Defensoria Pública: Questão de Justiça

Opinião
08/09/2005 16:38

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O Estado de São Paulo está a um passo de reparar uma omissão histórica. Omissão esta que já dura 16 anos e cujo maior pecado tem sido o de dificultar o acesso de pessoas pobres à justiça, ao conhecimento de seus direitos mais básicos.

Em 1989, a Constituição do Estado de São Paulo determinou que o Executivo criasse e instalasse a Defensoria Pública, órgão independente que seria responsável pela prestação da assistência jurídica às pessoas carentes, aqueles que não têm condições de contratar um advogado.

Valendo-se da existência de um serviço parecido, mas insuficiente, prestado pela Procuradoria de Assistência Judiciária " PAJ " e por convênios com entidades como a Ordem dos Advogados " OAB ", os sucessivos governos desde aquela época, inclusive os do PSDB, foram "empurrando com a barriga" a criação da Defensoria Pública.

Dados do IBGE, em 2002, mostravam que o Estado de São Paulo tinha cerca de 15 milhões de pessoas vivendo com até 2 salários mínimos por mês, espalhadas pelos seus 645 municípios. Já a assistência jurídica feita pela PAJ está presente em apenas 21 cidades e nem mesmo nelas consegue prestar atendimento a todos os necessitados. Muitas filas e frustrações tem sido o resultado desse atendimento.

Além disso, nos últimos 2 anos, foram fechadas unidades de atendimento criminal das PAJs de todos os foros regionais da Capital e de Mogi das Cruzes, e as cíveis de cidades da Grande São Paulo, como Poá, Suzano, Mauá, Ribeirão Pires e Guarulhos. Nessas e nas outras mais de 300 cidades do Estado que não possuem unidades da PAJ, o atendimento às pessoas pobres é feito por advogados da OAB conveniados, que recebem um valor determinado para cada tipo de ação que ingressam na justiça.

Esse modelo de atendimento às pessoas carentes " PAJ e convênios ", no entanto, é insuficiente e pouco eficaz. Nestes anos todos nunca houve organização, especialização, treinamento e fiscalização deste trabalho. Além disso, os custos desse modelo sempre foram altíssimos se comparados aos custos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, por exemplo. No ano passado, cada atendimento feito pela PAJ custou aos cofres públicos cerca de R$ 99; cada atendimento feito pelos advogados dos convênios, por sua vez, custou ao Estado mais de R$ 230. No Rio de Janeiro, contudo, onde a Defensoria Pública está presente em todas as cidades do Estado, cada um dos 2 milhões e 200 mil atendimentos realizados -mais que o dobro do número de atendimentos feitos em São Paulo, que é 2 vezes maior que o Estado do Rio de Janeiro - custou apenas R$ 51,00.

Esse cenário, no entanto, está preste a começar a mudar. Desde o início de julho estamos analisando na Assembléia Legislativa o projeto de lei que cria a Defensoria Pública estadual. O projeto foi elaborado pelo Executivo a partir de um anteprojeto proposto pelo Movimento pela Defensoria Pública, que reúne 440 entidades de todo o Brasil e que vem, desde 2002, lutando pela criação da Defensoria Pública em São Paulo.

O movimento sempre defendeu " e a Assembléia Legislativa deve garantir " que a Defensoria Pública de São Paulo não se limite apenas a prestar assistência judiciária aos mais pobres, ou seja, atuar dentro dos fóruns, quando o processo judicial já se mostrou inevitável, mas também prestar um atendimento preventivo e interdisciplinar, a fim de fornecer mecanismos " através da educação em direitos " que possam auxiliar as pessoas a prevenirem conflitos e que, em caso de inevitabilidade, busque a solução efetiva e global desses conflitos.

Recursos para isso o Estado tem. No ano passado ele arrecadou mais de R$ 280 milhões por meio de custas extrajudiciais para o Fundo de Assistência Judiciária. E esse dinheiro só pode ser utilizado para custear a prestação de assistência jurídica às pessoas pobres.

O que discutimos hoje, na Assembléia paulista, é o aprimoramento desse projeto, principalmente no que toca ao seu controle externo. É preciso debater e fazer valer mecanismos que garantam a participação da sociedade civil na gestão e na fiscalização da Defensoria Pública, principalmente através de uma Ouvidoria independente e da realização de conferências anuais para a definição do plano anual de atuação da instituição.

O Parlamento paulista, portanto, está muito próximo de contribuir para que as pessoas pobres de São Paulo tenham efetivamente seu direito constitucional de acesso à Justiça garantido, o que se constitui num importante passo no combate à exclusão social.

Donisete Braga é deputado estadual pelo PT, membro da CCJ e Relator do projeto de criação da Defensoria Pública do Estado.

alesp