Uma vela para Lula

Opinião
09/08/2005 18:31

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Deputado Milton Flávio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/MiltonFlavio7.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Entre os analistas e políticos de diferentes correntes de pensamento há uma unanimidade: a de que o presidente da República não se deu (ou finge não se ter dado) conta do tamanho da atual crise que paralisa o país e atormenta os brasileiros. É senso comum o fato de que Lula se comporta, em público, como um alienado ensandecido, que não consegue mais entender a realidade à sua volta, mas acredita que dela pode dar conta com seus discursos de improviso e arrogância histórica. Como ele não sabe ler os resultados das pesquisas de opinião (também isso), aposta suas fichas na comunicação direta com a "massa". A continuar assim, acabará fazendo discursos em feira-livre. Com chapéu coco na mão.

Ainda é expressiva, embora decrescente, a parcela da sociedade que acredita que Lula não sabia de nada do que ia sob suas barbas. Aliás, esta tem sido a estratégia adotada por uma grande parte dos líderes petistas, a começar pelo deputado José Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil, uma espécie de primeiro-ministro informal de Lula. O problema, para eles, é que os fatos os desmentem com uma velocidade avassaladora. Mais que isso: o desenrolar da crise tem feito com que muitos ex-petistas ilustres venham a público para dizer o que pensam de Lula e do PT, especialmente daquela facção " a tal do Campo Majoritário " à qual pertencem o próprio Lula, José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, Sílvio Pereira, entre outros tantos, direta ou indiretamente, envolvidos com o "valerioduto".

Para eles " os ex-petistas ", nada do que está acontecendo agora é motivo de surpresa. Por essa razão, peço sua licença para reproduzir trecho de um artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo em 7 de agosto. Nele, César Benjamim " fundador e dirigente do PT até 1995, quando rompeu com a agremiação " rasga o verbo e põe os pingos nos is.

- Os malfeitos que têm vindo à luz não começaram agora nem decorrem de um equívoco individual. Eles representam apenas a transferência, para a esfera do governo federal, de práticas iniciadas, com certeza, nos primeiros anos da década de 1990, talvez antes, e nunca descontinuadas. As impressões digitais do mesmo grupo (Campo Majoritário) aparecem na gestão do Fundo de Amparo ao Trabalhador, na organização das finanças da campanha presidencial de 1994, na gestão de algumas prefeituras, como a de Santo André, na busca do controle dos fundos de pensão, para citar apenas as situações mais notórias.

Benjamim não poupa palavras: "Ao aceitar conviver com isso, ao mesmo tempo mantendo a bandeira da ética para consumo externo, o PT ficou exposto à ação corrosiva da hipocrisia " que o destruiu". E vai além: "Lula sempre compartilhou da intimidade do grupo e foi o principal beneficiário de suas ações". Por isso, afirma, Lula "não deixará nenhum legado político, teórico ou moral".

Na mesma edição da Folha, outro ex-petista de renome, o professor Reinaldo Gonçalves, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, encomenda as flores para o velório: "O fato é que Lula e o PT morreram. Enterremos Lula e, sem compaixão, deixemos o PT chorar os seus mortos. E que o espectro de Lula não ronde as esquerdas brasileiras nos próximos anos. Assim, poderemos reconstruir blocos consistentes de forças políticas efetivamente democráticas e populares. Lula foi uma aposta perdida".

A atual alienação de Lula, como se vê, é compreensível, embora injustificável. Não deve ser fácil trocar uma biografia que se pretendia vistosa por um réquiem ordinário.

*Milton Flávio (PSDB) é professor de urologia da Faculdade de Medicina da Unesp, em Botucatu, e vice-líder do governo na Assembléia Legislativa de São Paulo.

alesp