Audiência discute condições de trabalho dos cortadores de cana


26/04/2006 21:27

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Audiência pública debate as condições de trabalho dos cortadores de cana do Estado de São Paulo. <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/aud publ def vida geral 710cint.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Da redação

Realizou-se nesta quarta-feira, 26/4, no Plenário D. Pedro I, audiência pública convocada pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos, Ítalo Cardoso (PT), para debater as condições de trabalho dos cortadores de cana do Estado de São Paulo.

Cardoso lembrou que a audiência aconteceu por ocasião da celebração do Dia Nacional e Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes do Trabalho " 28 de abril. Citou vários eventos ocorridos no Estado buscando reafirmar o compromisso da sociedade com a melhoria das condições de trabalho, como o 2º Encontro da Comunicação a Serviço do Trabalhador, o IX Congresso dos Secretários Municipais de Saúde do Estado e o lançamento, no município do Amparo, da Semana de Saúde do Trabalhador, de 28 de abril e 2 de maio. "Encaminhei este debate por entender que não podemos admitir que cortadores de cana continuem morrendo por excesso de trabalho", declarou.

"A produção da cana-de-açúcar tem se expandido para atender à demanda do mercado internacional. Mas vem sendo feita sem a menor preocupação com a saúde dos que proporcionam o plantio e a colheita da safra. O ritmo de trabalho imposto aos que trabalham no setor cria condições para acidentes, doenças e morte dos trabalhadores. Por isso, precisamos nos mobilizar, junto com o Ministério Publico, o Ministério do Trabalho e sindicatos, para discutirmos as possíveis soluções para o problema", afirmou Simão Pedro (PT). Seu companheiro de partido José Zico Prado acrescentou que as más condições de trabalho no campo não se restringem aos plantadores de cana, citando as dificuldades dos trabalhadores de todos os setores agrícolas " especialmente as dos que trabalham nos laranjais.

Cada vez pior

O presidente da Federação dos Empregados Assalariados do Estado de São Paulo, Hélio Neves, fez várias denúncias. Segundo ele, de 2000 para cá, devido às exportações, as condições de trabalho da categoria pioraram muito. "Na década de 80, os cortados de cana tinham de cortar o que se chama de sete ruas, quantidade que acarretava a morte de muitos deles por exaustão. Após a greve de Guariba, conseguiram que a quantidade retornasse ao que era nas décadas anteriores " cinco ruas. Mas o problema não foi resolvido, e agora a situação é até pior que a da década de 70", denunciou. Disse que os usineiros adotaram o processo de metas que estipula que o trabalhador deve cortar em média 12 toneladas de cana por dia. "Os que não cumprem a meta são despedidos e não encontram outro trabalho na região".

Sobre a luta da categoria por seus direitos, Neves declarou que os trabalhadores do campo sofrem preconceitos dos vários atores sociais e sempre tiveram enormes dificuldades no processo de negociação. Cobrou ainda do Estado " que, segundo ele, tanto favoreceu os usineiros com isenções de impostos, por exemplo ", que favoreça também os que sustentam esse setor tão importante na criação de riquezas para o país.

Situação endêmica

"É uma situação endêmica. Embora haja oficialmente 13 mortos, 416 contratos de trabalho foram rescindidos em 2005 por morte de trabalhadores. Isso foi detectado numa pesquisa realizada pelo MP. Além dos 416 mortos, outros 300 foram aposentados por invalidez", falou Ricardo Garcia, representante do Ministério Público. Para ele, o problema é a omissão: do Estado, que não fiscaliza as atividades dos usineiros; da Vigilância Sanitária, que se omite em verificar em que condições essas pessoas trabalham; e do Ministério da Saúde, assim como dos órgãos ambientais. "Mas a omissão do Estado beira a cumplicidade, de tal forma que as empresas podem agir como querem." Acrescentou que o próprio governo estadual se omite, desrespeitando a Constituição Estadual.

Garcia culpou ainda a terceirização pelas irregularidades ocorridas. "O cultivo e o corte de cana não são de responsabilidade do produtor rural, mas do usineiro. Portanto, este deve ser o único responsável pelos seus contratados, não devendo atribuir o ônus de organização do processo do cultivo a terceiros. Afirmo também que as negociações não irão avançar se o Estado, lato sensu, não usar os instrumento de que dispõe para fazer cumprir a lei."

"A indústria da cana é uma latifundiária, já que não se expande pela produtividade, e sim por mais terras, expulsando gente, criando migrantes e desemprego. A única saída para o problema é uma reforma agrária", declarou o representante do Incra, Raimundo Pires da Silva.

Juntar esforços

O secretário estadual da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, impossibilitado de comparecer, foi representado na reunião por Koshiro Otani, coordenador da área da Saúde do Trabalhador. Segundo Otani, o problema não é a omissão do Estado e sim a sua desorganização. Disse que há uma fragmentação nas atribuições das secretarias que dilui as responsabilidades de cada uma. "Nós, gestores do sistema, não nos entendemos", asseverou. Concordou que é competência do Estado cuidar da saúde e das condições de trabalho da população. Mas ressaltou que é necessário definir as prioridades. Mostrou-se favorável à criação dos Centros de Referência de Saúde, "mas deve haver trabalho articulado".

A técnica da Fundacentro Maria Maeno, otimista, afirmou que pela primeira vez há um ato conjunto entre os governo estadual e federal e organizações da sociedade civil no sentido de juntar esforços para buscar soluções para o problema das condições de trabalho dos cortadores de cana.

alesp