Comissão de Serviços e Obras Públicas ouve presidente da Brasil Ferrovias S/A

(com fotos)
13/06/2002 20:20

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DA REDAÇÃO

A Comissão de Serviços e Obras Públicas ouviu na tarde desta quinta-feira, 13/6, o depoimento do presidente da Brasil Ferrovias S/A, Nelson de Sampaio Bastos, sobre denúncias envolvendo o Plano de Demissão Voluntária (PDV) e afastamentos com licença remunerada de funcionários daquele empresa.

Bastos disse que as ferrovias brasileiras não foram privatizadas, mas arrendadas às concessionárias por período de trinta anos. Sendo assim, complementou, seus bens continuam sendo de propriedade da União, mantendo a Brasil Ferrovias S/A apenas sua posse. Bastos ressaltou que "a Ferroban ou demais empresas não são sucessoras da Rede Ferroviária Federal mas arrendatária de seus ativos por escolha dessa mesma Rede enquanto órgão da União". Em segundo lugar, continuou ele, "a situação competitiva das ferrovias é muito diferente daquela que prevaleceu nos últimos dois séculos, quando foram concebidas. Hoje, é muito difícil competir com o caminhão para distâncias maiores de 1.000 km. Isso molda mudanças que têm de ser implementadas".

Volume de mão de obra.

Ainda segundo Bastos, a Ferroban mantém contratos de trabalho baseados na cláusula 4.49 da licitação, "que contempla regras específicas referentes a reestruturação". A Ferroban tem gastos com pessoal e encargos que atingem 47,9% da receita líquida. Pelas projeções, isto significa um prejuízo operacional de 36,6 milhões de reais, o que representa 20% da receita da empresa. "Trata-se se uma situação muito grave, que implica dificuldades de sobrevivência a médio prazo." A empresa vem implementando formas de absorver essa mão-de-obra ampliando suas operações, como o aumento de transporte de cargas de grãos embarcados e desembarcados do porto de Santos. A seguir, Bastos passou a explicar que a estrutura da empresa mantinha antigamente quadros funcionais que hoje não são mais necessários. Como exemplo, citou a figura do "estafeta, outrora indispensável para a tração de trens, mas hoje completamente obsoleta uma vez que os trens são controlados via satélite". A empresa concluiu que necessitava de apenas 1072 cargos para obter resultados operacionais positivos, restando 1423 cargos sem utilização operacional. "Ou segregávamos os funcionários não necessários em uma sala, ou partíamos para um Plano de Demissão Voluntária. Ficamos com a segunda hipótese e o PDV teve 832 adesões, depois mais 33 em junho, sobrando assim 392 pessoas. Estabelecemos que funcionários, que ficaram sem ter o que fazer, teriam licença remunerada até decidirmos sobre seu destino." Controvérsia.

O deputado Nivaldo Santana (PcdoB) argüiu que Nelson Bastos procura se excluir da responsabilidade e ver o fenômeno das demissões em sua empresa sob a ótica da lucratividade crescente e da exclusão ao máximo. "Quando as ferrovias foram privatizadas, a situação da empresa já era conhecida. Inclusive, existem estudos amplos que dizem que a privatização foi auxiliada por recursos públicos do BNDES e ativos subavaliados, o que representou um verdadeiro ''negócio da China''. A Ferroban sabia do passivo trabalhista a ser honrado, tanto que a cláusula 4.49 contempla um deságio de 50%, a ser pago em cinco anos sobre esse item. Houve uma coerção forte por parte da empresa para se safar do compromisso. Ela tem obrigado trabalhadores a abrir mão de certos direitos para serem beneficiados pela cláusula 4.49". Nivaldo Santana indagou se houve algum tipo de coerção no processo de demissões, uma vez que funcionários da Ferronorte se queixaram de assédio moral. A Ferroban cumpre o estipulado na cláusula 4.49 quanto a indenizar plenamente os funcionários, independentemente de férias, licenças e etc. ou os funcionários vêm sofrendo assédio moral para desistir de seus direitos?"

Debate

Em resposta a Nivaldo Santana, Bastos argumentou que o uso de recursos públicos, no Brasil, se dá de forma anômala em relação ao resto do mundo. "Aqui não existe financiamento fora do BNDES. Até montadoras estrangeiras acabam sendo financiadas por ele e seria estranho se isto não tivesse ocorrido com a concessão. Até hoje, a Ferroban não obteve recursos públicos para financiamento e o processo de solicitação desses recursos até hoje se encontra em tramitação, o que não acontece com a Ferronorte, que foi privatizada". Disse também que houve uma ampla divulgação sobre o preço do deságio fixado no leilão, com informações sobre o número de funcionários e de que havia um excesso de contingente que representava 244,8 milhões de reais em encargos trabalhistas, que seriam compensados com um deságio de 50%, a ser pagos em cinco anos. "Demitir pessoas é sempre problemático, mas indispensável pela lógica empresarial. Mas fazer da demissão oportunidade para coerção não faz parte do desenho. A cláusula 4.49 assegura direitos do trabalhador mas também da empresa, em função do desequilíbrio econômico. É assunto de justiça e está sob júdice", concluiu.

Testemunhos

O presidente da Comissão, deputado Antonio Mentor, que participou de reuniões com sindicatos e trabalhadores antigos dessa ferrovia, comentou relatos que ouviu na Assembléia e na Delegacia Regional do Trabalho (DRT). Citou o caso da mudança de crachás, que impediu que funcionários entrassem na empresa; o de equipamentos de funcionários que há muitos anos trabalhavam na empresa terem sido retirados de suas mesas de trabalho, e de mecânicos que foram privados de ferramentas para trabalhar. "A licença, do modo como foi relatada, significou coerção, porque sua comunicação foi feita de forma autoritária, atacando diretamente a auto-estima do funcionário, causando casos de depressão profunda e outros, mais graves. O presidente nos dá conta de que não há coerção. O que se pode concluir?", questionou Mentor.

Uma questão de intenção

Bastos rebateu dizendo não houve intenção de coagir funcionários no processo de demissão, mas que não há colocação para o que existe de demanda. "Se é coerção ou não, é difícil definir, porque percepção é algo que cada um tem e não há como resolver isso. O PDV tem pago muito mais do que o estipulado na cláusula 4.49 e de forma muito mais rápida do que havia sido considerado". Para Bastos, o PDV é tão bom que 855 pessoas aderiram a ele. "A empresa não pretende se pautar na avaliação do governo federal mas tem procurado uma solução que atenda os interesses dos dois lados. Não há documento que faça menção específica à responsabilidade, senão o deságio de 50% sobre um montante de 50 milhões, a serem pagos em cinco anos."

Ricardo José Coelho Lessa, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo, apontou que "indenizações já foram pagas segundo a cláusula 4.49. Agora, outros funcionários, ao receberem sua demissão, são informados que receberão apenas verbas legais". E indagou: "Por que essa diferença?" Lessa continuou, declarando que pessoas foram transferidas de maneira constrangedora: "informadas à noite, por telefone, da transferência, foram notificadas de que sua recusa constituiria desobediência e, portanto, motivo para demissão por justa causa. Trabalhadores da Ferroban têm sido segregados em um departamento de mecânica, trabalhando à noite em péssimas condições; a média de carga horária de trabalho tem sido de 16 horas, sem direito a repouso; trabalhadores já trabalharam por 25 horas consecutivas sem direito a refeições ou descanso; o emprego de mão-de-obra cooperada de Governador Valadares tem sido utilizado para reduzir o custo e lesar direitos de trabalhadores, que são contratados por uma companhia, trabalham para outra e não sabem como ficam seus direitos; funcionários são proibidos de se sindicalizar sob pena de perderem o emprego. É uma situação que desmonta o quadro traçado pelo presidente da Brasil Ferrovias".



Verba rescisória

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias paulista, Waldemar Raffa, argumentou que a 4.49 é uma indenização por tempo de serviço. "É verba rescisória. A empresa tem que fazer constar isso no termo de rescisão do contrato. A Ferroban colocou em licança remunerada 1100 trabalhadores em março, abril e maio. Está caracterizado assédio moral e rebaixamento de cargo, com casos de chefes de seção chegarem ao local de trabalho e não encontrarem nem sua mesa. A situação afetou psicologicamente famílias. PDV é demissão voluntária, é conceito que não pode ser usado para proposta de redução de indenização. Segundo carimbo colocado nas carteiras de trabalho, a Ferraban é sucessora nas responsabilidades trabalhistas, é responsável por indenizar a rescisão de contratos de trabalho. Todos os trabalhadores podem contestar na Justiça o PDV. Os tribunais entendem que a Rede é subsidiária e não responsável pelas demissões. Ninguém aceitou o PDV de forma voluntária, mas porque seu local de trabalho foi extinto. O funcionário recebe sua indenização em abril de 2003 e fica em licença remunerada para descaracterizar o assédio moral. O desemprego é uma realidade nacional, a não contratação de jovens já é preocupante, quanto mais a de pessoas de mais idade que não recebam indenização. Isto é uma sentença de morte", finalizou

Raffa ressaltou que "ex-empregados que têm procurado se aposentar são impedidos de fazê-lo porque a empresa não tem recolhido o INSS e o FGTS. São 300 milhões de reais em atraso", concluiu.

alesp