Comissão recebe representantes de movimentos sociais para debater ação da polícia


29/09/2005 21:14

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Hamilton Pereira, Tiãozinho da Farmácia, Rosmary Corrêa e Ana do Carmo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/dirhum389mau.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Valdênia Paulino, do Centro de direitos Humanos de Sapopemba, critica operação policial na Favela Elba. Ao lado, Ítalo Cardoso, presidente da comissão<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/dirhum395mau.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Nelson da Cruz Souza, do Movimento de Moradia da Região Centro, denunciou intimidação de famílias despejadas<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/dirhumNelson01mau.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

A Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo deputado Ítalo Cardoso (PT), se reuniu nesta quinta-feira, 29/9, para debater a atuação das polícias do Estado de São Paulo em relação aos movimentos sociais e em áreas de ocupação. Representantes de movimentos por moradia e de direitos humanos puderam expor suas reclamações e denúncias, assim como reivindicar ações sociais da parte do Estado.

População assustada

Segundo a representante do Centro de Direitos Humanos de Sapopemba, Valdênia Paulino, no dia 28/8, cerca de 300 policiais militares realizaram uma mega-operação para desarmar a população da favela Jardim Elba e Santa Madalena, situada na zona leste de São Paulo. "Chegaram às 5 horas da manhã de um domingo, com todo o arsenal, helicóptero, cachorro, e invadiram muitas casas. A população não sabia, mas quem é responsável pelo tráfico sim, pois já haviam sumido no dia da operação. A informação deve ter vazado", suspeitou Valdênia. Para ela, a população precisa da polícia sim, mas não por apenas 40 dias, e sim permanentemente.

Valdênia reclamou da falta de identificação desses policiais e do fato de as operações só acontecerem na periferia. "Muita gente perde emprego porque seus chefes ficam com medo. Qual a finalidade e efetividade das mega-operações e o impacto disso na vida das pessoas? Segurança se faz com respeito e não tratando pessoas como marginais".

O representante do Movimento de Moradia da Região Centro, Nelson da Cruz Souza, relatou uma prática que ocorre naquela área da cidade, que também sofre com a violência da polícia. No dia 16 de agosto deste ano, ocorreu um despejo em que as famílias, sentadas no chão, sofreram agressões dos policiais com sprays de pimenta. "As pessoas estavam sentadas e não puderam se defender. Estamos sofrendo com o descaso e despreparo do governador do Estado. O preparo da polícia é para coibir o trabalhador, cidadão de bem", protestou.

Nelson tem recebido ameaças de que, se for visto em locais de protesto, será preso. "Não queremos ser tratados como marginais. Que crime cometi? Só porque sou pobre, preto e sem teto?". O manifestante reclamou das mudanças feitas pelo prefeito José Serra e das ações do presidente da República, que oferece um auxílio-moradia de R$250, que ele considera uma "bolsa-miséria": "Essa quantia só serve se for para as pessoas morarem na periferia, mas o povo não quer viver lá porque lá não pode se organizar e lutar por seus direitos".

Representante dos despejados, o advogado André Araújo, engajado na questão da região central, disse que a ação da polícia no despejo criminalizou o movimento. Ele se disse envergonhado pela atitude da polícia, que ameaçou impedir a ação dos advogados, que não estavam ali para agitar, e sim para tranqüilizar as famílias. "A polícia militar chegou atirando com balas de borracha antes mesma da ação de qualquer manifestante", assegurou. "Quero registrar a ação da Secretaria de Assistência Social, que não se preocupou com o destino de crianças e idosos que estavam no local. Os móveis das famílias foram levados como lixo nos caminhões".

Criminalização da pobreza

O coordenador dos Trabalhadores Sem-teto, Guilherme, reclamou do fato de que os policiais invadem bairros de uma maneira que jamais empregariam em bairros de classe média. Além disso, ele falou sobre um acordo feito em 2002 com o secretário da Justiça na época, Alexandre de Moraes, no qual assegurava que em 4 meses haveria a construção de prédios para moradia das famílias, na região de Guarulhos. Em menos de um mês, a polícia entrou despejando as famílias, rasgando o acordo. O secretário, segundo Guilherme, alegou que não era o primeiro e nem seria o último acordo a ser rompido por ele, e as famílias foram obrigadas a retornar a Osasco, lugar de origem do movimento. Em outra ocasião, policiais queimaram pertences dos sem-teto, prenderam 7 pessoas por suposto desacato, inclusive uma criança de 12 anos, que reagiu ao ver sua mãe ser atacada. Famílias foram jogadas na via expressa da Marginal Pinheiros. "Não precisa estar em luta para ser criminalizado. Basta ser pobre. Proponho uma audiência pública para discutir a violência policial, a criminalização da pobreza e convocar o secretário de Segurança Pública. Os policiais estão confiantes na impunidade. Só por cima se pode mudar a conduta dos policiais".

Esse tipo de problema também ocorria com a coordenadora da Associação do Movimento do Povo e Trabalhadores do Pantanal Jardim São Martinho e Adjacências, Maria de Lourdes Scarpim. Após a comunidade decidir denunciar os abusos, a situação melhorou 50%, segundo ela. Mas, para isso, as famílias foram para a rua, apanharam, foram humilhadas e processadas. Ela aconselha a população a não ter medo.

O outro lado

Eduardo Altomare Ariente, em nome de Antonio Funare Filho, disse que a Ouvidoria da Polícia Militar de São Paulo está acompanhando todos os casos apresentados na reunião. Ele citou a importância de a sociedade civil se manifestar, pois é preciso ter outras fontes de informação além da imprensa. A Ouvidoria disponibiliza um telefone gratuito para que a população possa fazer reclamações, dar sugestões ou elogiar a Polícia Civil e Militar (0800-17-7070).

Já o promotor social do Ministério público do Estado de São Paulo, Carlos Cardoso, acredita que as ações na comunidade do Jardim Santa Madalena foram desencadeadas pelo assassinato brutal de um oficial de polícia pelos traficantes daquela área. Para ele, não adianta haver só vigilância policial para garantir a segurança, é preciso haver apoio através de ações educacionais, de moradia, de saneamento básico e de lazer para os jovens, que hoje não têm perspectiva nenhuma. "Espero que reuniões como essa possam mudar a mentalidade das autoridades. Falta um empenho maior dos governantes". A sugestão que ele dá é de realizar eventos com a sociedade civil e as autoridades policiais, a fim de traçar estratégias para combater o crime sem agredir a população.

Em defesa da polícia, falou a deputada Rosmary Corrêa (PSDB), que informou que nenhum policial faz o despejo com prazer. São determinações que eles devem seguir depois que todas as possibilidades de acordo se esgotem. A parlamentar citou o funcionamento dos Consegs (Conselhos Comunitários de Segurança), que permitem que a população se una a fim de melhorar a questão da segurança em sua região. "O Conseg é um grande mecanismo para a população se aproximar da polícia, levar questionamentos e recorrer a outros mecanismos caso não seja atendida". No currículo das academias de polícia, Diretos Humanos é matéria obrigatória, o que melhora a qualidade desses profissionais, que aprendem como tratar a população.

Ação agressiva

O deputado Hamilton Pereira (PT) comentou que foi possível ver a ação agressiva na polícia na própria Assembléia, nas ocasiões em que a Casa recebeu manifestantes contra o veto do governador às emendas da LDO. Isso também ocorre, segundo ele, nas portas de metalúrgicas em campanhas salariais. "Essas repressões não são exclusividade da capital". Porém, esses atos de repressão não são feitos pela polícia local. De acordo com o parlamentar, a polícia é enviada diretamente pela Secretaria de Segurança Pública, o que torna isso uma política de Estado. Hamilton Pereira ressalta que não se deve julgar a polícia como um todo, e que essas atitudes são exceções. "Proponho fazer um grande relatório, coletar material das entidades e associações para elaborar um dossiê circunstanciado".

O presidente Ítalo Cardoso (PT) decidiu encaminhar relatório para a próxima reunião da comissão. O deputado ressaltou que o secretário de Segurança Pública não tem se apresentado em nenhuma comissão da Casa, às quais tem sido freqüentemente convidado a comparecer.

alesp