Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo Ficha informativa

DECRETO Nº 42.041, DE 01 DE AGOSTO DE 1997

Dispõe sobre critérios, condições e procedimentos para arrecadação de terras em processo de discriminação por meio de acordos

MÁRIO COVAS, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais, e
Considerando a existência de grandes extensões de terras ainda não discriminadas no Estado, em especial no Pontal do Paranapanema;
Considerando que as ações discriminatórias nos diversos graus de jurisdição têm durado decadas para sua conclusão, por envolverem grande número de réus, demandando perícias "in loco" e complexa análise documental;
Considerando que a longa duração das ações discriminatórias pode gerar insegurança que leva à diminuição ou à paralização dos investimentos na produção, enquanto permanece a incerteza dominial;
Considerando que existem focos de conflito pela terra em várias dessas regiões, envolvendo milhares de famílias e que a manutenção da indefinição dominial pode aumentar o clima de tensão, tornando-o indesejável;
Considerando que a pacificação de tais conflitos se dará pela eliminação das incertezas quanto ao domínio, com a regularização fundiária e a promoção de assentamentos das famílias aptas, propiciando a distensão social e a retomada dos investimentos;
Considerando que os assentamentos realizados no Pontal sob a égide da negociação vêm apresentando excelentes resultados, tanto nos aspectos sociais como também nos econômicos;
Considerando que a legislação estadual em vigor permite a efetivação de acordos nas áreas em discriminação, possibilitando obter novas áreas para assentamento, ao mesmo tempo em que se promove a regularização fundiária nas áreas em conflito, em prazo compatível com a demanda social,
Decreta:
Artigo 1.º - São regidos pelas disposições deste decreto os acordos e transações autorizados pelo artigo 9.º da Lei n.º 4.925, de 19 de dezembro de 1985, firmados com o objetivo de arrecadar rapidamente terras em processo de discriminação situadas nos perímetros definidos pela Fazenda do Estado.

§ 1.º - As terras arrecadadas serão destinadas a projetos de assentamento de trabalhadores rurais, nos termos da Lei n.º 4.957, de 30 de dezembro de 1985, que dispõe sobre planos públicos de valorização e aproveitamento dos recursos fundiários, administrados pelo Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva" - ITESP, órgão da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania.

§ 2.º - As transações e acordos poderão referir-se a imóveis envolvidos em ações judiciais de discriminação de terras devolutas ou em processo de discriminação administrativa.

Artigo 2.º - A área de terras a ser recebida pela Fazenda do Estado em cada transação não poderá ser inferior a 500,00 (quinhentos) hectares, exceto nos casos de viabilidade sócio-econômica para execução de projetos de assentamentos, comprovada pelo Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva" - ITESP.

Parágrafo único - No mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) da área total envolvida no acordo deverá ser arrecadada, observado o seguinte:

1. 75% (setenta e cinco por cento), no mínimo, das terras a serem recebidas pela Fazenda do Estado deverão ser agricultáveis;
2. nas áreas de interesse ambiental, poderá ser admitida a redução da parte agricultável para 65% (sessenta e cinco por cento), desde que 30% da área a ser recebida pela Fazenda do Estado seja coberta por matas não degradadas ou em estágio avançado de regeneração.
Artigo 3.º - A transação ficará sujeita aos critérios e condições que seguem:
I - as acessões e benfeitorias existentes no imóvel serão classificadas do seguinte modo:
a) centralizadas: aquelas localizadas junto da sede do estabelecimento rural, tais como casas de residência, instalações administrativas, estábulo principal, poços de captação de água, instalações elétricas e outras, relacionadas em resolução do Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania;
b) descentralizadas: aquelas dispersas homogeneamente por todo o imóvel, tais como pastagens, cercas, bebedouros, terraços, estradas e outras, relacionadas em resolução do Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania;
II - a parte remanescente do particular transigente abrangerá, preferencialmente, a área onde se localizam as acessões e benfeitorias centralizadas;
III - o valor das acessões e benfeitorias localizadas na área a ser recebida pela Fazenda do Estado será compensado por meio de redução da mesma área, conforme cálculos indicados nos ítens seguintes;
IV - a área a ser recebida pela Fazenda do Estado, contendo acessões e benfeitorias descentralizadas, será calculada pela aplicação da fórmula matemática A = X, 1+b na qual "X" corresponde a um percentual da área total do imóvel, fixado como base para o acordo; "b" corresponde ao percentual do valor da totalidade das acessões e benfeitorias descentralizadas em relação ao valor total do imóvel menos o valor das acessões e benfeitorias centralizadas; e "A" corresponde ao percentual da área total do imóvel a ser recebida pela Fazenda do Estado na transação;
V - no caso de ser acordada a abrangência de acessões e benfeitorias centralizadas pela área a ser recebida pela Fazenda do Estado, esta será calculada pela aplicação da formula matemática A = X-bc, 1 + b na qual "bc" corresponde ao percentual do valor daquelas acessões e benfeitorias em relação ao valor total do imóvel menos o valor total das acessões e benfeitorias centralizadas, definindo-se os demais elementos da fórmula como no inciso IV deste artigo;
VI - os percentuais da área total do imóvel expressadds pelo elemento "X" das fórmulas matemáticas indicadas nos incisos IV e V deste artigo, e que servirão de base para os acordos, são fixados como segue:
a) 50% (cinqüenta por cento) se a ação discriminatória não tiver ainda sido julgada em primeiro grau, ou na pendência de processo de discriminação administrativa;
b) 60% (sessenta por cento) se o imóvel tiver sido, considerado devoluto por sentença, pendendo julgamento em segundo grau;
c) 70% (setenta por cento) se o imóvel tiver sido considerado devoluto com o julgamento em segundo grau, pendendo julgamento nos Tribunais Superiores.
VII - no caso de não existirem acessões e benfeitorias no imóvel ou na parte a ser recebida pela Fazenda do Estado, esta corresponderá aos percentuais indicados no inciso anterior;
VIII - a área a ser recebida pela Fazenda do Estado deverá ter, preferencialmente, divisas constituídas por linhas retas, com o menor número possível de deflexões;
IX - a medição e a demarcação da área a ser recebida e do remanescente ficarão a cargo da Fazenda do Estado ou de órgão por ela indicado e a construção de cercas de divisas a cargo do particular transigente.
Artigo 4.º - Vários particulares, em conjunto, poderão integrar a mesma transação por conveniência das partes ou para alcançar a área fixada no artigo 2.º, considerando-se as terras em sua totalidade para aplicação do disposto no artigo 2.º, e desde que as áreas entregues sejam contíguas entre si.
Artigo 5.º - Havendo conveniência na concentração e conformidade de glebas destinadas a projetos de assentamentos, a Fazenda do Estado, na transação, poderá receber do particular transigente, ou de terceiro, área de domínio privado situada em outro local, respeitando-se o disposto no artigo 3.º e procedendo-se como segue:
I - na escritura pública de transação o particular transigente, ou o terceiro, doará a área de domínio privado à Fazenda do Estado;
II - a renúncia prevista no artigo 6.º deste decreto, bem como a exclusão do feito prevista em seu § 1.º, alcançarão a totalidade dos imóveis envolvidos no acordo.

§ 1.º - Consideram-se de domínio privado, para os efeitos deste artigo:
1. as terras declaradas e demarcadas como particulares em discriminações judiciais e administrativas já findas;
2. as terras cujas posses foram regularmente legitimadas ou justificadas;
3. as terras situadas fora dos perímetros delimitados pela Fazenda do Estado, desde que tenham títulos hábeis para a aquisição do domínio, registro regular, ausência de falhas ou vícios na cadeia sucessória e posse mansa e pacífica.

§ 2.º - Igualmente poderão ser recebidas terras remanescentes de imóveis envolvidos em transações com a Fazenda do Estado.

Artigo 6.º - Cada transação será formalizada por meio de escritura pública, destacando-se e descrevendo-se a área a ser entregue a Fazenda do Estado, renunciando esta ao direito de discriminar o remanescente das terras do particular ou de discutir a sua posse.

§ 1.º - Estando o imóvel envolvido em processo judicial de discriminação, a composição homologada pelo Juiz da causa implicará a extinção do processo com relação a parte transigente, excluindo-se do feito a sua área remanescente e prossegindo-se na demanda contra os demais réus.

§ 2.º - A transação poderá ser firmada somente até o trânsito em julgado da decisão que apreciar a fase de conhecimento da ação discriminatória.

§ 3.º - O particular transigente arcará com as despesas processuais, notáriais e de registro.

Artigo 7.º - A transação não importará o reconhecimento, pela Fazenda do Estado, do domínio privado das terras nem da validade dos títulos dominiais do particular transigente, restringindo-se apenas a renuncia e a extinção do processo referidas no artigo 6.º e seu § 1.º.
Artigo 8.º - No prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias, contados da intimação da homologação judicial do acordo ou, no caso de imóvel não envolvido em ação discriminatória, da data da escritura de transação, deverá ser entregue à Fazenda do Estado a área que lhe couber, livre de pessoas e semoventes.
Artigo 9.º - A proposta de transação será encaminhada à Procuradoria Geral do Estado, que promoverá o seu processamento.

§ 1.º - O interessado anexará a seu requerimento, certidão imobiliária atualizada, com negativa de ônus e alienações, cópia de sua contestação na ação discriminatória, se proposta, e o que mais interessar.

§ 2.º - Autuado o requerimento, a Procuradoria Geral do Estado, em caráter preliminar:
1. juntará cópia da réplica da Fazenda do Estado à contestação;
2. manifestar-se-á sobre a legitimidade do interessado para o acordo, sobre eventuais interesses de terceiros e sobre outras questões, discutidas judicialmente ou não, que possam interessar ao exame do assunto;
3. informará sobre a situação processual, em havendo ação discriminatória proposta, conforme o disposto no artigo 12, inciso II deste decreto;
4. no caso de imóvel não envolvido em ação discriminatória, manifestar-se-á sobre a origem dos títulos dominiais do imóvel e sua situação jurídica.

Artigo 10 - Competirão ao Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva" - ITESP da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania:
I - a escolha da área a ser recebida pela Fazenda do Estado, conforme entendimentos com o particular interessado;
II - o exame da viabilidade sócio-econômica das terras para projetos de assentamentos;
III - a manifestação sobre a produtividade, as acessões e benfeitorias, na conformidade do disposto no artigo 12, inciso I deste decreto;
IV - a informação sobre a demanda por terras referida no artigo 12, inciso IV;
V - os trabalhos de agrimensura e as avaliações;
VI - a prestação de outros esclarecimentos técnicos de interesse para o exame do assunto.
Artigo 11 - Fica criada, junto ao Gabinete do Secretária da Justiça e da Defesa da Cidadania, uma Comissão de caráter consultivo com atribuição de se manifestar sobre cada proposta de acordo, tendo a seguinte composição:
I - 1 (um) representante do Gabinete da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, que exercerá a presidência;
II - 1 (um) representante da Procuradoria Geral do Estado;
III - 2 (dois) representantes do Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva" ITESP, aos quais caberá a relatoria dos processos;
IV - 1 (um) representante da Secretaria do Meio Ambiente;
V - 2 (dois) representantes da sociedade civil, sendo 1 (um) das entidades ligadas a agricultura, e 1 (um) das entidades que tratam da questão agrária, convidadas pelo Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania.
Artigo 12 - No exame de cada caso, a Comissão, além das condições e critérios estabelecidos neste decreto, levará em conta os seguintes fatores:
I - quanto a área a ser recebida pela Fazenda do Estado, sua produtividade e a natureza, a quantidade e o estado das acessões e benfeitorias nela existentes;
II - quanto a ação discriminatória, sua situação processual e a perspectiva para sua conclusão;
III - a situação jurídica do título de domínio de cada imóvel;
IV - a amplitude da demanda por terras para execução de projetos de assentamentos.
Artigo 13 - Com o parecer da Comissão e a decisão do Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania, o processo será encaminhado a Procuradoria Geral do Estado para as providências complementares.
Artigo 14 - As disposições deste decreto aplicam-se, no que couberem, as transações propostas em processos de discriminação administrativa, de legitimação ou de regularização de posses, respeitada a legislação pertinente.
Artigo 15 - Os membros da Comissão e seus respectivos suplentes serão indicados ao Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania no prazo de 10 (dez) dias.
Artigo 16 - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação.
Palácio dos Bandeirantes, 1.º de agosto de 1997
MÁRIO COVAS
Belisário dos Santos Junior
Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania
Fábio José Feldmann
Secretário do Meio Ambiente
Walter Feldman
Secretário-Chefe da Casa Civil
Antonio Angarita
Secretário do Governo e Gestão Estratégica
Publicado na Secretaria de Estado do Governo e Gestão Estratégica, a 1.º de agosto de 1997.