Presidente da Radiobras faz palestra sobre comunicação pública


01/10/2003 21:19

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Deputado Vicente Cândido, Eugênio Bucci e Bia Pardi, subprefeita de Pinheiros<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/Radiobras1out03AB.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Jornalista Eugênio Bucci<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/Radiobras1out03A.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

DA REDAÇÃO

Em palestra proferida na Assembléia Legislativa de São Paulo, no último dia 29/9, o jornalista Eugênio Bucci, presidente da Radiobras, abordou questões da comunicação pública no Brasil. Bucci foi convidado pelo deputado Vicente Cândido (PT) a falar sobre o tema Mídia, Governo e Militância. Segundo o parlamentar, a comunicação é um assunto ainda pouco debatido dentro do partido, apesar de o noticiário tê-lo trazido para a ordem do dia.

Eugênio Bucci considera que o país vive um momento em que é preciso se discutir a comunicação pública, e que a configuração da Radiobras pode ser um grande instrumento para afirmar o direito à informação de qualidade e inclusiva do ponto de vista social e regional.

Independência x Uniformização

O papel da comunicação pública no mundo inteiro frente à uniformização dos grandes veículos de mídia comercial é uma das questões centrais apontada por Eugênio Bucci. Em sua avaliação, para entender a atual uniformização do padrão jornalístico da grande mídia, é preciso compreender o que é o seu contraponto, a mídia independente. Uma concepção que remonta ao pensamento iluminista do Século XVIII, ambiente no qual o jornalismo começou a existir, baseado no princípio de que todo o poder emana do povo e em nome dele será exercido.

Os filósofos iluministas acreditavam que a imprensa tinha o papel de mediadora da opinião pública. A imprensa foi concebida como instituição que fica longe do controle do estado. E para mediar o debate público, ela precisava necessariamente reunir condições de assumir um lugar crítico em relação ao estado e à sociedade. Inscrever o direto à informação e à livre opinião como direito do cidadão pressupunha o devido distanciamento das estruturas do poder do estado.

O século XIX operou a transformação da imprensa em um grande negócio. Aliada aos grandes avanços tecnológicos, como o telégrafo, os trens e a indústria gráfica, a imprensa passaria a ser uma instituição comercial e a fazer circular seu produto como mercadoria.

Segundo Bucci, é importante entender que foi enquanto "mercadoria" que a informação encontrou seu lugar na democracia. "Não se pode conceber democracia sem a imprensa livre e comercial no mundo contemporâneo."

Colocamo-nos assim diante do quadro atual, em que, há pelo menos três décadas, a comunicação de massa passou a ser controlada por grandes corporações, aglomerados de mídia de escala internacional, que promoveram a oligopolização dos sistemas de mídia em todo o planeta. Para Bucci, o predomínio dos aglomerados de mídia significa que o jornalismo comercial foi cooptado por interesses que não são os de caráter da informação jornalística. Os jornais deixaram de ser empresas independentes das demais, cuja receita estava ligada a anunciantes. A pulverização da receita publicitária era a garantia para os jornais de sua independência. Os jornais só mantêm sua independência enquanto há independência com relação aos seus anunciantes, incluindo-se aí o estado. Atualmente, os grandes jornais inserem-se na órbita dos grandes conglomerados, que não têm no jornalismo sua principal função. "Isso começa a produzir efeitos de subordinação da lógica jornalística à lógica do entretenimento, da indústria fonográfica, cinematográfica etc.", diz Bucci.

Situação perturbadora

O resultado desse processo é que o mercado passou a produzir um padrão de noticiário semelhante às fontes oficiais. Essa identidade e padronização podem ser claramente percebidas no noticiário americano sobre a guerra do Afeganistão e do Iraque. Como demonstra Bucci, a mídia americana apresenta-se como chapa branca frente a esses episódios, realizando um tipo de cobertura jornalística de caráter oficialista e estatatizado.

Pôde-se observar, de outro lado, na Inglaterra, outra protagonista da guerra do Iraque, que foi uma empresa pública de comunicação, a BBC, que se distinguiu pelo caráter independente da cobertura jornalística dos acontecimentos relativos ao conflito.

"O jornalismo crítico, por algum motivo, migrou em grande parte das empresas comerciais para as empresas públicas", observa Bucci, arriscando algumas interpretações para explicar o fenômeno. Para a imprensa contemporânea, seria muito mais importante conquistar independência em relação ao capital do que sua independência frente ao estado. "Por algum motivo, o capital entrou em relação promíscua com o aparelho de estado e subverteu a própria vocação e natureza da democracia", constata.

Lembrando Habermas, o presidente da Radiobras entende que para garantir o direto democrático à informação é necessário defender o debate público da colonização do capital. "Levemos em conta que há critérios públicos regulando as atividades privadas, com preocupações e princípios também de ordem pública. O direito à informação não surge como uma dádiva do mercado, mas de uma conquista originada do debate público."

Os princípios públicos que mantêm o jornalismo foram desvirtuados no Brasil, na avaliação de Bucci. Segundo ele, existem no país bolsões demográficos de informação, enquanto para outros tantos situados em regiões diversas e em camadas sociais excluídas não há informação nenhuma. O desafio assim colocado seria promover simultaneamente a ampliação da circulação dos jornais privados e intensificar o papel da comunicação pública. "Concebo a coexistência democrática do jornalismo comercial e da comunicação pública como o meio para promoção da inclusão e da absorção dos bolsões dos sem informação", concluiu.

Eugênio Bucci disse não acreditar num tipo de comunicação pública partidária, tradicionalmente reproduzida no Brasil. Segundo ele, a concepção de comunicação pública só pode estar baseada no direito à informação e à opinião. "Direito à informação processada com métodos jornalísticos, essa é grande tarefa e o grande desafio." Bucci concluiu sua exposição dizendo que esse é o caminho vislumbrado pela Radiobras, que empolga as TVs e as Rádios Educativas a abandonar preceitos de que é preciso "educar" a sociedade e a adotar um concepção de comunicação que vise "libertar" as pessoas.

alesp