Comissão ouve denúncias de torturas contra funcionários da Penitenciária de Potim

Agentes penitenciários afirmaram, em reunião de Direitos Humanos, que PCC tem trânsito livre dentro da unidade II
27/05/2004 20:43

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Célio Faiolo e deputado Renato Simões<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/Com Dir27mai04B.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

DA REDAÇÃO

A Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo deputado Renato Simões (PT), ouviu na tarde desta quinta-feira, 27/5, os depoimentos de funcionários da Penitenciária II de Potim (Vale do Paraíba) sobre torturas sofridas e também sobre procedimentos irregulares praticados naquele presídio.

O primeiro a falar na audiência, solicitada pelo deputado Marcelo Candido (PT), foi o ex-funcionário Célio Faiolo, demissionário ainda no estágio probatório de seu exercício.

Faiolo disse que após dois meses de função verificou alguns procedimentos errados que decidiu questionar por julgar que afetavam a segurança do presídio. "Presos ligados ao PCC circulavam livremente pelos corredores do presídio", disse ele.

Em julho de 2002, foi chamado a comparecer na sala do diretor Fábio Brandão, que o aguardava portando uma arma. "Fui espancado e ameaçado. Tive um revólver apontado para mim e um estilete contra minha garganta."

Faiolo registrou a ocorrência junto à Corregedoria e apresentou queixa ao Ministério Público. Não obteve resposta de nenhum dos dois órgãos. "Atemorizado, pedi demissão e não retornei ao prédio nem para retirar meu hollerith".

Sérgio Trindade afirmou ter testemunhado o espancamento de Faiolo, e desde então tem sido perseguido pela diretoria do presídio. "Passei a ter o hábito de anotar todos os procedimentos tomados e fui advertido por isso".Trindade apontou como exemplo de irregularidade a prática de os detentos ligados ao PCC terem prioridade nas refeições e de os restos dos alimentos consumidos por eles serem oferecidos aos presos que não integram a facção.

Dispensa de revista

Alice Mendes, ex-secretária do diretor do presídio, disse que muitos têm medo de prestar testemunho. A funcionária contestou a postura da diretoria, que tentou justificar o espancamento em razão do peculato. "Batemos no Célio porque ele estava com preservativos da penitenciária no bolso", afirmou a diretoria, segundo apontou Alice, lembrando que o boletim de ocorrência de peculato foi lavrado após a data em que Faiolo apresentou queixa formal contra os diretores.

No dia 18 de abril passado, Alice disse ter recebido ordem verbal do diretor Nivaldo Duarte para que não procedesse a revista nas sacolas dos visitantes. "Recusei-me a cumprir a ordem e ao final do dia fui ameaçada por Nivaldo, que frisou: Quem não corre comigo, corre contra mim".

Detento morto

Odair Pompeu relatou as condições em que faleceu o preso Fernando Nascimento. "O preso estava em péssimas condições físicas quando chegou à enfermaria, tanto que o funcionário que o atendeu solicitou ao diretor Nivaldo o encaminhamento do preso ao hospital de Aparecida, o que foi negado. E o detento acabou morrendo".

Joselito Vaz, diretor do Sindicato dos Funcionários da Administração Penitenciária, destacou que o sindicato enviou cópia dos relatos aos ministérios públicos de Pindamonhangaba e de Aparecida e à Corregedoria.

"Também solicitamos o afastamento da diretoria do presídio e desde então temos recebido ameaças na sede do sindicato", disse Vaz, lembrando que outro funcionário espancado, Emerson Santos, havia confirmado presença nesta reunião, mas se encontra desaparecido há 24 horas.

Corregedoria

O corregedor do sistema penitenciário, Antonio Ruiz Lopes, afirmou que o órgão não é conivente com os procedimentos e que continua a apurar os fatos. "Para se afastar a diretoria é preciso provas que justifiquem isso".

Segundo Ruiz, o secretário de Segurança Pública visitou a Penitenciária de Potim recentemente e não ouviu quaisquer reclamações dos funcionários.

A deputada Rosmary Correa (PSDB) disse que houve pelo menos três casos de tortura, o que já aponta para o afastamento dos diretores. "Não se trata de julga-los, mas apenas de evitar constrangimento, uma vez que a maioria dos funcionários está em estágio probatório e são subordinados aos denunciados".

Para o deputado Roberto Alves (PTB), seria muito difícil um dos funcionários acusar a diretoria ante o secretário. "Eles têm medo de falar, porque o secretário vai embora e os funcionários são obrigados a continuar o convívio com seus superiores".

O deputado Marcelo Candido (PT) considera pouco provável que os funcionários do presídio tenham vindo a público denunciar fatos que não pudessem provar. "É muito estranho que vários funcionários tenham pedido demissão ainda em estágio probatório para permanecerem desempregados".O parlamentar também demonstrou preocupação com o paradeiro de Emerson Santos e sugeriu que, assim que o caso for esclarecido, os demissionários possam ser readmitidos.

O presidente da comissão disse que visitou a penitenciária no ano passado e que os presos denunciaram o domínio do PCC no local. "A maioria dos detentos cometeu crimes leves, mas permanecem em celas de segurança máxima superlotada, a pedido e por medo, porque não pertencem ao PCC".

Deliberações

A comissão aprovou a solicitação dos livros de registros da Penitenciária, a convocação dos diretores Fábio Brandão e Nivaldo Duarte para oitiva, o pedido de afastamento da diretoria junto ao secretário de Administração Penitenciária, a requisição de cópia do inquérito sobre a morte de Fernando Nascimento e o pedido para o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) investigar o paradeiro de Emerson Santos.

Nova reunião sobre o assunto, em caráter extraordinário, será realizada no próximo dia 2 de junho, às 14h30, na Assembléia Legislativa.

alesp