Sessão solene homenageia centenário do militante Apolonio de Carvalho

Deputados defenderam atuação da Comissão da Verdade
02/04/2012 15:47 | Da redação Foto: Roberto Navarro

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Rui de Carvalho, Reneé France, Simão Pedro, Rui Falcão, Adriano Diogo e Paulo Vannucchi<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-04-2012/fg87134.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Convidados da solene<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-04-2012/fg87135.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Da redação - Foto: Roberto Navarro

A memória e as lutas de Apolonio de Carvalho foram relembradas nesta segunda-feira, 2/4, na Assembleia Legislativa, em sessão solene proposta pelos deputados Rui Falcão, Adriano Diogo e Simão Pedro, do PT, para comemorar o centenário de nascimento do dirigente.

Falcão lembrou a presença do histórico dirigente, nos anos 1960, durante o processo de organização do 6º Congresso do Partido Comunista Brasileiro. A esquerda seguiu então caminhos diferentes e uma parte dela, segundo Falcão, se reencontrou depois no Partido dos Trabalhadores, onde Apolonio assinou a ficha de inscrição de número 1.

O importância de Apolonio no PT também foi apontada pelo ex-ministro José Dirceu. "Viajamos juntos por diversos Estados, na época de formação do PT. Ele sempre falava sobre a necessidade de o partido fazer alianças com a sociedade, reunindo interesses nacionais, e também alianças políticas, visando a capacidade de gestão", afirmou. Para o senador Eduardo Suplicy, o legado de Apolonio foi a indicação do melhor caminho para a superação de divergências.



Solidariedade internacional

A atuação de Apolonio de Carvalho além dos limites do território nacional foi destacada por Simão Pedro e pelo deputado federal Paulo Teixeira. "Ele foi um exemplo de militante e de solidariedade internacional, um entusiasta da transformação da sociedade", observou Simão. "Era um cidadão do mundo, e para ele nunca foi um peso lutar pelos ideais de brasileiros, espanhóis e franceses", acrescentou Teixeira. O representante de São Paulo na Câmara dos Deputados considerou ainda uma homenagem ao dirigente o trabalho a ser feito pela Comissão da Verdade, órgão criado em âmbito federal e no Estado de São Paulo para esclarecer episódios ocorridos durante o período da ditadura militar no Brasil.

"Se Apolonio estivesse vivo, estaria nos orientando a fazer a Comissão da Verdade com grandeza, como um momento maior da nossa nacionalidade", reforçou Adriano Diogo, ressaltando que existem atualmente cerca de 70 mil processos abertos na Comissão Nacional de Anistia. "Que nossos desaparecidos possam ter uma sepultura digna, que a história seja contada e os bárbaros crimes cometidos sejam identificados", acrescentou.

O ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vannucchi, foi auxiliar de Apolonio na elaboração de documentos sobre a relação do PT com grupos de esquerda. "A palavra "novo" aparecia mais de 50 vezes em cada texto", lembrou. Ele também associou o fato de Apolonio ser "um revolucionário de vida inteira" ao recente enfrentamento entre jovens apoiadores da Comissão da Verdade e militares que comemoravam o aniversário do movimento de 1964 no Clube Militar, no Rio de Janeiro. "Este clube se transformou numa trincheira de defesa de torturadores que não podem ser confundidos com o Exército brasileiro".

Emocionada, a viúva de Apolonio, Reneé France de Carvalho, agradeceu as homenagens, oportunas "neste momento em que ressurge um movimento de protesto tão justo". Ao seu lado, o filho Raul disse que o pai viveu coerentemente com seu ideal político. "Ele se entusiasmava muito com seu papel de organizador. Não queria adeptos, queria construir militantes, pessoas críticas e esperançosas", concluiu.

Também participaram da sessão solene a historiadora Marly de Almeida Gomes e o advogado e artista Idibal Pivetta.



Palavras do 1º secretário

"Apolônio me inspirou a gostar da liberdade, porque a vida dele pode ser resumida nisso. Foi uma pessoa que sempre lutou pela liberdade. E a liberdade traz junto com ela a ideia de igualdade, fraternidade, solidariedade. Essas coisas aprendi com Apolônio", disse o deputado Rui Falcão, 1º secretário da Assembleia Legislativa e presidente nacional PT na homenagem aos cem anos de Apolônio de Carvalho, nesta segunda-feira, 2/4.

"Corriam os anos 1969 e nós, que éramos militantes do Partido Comunista, impactados pelo golpe de 1964, nos reunimos fazendo uma crítica daquele período e buscando novos caminhos. Cada um de nós seguiu caminhos diferentes naquele momento, apesar de termos os mesmos objetivos. Apolônio foi fundar o PCBR e eu fui para a Colina, depois para a Var-Palmares e todos nos encontramos no Partido dos Trabalhadores", prosseguiu.

Para Falcão, Apolônio era uma pessoa que trazia um imenso cabedal teórico, uma vida de luta e de exemplos para quem ansiava por liberdade. "Apolônio lutava pela unidade de dentro do PT e contribuiu para termos um partido que falasse com as massas populares, que reunisse as pessoas, que a revolução não fosse vista como um golpe de mão, mas como um processo social envolvendo as maiorias", acrescentou.

"É importante lembrar que Apolônio não só lutou contra a ditadura e o fascismo. Lutou também contra o capitalismo, porque defendia uma sociedade pautada pelo fim da exploração e opressão e que a busca incessante do lucro não fosse o móvel principal da relação entre homens e mulheres", disse.

Falcão lembrou durante a homenagem que Renné France de Carvalho, esposa de Apolônio, recebeu este ano nas comemorações dos 32 anos do PT, em Brasília, um quadro com a ficha de filiação número 1 ao partido. "Ele foi o nosso primeiro filiado", lembrou Rui Falcão, para quem "Apolônio será sempre exemplo para todas as gerações".



Biografia



Vale a pena sonhar. Não poderia ser outro o título do livro de memórias de um homem que combateu a ditadura no Brasil, o franquismo na Espanha e o nazismo na França, conheceu a tortura e o exílio, mas não perdeu a capacidade de acreditar na construção de um mundo mais justo.

Apolonio de Carvalho (fevereiro 1912 - setembro 2005) nasceu em Corumbá (atual Estado do Mato Grosso do Sul) e cursou a Escola Militar do Realengo, de onde saiu como tenente em 1933. Em 1935 ingressou na Aliança Nacional Libertadora (ANL). Com a decretação da ilegalidade da ANL nesse mesmo ano, foi preso e perdeu sua patente. Solto em 1937, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro. Em seguida, viajou para a Espanha e ingressou nas Brigadas Internacionais, que combatiam o exército de Francisco Franco na Guerra Civil Espanhola (1936/1939).



Na Europa



Com a derrota dos republicanos na Espanha, Apolonio foi para um campo de internamento na França, de onde fugiu para participar do combate aos invasores nazistas. Em Marselha, ele ingressa na Resistência Francesa, em 1942, da qual se torna comandante da guerrilha dos partisans para a região sul, com sede em Lyon. É também em 1942 que conhece Renée, uma jovem militante comunista da Resistência, que se tornaria sua companheira para o resto da vida.

Em janeiro de 1944, Apolônio e Renée se instalam em Nimes, onde em fevereiro, se organiza o ataque à prisão daquela cidade, libertando 23 militantes da Resistência. Em maio, mudam-se para Toulouse. Em agosto, Apolônio comanda a liberação de Carmaux, Albi e Toulouse. Em novembro, nasce o primeiro filho do casal, René-Louis. Por sua coragem, é considerado um herói na França, onde foi condecorado com a Legião de Honra.

O fim da guerra encontra a família em Paris, de onde embarca no ano seguinte para o Rio de Janeiro. Em 1947 nasce o segundo filho do casal, Raul. Apolônio, Renée e as duas crianças passam a viver na clandestinidade, militando entre Rio e São Paulo até 1953, quando ele parte para um curso na União Soviética que dura cerca de quatro anos. Em 1955, Renée o encontra em Moscou e, em 1957, a família está de volta ao Brasil, vivendo na semi-legalidade, situação que se estende até o golpe militar de 1964.



PCBR



Na década de 1960, participou da oposição popular ao regime militar. Logo após o golpe de 31 de março de 1964, Apolônio passa a viver em profunda clandestinidade no Estado do Rio de Janeiro, longe da família. Em consequência das divergências com o Comitê Central do Partido Comunista (do qual era membro), Apolônio e a Corrente Revolucionária do Estado do Rio deixam o PCB, em 1967. Em abril do ano seguinte, juntamente com Mário Alves, Jacob Gorender e outros dissidentes, Apolônio funda o PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário).

Em janeiro de 1970, no bojo de quedas que atingiram dezenas de militantes do PCBR, Apolônio e Mário Alves são presos no Rio, e Jacob Gorender em São Paulo. Todos são violentamente torturados e Mário Alves, assassinado. Em fevereiro, os filhos Raul e René-Louis também são presos.

Em junho, Apolônio e outros 39 presos políticos brasileiros chegam a Argel, trocados pelo embaixador alemão, sequestrado por um comando revolucionário no Rio de Janeiro. René-Louis será libertado em 1971, trocado (juntamente com 69 outros presos políticos) pelo embaixador da Suíça. Raul sai da prisão no ano seguinte. Depois disso, Renée deixa o Brasil e a família se reúne em Paris.

Durante os anos que teve de ficar fora das terras brasileiras, Apolônio manteve contato com o Brasil e se articulou com os exilados no exterior. A volta ao Brasil será em outubro de 1979, depois da Anistia, em agosto daquele ano.



Anistia



No fim dos anos 1970, Apolônio aproximou-se dos grupos que então trabalhavam para criar o PT, tornando-se um de seus fundadores. "Nós tivemos uma imensa simpatia pelo PT", disse ele. "Em fevereiro de 1980, quando se lança (o partido) oficialmente, vemos o primeiro partido de esquerda em todo o século que pleiteia, como um de seus traços essenciais, a conquista da legalidade".

Permanece na direção do novo partido até 1987, quando se afasta por orientação médica.

Apesar das limitações da saúde e da idade, Apolônio prossegue como um militante que não se furtará jamais aos debates e à manifestação pública de suas posições de socialista convicto. Um socialista que soube combater criticamente as distorções do socialismo real mas que, nem por isto (ou por isto mesmo), a queda do muro de Berlim ou o diversionismo das teorias propagadas pelo capital conseguiram dobrar.

Entusiasta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao qual sempre prestou apoio e junto ao qual esteve sempre presente, frente ao que não abriu mão da crítica ou da esperança. Para ele, um novo mundo (socialista) era sempre possível e poderá estar sempre ao alcance de nossas mãos, desde que estejamos dispostos a nos organizar e a lutar por ele.

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