Ex-diretores da área internacional do Banco Central depõem na CPI do Banestado


16/10/2003 22:18

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DA REDAÇÃO

O ex-diretor da área internacional do Banco Central, Demósthenes Madureira de Pinho Neto, depôs na manhã desta quinta-feira, 16/10, na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Senado e da Câmara Federal que investiga a evasão de divisas através das contas CC5. Nesta quinta e sexta-feiras, a Comissão está funcionando na Assembléia Legislativa de São Paulo para colher depoimentos.

O depoimento de Demósthenes teve o objetivo de esclarecer qual foi a postura do Banco Central diante das denúncias de evasão de divisas e quais seriam as justificativas técnicas do banco para editar medida que deu as autorizações especiais para cinco bancos operarem na região de Foz do Iguaçu, sem a necessidade de cumprirem todas as exigências legais para remessa de dólares ao exterior.

A justificativa do ex-diretor é que as contas CC5 são alternativas legais para facilitar a entrada e saída de capital estrangeiro no País e que a autorização especial dada para os cinco bancos (Banestado, Banco do Estado de Minas Gerais, Real, Araucária e Banco do Brasil) operarem na praça de Foz do Iguaço objetivava controlar o mercado paralelo de dólares e manter o ágio em níveis suportáveis em uma região que, pelo volume de negócios, em virtude do comércio, era considerada estratégica pelo Banco Central.

O deputado José Mentor(PT/SP), relator da comissão, enfatizou que o objetivo da CPMI é descobrir quem se beneficiou dos esquemas de envio de dinheiro e determinar a origem do mesmo. "Se quem movimentou o dinheiro não quer se identificar, com certeza, é porque não pode provar a origem do mesmo, o que faz supor que seja dinheiro sujo, proveniente do narcotráfico, do tráfico de armas, da corrupção ou de outra ação ilegal", afirmou.

Daniel Luiz Gleizer, que também ocupou o cargo de diretor da Área Internacional do BC, informou em seu depoimento à CPMI que era prática da instituição dar autonomia aos departamentos para resolver as situações excepcionais. Gleizer disse ainda que em sua gestão não formalizou nenhuma comunicação ao Ministério Público sobre irregularidades nas contas CC5, nem via necessidade de alteração nas normas que regulamentam estas contas. "A lei não era o foco do ilícito e, por outro lado, dava meios para apurar eventuais atos ilegítimos".

Águas Espraiadas

De todo o montante que saiu do país por meio das contas CC5, R$ 5 milhões são referentes a cheques emitidos por Sérgio Lima Santoro, representante legal da empresa Planicampo Terraplenagem, uma das subcontratadas pela empreiteira Mendes Júnior para a realização da avenida Águas Espraiadas, em São Paulo, durante a administração municipal de Paulo Maluf e, posteriormente, a de Celso Pitta.

Santoro alegou não ser mais proprietário da Planicampo desde 1994, e que quando firmou contrato com a Mendes Júnior, o fez apenas como procurador, por ter grande trânsito no ramo da construção civil. "Apenas 15 caminhões e algumas máquinas eram minhas", justificou o motivo pelo qual embolsava 10% dos adiantamentos da empreiteira, pagos semanalmente aos caminhoneiros por meio de Santoro.

"A única pessoa da Mendes Júnior com que tinha contato era o ex-diretor financeiro, Simeão Damasceno, mas quando o pagamento era liberado pela prefeitura, às vezes oito, dez meses após a realização do trabalho, eu já havia recebido minha parte em adiantamentos", disse Santoro, explicando que dava vários cheques em branco a Damasceno para que este os usasse conforme conveniência da empresa. "Por isso, o dinheiro não parava na conta da Planicampo, no banco Noroeste, que depois virou Santander".

Sérgio Lima Santoro concordou que as notas fiscais emitidas pela Panicampo eram superfaturadas em, no mínimo, 100%, mas que isso seria um artifício da Mendes Júnior para compensar a perda financeira provocada pelo atraso nos pagamentos da prefeitura. "Todos os R$ 10 milhões que foram depositados na conta da empresa foram devolvidos pelos cheques em branco, que Damasceno preenchia e me informava dos valores. Nós recebemos efetivamente, nos adiantamentos, algo entre R$ 3,5 e R$ 5 milhões."

Santoro, que ainda não foi acusado formalmente, nega ter informação de que a diferença entre os pagamentos reais e os apresentados na contabilidade da empresa serviria para alimentar o esquema de propinas dos governos Maluf e Pitta. Disse também não ter recebido nenhum tipo de orientação por parte dos eventuais envolvidos no caso. "Eu era um pobre empreiteiro que trabalhava para sobreviver. Eu fui usado". O empresário não soube explicar aos parlamentares o depósito de US$ 11 mil, em seu nome, em uma conta do Banco Safra. "Eu nunca trabalhei com esse banco. Será que não se trata de um homônimo?".

Convocação precipitada

Alkmar Moura, diretor de Normas do Banco Central entre março de 1996 e setembro de 1997, iniciou seu depoimento fazendo um apanhado geral da função normativa do BC frente às instituições financeiras, que visam à segurança dos próprios bancos quanto à sua solvência e liquidez e à proteção ao consumidor. Mas ao ser inquirido sobre o trâmite específico da portaria que flexibilizou as exigências legais das contas CC5 abertas em agências bancárias de Foz do Iguaçu, Moura garantiu apenas que, como todas as normas expedidas pelo BC, teve de passar pelo colegiado e foi assinada por dois diretores, o de Normas e o da Área Internacional. "Lamento não ter tido tempo de me preparar para responder essas questões, afinal já faz sete anos que deixei o cargo", disse o executivo, argumentando o fato de ter sido convocado para depor apenas na véspera.

O presidente da CPMI, senador Antero Paes de Barros (PSDB/MT), concordou com o depoente e suspendeu sua oitiva, dando-lhe oportunidade para buscar os documentos que lhe situem nos fatos. A atitude do presidente foi, de imediato, apoiada pelo relator José Mentor (PT/SP) e pelos demais membros. Paes de Barros informou à imprensa já ter solicitado à Polícia Federal que proceda à busca de Ricardo Augusto da Costa, proprietário da empreiteira Costaço, e Renato Lanzolo Filho, dono da pizzaria Verona, e os conduza à reunião da CPMI. Ambos são suspeitos de facilitar a evasão de divisas. "A Polícia Federal deve, inclusive, montar um esquema de vigilância para evitar que essas pessoas fujam do país", concluiu.

Para entender o caso

A CPMI, presidida pelo senador Antero Paes de Barros, foi instalada em 18 de junho passado para apurar denúncias de remessa de dinheiro sem identificação para o exterior. Os depósitos tiveram como destino uma agência do Banco do Estado do Paraná(Banestado) em Nova York. A Operação Macuco, realizada pela Polícia Federal, identificou mais de 20 mil operações de remessa de dinheiro, que movimentaram 30 bilhões de dólares, a partir de Foz do Iguaçu, no Paraná, para 137 contas da agência do Banestado nos EUA.

Toda remessa que ultrapassa 10 mil dólares, nas contas CC5, deve ter a identificação de quem está enviando o dinheiro. Com a autorização especial, concedida pelo Banco Central, entre 96 e 99, esta exigência foi abolida para os bancos que operaram na praça de Foz do Iguaçu, o que para os deputados da comissão foi um facilitador para a movimentação de recursos oriundos de atividades criminosas.

alesp