O Polvo e a Filósofa

Opinião
31/08/2005 19:43

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Milton Flávio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/MiltonFlavio7.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Hoje, há um consenso entre a maioria dos analistas políticos sérios, independentemente de sua coloração partidária: o país vive a mais grave crise de sua história republicana. A crise deriva do assalto ao estado produzido pelo polvo petista, que levou para o Palácio do Planalto o know how adquirido por vários "companheiros", no período em que estiveram no comando de diversas prefeituras pelo país afora. Só não enxerga quem não quer: o PT está para a política assim como o polvo está para o mar.

Vale a pena, por sempre atual, reproduzir um breve trecho do sermão que o padre Antônio Vieira dedicou aos peixes, em 1.654, em São Luís do Maranhão: "O polvo com aquele seu capelo parece um monge; com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela; com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo dessa aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa... é o maior traidor do mar."

Ainda afirma Vieira: "Consiste esta traição do polvo primeiramente em se vestir ou pintar das mesmas cores de todas aquelas cores a que está pegado... Se está nos limos, faz-se verde; se está na areia, faz-se branco; se está no lodo, faz-se pardo; e se está em alguma pedra, como mais ordinariamente costuma estar, faz-se da cor da mesma pedra." E tudo isso para transformar em prisioneiros os peixes que por ele passam "desacautelados".

Ao contrário do camaleão, o polvo não se transforma para se defender de seus agressores. Transforma-se para fazer vítimas. Hoje, todos nós, mesmo os milhões de brasileiros que não votaram em Lula, somos vítimas: da absoluta falta de projetos para o país; da tentativa de aparelhar o Estado e os movimentos sociais em benefício de um grupo; do assalto aos cofres públicos em nome de um projeto de poder; do esforço mal dissimulado para calar a imprensa, produtores culturais e o Ministério Público; do preço alto que estamos obrigados a pagar por conta do "risco PT"; do esforço para aniquilar um dos poderes da República " o Legislativo "; das bobagens embaladas na forma de discursos e improvisos diários de Sua Excelência.

Nada disso, porém, parece ser capaz de incomodar gente como a filósofa petista Marilena Chauí. Dias atrás, num seminário sobre "O silêncio dos intelectuais", ela disse em alto e bom som que não tem "informação suficiente" para se pronunciar sobre o "assunto" " no caso, a crise política em curso por obra e desgraça de seu partido e do governo que ela faz questão de defender.

A falta de "informação suficiente" da filósofa petista resulta do fato de que ela, há cinco meses, não lê jornais em função de problemas de saúde na família. É um direito seu não ler jornais, embora tal prática me pareça heterodoxa para quem vive de pensar. Sinceramente, torço para que seus problemas sejam superados da melhor forma possível. Mas o que me chama a atenção é o fato de que Chauí só fala o que lhe convém e quando lhe convém. A falta de leitura, por exemplo, não lhe impediu de acusar a imprensa de ser pautada pelos ideólogos tucanos. Em sendo assim, afirmou a filósofa, "sobraria para o PT a pecha da falta de seriedade e a da incompetência".

Como a doutora Chauí, ao contrário do padre Vieira, não se dirigia aos peixes, é possível que o polvo tenha feito ouvidos moucos à sua peroração. Do contrário, pela sua natureza, quero crer que se tingiria de vermelho carmim. De pura vergonha. Essa gente não se emenda. Saqueia o país e ainda se pretende dona exclusiva de todas as virtudes. A culpa é sempre dos outros.

* Milton Flávio (PSDB) é professor de Urologia da Faculdade de Medicina da Unesp, em Botucatu, e vice-líder do governo na Assembléia Legislativa de São Paulo.

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