1955, Jânio Quadros é o Governador de São Paulo. A Assembléia Legislativa, localizada no Parque Dom Pedro II, está no primeiro ano da 3ª Legislatura. O País, sob o estado de sítio, está em calmaria. A ameaça de um golpe para impedir a posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart, eleitos Presidente e Vice-presidente da República no dia 3 de outubro, parece descartada.

No dia 11 de novembro o Congresso Nacional aprovara o impedimento do Presidente Carlos Luz " conduzido à Presidência da República no dia 8 de novembro, em substituição ao Presidente Café Filho " empossando Nereu Ramos, vice-presidente do Senado, para substituí-lo, com o compromisso de empossar os eleitos.

No dia 21, Café Filho declara oficialmente ao Presidente em exercício e aos presidentes do Senado, Câmara e Supremo Tribunal Federal seu intuito de reassumir o cargo, mas na madrugada de 22 de novembro, o Congresso aprova seu impedimento e confirma Nereu Ramos como Presidente. No dia seguinte aprova o estado de sítio no território brasileiro, que permanece até a posse dos eleitos.

No Plenário da Assembléia, o projeto que propõe a ampliação das reservas florestais assume a dianteira dos debates na semana do dia 28 de novembro. O estado de sítio convive com a normalidade política.

O Acervo Histórico mergulha no Plenário e traz à tona o debate travado na Tribuna há 50 anos. Quer, com esse espaço, resgatar um pouco da nossa história. A voz da Tribuna, semanalmente, invadirá as páginas do "Diário do Legislativo" com temas enfocados, no mesmo período, há meio século.

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Desapropriação de terras no Pontal

No dia 30, o Deputado Leônidas Camarinha (PSD) cita artigo do O Estado de São Paulo, que apoiava um substitutivo apresentado por ele ao Projeto de Lei 466/1954, de iniciativa do ex-Deputado Cunha Lima (PTB). Conhecido pelo nome de seu autor, o projeto subordinava as Reservas Florestais do Estado " com grande concentração no Pontal do Paranapanema " ao regime de guarda e fiscalização particulares e não considerava o fato do Código Florestal vigente determinar a preservação das matas nativas em 25% da área de qualquer propriedade agrícola. O substitutivo, que contava com o apoio do Governador Jânio Quadros, previa a desapropriação de 36.300 alqueires de reserva, região onde havia 31 possuidores na área a montante do Ribeirão dos Insetos e 3 ocupantes, em 30 alqueires, na área a jusante.

Alguns proprietários se achavam prejudicados e questionavam que o projeto favoreceria aos que se encontravam fora das áreas de reserva. Esta crítica foi matéria paga em jornais. O substitutivo fora aprovado nas Comissões e o projeto principal rejeitado. O líder do PTB, Cássio Ciampolini, apresentou o pedido do ex-deputado Cunha Lima de retirada do seu projeto. Leônidas Camarinha avaliou que o pedido era uma medida protelatória . "Enquanto tramita o projeto para criação do Dia da Árvore, [...] protelam-se medidas de preservação contra o desmatamento da região do Pontal", argumenta o parlamentar, que apela aos deputados para que neguem a retirada do projeto.

Apesar dos apelos, o Deputado Ariel Tomazini (PRT) declara-se favorável ao pedido de retirada, propondo novo substitutivo, o qual seria apresentado por Rocha Mendes Filho (PTB), com objetivo de ampliar a área destinada a reservas, para a margem direita do rio [Ribeirão dos Insetos]. O Deputado Cantídio Sampaio (PSP) também quer a ampliação da área, afirmando que apresentará à bancada do PSP outro projeto, reconhecendo a área de reserva florestal de 102 mil alqueires decretada pelo interventor Fernando Costa em 1942.

Na votação, 29 deputados votaram pela retirada e 22 pela manutenção. O Deputado Abreu Sodré (UDN) declarou-se impedido de votar, por haver pessoas de sua família envolvidas no conflito. Logo após, o Deputado Cantídio Sampaio apresenta à Mesa o seu projeto de desapropriação total dos 102 mil alqueires de floresta no Pontal, com apoio do Deputado Camarinha.

No dia primeiro, o Deputado Salgado Sobrinho (PRT) manifesta indignação com o jornal Folha da Manhã que criticou a retirada do projeto e propôs que o Governador assumisse a responsabilidade da questão. O Deputado Cid Franco (PSB) fala sobre o parecer da Secretaria da Justiça, favorável à desapropriação da área pelo Governador, declarando a utilidade pública, entendendo que tal medida serviria "como estímulo benéfico e lição necessária" para todo o continente.

O Deputado Camarinha lê matéria do jornal A Folha da Manhã, cujo redator-chefe era irmão de um proprietário de terras na área: "A Inquietação continuará reinando na Alta Sorocabana [...]. O Legislativo confessou que não tem forças para tomar uma decisão [...]. A palavra cabe agora ao chefe do executivo".

No dia 2, o Deputado Silveira Bueno (PTN) solicita ao Deputado Federal/SP Luís Francisco da Silva Carvalho (PTN), que intermedeie pedido de informações ao Ministério da Agricultura e à Petrobrás de estudos sobre a existência de reservas de petróleo no Pontal de Paranapanema, como consta de um relatório de autoria do ex-diretor do Departamento Nacional de Produção Mineral, Sr. Fleury da Rocha, dirigido ao então Ministro da Agricultura, Sr. Juarez Távora, e divulgado por Monteiro Lobato em seu livro O Escândalo do Petróleo, que afirma a existência de petróleo no Oeste do Estado, nas margens do Rio Paraná. O deputado declara suspeita sobre os interesses ocultos na campanha dirigida pelo jornal A Folha da Manhã. A semana se encerra, mas não o debate.

Crise superada

No Dia 28, o Deputado Ariel Tommasini (PRT) denuncia na Tribuna que o Governador Jânio Quadros, através de uma proibição ilegal da Casa Civil, impediu a realização de uma manifestação de solidariedade ao Presidente da República e às Forças Armadas, marcada para o dia 25, na Praça Roosevelt. "Ia o povo dispersando-se pacificamente quando foi atacado a cassetetes pelos policiais. A fúria [...] foi tal que recaiu sobre todos os presentes, inclusive transeuntes, como foi o caso de uma senhora em estado de gravidez, que aguardava condução", relata o deputado. Lembra que o estado de sítio não estava em vigor. "Com esse ato, o Sr. Jânio da Silva forneceu mais uma prova para ser processado como golpista e extremista", conclui o parlamentar.

No dia 30, em entrevista lida no Plenário pelo Deputado Ariel Tommasini, o desembargador Erotides da Silva Lima [um dos patrocinadores do comício] alega que o Governador incorreu em crime de responsabilidade, sujeito a processo penal e conclui: "proibições e dissoluções feitas na vigência de garantias constitucionais são atos de força, [...] atentados ostensivos [...] à Constituição. [...] Nada tiveram com o sítio".

No dia 28, o Deputado Juvenal Rodrigues de Moraes (PSD) afirma que o decreto do estado de sítio "nada mais foi que [...] justa reação contra a pregação da ilegalidade [...] tem apenas uma função de prevenção [...]. Não tem caráter punitivo. [...] é por isso mesmo, inútil [...] a tentativa de apresentá-lo ao povo como um ato de violência, porque o povo conhece muito bem quem criou no País esse clima de ilegalidade".

No dia 29, o deputado Paulo Teixeira de Camargo (PSD) fala da volta da normalidade ao País: "As medidas decorrentes do estado de sítio nem foram sequer postas em prática. [...] Não interferiu na autonomia dos estados e nem tampouco cerceou a atividade das Assembléias Estaduais". O Deputado Gabriel Quadros (PTN) sobe à Tribuna no dia 30 e "embora continue irredutível [...], contrário ao estado de sítio", tece elogios ao seu executor no Estado de São Paulo, General Stênio de Albuquerque Lima, e recomenda à Assembléia a criação de uma comissão "integrada por representantes de todos os partidos, a fim de levar a esse digno oficial superior as congratulações desta Casa". Esvaziada de polêmicas, dezembro resgata, no Parlamento paulista, o espírito natalino: Paz na Terra.

Racismo em pauta

No dia 28, o deputado Rocha Mendes Filho (PTB) leu a reportagem do jornal Última Hora, sobre a discriminação racial contra negros e nordestinos, por parte de empregadores. Em aparte, o deputado Abreu Sodré (UDN) lembrou que a Lei Afonso Arinos, do líder de seu partido, "impediu que houvesse discriminação racial em nossa terra". A reportagem transcreve carta do Comitê Pró-Melhores Relações Humanas, que defende o interesse dos negros do nosso Estado. Conforme afirmações de dirigentes sindicalistas ouvidos na reportagem, "nas bombas de gasolina não se empregam pretos. A quase totalidade de nossas casas de comércio não aceita negros como balconistas, ascensoristas, boy". O Deputado Rocha Mendes Filho conclamou o Governador a tomar "as medidas para que o Departamento de Colocações deixe de dar preferência aos brancos".

Água para todos

No dia 28, o Deputado Salgado Sobrinho (PPP) abordou o problema do abastecimento de água na Capital. "É preciso que as autoridades [...] respeitem um pouco mais a saúde do povo, dando-lhe água potável em condições de ser tomada". Na mesma sessão, o deputado Maurício dos Santos (PTN) protestou contra o aumento da taxa de consumo de água, criticando o Governador Jânio Quadros. "Entendo até que o serviço público de água deveria ser gratuito, já que [...] é indispensável à sobrevivência da vida humana [...]. Certos tipos de serviços públicos [...] não devem ser concedidos pelo Estado a empresas particulares, justamente porque, [...] esses serviços são deficitários, devem ser deficitários [...] para que possa o seu acesso ser acessível a todos".

Falta de ônibus

O Deputado Rocha Mendes Filho (PTB), no dia 28, denunciou a precariedade do serviço de transportes públicos na Capital, sobretudo na linha "Fábrica-23". Conforme o deputado, havia anteriormente 50 ônibus na linha e, agora, a frota estaria reduzida para 3 a 5 ônibus."Trabalhadores residentes no Ipiranga e Sacomã vêm sofrendo sérios prejuízos, inclusive a perda do descanso remunerado, em virtude de faltas ao serviço, provocadas pela deficiência dos transportes". E lembra: "O ilustre Prefeito da Capital, Senador Lino de Mattos, quando eleito, prometeu que resolveria o problema da CMTC, inclusive colocando ônibus para os bairros mais populosos e principalmente para os bairros operários".

Cidade infestada de ladrões

O Deputado Cid Franco (PSB), no dia 28, lê relato de assalto na Rua Borges Lagoa: dois jovens lutaram com duas moças para arrancar-lhes as bolsas. Diante de gritos por socorro, apareceu num automóvel um terceiro indivíduo, que derrubou uma das moças com um pontapé. À chegada de populares, um deles disparou tiros de revólver, alarmando a vizinhança. "A cena de "gangsterismo" ocorreu em bairro densamente habitado", comentou o parlamentar. No dia 30, o Deputado Alfredo Farhat (PR) apela ao Secretário da Segurança Pública por policiamento, já que "bandos de perversos [...] infestam a nossa Capital. Quando não conseguem arrombar [...] lançam mão de toda sorte de vandalismo". No dia seguinte retoma o tema: "Há poucos dias, arrombava-se. Hoje já não se arromba, carregam-se até os cofres". Cita depredação em sua própria casa. Retorna à Tribuna com a mesma preocupação: "Os jornais continuam a noticiar [...] a ousada experiência técnica dos ladrões e assaltantes [...]. Enquanto [...] a Polícia de São Paulo continua a marcar passo com seus cavalinhos montados e seus guardas a pé". Logo em seguida, o Deputado Bento Dias Gonzaga (PSP), relata reunião do Governador, sobre a urgência em movimentar a máquina da Polícia para evitar-se a onda de roubos. Segundo o parlamentar, "a base primeira de tudo isto [...] nada mais é do que uma conseqüência da desonestidade [...]. Esta é, Srs. Deputados, a verdadeira causa da onda de crimes [...] os responsáveis pelos poderes deixam levar-se apenas pelos níqueis da vaidade que carregam nos furados bolsos da honestidade".

Antes das Delegacias da Mulher...

No dia 30, o Deputado Farabulini Júnior (PTN) relata a seus pares que recebeu apelo de mãe e vítima de "monstruoso crime de estupro" ocorrido na Vila Maria: "depois de examinada a vítima, o delegado não tomou as providências, apesar da consciência do crime consumado. O caso foi encaminhado ao então Secretário da Segurança Pública [...] que também não tomou conhecimento do fato". Teriam recebido proposta de suborno, em troca de silêncio, e do envio da vítima em definitivo para o Norte " o culpado, supostamente, era coronel do Exército ", quando pediram ao Deputado que acompanhasse o processo no Juizado de Menores. Segundo o parlamentar, que apresentou requerimento de inquérito administrativo, a par do policial, para apurar eventual prevaricação e corrupção passiva do delegado, "houve incúria da polícia como bem acentua o jornal Folhas", dada a patente militar do ofensor, e não manifestação do Secretário da Segurança Pública.

Contingência da modernidade

O Deputado Dante Perri (PR), no dia 2, protestava contra decisão do Governador de "suprimir os privilégios de estacionamento" no centro da cidade, alegando que os automóveis, embora importados, já se incorporaram à vida paulistana. "Obrigar o cidadão a deixar o veículo [...] a servir-se de ônibus é inutilizar a função do veículo, tornar sem valor as divisas despendidas, e dificultar [...] a vida do homem laborioso. Há patente exagero na salvaguarda da imensidade de vazios existentes no centro da cidade, [...] porque o estacionamento é proibido. Exagero e luxo [...]. Trânsito [...] volumoso é uma contingência da vida moderna".



Acervo Histórico no Portal

A Divisão de Acervo Histórico é responsável pela guarda de 91 mil negativos fotográficos, do período de 1953 a 1992, digitalizados e disponíveis para consulta, além de documentos históricos de 1819 até 1947 e aproximadamente 28 mil livros. Tem utilizado este farto material em exposições que, posteriormente, são disponibilizadas, virtualmente, no portal da ALESP, onde também podem ser consultados uma base de dados dos documentos do Império, o Guia do Acervo e o catálogo de suas publicações. (www.al.sp.gov.br/web/acervo/index_acervo.htm).



Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo

3ª Legislatura (1955 " 1959)

Mesa Diretora eleita em março de 1955:

Presidente " André Franco Montoro (PDC)

1º Secretário " Luciano Nogueira Filho (PSD)

2º Secretário " Mendonça Falcão (PST)

Partidos representados " nº de deputados

Partido Social Progressista (PSP) " 17

Partido Social Democrático (PSD) " 12

Partido Trabalhista Nacional (PTN) " 08

Partido Republicano (PR) " 07

União Democrática Nacional (UDN) " 07

Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) " 06

Partido Democrata Cristão (PDC) " 04

Partido Socialista Brasileiro (PSB) " 04

Partido Republicano Trabalhista (PRT) " 03

Partido Social Trabalhista (PST) " 03

Partido Republicano Progressista (PRP) " 03

Partido Libertador (PL) " 01

Total de parlamentares " 75