Optamos por não crescer

Opinião
26/10/2006 18:00

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Arnaldo Jardim<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/arnaldo jardim3.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Inflação de 1º Mundo, crescimento econômico de 4º Mundo. No Brasil dos contrastes, o governo Lula se prepara para comemorar uma inflação que, tudo indica, vai ficar em torno de 2,8%, patamar bem abaixo do teto de até 6,5% para este ano. O que significa isso? Será que é algo a ser comemorado?

O fato de ter uma inflação tão baixa vai ser alardeado como uma grande conquista, porém o preço que a sociedade pagou por isso foi absolutamente alto. Questiono a retórica da atual equipe econômica de condicionar que o crescimento gera inflação. Isso só é verdadeiro quando o governo não investe o suficiente em infra-estrutura, fomenta a instabilidade no mercado, não conta com uma política cambial duradoura e aumenta a carga tributária para sustentar o superávit primário. Ou seja, na ausência de reformas estruturais, optou-se pela saída mais simples, frear o ritmo do nosso crescimento econômico.

O mesmo álibi foi utilizado para explicar a pequena e comedida queda nos juros. Com isso, o Brasil continua mantendo a liderança no ranking mundial de juros reais (taxa Selic descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses), com uma taxa real de 9,3% ao ano, enquanto a média mundial é de 1,9%. Este número demonstra de uma forma muito clara que esta queda poderia ter sido maior e mais acelerada. Afinal, a economia básica diz: juros altos direcionam investimentos do setor produtivo para o setor financeiro.

Levantamento recente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) reforça que a indústria brasileira apresentou um crescimento de produção da ordem de 2,2% nos 12 meses encerrados em julho. Em contrapartida, o grupo de economias em desenvolvimento registrou alta de 4,5% a 17%, este último na China. Sem um ambiente propício para ampliar a produção, quem é louco de investir? A crise do agronegócio está aí e não me deixa mentir, quem investiu foi penalizado neste governo.

Afinal, é justamente o investimento que comanda o crescimento. No Brasil estes recursos patinam há anos abaixo dos 20% do PIB, nível insuficiente para um crescimento sustentável.

A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad) revela que o investimento estrangeiro direto (IED) no Brasil caiu 17%, entre 2004 e 2005 " um dos piores desempenhos da América Latina. Depois de atrair US$ 18 bilhões de IED em 2004, o Brasil viu o seu volume reduzido para US$ 15,1 bilhões em 2005. A Unctad estima que o país deve receber US$ 14,8 bilhões este ano. Entre 2004 e 2005, o aumento dos investimentos globais foi de 29%, ante os 20% previsto para este ano. Nos demais emergentes, a tendência é de crescimento médio de 22%, em 2005.

Real valorizado, juros estratosféricos, ausência de marcos regulatórios fortes, carga tributária excessiva e falta de investimentos, estes aspectos criaram um círculo vicioso que contrasta com a celeuma do "espetáculo de crescimento", alardeado por Lula e sua trupe. Este ano, mais uma vez, só ficamos a frente do Haiti, registrando um crescimento econômico abaixo de todos os outros emergentes latino-americanos. Parafraseando Caetano Veloso - "O Haiti é aqui".

O Governo Lula alardeia e comemora o crescimento de pessoas empregadas, mas são irrefutáveis os dados de que, no início da sua administração, havia oito milhões de desempregados, hoje, este número chega a nove milhões. Isso significa que o assistencialismo vai continuar a vigorar como moeda eleitoral, sem produzir nenhum efeito consistente de incorporar novos contingentes populacionais à condição de consumidor, sob a perspectiva de efetivamente resgatarem a dignidade de milhões de excluídos. Já dizia o nosso grande Luiz Gonzaga, o eterno Rei do Baião, que a esmola para um homem "ou mata de vergonha ou vicia o cidadão".

Ao aderir ao atual modelo econômico, com o objetivo expresso de controlar a inflação, o Brasil comprometeu boa parte da indústria nacional, do emprego formal urbano e da classe média, além de precarizar a capacidade de regulação e de prestação de serviços públicos.

Após a abertura comercial, privatizações e o elevado superávit primário, a economia brasileira não cresceu, o desemprego continua elevado, a renda do trabalho perdeu participação no PIB e o Estado não recuperou a sua capacidade de investimento. Por quê? Simplesmente, porque não fomos competentes na condução das reformas estruturais necessárias para "alavancar" o nosso crescimento.

Hoje, um verdadeiro projeto para o Brasil deverá atuar em três frentes complementares: recuperação do papel do Estado, investindo em infra-estrutura, diminuindo seus gastos e a atual sanha arrecadatória; a dinamização do mercado interno, com a redução da desigualdade social e o fortalecimento das agências de regulação; além da necessidade premente de mantermos um esforço permanente de ampliar a nossa competitividade internacional.

*Arnaldo Jardim é deputado estadual pelo PPS

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