Funcionalismo paulista e o desmonte do estado

Opinião
21/07/2005 17:28

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Instalou-se o impasse entre o governo do estado e as entidades sindicais que promovem, nos últimos meses, campanha salarial unificada do funcionalismo estadual. Todo santo ano, o funcionalismo paulista tenta adivinhar qual será a política salarial que os tucanos implementarão naquele ano. Aliás, nem se especula mais sobre política salarial. Especula-se quais serão as categorias que receberão reajustes pontuais na forma de gratificações ou bônus a serem aprovados pela Assembléia Legislativa, a partir de projetos de lei encaminhados pelo governador. Afinal de contas, nestes dez anos em que sou deputado estadual, nunca vi uma política salarial digna desse nome por parte do governo tucano.

Há espaço, no entanto, para uma política salarial neste ano. Desde o começo de 2005, de acordo com dados oficiais publicados em 29/1, o governo do estado está longe do limite legal estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para gastos com pessoal. Como se sabe, a LRF penaliza gestores que ultrapassem 49% da receita corrente líquida com a despesa com pessoal, e impõe um limite prudencial de 46,5%. Ora, os dados publicados naquela data pelo governo do estado mostram que a despesa líquida com pessoal é da ordem de R$ 22.031.646.000,00, exatos 44,53% da receita corrente líquida " orçada em R$ 49.479.722.000,00. Portanto, sobrariam R$ 2,213 bilhões para bater no teto legal estabelecido pela LRF, ou R$ 1.001.165 bilhão para atingir o limite prudencial.

Ao final do primeiro quadrimestre de 2005, a situação evoluiu para um gasto com pessoal ainda mais arrochado. Na prestação de contas imposta pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o governo anunciou ter chegado a um patamar de gastos com pessoal da ordem de 42,78% das receitas correntes líquidas, tendo sim uma margem de R$ 1,96 bilhão de reais para expansão, até atingir o limite prudencial da LRF.

Nem consideremos ainda que o Orçamento do Estado de São Paulo virou peça de ficção nos últimos anos, pois a prática, infelizmente corrente, do Executivo tem sido a de subestimar a receita de modo a limitar a capacidade da sociedade e do parlamento que a representa incidir realmente na definição das despesas do estado. Estudo da assessoria da liderança do PT na Assembléia, utilizando-se sempre de dados oficiais, demonstra que entre 1998 e 2004 o Orçamento do Estado vem produzindo "excessos de arrecadação" da ordem de 5,81%, em média.

Vê-se, pois, que a má vontade de Alckmin com o funcionalismo estadual não se explica por razões meramente financeiras. Na verdade, ela obedece a uma concepção neoliberal de enxugamento do Estado que vem sendo pacientemente implementada desde 1995. De acordo com o Balanço Geral do Estado, entre 1994 e 2003, o número de funcionários públicos de São Paulo caiu de 1.298.891 para 1.199.391, ou seja, uma queda de 99.500 pessoas. Quando consideramos apenas os funcionários da ativa, retirando do cálculo aposentados e pensionistas, fica mais evidente o desmonte do serviço público promovido pelos tucanos: nada menos de 170.758 funcionários foram retirados do serviço público estadual. Eram 912.036 funcionários da ativa em 1994, contra 741.268 funcionários da ativa em 2003.

No ano de 2004, só para registrar que esse processo não se faz sem prejuízo às políticas sociais do governo, cito os dados da saúde e da segurança pública. Na área da saúde, o pagamento de pessoal foi 6,32% menor que o orçado. Na área da segurança, propagandeada pelo secretário Saulo como o supra-sumo das prioridades do governo, o pagamento de pessoal civil foi 8,89% menor que o orçado e o de pessoal militar foi 11,87% menor que o orçado. Belos exemplos de valorização profissional nas áreas sociais do governo.

Paralelamente a este desmonte do estado, houve um aumento de 160% nos gastos com terceirização dos serviços entre 1998 e 2004. Neste último ano, a participação dos gastos com terceirização na despesa geral do estado chegou a 8,45%, contra 5,49% em 1998. Não é à toa que o governador Geraldo Alckmin vem se transformando no queridinho do empresariado prestador de serviços no estado, pelo menos daqueles setores beneficiados com o repasse de funções antes assumidas diretamente pelo serviço público.

*Renato Simões é deputado estadual e líder da bancada do PT na Assembléia Legislativa de São Paulo.

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