Comissão da Verdade promove seminário Desafios e Possibilidades

Evento teve a participação de Eduardo Cueva, do Centro Internacional para a Justiça de Transição
21/03/2012 21:27

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Eduardo Gonzales Cueva, Adriano Diogo e Marlon Weichert <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2012/VerdadeVLM8212.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Seminário Desafios e Possibilidades<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2012/VerdadeVLM8193.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Comissão da Verdade Rubens Paiva realiza workshop nesta quarta-feira, 21/3, para discussão do tema Desafios e Possibilidades, em parceria com o ILP <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2012/Verdade.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

A Comissão da Verdade Rubens Paiva, presidida pelo deputado Adriano Diogo (PT), realizou workshop nesta quarta-feira, 21/3, para discussão do tema Desafios e Possibilidades, em parceria com o Instituto do Legislativo Paulista (ILP) e do Núcleo de Preservação da Memória Política.

Após a abertura dos trabalhos, foi dada a palavra ao primeiro palestrante, o sociólogo Eduardo Gonzales Cueva, diretor do programa Verdade e Memória do Centro Internacional para a Justiça de Transição (CIJT) e responsável pela organização e funcionamento da Comissão da Verdade e Reconciliação do Peru, cujo trabalho foi pautado em audiências públicas.

Cueva apresentou vídeo com o testemunho de uma vítima chilena que teve seus direitos violados. No vídeo, além das atrocidades, a vítima relatou que o desconhecimento do destino das pessoas da sua família é martirizante. A comentar esse testemunho, Cueva afirmou que o direito à verdade é praticado na comunidade internacional. É um "principio jurídico que a nenhum país é dado desconhecer e desconsiderar".

A assembleia geral da ONU aprovou, por unanimidade, de acordo com a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que o dia 24/3 seja o Dia Internacional do Direito à Verdade. Para Cuevas, as comissões da verdade formadas nos países que sofreram violações dos direitos humanos por suas ditaduras, políticas ou segregacionistas, são poderosos instrumentos para implementar o direito à verdade.

Cueva ainda ressaltou o trabalho de Sérgio Vieira de Mello, ex-chefe do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, que construiu um processo de reconciliação dentro de cada comunidade do Timor Leste, coordenando processos penais com ampla participação dos cidadãos.

Encerrando sua participação, Cueva fez um breve paralelo entre as diversas comissões da verdade instaladas em países como África do Sul, Canadá, Chile, Argentina, Guatemala, Peru e Timor Leste. Destacou que, dentre os países que passaram por ditaduras, o último a implantar a Comissão da Verdade é o Brasil. Cueva espera que o caminho aberto aqui tenha resultados positivos.



Distanciamento no tempo



O segundo convidado pela Comissão da Verdade Rubens Paiva, o procurador do Ministério Público federal, Marlon Alberto Weichert, falou sobre os objetivos que uma comissão da verdade deve ter e elogiou o deputado Adriano Diogo pelo início do funcionamento da comissão paulista, antes mesmo do início da comissão nacional.

Marlon chamou a atenção da plateia para o que se pretende com uma comissão da verdade, 40 anos após os fatos terem ocorrido, e lembrou que essas comissões são estabelecidas geralmente logo após a volta do país ao Estado de Direito. "Após tanto tempo, as provas vão se evaporando, as testemunhas vão se esquecendo ou se confundindo. Mas esse distanciamento no tempo também traz vantagens, sobretudo numa comissão da verdade, que é a vantagem do distanciamento do contexto político do conflito. Também a distância do tempo dos conflitos é que vai permitir uma análise mais profunda das causas e consequências do regime autoritário. A distância pode permitir que nós tenhamos saldos importantes na consolidação de um Estado Democrático de Direito".

Marlon analisou também alguns artigos da Lei 12.528/2011, que criou a Comissão Nacional da Verdade. Em seu artigo 1º, a lei cita a finalidade da comissão como sendo a de "examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos" e Marlon debruçou-se, em sua análise, principalmente em alguns parágrafos do artigo 3º, que determina como objetivos da Comissão Nacional da Verdade: esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações de direitos humanos mencionados no caput do artigo 1º; promover o esclarecimento circunstanciado dos casos de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria, ainda que ocorridos no exterior; identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos mencionadas no caput do artigo 1º e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade. Marlon esclareceu que a preocupação da Comissão da Verdade nesse último parágrafo é com os aparatos estatais, e não com o agente da violação, o que o procurador chamou de injustiça trazida pela que a Lei da Anistia.



Terrorismo ou resistência



Entre os elementos de investigação, o procurador citou: quantificar as violações (mais tarde, por sugestão da plateia, Marlon incluiu a qualificação das violações); identificar as estruturas (espaços oficiais e clandestinos de graves violações dos direitos humanos); apurar responsabilidades pelas violações (indicando autorias pessoais pelas violações); desvendar as estruturas de sustentação econômica do período e esclarecer se há ou não arquivos da época e, em não havendo, quem foi o responsável pela destruição desses arquivos; pesquisar a legislação secreta; definir oficialmente se houve terrorismo ou resistência (outro item que foi cobrado pelo público, mas o procurador disse que usou o termo terrorismo como provocação e que é importante o reconhecimento oficial de que houve resistência).

Marlon alertou ainda para as armadilhas em que a comissão não pode cair, como a nominação de autores e como se vão qualificar esses nomes (a comissão não julga, a comissão indica). Marlon esclareceu ainda que a Corte Interamericana dos Direitos Humanos entende que a anistia não produz efeito para as graves violações dos direitos humanos.

Após a explanação de Marlon, o deputado Adriano Diogo abriu a palavra para a plateia, que pediu esclarecimentos e ofereceu sugestões. O primeiro a tomar a palavra, sugeriu que se fizesse um pedido à presidente Dilma Rousseff para que instale urgentemente a Comissão da Verdade. Eduardo Cueva acatou a sugestão e ainda lembrou que isso poderia acontecer no próximo dia 24/3, data de aniversário do assassinato do bispo salvadorenho Oscar Romero e o dia que foi proclamado pela ONU como o "Dia Internacional pelo Direito à Verdade".

O público também se pronunciou para indagar se as pessoas podem falar o nome de torturadores sem que sejam penalizadas por processos indenizatórios. Eduardo Cueva disse que um ato de calúnia ocorre quando não se pode provar. Se uma família perdeu alguém por causa da tortura que uma pessoa conhecida cometeu, ela pode dizer o nome desse torturador. E o torturador que entre na Justiça para provar que não cometeu aquele crime. Uma outra pergunta da plateia abordou a questão do perdão, ou melhor, eventuais atos que a Comissão da Verdade poderia realizar para fazer com que as vítimas viessem a perdoar seus algozes. Marlon lembrou que o perdão é subjetivo e a comissão não quer que as vítimas perdoem seus torturadores, mas que voltem a confiar nas instituições, que falharam na época do regime de exceção.

O procurador Sérgio Gardenghi Suiama, também presente ao evento, respondeu algumas questões, lembrando que ele e seu colega Marlon estavam ali representando a posição de todo o Ministério Público federal.

alesp