, salvo consentindo nella o inspector do Districto e Presidente da Camara de cada uma das sédes das respectivas escolas.
Art. 16. - O Presidente da Provincia expedirá os necessarios regulamentos para perfeita execcução desta Lei.
Art. 17. - Ficão revogadas as disposições em contrario
Mando, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumprão e fação cumprir tão inteiramente como nella se contém
O Secretario desta Provincia a faça imprimir, publicar e correr.
Dada no Palacio do Governo de S. Paulo, aos vinte e dous dias do mez de Marco de mil oitocentos setenta e quatro.
(L.S.) 

JOÃO THEODORO XAVIER.

Carta de Lei pela qual V. Exc. manda executar o Decreto da Assembléa Legislativa Provincial, que houve por bem sanccionar, estabelecendo o ensino primario obrigatorio para todos os menores de 7 a 14 annos do sexo masculino, e 7 a 11 do sexo feminino, como acima se declara.

Para V.Exc. vêr, Lourenço Domingues Martins a fez

Publicada na Secretaria do Governo de S, Paulo, aos vinte e dous dias do mez de Março de mil oitocentos setenta e quatro.

José Joaquim Cardoso de Mello.