LEI N.2.038, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1924 (1)

Dispõe sobre construcção e acquisição de casas para funccionarios publicos

O doutor Carlos de Campos, Presidente do Estado de São Paulo,
Faço saber que o Congresso Legislativo decretou e eu promulgo a lei seguinte:

Artigo 1.º - As Caixas Beneficentes dos Funccionarios Publicos e da Força Publica do Estado poderão contractar a construcção ou a acquisição de casas, na capital ou no interior do Estado, designadas á morada dos funccionarios publicos e dos officiaes da Força Publica que quizerem gosar desse favor, nos termos e mediante as condições estabelecidas na presente lei.
Artigo 2.º - O valor da divida não poderá exceder ao do peculio que compete ao funccionario civil, e quanto aos militares não poderá exceder, para um coronel, da quantia de 30.000$000; para um tenente-coronel, de 25.000$000; para um major, de 20:000$000; para um capitão, de 15:000$000; para um primeiro tenente, de 12:000$000 e para um segundo tenente, de 10.000$000.
Artigo 3.º - Cada funccionario ou official só poderá adquirir ou construir em predio, e aquelle que já o possuir não poderá gosar das vantagens desta lei. 

Paragrapho unico - O funccionario ou official que já possuir um predio, poderá fazer emprestimo para reparar, ampliar ou desembaraçar de qualquer onus o predio da sua propriedade, ficando este sujeito as condições estabelecidas na presente lei.
Artigo 4.º - Para os fins previstos no artigo 1º exclusivamente, fica o governo autorizado a emprestar a cada uma das Caixas Beneficentes, a que se refere o artigo 1º, a juros de seis por canto (6%) ao anno, e á medida da suas necessidades, por deficiencia de fundos proprios, até á quantia de dois mil contas de réis (2.000:000$000) mediante as garantias estabelecidas no artigo 10 e as que forem determinadas em regulamento. Outrosim, poderá, si preferir, e mediante cessão dos direitas e garantias desta lei, autorizar empresas idoneas a realizar o referido emprestimo, para o fim determinado e em identicas condições.
Artigo 5.º - A duração do contracto será, no maximo, de doze annos, exceptuados os casos previstos no artigo 12.
Artigo 6.º - O funccionario ou official a quem forem concedidos os favores da presente lei ficará sujeito ao pagamento de juros de 8% ao anno sobre o capital emprestado.
Artigo 7.º - O capital, accrescido dos juros vencidos, será restituido á Caixa respectiva, em prestações mensaes eguases, descontadas em folha do pagamento na repartição competente, dos vencimentos mensaes dos devedores.
Artigo 8.º - Ao funccionario ou official será facultado o pagamento adeantado de qualquer importancia.
Artigo 9.º - Para gosar dos favores da presente lei, exigir-se-á que o funccionario ou official possua, livre de quaesquer onus, o terreno, cujo valor não deverá ser inferior a um decimo do valor do contracto. 

Paragrapho unico. - A Caixa facilitará a aquisição do terreno, mas sómente depois de pago integralmente este é que o funccionarío ou official poderá pedir a construcção da essa. 
Artigo 10. - Como garantia do capital effectivamente empregado, serão as casas adquiridas ou construídas, bem como os terrenos adquiridos, dados em hypotheca unica á Caixa respectiva, a qual, por sua vez, e no mesmo instrumento, a transferirá ao Estado, ou empresa, a que se refere o artigo 4°, até á extincção das dividas respectivas,
Artigo 11. - O funccionario ou official se obrigará a segurar contra o fogo, em companhia idonea, a juizo do governo a essa adquirida ou construida durante a vigencia da divida. A entrega da casa dependerá da apresentação da respectiva apolice, que deverá ser exhibida dentro de um mez a contar da conclusão dias obras.
Artigo 12. - Si, na vigencia do contracto, o funccionario ou official deixar o serviço publico, se observará o seguinte:
a) Si se aposentar ou reformar, será apurado o valor actual da divida e prorogado o contracto, de sorte que, aposentado ou reformado, venha a pagar uma mensalidade aquivalente a dois terços, do que até então pagava, até completa extincção da divida;
b) Si deixar o cargo, por ter sido considerado em disponibilidade por invalidez, o restante devido, prorogado o contracto na fórma da letra a), deste artigo, poderá ser pago á razão de metade da prestação a que até então era obrigado;
c) Si deixar o cargo e continuar a contribuir para a Caixa, o valor da contribuição mensal será o mesmo a que era obrigado quando em actividade, e, neste caso, o pagamento da prestação não poderá ser retardado por mais de dois mezes, e si tal suceder, pagará os juros da móra, á razão da doze por cento ao anno, e, si exceder de quatro mezes, se considerará vencido o total da divida, dando direito á Caixa a proceder á respectiva cobrança, nos temos da lei hypothecaria;
d) O funccionario ou oficial, já nomeado por occasião da publicação da presente lei, que deixar o cargo e não continuar a fazer parte da Caixa Beneficente, sujeitar-se-á, entretanto, a liquidar a divida dentro dos cinco annos seguites á exoneração, si esta se der dentro dos sete annos seguintes á vigencia desta lei, e o funccionario ou official tiver contribuido, no minimo, durante quatro annos, para a Caixa. Fóra deste prazo, a exoneração importa no vencimento da divida, si o fuuccionario ou official não requerer, dentro de dois mezes, a contar da publicação da exoneração no Diario Official, a sua continuação como contribuinte;
e) Caso deixe o cargo por abandono, ou om virtude de sentença passada em julgado, se reputarão vencidas e exigiveis todas as demais prestações, na fórma da lei hypothecaria, seis mezes depois da data da publicação da sentença passada em julgado, ou da do decreto de demissão.
Artigo 13. - Si, por motivo de licença sem vencimentos ou outro não fôr possivel effecctuar-se o desconto de que trata o artigo 7° da presente lei, o funccionario ou official será obrigado a recolher a importancia devida, mediante guia do encarregado da escripturação das operações das respectivas Caixas Beneficentes. Tratando-se, porém, de molestia attestada por inspector sanitario, medico militar na Força Publica, ou outro designado pelo Secretario da Fazenda, poderá este, attentas as circumstancias especiaes do caso e os fins da presente lei, conceder razoavel prazo para a indemnização das prestações devidas.
Artigo 14. - O funccionario ou official nomeado depois da publicação desta lei só após quatro annos de exercicio effectivo do cargo poderá gosar das regalias por ella instituidas, e egual periodo se exigirá ao nomeado antes della, contado porém, da data da nomeação.
Artigo 15. - Terão preferencia nos contractos os funccionarios ou officiaes em exercicio na época da creação das respectivas Caixas Baneficentes, e dentre elles, se observará a ordem seguinte: 1°, os casados, ou viuvos, com filhos e que mantiverem as suas familias; 2º, os casados sem filhos e que viverem em companhia da sua consorte; 3°, os demais funccionarios em actividade; 4°, os aposentados ou reformados.
Paragrapho unico. - Para os effeitos da presente lei, os pretendentes requererão o contracto ao secretario da Fazenda, os civis; por intermedio do secretario da Justiça, os militares, nos mezes de Junho e Dezembro de cada anno, não sendo admittido requerimento algum fóra destes mezes.
Artigo 16. - A amortização ao Estado será feita na primeira quinzena de cada semestre, na qual serão assignadas as propostas a que se refere o paragrapho unico do artigo anterior, e o prazo para extincção de cada emprestimo feito pelo Estado, ou empreza, á Caixa será de doze annos, no maximo, e dividido em séries, conforme se determinar em regulamento.
Artigo 17. - As casas construídas em virtude da presente lei ficam isentas de quaesquer taxas e impostos estaduaes e municipaes,emquanto durarem os respectivos comtractos, ficando, tambem, isentos de impostos os respectivos contractos de contrucção e bem assim a agua despendida na mesma, e o capital empregado pela Caixa ou empresa.
Paragrapho unico. - Cessarão os favores deste artigo, logo que se extinguir o contracto. Outrosim, não se applicarão mais esses favores aos funccionarios ou officiaes que, por qualquer motivo deixarem o serviço publico.
Artigo 18. - Liquidado o contracto, será dado pela Caixa ao funccionario ou official o recibo de quitação geral, á vista do qual se fará a competente baixa no registo de hypotheca.
Artigo 19. - A casa assim adquirida ou construída será impenhoravel, e passando, ipse jure, a constituir o Bem da Familia (homestead) nos termos dos arts. 70 a 73 do Codigo Civil, será como tal inscripta no registo publico respectivo.
Artigo 20 - Si sobrevier o fallecimento do funccionario civil que tenha ajustado a acquisição ou construcção de um predio antes de sua liquidação final, deduzir-se-ão de seu peculio as prestações devidas.
Paragrapho unico. - Si o fallecimento fôr de offcial da Força Publica, a viuva ou herdeiros poderão optar por uma das seguintes situações:
a) Continuar a pagar as quotas restantes, mediante uma renovação de contracto, em prestações que não sejam superiores á metade da pensão;
b) transferir, com licença prévia do governo, a outro official ainda não aquinhoado com moradia, a hypotheca do immovel pelo saldo que restar para amortização total da divida, restituindo-lhe este as prestações já pagas;
c) alugar, com sciencia prévia do governo, a official da Força Publica, o immovél consignando as respectivas rendas mensaes á Caixa para pagamento das prestações restantes.
Artigo 21. - Será facultado ao funccionario ou official pedir a construcção ou compra da casa de valor inferior ao que corresponder a sua categoria, e egualmente de valor superior entrando, porém neste caso, e desde logo, com a differança calculada pelos respectivos orçamentos, entre o preço da casa de valor correspondente á sua categoria e o da que preferir.
Artigo 22. - O funccionario ou official que, por necessidade do serviço publico, fôr obrigado a mudar de residencia antes de concluido o prazo para o pagamento total da divida, poderá, com licença prévia do governo transferir a outro funccionario ou official o seu direito, ou fazer permuta dos predios, subrogadas as partes contractantes nos respectivos direitos e deveres.
Artigo 23. - Uma vez indemnizado o Estado na metade, no minimo, do capital fornecido e effectivamente empregado de accôrdo com o art. 1° da presente lei, poderão as Caixas obter, sucessivamente, novos emprestimos para o mesmo fim, a juizo do governo.
Artigo 24. - Em relação aos officiaes da Força Publica, o governo poderá autorizar á Caixa Beneficente da mesma a emprestar aos officiaes até a quantia, anualmente, de 600.000$000, de accôrdo e para os fins do disposto nesta lei, devendo, porém, os juros que forem devidos e recebidos dos emprestimos feitos, ser computados exclusivamente em favor dos inferiores e praças que não têm direito ás regalias da presente lei, sendo os mesmos juros rapartidos pelas pensões destes, á razão de 6% e os restantes 2% reverterão em favor do fundo da Caixa (art. 6º).
Paragrapho unico. - Si o governo preferir lançar mão da faculdade outorgada por este artigo, o quantum do emprestimo autorizado em favor dos funccionarios civis não deverá exceder de mil contos de réis (1 000:000$000).
Artigo 25. - As caixas beneficentes dos funccionarios publicos e da Força Publica do Estado terão personalidade juridica e serão dirigidas;
a) A dos funccionarios publicos por um Conselho Administrativo composto dos directores do Thesouro e secretarias do Interior e da Agricultura, sob a presidencia do secretario da Fazenda,
b ) a da Força Publica pelo Conselho Administrativo, instituido na conformidade do art. 12 e seguintes do dec. n. 1.407, de 2 de Outubro de 1906.
Artigo 26. - Os conselhos administrativos das caixas beneficentes apresentarão, annualmente, um relatorio com todos os dados relativos ás operações realizadas aos seus respectivos presidentes, e estes farão publicar pela imprensa um balancete trimestral das finanças das caixas.
Artigo 27. - Os membros do Conselho Administrativo são responsaveis pessoalmente pelos aactos praticados ma administração das caixas respectivas e sujeitos as penalidades previstas nas leis criminaes para os detentores de dinheiros publicos.
Artigo 28. - O governo expedirá o regulamento da presente lei, que entrará em vigor na data da sua publicação.
Artigo 29. - Revogam se as disposições em contrario.

Palacio do Governo do Estado de S. Paulo, 31 de Dezembro de 1924.

CARLOS DE CAMPOS
Mario Tavares
Bento Bueno

Publicada na Secretaria da Fazenda e do Thesouro do Estado aos 11 da Dezembro de 1924

Theophilo M Nobrega, Director Geral.

(1) Publicada pela 3ª vez por ter sahido sem a assignatura do Secretario da Justiça.