No "Pânico", a Febem que deu certo

Opinião
04/08/2005 18:58

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Deputado Afanásio Jazadji<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/afanasio.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Uma das mais recentes revelações da televisão brasileira explica seu passado de garoto maltratado pelos pais, conta que foi parar na Febem quando tinha só 4 anos de idade e dá a receita para essa instituição educar menores abandonados, em vez de ser uma escola do crime: o Brasil precisa alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em vigor há 15 anos, e ser mais rigoroso contra os infratores.

Aos 25 anos, Carlos Alberto da Silva, o Carlinhos, é atração do programa "Pânico na TV" nos papéis do Mendigo e de Merchan Neves.

Numa entrevista ao Jornal da Tarde, de São Paulo, ele deixou de lado o estilo cômico que o tornou famoso e assumiu a condição de cidadão: "A Febem recuperava, antigamente, 20% dos menores recolhidos às suas unidades. Hoje em dia, não recupera mais, pois não se pode encostar a mão no menor."

Carlinhos expõe, com clareza e coragem, uma tese que também tenho defendido a muitos anos, como deputado estadual especialista em questões de segurança pública, problemas sociais e educação: está na hora de mexer e melhorar para valer o ECA.

Ele lembra que, depois de o Estatuto ter sido oficializado em todo o país, em 1990, a Febem foi diretamente afetada por uma crise de falta de autoridade. "Lá, tem interno que fuma maconha, bate nos colegas e até mata. E nada acontece com ele porque não se pode encostar nos menores. A lei acaba incentivando essa distorção", conta Carlos Alberto da Silva, que fala com a experiência de ex-interno.

A história de Carlinhos é um moderno conto de fadas. Hoje, ele é famoso, tem um bom salário, freqüenta restaurantes caros, namora sua colega Sabrina e não tem saudade nenhuma do passado. Os tempos de garoto são, na verdade, o primeiro capítulo dessa história: aos 4 anos, Carlinhos e seus dois irmãos fugiram de casa, na Zona Norte da Capital, porque não suportavam mais o pai, que, bêbado, era violento com toda a família.

"Ele espancava minha mãe e a gente. Saí de casa e nunca mais vi meus pais. Também me afastei de meus irmãos. Fui parar em várias Febens. Um dia, quando eu tinha 7 anos, fui levado da Febem do Tatuapé para o Colégio Educandário Dom Duarte, um sistema de internato de padres, onde vivi até os 16 anos", conta Carlinhos, que já havia passado por mudança aos 14 anos, quando começou a trabalhar como office-boy na Rádio Jovem Pan, na avenida Paulista.

O emprego inicial na rádio garantiu a Carlinhos uma promoção a produtor. Ao aproximar-se da equipe que fazia o programa "Pânico" na Jovem Pan FM e que lançaria esse estilo na Rede TV!, ele garantiu a chance de ser ator. Como imitador do apresentador esportivo Milton Neves, seu antigo colega na Pan, criou o personagem Merchan Neves, ao lado de três anões, e deu fama ao grito de "Pedala, Robinho!". Há um segundo papel: "Interpreto o Mendigo, que tem tudo a ver com minha história de garoto abandonado." Carlinhos recorda o passado e comenta: "A Febem já foi boa. Na minha época, era diferente."

A época da Febem de Carlinhos, na década de 80, era mesmo um tempo diferente no Estado e em todo o país. O Estatuto da Criança e do Adolescente contribuiu para lançar gigantesca dose de impunidade no mundo dos menores infratores. Segundo o Estatuto, é crime bater em menor de idade. E, na verdade, alguns desses adolescentes internos em unidades da Febem são marmanjos de 14 a 17 anos que já mataram muita gente, como ocorreu com Batoré, aquele acusado de ter cometido 15 homicídios entre uma e outra fuga da Febem. Aos erros dessa legislação de âmbito nacional, deve ser somado o fato de o governo do Estado ter colocado em prática, nos últimos dez anos, uma política de perseguir funcionários e bajular infratores. Uma covardia!

Mário Covas chegou a derrubar a unidade da Febem da Rodovia dos Imigrantes como se a destruição do prédio fosse suficiente para superar rebeliões e corrigir erros de estrutura. Numa espécie de Síndrome do Carandiru, que leva a implosões espetaculares e desnecessárias, Geraldo Alckmin fala em acabar com a unidade do Tatuapé e até em mudar o nome da Febem, mas sem ter soluções. Ao contrário!

O hábito de transferir para funcionários públicos a culpa por falhas da cúpula levou o governo a afastar mais de mil servidores da Febem, que, em seguida, foram reintegrados aos seus cargos por decisão da Justiça.

De trapalhadas e incompetência, só se pode dar razão ao ator Carlinhos, interno da Febem em melhores épocas: já não se faz Febem como antigamente.

alesp