Nesta quarta-feira, 15/5, na Assembleia Legislativa, por iniciativa da deputada Beth Sahão (PT), foi realizada a audiência pública Muito além da maioridade penal - Desafios para a construção de políticas efetivas de prevenção e enfrentamento à violência entre crianças e adolescentes. A deputada enfatizou a necessidade de que este debate seja realizado de forma aprofundada e responsável, evitando que paixões despertadas por episódios isolados influenciem decisões primordiais para o futuro do país. Dados demonstram que apenas 0,09% dos 60 milhões de jovens menores de 18 anos no Brasil cumprem algum tipo de medida socioeducativa e, destes, apenas 0,9% respondem por latrocínio. "Uma parcela insignificante dos crimes é cometida por adolescentes", disse Beth Sahão. Números mostram também que a maioria dos adolescentes infratores deixou a escola por volta dos 14 anos e 90% dos adolescentes infratores do país não conseguiram concluir sequer o ensino fundamental. Por dia, em média, são reportados ao disque denúncia (Disque 100) 129 casos de violência psicológica e física, incluindo a sexual, e negligência a crianças e adolescentes. Foram vítimas de maus-tratos e agressões em 2012 cerca de 120 mil crianças e adolescentes e mais de 8.600 foram assassinados no ano de 2010. Os dados mostram que menos de 3% dos suspeitos de terem cometido violência contra crianças e adolescentes tinham entre 12 e 18 anos. Dom Milton Kenan Júnior, bispo auxiliar da Arquidiocese de São Paulo, vigário episcopal da Brasilândia e membro da Comissão para o Laicato da CNBB, destacou a dívida que a nação brasileira tem com milhões de jovens a adolescentes que vivem em condições precárias, sem educação, lazer, segurança, moradia digna, ficando à mercê do crime e do tráfico. "Estas são as primeiras vítimas de uma sociedade extremamente violenta; estes jovens clamam por justiça e por um novo ordenamento social", declarou, acrescentando que a redução da maioridade penal penaliza ainda mais os adolescentes, sobretudo os mais pobres. "Não se trata de criminalizar, mas de educar; não se trata de encarcerar, mas de reintegrar", concluiu. Padre Júlio Lancellotti, monsenhor e pároco da Igreja São Miguel Arcanjo da Mooca e vigário episcopal para o Povo da Rua, lembrou que não se trata de sermos insensíveis à dor das famílias em que jovens sofreram violência e que não se está pregando a impunidade ou a indiferença, mas se trata, sim, de garantir que o Estatuto da Criança e do Adolescente seja efetivamente colocado em prática. Para tanto, propõe que o ECA seja distribuído a todos os adolescentes e educadores, para que seus direitos e deveres sejam conhecidos e debatidos. Para padre Júlio, é fundamental que haja uma complexa rede de atendimento à criança e ao adolescente e que o educador seja capacitado para a mediação de conflitos. Em sua opinião, a redução da maioridade penal é busca desesperada por uma solução rápida, que, de fato, não resolve e ainda torna mais grave o problema da violência. Razões A psicóloga Rosário Ferreira citou dez razões contra a redução da maioridade penal. Entre elas, a necessidade de enfatizar a educação na medida em que a adolescência é uma fase de grandes transformações e a importância da não segregação da juventude, pois se trata de um momento crucial para a constituição subjetiva. "O que temos hoje é o resultado de um processo histórico de exclusão, desigualdade, violências e vulnerabilidade. Do ponto de vista da psicologia, precisamos cuidar de todos os sujeitos implicados em situações de violência, e também dos agressores, para que sejam ressocializados", declarou a psicóloga. O coordenador do Sistema Nacional de Medidas Sócio-Educativas (Sinase), Claudio Augusto Vieira da Silva, enfatizou que o governo federal reafirma sua contrariedade a qualquer proposta de rebaixamento da maioridade penal, mas revelou sua preocupação quanto à posição do Congresso. Claudio Vieira também trouxe dados que demonstram ser insignificante o índice de adolescentes que deram entrada na Fundação Casa por homicídio. O coordenador do Sinase informou que o governo pretende implantar a Escola Nacional de Sócio-Educação no país. "Temos a obrigação de manter o sistema socioeducativo no Brasil, sucateado nos últimos 23 anos. É preciso profissionais formados para isso. A tentativa de reduzir a maioridade penal é o mesmo que dizer: vamos prender nossos jovens pretos e pobres". O advogado Ariel de Castro Alves, integrante do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, também trouxe dados que negam a afirmação de que adolescentes sejam responsáveis pela violência no país, lembrando que "não cabe ao Estado e à sociedade civil organizada serem vingativos". Rogério Sotilli, secretário municipal dos Direitos Humanos, representando o prefeito Fernando Haddad, parabenizou a deputada Sahão pela iniciativa do debate, destacando a necessidade de que políticas públicas sejam implementadas de forma a proporcionar à criança e ao adolescente condições de desenvolvimento saudável. A redução da maioridade penal, a seu ver, é medida ineficaz e injusta. Os deputados Edinho Silva, Enio Tatto, Luiz Claudio Marcolino, Adriano Diogo, Marco Aurélio de Souza, Marcos Martins, Antonio Mentor, João Paulo Rillo, Alencar Santana e Telma de Souza, do PT, compareceram ao debate e criticaram a iniciativa do governador Geraldo Alckmin de levar ao Congresso Nacional projeto que prevê o aumento da reclusão de jovens infratores. Para eles, trata-se de medida que visa colocar uma cortina de fumaça para encobrir os reais problemas da segurança pública no Estado de São Paulo. Participaram também do debate a deputada Leci Brandão (PCdoB), além de prefeitos e vice-prefeitos do Estado de São Paulo, secretários municipais, vereadores, integrantes de conselhos tutelares, profissionais da área de assistência social e psicologia, e jovens de escolas estaduais.