Corporativismo é apontado como obstáculo da Reforma do Judiciário


02/09/2005 19:10

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Debate realizado pela Liderança do Partido dos Trabalhadores sobre a Reforma do Judiciário <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/REforma Judiciario.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Uma das alterações previstas na Emenda Constitucional 45 " que tratou da Reforma do Judiciário " foi a criação do Conselho Nacional de Justiça, cuja função é realizar o controle externo dos órgãos desse poder. Porém, sua atuação foi amplamente questionada durante o debate realizado pela Liderança do Partido dos Trabalhadores nesta quinta-feira, 1º/9. O primeiro ponto questionado foi a própria natureza jurídica do conselho, qué vinculado ao Poder Judiciário e composto majoritariamente por ministros dos tribunais superiores, desembargadores e juízes.

A timidez do conselho, segundo o especialista em Direito Constitucional, José Afonso da Silva, já se mostrou na questão da proibição das férias coletivas de 60 dias, adotadas na maioria dos órgãos judiciais. "A inovação constitucional que vedou o recesso do Judiciário é auto-aplicável, mas a maioria dos tribunais estaduais entendeu que seria necessário haver uma regulamentação. Nesse contexto, o Conselho Nacional de Justiça editou uma simples recomendação, que não foi atendida por praticamente nenhum tribunal", explicou o professor, indagando "que poder terá uma resolução do Conselho Nacional de Justiça, se os desembargadores não obedeceram nem a Constituição?"

Outro aspecto negativo da EC 45 apontado pelo livre-docente da USP foi a intenção de unificação processual dos juizados especiais civis e criminais, que julgam causas cíveis de menor complexidade e delitos de menor potencial ofensivo. "O grande sucesso que os juizados especiais vinham obtendo devia-se exatamente à sua simplicidade processual. Com a adoção de um rito mais complexo, esses órgãos correm o risco de perder sua agilidade".

Judiciário deve buscar meios de economia processual, diz secretário

O secretário nacional da Reforma do Judiciário, Pierpaolo Bottini, afirmou que o trabalho de sua pasta tem em foco a desburocratização e a modernização do Judiciário, além de estudar as alterações possíveis nos códigos de Processo Civil e Penal. "Nossa legislação torna possível que, em um único processo, sejam interpostos mais de 47 recursos, muitas vezes somente com a intenção de procrastinar a sentença". Para Bottini, o desafio é buscar meios de economia processual sem que, com isso, fiquem tolhidos o contraditório e a ampla defesa.

"O Brasil investe no Judiciário 3,66% do orçamento. Nossos juízes proferem, em média, 4 sentenças por dia, o que não é pouco. Além disso, contamos com 7,7 magistrados a cada 100 mil habitantes, sendo que o mínimo recomendado pela Organização das Nações Unidas é de 7,1", informou o secretário, explicando que busca meios de conferir maior celeridade e acesso ao Judiciário sem que com isso haja perda de qualidade nas sentenças.

Além de mudanças no processo civil e penal, sua proposta traz mudanças de gestão, que não necessitam de alteração legislativa, como desburocratização, uso intensivo de recursos de informática e capacitação e valorização dos servidores públicos, além do incentivo a iniciativas de intermediação de conflitos, sem a necessidade de ações judiciais. "Poderão ser realizadas penhoras on-line de contas bancárias, de imóveis e de veículos", afirmou Bottini, que também defende que a decisão do mérito e a execução sejam unificadas em uma única peça processual.

Reforma do Judiciário Federalismo

Professor titular da USP, o desembargador Enrique Ricardo Lewandowsky afirmou ter uma visão extremamente crítica e negativa dessa reforma do Judiciário, pois, "como todas as reformas que ocorrem no país, essa também foi realizada "no varejo", com caráter tópico e imediatista, sem levar em conta um projeto nacional".

Lewandowsky também considera que a EC 45 é antifederalista, pois não segue o princípio da subsidiariedade: "tudo o que o ente menor puder resolver melhor, a ele caberá essa competência". Dessa forma, o desembargador condena a interferência da União na tentativa de estabelecer normas e procedimentos semelhantes em estados tão desiguais, como São Paulo e Acre. "Se há dificuldade de acesso e comunicação na região amazônica, é natural que lá os prazos processuais sejam mais dilatados", afirmou. Mais do que isso, Lewandowsky defende a criação da Justiça Municipal, à semelhança do que ocorre nos Estados Unidos: "É a justiça do "martelinho", que resolve em 24 horas questões simples como infrações de trânsito.

Instrução

Também seguindo o exemplo norte-americano, o advogado Ricardo Tosto, presidente da Comissão de Reforma do Judiciário da OAB-SP, sugeriu que a fase de instrução " quando se juntam as provas ao processo " fosse totalmente coordenada pelos advogados das partes, o que diminuiria a atribuição dos magistrados, dando-lhes mais tempo para apreciar o mérito das lides. Quanto ao corporativismo dos membros do Judiciário e o lobby que promoveram junto ao Congresso Nacional, o advogado considerou como algo natural, inerente ao ser humano.

Nesse momento, a deputada Maria Lúcia Prandi (PT), que coordenou o debate em conjunto com o também petista Vanderlei Siraque, tomou a palavra para afirmar que os legisladores são sensíveis a alguns lobbies, mas a outros não. "A Casa esteve lotada de estudantes durante o dia de hoje, mas a reação da bancada governistas foi negar quórum para a apreciação do veto à LDO", explicou a deputada, lembrando que, por outro lado, o lobby dos cartórios tem sido eficiente desde o tempo das capitanias hereditárias.

A visão defendida por Enrique Lewandowsky " de que deve caber ao poder local competência legislativa sobre o funcionamento do judiciário " também foi tratada com ressalvas por Prandi: "Descentralização não é sinônimo de democracia. A maior concentração de poder que este país já sofreu foi com o coronelismo, que era poder local". Para a deputada, o essencial é que a Justiça esteja acessível a todos, de forma ágil e eficiente, de forma a estimular que os cidadãos passem a lutar pela garantia de seus direitos.

alesp