Caixa-preta

Opinião
23/08/2005 17:33

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Deputado Milton Flávio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/MiltonFlavio7.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

É aquela velha história: quem nunca comeu melado... A se julgar pelo noticiário, em breve, possivelmente, estaremos ante um novo escândalo patrocinado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Refiro-me à caixa-preta dos cartões de crédito corporativos. Há fortes indícios de que o que está por vir a público é coisa cabeluda. No dia 16 de agosto, conforme relato da revista Isto É Dinheiro, o Tribunal de Contas da União (TCU) recebeu um pedido de "devassa" na forma nada transparente como o instrumento vem sendo usado por funcionários do Palácio do Planalto.

Os cartões de crédito coorporativos foram criados na gestão Fernando Henrique Cardoso com o objetivo de dar mais eficiência e transparência a pequenos gastos do governo. Por meio deles, funcionários devidamente autorizados pelos seus superiores, tratam de quitar despesas com viagens, papelaria e todas aquelas que dispensam processo de licitação. No governo anterior, as faturas eram enviadas ao TCU para análise.

O governo Lula, sempre criativo, resolveu inovar. E passou a tratar tais despesas como "segredo" de Estado. O que ele pretende esconder ainda não se sabe. O que já se sabe é que ele deixou de enviar as faturas e notas fiscais ao TCU e que retirou do Siafi (Sistema de Acompanhamento Financeiro da Administração Federal) as informações relativas aos pagamentos e os nomes dos funcionários autorizados a usar os cartões. Só as investigações poderão nos dizer os motivos.

Além da falta de transparência, dois outros fatos chamam a atenção de quem se preocupa com o destino do dinheiro público. O mais óbvio deles está no volume do que vem sendo gasto. Em 2002, último ano da gestão FHC, os cartões de crédito corporativos cobriram despesas da ordem de R$ 5,2 milhões. Em 2003, primeiro ano da era Lula, os gastos com eles saltaram para nada menos que R$ 12,2 milhões. No ano passado, atingiram a marca de R$ 15,2 milhões. Segundo a Isto É Dinheiro, de 1º de janeiro a 18 de agosto deste ano, a soma das faturas dos cartões somavam R$ 10,3 milhões, contra R$ 5,5 milhões no mesmo período do ano passado. Como se vê, em certos quesitos, especialmente em "alegorias", o governo Lula é imbatível.

O crescimento dos gastos poderia ser, por assim dizer, obra do deslumbramento que parece ter tomado conta da rapaziada. Bem mais grave que isso, porém, é o fato de que a maior parte dos gastos é ressarcida com dinheiro vivo, isso mesmo, em espécie. Por exemplo: dos R$ 10,3 milhões gastos de janeiro a 18 de agosto de 2005, R$ 6,8 milhões foram retirados em dinheiro vivo. Por quê? Bem, isso é algo que o TCU parece disposto a descobrir. Até para que não se dê asa à maledicência e comece a se suspeitar de que nem todos os gastos possam mesmo ser tornados públicos.

A vantagem da transparência " para os cidadãos, claro " é que ela desnuda certas práticas. Um fato relatado pela revista é exemplar do tratamento dado ao dinheiro público por certas autoridades. Entre os dias 7 e 9 de abril do ano passado, o ex-ministro Luiz Gushiken, da Comunicação, hospedou-se num hotel em São Paulo. Gastou R$ 470 em diárias, R$ 231 no restaurante e R$ 501 no bar do próprio hotel. Ninguém poderia imaginar que ele gostasse tanto de água mineral. Menos ainda que a água custasse tão caro.

As despesas do ex-ministro foram pagas com o cartão de crédito de sua esposa. E, depois, claro, foram ressarcidas pelo Palácio do Planalto.

*Milton Flávio (PSDB) é professor de urologia da Faculdade de Medicina da UNESP, em Botucatu, e vice-líder do governo na Assembléia Legislativa de São Paulo.

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