20 anos da Constituinte Estadual de 1989 - José Cicote: combate ao trabalho escravo


05/10/2009 16:33

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Foi, para mim, de extrema importância participar da Constituinte paulista. Naquele momento eu participava de sindicatos que representavam metalúrgicos, em Santo André, no ABC. Na ocasião fui cassado e preso, mas não era comunista, nada.

Na época da ditadura, em todos os boletins que as autoridades soltavam, era transcrito o conteúdo dos nossos discursos e o dos trabalhadores, que aconteciam nas reuniões, nas portas das fábricas. Nesses encontros, a discussão terminava sempre com comentários sobre a Assembleia Nacional Constituinte. Sempre havia muita movimentação em torno do tema. Os participantes das discussões eram Maria da Conceição Tavares, José Dirceu. Era um pessoal que fugira do país, e que, até então, ficava isolado da sociedade. Discutia-se sobre a atuação do "Partidão", dos comunistas.

Numa dessas oportunidades terminamos por fundar o PT. Gostaria de dizer que, inclusive, a ideia desse nome foi minha, tendo sido aprovada num congresso, na cidade de Lins, em 1980.

Fui eleito para deputado. As Constituições Federal e Paulista aconteceram e eu tive a sorte, ou a honra, de participar, como parlamentar, da Constituinte estadual. Era generalizada a opinião de que havia assuntos a serem incluídos na Constituição. Eu tenho só o quarto ano primário, não tenho estudo, fui criado na roça. Recebi muito suporte das sociedades de amigos de bairro e dos sindicatos, até de quem havia sido cassado.



E a participação popular?



A Constituinte trouxe a oportunidade e a liberdade do pessoal se reunir e promover discussões dos temas que nos eram caros. Foi tudo muito lindo. O povo, até então, estava muito retraído para se expor e participar da defesa de qualquer coisa: o povo estava silencioso. A partir do momento em que puderam usufruir de liberdade para falar, esta Casa vivia cheia. De professor, de bóia-fria, de cortador de cana.

Participei de reuniões em Guariba, que tinha um tremendo canavial; na Usina Tamoio, em Araraquara. Apesar de os afiliados do PT terem de doar 40% do seu salário para o partido, não havia recursos para transportar para a Casa as pessoas que vinham participar das discussões. A gente tinha que arrumar ônibus para seu transporte.

Uma das discussões mais acirradas foi a do trabalho escravo no país e em São Paulo, principalmente em Itanhaém, onde tinha muito cacau. Conseguimos colocar emendas, sobretudo as que tratavam da questão da segurança nacional e da condição de sobrevivência de um pessoal que não tinha nem o que comer, que trabalhava, mas não tinha salário: era um trabalho escravo. Abasteciam-se num lugar que era chamado de "armazém", mas que era apenas uma vendinha, que funcionava dentro da fazenda onde trabalhavam. Gastavam todo seu salário nessas compras, que tinham de ser feitas naquele local, e nada lhes sobrava dos seus ganhos mensais. A emenda colocou um ponto final nesse modelo baseado em trabalho forçado, escravo. Este último termo a ser utilizado na redação da emenda, que também foi impressa na Constituição Federal, foi por nossa inspiração.

Havia pessoas que me ajudaram a transformar ideias em textos, como Marco Aurelio Ribeiro, Sergio dos Campos, Geraldo Siqueira, Irma Passoni. Não conseguiria fazer tanto se não fosse essa ajuda.

Mas, havia questões do meio ambiente, da queima da cana. Queríamos impedir que o canavial continuasse a ser incendiado, pois, com essa prática, se extingue rapidamente, exaurindo o solo. Inclusive é sacrificada a fauna local. Nada escapa. E até hoje acontece isso, embora tenha diminuído gradativamente. Não tendo sido colocada na Constituição, a questão seguiu para comissões temáticas e, segundo o termo utilizado, a lei fica sobrestada. Ficamos aguardando uma chance de incluir uma emenda a respeito. Ninguém ficava contra, mas também não votava a favor. Barros Munhoz era o presidente da Comissão de Sistematização. Apesar de discutir bastante o assunto com ele, não houve condição de chegarmos a nenhuma solução.



Como foram os debates?



Acho que poderia ter sido mais exigente na época, do que me arrependo bastante. Mas a gente ainda tinha receio de se abrir muito: estávamos saindo de uma ditadura militar muito ferrenha, sangrenta, amigos meus morreram. Foi muito difícil para mim. Todo mundo aconselhava a ter um comportamento mais discreto, que ainda não era a hora de fazer provocação. Aí o pessoal do partido me chamou. O Zé Dirceu me avisou que eu poderia estar sendo visado. Havia um pouco de abertura, mas era como rabo de cabrita, que é muito curto. Então a questão ficou apenas na discussão. Assim mesmo, entendo que a discussão do meio ambiente foi importante para toda a sociedade, o que valeu muito mais do que apenas colocar na Constituição, pois o movimento foi muito divulgado. Naquela época foi realizada, na Câmara Municipal de Araraquara, uma sessão, em atendimento a pedidos de trabalhadores da Usina São Luiz, que estava sob intervenção. Um pessoal de Guaríba e de toda a região, de Jaboticabal e de Araraquara, num movimento muito forte, foi participar da discussão.

A reforma agrária paulista foi outro ponto de discussão. Havia muita terra que não tinha serventia nenhuma, principalmente no Vale do Ribeira, Apiaí, Itararé, Barra do Chapéu, municípios grandes, onde havia um movimento de desmatamento, e essa questão também tinha de ser resolvida, mas não houve oportunidade.

Quando a Constituição terminou, houve muita cele­bração. Lembrei-me de que meu pai era uma pessoa muito falante, mas eu nunca tive oportunidade de discutir com ele sobre temas legais, de maior abrangência. Ao participar da Constituinte, porém, aprendi a discutir ideias, e foi por isso que fiquei muito emocionado ao lembrar de meu pai, na época da promulgação.



Você se lembra de 1989?

Carlos Saúl Menem Akil foi presidente da Argentina de 8 de julho de 1989 a 10 de dezembro de 1999 pelo Partido Justicialista (Peronista).

Foi muito criticado por corrupção; por seu perdão aos ex-ditadores Videla, Massera, e outros criminosos condenados da "guerra suja" contra os oposicionistas do golpe militar; o fracasso das suas políticas econômicas " que levaram a taxa de desemprego de mais de 20% "; e sua duvidosa manipulação das investigações do bombardeamento da comunidade judaica AMIA center, em 1994, que resultou na morte de 85 pessoas.

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