Jorge da Cunha Lima fala sobre a crise da TV Cultura


25/06/2003 22:45

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Deputados, sindicalistas e funcionários da TV e Rádio Cultura acompanham os trabalhos da Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia da Assembléia Legislativa<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/culturaA250603.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Presidente da Fundação Padre Anchieta, Jorge da Cunha Lima aborda a crise da TV Cultura <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/cultura250603.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

DA REDAÇÃO

A crise da TV Cultura foi tema de audiência pública promovida nesta quarta-feira, 25/6, pela Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia da Assembléia Legislativa, presidida pela deputada Célia Leão (PSDB). O presidente da Fundação Padre Anchieta, Jorge da Cunha Lima, apresentou a deputados, sindicalistas e funcionários da TV e Rádio Cultura um balanço de sua gestão e sua avaliação sobre as dificuldades financeiras enfrentadas pela instituição.

Cunha Lima disse que há um amadurecimento da análise sobre "o que se convencionou chamar crise da TV Cultura." Para ele, trata-se de uma crise a um só tempo estrutural e conjuntural, marcada pela falta de investimentos na atualização tecnológica da emissora e pela ausência de estabilidade dos repasses. Acrescentou ainda a inserção da TV Cultura no bojo da crise geral das televisões e dos meios de comunicação brasileiros. Para exemplificar, comparou o déficit atual da Cultura, de 5 milhões de reais, ao da TV Globo, de 5 bilhões de reais.

Sobre a repercussão dos problemas vividos pela TV Cultura, disse estranhar que a mesma ênfase não é dada para as Tvs comerciais, que são concessões públicas, mas têm recebido pouca atenção da imprensa nacional. "Há por parte desta última uma covardia técnica de mexer com a crise das TVs comerciais", afirmou.

Cunha Lima destacou que a Assembléia tem dado sua contribuição na análise que faz da situação da emissora, lembrando que esta aprovou emenda ao orçamento destinando à instituição R$ 8 milhões em 2001 e R$ 18 milhões em 2002. "Desejo que a Assembléia continue a colaborar também nas soluções definitivas da TV Cultura."

Política do Executivo

O presidente da Fundação Padre Anchieta respondeu a uma bateria de perguntas formuladas por parlamentares. Enio Tatto (PT) questionou a razão de os cortes de verbas destinadas à emissora não terem sido colocados a público ao longo dos últimos anos. "Se o governo está contingenciando os recursos da TV Cultura, por que houve tanto silêncio sobre o assunto?" Tatto chegou a sugerir que não existe vontade política do governo de manter a Fundação do jeito que está. O deputado questionou ainda se o Conselho Curador tem exercido participação ativa na condução da administração da emissora.

Lima disse que o conselho tem índice alto de freqüência e que, em 1995, quando ocorreu um corte de 30% das verbas, foi organizado um ato simbólico de abraço coletivo à TV Cultura, do qual participaram conselheiros, o presidente e funcionários. "Mas a vontade do Estado é que prevalece, o conselho tem limites de pressão", respondeu Lima.

O deputado Simão Pedro (PT) questionou se a crise atual tem ingredientes políticos, traduzidos em divergências entre a direção da Fundação e governo. Já o deputado Vicente Cândido (PT) foi mais longe dizendo que a exposição do presidente faz ver que o Estado saiu do orçamento da TV Cultura, realizando investimentos na instituição bem abaixo do que fizeram os governos de Maluf, Quércia e Fleury. "O que o Estado tem de fazer é repassar o dinheiro da Cultura e cumprir a lei", asseverou Cândido. Este e o deputado Enio Tatto questionaram contratos que, segundo eles, são suspeitos de beneficiar parentes de funcionários e de integrantes do conselho curador.

Cunha Lima disse que os deputados receberão cópias dos contratos requeridos e também da documentação solicitada por Orlando Morando (PSB), que repudiou o fato de a Fundação não ter enviado os balanços de 2001 e 2002, requeridos há algumas semanas por membros da comissão. Morando argumentou que a falta desses documentos reduziram a eficiência da audiência com Cunha Lima, já que faltaram elementos para a discussão mais aprofundada.

A exposição de Jorge da Cunha Lima à Comissão apresentou alguns procedimentos adotados pela sua gestão no período de 1995 a 2003 e a situação financeira recebida em 1995, com dívidas herdadas (trabalhistas, a fornecedores públicos e privados) de 26.221 mil reais.

Mudanças conjunturais

O período da gestão de Cunha Lima foi marcado, segundo ele, por profunda transição do sistema de televisão brasileiro. Outras emissoras iniciaram a produção de programação infantil, na esteira da programação da TV Cultura, carro-chefe da emissora responsável por índices de audiência de até 12 pontos. No mesmo período a presença da TV a cabo ofereceu programação infantil complementar ocupando fatia importante desse espaço mercadológico. Houve ainda a perda de profissionais de criação para os concorrentes, mesmo que fosse para mantê-los no freezer, e a demissão de cerca de 600 profissionais antes da posse da atual gestão.

Cunha Lima adicionou ao quadro a privatização das empresas públicas, que produziu nos últimos oito anos efeitos na estrutura de despesa da Fundação Padre Anchieta, já que ficou obrigada a pagar contas atrasadas e correntes.

O problema dos investimentos

As mudanças tecnológicas, segundo Cunha Lima, impuseram um novo paradigma. A passagem da TV analógica para a digital configurou-se num desafio para sua gestão. Nos governos anteriores houve investimentos em terrenos, na extensão das redes do interior, na recuperação de estúdios e de equipamentos, na instalação de torres de transmissão e na operação por satélites. No passado mais recente, continuou Lima, a digitalização dos estudos de rádio e TV vem sendo perseguida. De 2000 para cá, a Cultura vem completando o processo de digitalização que envolve a produção, a edição e a captação. O volume de recursos necessários para completar esse processo está estimado em 50 milhões de reais. Investimento considerado fundamental para que a TV Cultura possa responder ao desafio dos próximos quatro anos, quando deverá ter início a transmissão digital no país.

Receitas

Segundo Cunha Lima, as receitas originárias do Estado têm se mantido ao longo dos últimos oito anos relativamente estáveis, chegando a registrar uma queda de R$ 69 milhões em 2001 para R$ 68,9 milhões em 2002. O dado positivo, disse o presidente da Fundação, ficou por conta das receitas próprias da emissora que se elevaram em 500% no mesmo período. Em 1995, as receitas próprias representavam R$ 6 milhões, passando a R$ 40 milhões em 2002.

Apesar dos esforços da Assembléia para reservar recursos aos investimentos da TV Cultura, a dotação para essa finalidade tem sofrido sistematicamente o contingenciamento por parte do governo. Entre as verbas contingenciadas estão os 18 milhões previstos no orçamento de 2002.

Os contingencamentos parecem ser o calcanhar de Aquiles identificado por Cunha Lima, que vê neles conseqüências sobre a manutenção e sobre a depreciação dos ativos da emissora, bem como uma das causas que estão na origem do patrimônio líquido negativo da ordem de R$ 5 milhões.

Modelo de repasse da TV Cultura

A insuficiência de recursos para custeio e manutenção teria se agravado, segundo as explicações de Lima, com os dissídios coletivos, que elevaram sensivelmente a folha de pagamento, arrebatando parte de verbas operacionais.

Justificou ainda as recentes demissões, que atingiram cerca de 250 funcionários, dizendo que elas foram, paradoxalmente, uma solução para manter os empregos. Explicou: "Como a folha de pagamentos representa cerca de 80% das despesas, há claras restrições para promover cortes nos 20% restantes reservados às despesas de operação e manutenção. Cortes nesses itens poderiam representar riscos maiores para a manutenção dos postos de trabalho".

Providências da gestão

Jorge da Cunha Lima rechaçou as críticas que a atual administração da TV Culturas vem sofrendo. Chegou a comparar os custos de produção da TV Globo, que atingem R$ 1,5 bilhão, com os R$ 100 milhões gastos pela TV Cultura.

Ele elencou uma série de ações conduzidas pela atual gestão para enfrentar o quadro financeiro crítico. Disse que foram celebrados acordos com empresas credoras, buscaram-se novas receitas com publicidade institucional e que a prestação de serviços foi incrementada. Esta última, avaliou Lima, representou um grande trunfo da fundação para reduzir os impactos da crise. Destacou os serviços prestados à TV Assembléia e à TV do Judiciário, além da participação da Cultura na instalação das TVs públicas de Brasília. "Esse é um bom serviço que gera receitas, embora não na mesma proporção das da publicidade, que estão em queda."

A deputada Maria Lúcia Amary (PSDB) perguntou por que esses serviços não são estendidos à TV Câmara de São Paulo e às TVs federais. Cunha Lima ressaltou que a TV Cultura participa, sempre que possível, de todas as concorrências públicas desse setor.

Nível da programação

Respondendo às críticas de que a emissora tem exibido reprises abundantemente e que faltam novas programações, Lima defendeu-se dizendo que Cultura vai continuar primando pela qualidade de suas produções, tanto no tocante aos programas infantis quanto aos documentários. Estes últimos, destacou, limitavam-se a 4 por ano em 1995. Em 2002, a produção dos documentários saltou para 70 ao ano. Outra menção especial foi com relação aos programas educativos, os cursos produzidos em parceria, para educação à distância.

O presidente da Fundação Padre Anchieta, para sublinhar o reconhecimento de sua gestão, referiu-se aos 113 prêmios nacionais e internacionais recebidos pela emissora, entre os quais estão três prêmios Emmy, considerado o Oscar da Televisão.

Para poder manter o nível da programação, Cunha Lima disse que levou ao governador, em audiência na última semana, um balanço da situação atual, cujos principais problemas estão no déficit anual de R$ 5 milhões e no contingenciamento de verbas orçamentárias para custeio e investimentos.

Segundo Lima, o governador acenou com a possibilidade de repassar R$ 3,5 milhões para custeio e manutenção, os R$ 18 milhões que foram consignados por emenda aprovada na Assembléia, os recursos para o pagamento de sentenças judiciais e para atender os impactos do dissídio sobre a folha de pagamento. Porém, o governador teria dito que não liberará recursos para novos investimentos, a não ser que haja ao longo do ano elevação na arrecadação do ICMS.

A Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia deve ouvir no início do segundo semestre os secretários da Fazenda e da Cultura, além de representantes dos Sindicatos dos Radialistas, Jornalistas e dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão no Estado de São Paulo, que embora presentes na sessão desta quarta-feira, tiveram pouco tempo para apresentar seus pontos de vista e suas reivindicações, que incluem o pedido de instalação de uma CPI da TV Cultura na Assembléia Legislativa e a imediata liberação dos recursos do Estado. Também participaram da audiência com Cunha Lima os deputados Waldir Agnello (PSB), Adilson Rossi (PTB) e Nivaldo Santana (PCdoB).

alesp