Câmbio asfixiante

Opinião
19/05/2006 18:24

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Arnaldo Jardim<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ajardim.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

O Brasil tem atraído torrentes de dólares pela nossa alta taxa de juros tupiniquins. Isentos do pagamento de tributos, entram e saem com a mesma rapidez.

Neste contexto, o real se tornou uma moeda sobre valorizada, o que nos permitiu inclusive colocar papéis brasileiros em moeda local no mercado internacional, mas a atual política cambial brasileira traz consigo danos duradouros e talvez irreversíveis à nossa economia.

Entre 1998 e 2005, houve um expressivo aumento do comércio internacional, que cresceu 6,2% ao ano, em média. Ao mesmo tempo, houve uma grande elevação nos preços das commodities, que podem ser produzidas em qualquer parte do mundo. Dependem, basicamente, de grandes extensões territoriais e de um bom clima, em suma, da abundância de recursos naturais.

O Brasil, como bem sabemos, possui estas características e se aproveitou do momento para expandir suas exportações, principalmente em áreas como agricultura, pecuária, mineração e produtos advindos destes, como óleo e farelo de soja, aço, suco de laranja e café solúvel. Ou seja, cerca de 60% das nossas exportações são de commodities ou produtos primários.

Entre 2003 e 2005, as exportações brasileiras aumentaram em 25,2%. Impulsionados pelas compras de países como EUA, China e Japão. Só no ano passado, o nosso saldo comercial atingiu US$ 44,8 bilhões.

De olho no mercado externo e aproveitando a "boa onda", os setores exportadores brasileiros investiram pesado no aumento da produtividade, na contratação de pessoal e na ampliação dos parques industriais. Só não contavam com a forte apreciação do real, que colocou estes empreendedores em uma verdadeira sinuca de bico.

A moeda brasileira apreciou-se muito mais em relação ao dólar, do que a média das moedas de outros grandes produtores de commodities como Austrália, Nova Zelândia, Chile e Canadá. Entre abril de 2002 a abril de 2006, a média das moedas destes países valorizou-se 29% com relação ao dólar, enquanto o real atingiu 41%.

Áreas tradicionais da nossa economia, como a agricultura e o setor de calçados, só para citar dois exemplos, estão sentindo o "baque" do real valorizado.

Carro-chefe do nosso superávit comercial, a soja, que apresentou faturamento de R$ 37,6 bilhões em 2004 ao produtor, este ano deve contabilizar R$ 22 bilhões.

O setor de calçados exportou 23 milhões de pares de sapato em 2005, volume 11% inferior ao registrado em 2004. No primeiro trimestre deste ano, a queda foi de 4%. Em todo o país já ocorreram 20 mil demissões desde 2005.

O crescimento médio das exportações brasileiras no primeiro trimestre do ano passado foi de 31,5%. No mesmo período deste ano, entretanto, a taxa caiu para 16,8%. Por que esta queda se a economia mundial continua em crescimento?

Em vez do avanço competitivo está ocorrendo um retrocesso generalizado das estratégias de exportação com base no país. As transacionais, inclusive as brasileiras, estão esvaziando o papel exportador das suas plataformas no Brasil. Neste contexto, aumenta muito o risco de desnacionalização de empresas, tal como ocorreu durante a sobrevalorização cambial nos anos 90. Novos contratos e projetos estão sendo deslocados para outros países emergentes.

Há exatos 25 anos, o Brasil, a China e a Coréia do Sul exportavam exatamente o mesmo valor. Atualmente, os coreanos exportam três vezes mais que o Brasil, substituindo a exportação de produtos primários por produtos de maior valor agregado.

O problema é que produtos industrializados exigem um trabalho permanente de prospecção, visando o desenvolvimento do produto e do mercado, obrigando um conhecimento mútuo de todas as regras que embasam a negociação. São regras cambiais e de financiamentos, o estabelecimento de contratos de mercadoria exportada até o recebimento de divisas do exterior, que exigiram do exportador um esforço que tem um custo para ser realizado. Pena, que todo o este esforço está terminando e vários setores estão fechando as portas no Brasil, vide a Volkswagen.

Em suma, a apreciação prolongada do real sacrifica empregos, inviabiliza oportunidades de expansão competitiva em atividades de manufatura e serviços, além de bloquear novos investimentos. Empobrece qualitativamente o perfil socioeconômico e reduz o potencial de elevação do nosso PIB.

Enquanto não resolvermos nossos "gargalos estruturais" e não tivermos uma política agroindustrial competente, precisamos de uma taxa de câmbio especial para manter nossa competitividade internacional. As principais potências mundiais usam e abusam de mecanismos de proteção comercial, como subsídios e barreiras fitossanitárias. Em contrapartida, o Brasil acredita em um mercado global livre e distribui gestos generosos aos nossos vizinhos sul-americanos. O câmbio está asfixiando o nosso esforço exportador e comprometendo, sobremaneira, o futuro do nosso crescimento econômico para os próximos anos.

Arnaldo Jardim* é deputado estadual pelo PPs e presidente da Comissão de Assuntos Internacionais da Assembléia Legislativa de São Paulo

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