Opinião - Os sons da nossa São Paulo


30/11/2011 16:22

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Recente pesquisa da São Paulo Transporte (SP-Trans) mostra uma realidade preocupante no que se refere ao barulho produzido pelo ônibus paulistas. Na capital, cresceu cinco vezes o número de ônibus reprovados pelo excesso de ruídos, e devido a este problema, foram lacrados em 2011, de janeiro a setembro, 941 coletivos " 6% da frota. Mas, mesmo com a fiscalização, usuários e moradores dos locais de rota ainda se queixam do barulho excessivo.

Essa pode parecer uma preocupação menos importante frente a tantas outras bandeiras que venho defendendo, mas não é. Um dos veículos interditados neste ano gerava um ronco externo de 110 decibéis. Especialistas dizem que a exposição por mais de oito minutos a sons nesse nível pode levar a lesões auditivas: o pior é que ouvir este barulho de perto é como ficar em frente a uma caixa de som num show de rock. O limite permitido por aqui é de 92 decibéis para ônibus com motor na frente, e 98 nos que o possuem atrás.

Os níveis de som dentro do coletivo, para evitar danos, inclusive ao motorista e aos usuários, deveria ser de, no máximo, 84,9 decibéis. Mas o limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para evitar danos no sistema auditivo é ainda menor, não ultrapassando 50 decibéis, ou seja, nossos índices não têm sido nada saudáveis. Os ruídos, mesmo breves, causam mais que uma simples irritação, podendo ocasionar até mesmo danos irreversíveis.

A questão passa a ser ainda mais complexa se pensarmos que além dos danos à saúde, o barulho em excesso também pode atrapalhar quem se guia pela audição, tornando o ato de ouvir uma missão impossível. O problema é muito grave, mas, na verdade, o barulho dos coletivos soma-se a tantos outros que nossa cidade já possui. Hoje, é quase impossível ouvir algo além de buzinas e outros sons altos e mecânicos.

Neste ano, o canadense R. Murray Schafer, considerado o pai da ecologia sonora, teoria que analisa como interpretamos e somos afetados pelos sons naturais e artificiais que nos rodeiam, esteve no Brasil e participou de três eventos promovidos pelo Instituto de Artes, na USP. O compositor, educador e escritor propôs uma caminhada sonora de um minuto pelo campus de São Paulo e observou que a grande maioria dos sons era mecânica. Segundo ele, foi possível perceber a sonoridade do vento por apenas um segundo.

A constatação de Schafer não nos parece tão estranha, pois convivemos diariamente com isso, mas o educador tirou suas conclusões em um dos locais mais silenciosos de São Paulo. A Cidade Universitária é uma das regiões mais calmas de nossa capital, frequentada, inclusive, por amantes dos esportes ou pessoas que querem um local mais silencioso, onde possam ler, caminhar e até mesmo meditar. Se um local como esse possui índices que incomodam, imagine os locais de grande movimento.

É fundamental que as pessoas comecem a pensar que os ambientes seriam melhores se tivessem menos ruídos. Pode até parecer uma "viagem", mas o educador mostrou o quanto é importante viver em uma cidade saudável inclusive para os nossos ouvidos. Só percebendo o quanto os ruídos tem sido exagerados é que poderemos pensar em mudanças para melhorar a acústica de onde vivemos.

Além de problemas de audição irreversíveis, a poluição sonora pode desencadear problemas cardiovasculares, estresse, alterações no sono ou níveis de irritação difíceis de conviver. Também pode ocorrer o que os especialistas chamam de presbiacusia, que é a perda gradual auditiva devido à degeneração progressiva do ouvido interno.

É preciso pensar em novas maneiras para melhorar o ambiente sonoro. Os EUA e alguns países europeus têm implantado soluções antirruído que visam melhorar a qualidade de vida das pessoas, e uma coisa que eles levam muito a sério é o barulho do escapamento. As autoridades desses países vêm buscando modos de isolamento acústico, principalmente nos coletivos.

Os motores e escapamentos desregulados são a principal causa para o excesso de barulho nos coletivos, talvez uma boa iniciativa fosse aplicar silenciadores aos escapamentos. Tenho absoluta certeza de que esta ação já tornaria o transporte público algo melhor. Então, talvez, seja possível colocar em prática o que o educador canadense disse: "Abra seus ouvidos " escute e sinta o mundo ao seu redor".



*Gilmaci Santos é deputado estadual pelo PRB e presidente estadual do partido

alesp