Vítimas de violência policial denunciam racismo em tribuna livre


02/06/2004 21:17

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Parlamentares, promotores e representante da OAB-SP compõem mesa de trabalhos <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/Tribuna Ze.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Gegê, da coordenadoria do CMP<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/Tribuna G Ze.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

DA REDAÇÃO

A proposta de criar uma tribuna livre aberta a vítimas de violência policial resultou no que já se previa. Vítimas e familiares de pessoas que sofreram violência policial relataram uma série de casos de constrangimentos, agressões e mortes promovidas por policiais militares. Quem são as vítimas? Em sua maioria, moradores da periferia, jovens e negros.

A tribuna livre contra a impunidade, a violência policial e o racismo foi uma iniciativa Frente Parlamentar em Defesa da Igualdade Racial, presidida pelo deputado Sebastião Arcanjo (PT), e pelo Grupo de Negros e políticas Públicas da Assembléia Legislativa. Jovens negros, familiares de vítimas e entidades da sociedade civil ligadas ao movimento negro ocuparam a tribuna para relatar acontecimentos que causaram a morte de muitos jovens e experiências de agressões policiais injustificadas. Em todas as falas a mesma expressão de indignação e clamor por justiça.

Familiares do dentista Flavio Ferreira Santana, morto por policiais em Guarulhos, participaram do encontro. Joel Santana, primo de Flávio, disse que o caso da sua família somente ganhou repercussão nacional e internacional por se tratar de um dentista. "Entretanto, se não continuarmos mobilizados e vigilantes, mesmo esse caso tão flagrante pode cair na impunidade", disse.

Violência judiciária

Luiz Gonzaga da Silva, o Gegê, líder do Movimento de Moradia do Centro de São Paulo e da Central de Movimentos Populares (CMP), também participou da reunião e relatou sua experiência. Gegê ficou preso por 51 dias depois de um juiz da Primeira Vara do Tribunal do Júri da Capital ter expedido pedido de prisão preventiva, em razão de denúncia de co-autoria de um homicídio ocorrido há dois anos em acampamento da Vila Carioca, em São Paulo.

Depois de dizer que a violência policial não é particularidade da periferia, já que ocorre freqüentemente nas áreas centrais da cidade, Gegê disse que se considera vítima também da violência judiciária. "Estou sendo vítima de um arranjado. Eles querem calar a nossa organização. Depois de 51 dias preso em diversas delegacias de polícia, considero a reforma judiciária uma prioridade em nossa agenda política".

O promotor Carlos Cardoso, assessor especial de Direitos Humanos da Procuradoria geral de Justiça, disse que a sociedade paulista assiste ao recrudescimento da violência policial. "Ações criminosas da polícia estão se desenvolvendo com tanta desenvoltura que nos faz lembrar do período ditatorial".

Cardoso destacou a expedição de mandados de busca e apreensão coletivos com focos em favelas como uma das ações que ferem direitos individuas e coletivos garantidos na Constituição. "A pretexto de combater a criminalidade, com apoio do nosso judiciário, a polícia invade residências na periferia e deixa rastros de desrespeito, humilhação e traumas impingidos a crianças, mulheres e idosos. Isto demonstra o caráter classista e discriminatório do comando na polícia de São Paulo", disse Cardoso.

Criminalização

"Coisas como essa não ocorrem em bairros como Moema", emendou Hélio Silva Júnior, da Comissão de Direitos Humanos da OAB de São Paulo. Para ele, além do recrudescimento da violência policial, há ainda a redução da problemática da segurança pública aos encarceramentos e à ação centrada na repressão. "Quando o Estado não consegue resolver problemas sociais, apresenta a resposta simples da criminalização dos segmentos sociais atingidos pela pobreza, onde se concentra a maioria da população negra".

Para Silva, o policial age com o pressuposto de que a vida de um negro não vale nada. Para mudar essa mentalidade, o componente racial deve perpassar todas as esferas de formação da sociedade. É preciso um trabalho de conscientização da sociedade e particularmente dos policiais. Essa conscientização sobre questões raciais é fundamental, pois, diz Silva, "as pessoas podem nascer e morrer sem nunca ter refletido sobre o racismo que atravessa o amplo leque de espaços públicos no Brasil".

alesp