Frente parlamentar ajudou a colocar tema bullying na pauta de discussão, afirma coordenadora

Kits contra a prática nas escolas paulistas foi anunciado pelo Executivo em maio
13/08/2013 20:34 | Da Redação

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A Secretaria da Educação do Estado anunciou, em 15/5 último, o início de uma mobilização para que os 4,2 milhões de alunos da rede estadual firmem um compromisso para prevenir e combater ofensas e agressões no ambiente escolar. Trata-se do enfrentamento do chamado bullying, termo de origem inglesa e sem tradução ainda no Brasil utilizado para qualificar um tipo específico de comportamento agressivo no âmbito escolar, caracterizado pela desigualdade entre agressor e agredido, que, sem poder se defender, acaba se submetendo ao poder do outro.

A ação da secretaria faz parte da campanha Bullying - Curta outra Ideia, lançada pelo governo do Estado em 12/6/2012, quando também se anunciou a parceria com a iniciativa Chega de Bullying: Não Fique Calado, do Facebook e do canal Cartoon Network. Dessa parceria, nasceram ainda os kits que serão usados em escolas da América Latina para a prevenção e combate ao bullying e que, em São Paulo, começarão a ser distribuído às escolas até o início do próximo ano.

Para a deputada Regina Gonçalves (PV), coordenadora da Frente Parlamentar Contra o Bullying e Outras Violências nas Escolas, a medida do governo é altamente positiva e está em sintonia com o trabalho desenvolvido pela frente. "Nós já apontávamos para a necessidade de a Secretaria da Educação enfrentar o problema de forma leve, que pudesse fazer com que os alunos se sentissem parte do processo de reeducação e socialização dentro das escolas", explicou a parlamentar.

De acordo com a deputada, nas várias visitas que fez a escolas públicas de quase todas as regiões do Estado, encontrou muitas ações importantes para o combate ao bullying. "Esse trabalho, no entanto, era desenvolvido de forma isolada por uma professora, numa determinada escola, e não como um programa de governo. Eram vivências riquíssimas que tinham em comum o objetivo de encontrar soluções para a socialização e para o problema que atinge percentual significativo dos nossos alunos, não só nas escolas públicas". A coordenadora da frente relatou essas experiências ao secretário Herman Voorwald, que se mostrou, segundo ela, bastante sensível às preocupações, a partir das quais se estabeleceu um diálogo maior entre o Executivo e Legislativo tendo em vista o enfrentamento da questão.

"Entendo, portanto, que o trabalho da Frente Parlamentar Contra o Bullying contribuiu para que hoje pudéssemos ter esse programa específico para a prevenção das agressões nas escolas", afirmou a deputada, que se manifestou bastante satisfeita com o fato de a frente ter ajudado a trazer para a pauta de discussão o assunto que agora é objeto de um programa da governo do Estado.

Frente parlamentar

A frente foi lançada em 23/5/2012. O evento contou com a presença da professora Deisi Romano, então supervisora do Sistema de Proteção e Cidadania da Secretaria Estadual de Educação; do promotor de Justiça Criminal de São Paulo José Carlos Blat; da diretora da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Edimara de Lima; da então professora da Escola Estadual Alberto Levy, Sarah Realti, e dos deputados Heroilma Tavares (PTB), que é pedagoga e vice-coordenadora da frente, e do deputado Ulysses Tassinari (PV), médico. Também participaram alunos, professores e monitores de escolas de São Paulo e de Diadema.

Foi também relatada a experiência da Escola Estadual Professor Alberto Levy, localizada no bairro da Barra Funda, na capital. A professora Sarah Realti destacou o trabalho feito pela organização não-governamental Makanudos de Javeh, que produziu um vídeo com relatos de bullying que é usado na Alberto Levy e foi exibido no início do evento de lançamento da frente.

Segundo Regina Gonçalves, a frente deverá realizar no meio do segundo semestre um novo encontro, quando poderá ser feita uma avaliação das medidas implementadas pela secretaria de Educação.

Na ordem do dia

Diversos projetos sobre o tema já foram apresentados à Assembleia Legislativa. Destacamos aqui os que já foram apreciados pelas comissões permanentes e se encontram prontos para ser inserido na ordem do dia.

Dois desses projetos foram apresentados em 2008, ambos pelo deputado Carlos Giannazi (PSOL). O primeiro (PL 757/2008) autoriza o Poder Executivo a criar o Programa de Defesa do Magistério contra a Violência e o segundo (PL 758/2008), também autorizativo, trata da criação pelo Poder Executivo nas unidades escolares da Secretaria Estadual de Educação de um grupo de estudos e ação contra a violência.

Um programa de combate ao bullying nas escolas públicas e privadas do Estado de São Paulo está previsto no PL 1.135/2009, de autoria do deputado Antonio Mentor (PT). Já o PL 424/2011, do deputado Enio Tatto (PT), institui a Semana de Combate e Prevenção ao Assédio Escolar (bullying) no Estado.

Código Penal

As agressões no ambiente escolar foram levadas também para o debate no interior da reforma do Código Penal Brasileiro. O projeto de lei que hoje tramita no Senado Federal (PLs 236/2012) tipifica como crime a prática de bullying, passando a defini-la como "intimidação vexatória". No entendimento da comissão de juristas que redigiu anteprojeto do novo Código, o autor da prática, sendo menor de idade, deverá receber medidas socioeducativas estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, como prestação de serviços, acompanhamento e internação. Quando o autor for maior de idade, poderá ser punido com pena de até quatro anos de prisão.

A questão tem provocado polêmica entre educadores, especialistas e legisladores. Num encontro realizado em Brasília, em março deste ano, organizações da área da criança e do adolescente defenderam que a proposta seja retirada do texto do novo Código Penal.

Para a deputada Regina Gonçalves, a decisão dos juristas é louvável apenas pelo fato de a existência do problema ser finalmente reconhecida.

Segundo a parlamentar, é preciso entender que e a intervenção no problema passa pela responsabilidade da família na socialização da criança; da escola nas ações de prevenção e capacitação de profissionais, além de proteção às vítimas; e do Poder Público no grantia dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Onde encontrar os kits

De acordo com a Secretaria estadual da Educação, o conteúdo dos kits contra o bullying foi elaborado com o auxílio de especialistas no assunto, entre eles a educadora brasileira Cléo Fante. Participaram do processo também a Secretaria de Educação da Cidade do México, a Organização dos Estados Iberoamericanos para a Educação, Ciência e Cultura (OEI) e as ONGs Plan International e Visão Mundial.

O kit e compromisso para prevenir e combater ofensas e agressões no ambiente escolar estão disponíveis no site http://www.chegadebullying.com.br/ e pode ser lido no portal da Secretaria da Educação, em formato de livro virtual.

O que é o bullying

De acordo com cartilha elaborada pelo Conselho Nacional de Justiça, no bullying os atos de violência, física ou não, ocorrem de forma intencional e repetitiva contra um ou mais alunos que se encontram impossibilitados de fazer frente às agressões sofridas. Tais comportamentos não apresentam motivações específicas ou justificáveis. Em última instância, significa dizer que, de forma "natural", os mais fortes utilizam os mais frágeis como meros objetos de diversão, prazer e poder, com o intuito de maltratar, intimidar, humilhar e amedrontar suas vítimas.

A cartilha ainda relaciona as formas de bullying, que podem ser: ver verbal " insultar, ofender, falar mal, colocar apelidos pejorativos, "zoar"; física e material " bater, empurrar, beliscar, roubar, furtar ou destruir pertences da vítima; psicológica e moral " humilhar, excluir, discriminar, chantagear, intimidar, difamar; sexual " abusar, violentar, assediar, insinuar; virtual ou ciberbullying, por meio de ferramentas tecnológicas como celulares, filmadoras, internet etc.

Ainda segundo a cartilha, estudos revelam um pequeno predomínio dos meninos sobre as meninas. Há, no entanto, que se considerar que, por serem mais agressivos e utilizarem a força física, as atitudes dos meninos são mais visíveis. Já as meninas costumam praticar bullying mais na base de intrigas, fofocas e isolamento das colegas. Podem, com isso, passar despercebidas, tanto na escola quanto no ambiente doméstico.

O bullying em outros países

Diversos países do mundo vêm traçando estratégias para reduzir a agressividade no ambiente escolar. O jornal Zero Hora relacionou os casos considerados mais significativos:

Portugal

Um estudo indica que 23% das crianças sofrem bullying duas ou três vezes por mês. A Procuradoria-geral da República de Portugal pretende definir o bullying como um crime específico de violência escolar previsto no Código Penal do país. Com isso, passaria a ter um enquadramento penal diferente do que costuma ser aplicado a casos de violência em geral. Além disso, a denúncia de agressões no âmbito escolar passaria a ser obrigatória por parte dos diretores das escolas. A proposta foi encaminhada no final de março para os ministérios da Justiça e da Educação.

Noruega

As pesquisas sobre os efeitos nocivos do bullying tiveram impulso, no final dos anos 70, graças ao trabalho de estudiosos como o pioneiro Dan Olweus. Ele desenvolveu um questionário capaz de identificar e quantificar os casos de hostilidade entre colegas e permitiu vincular casos de suicídio juvenil com a perseguição sistemática sofrida no ambiente escolar. A Noruega foi um dos primeiros países a lançar um programa nacional antibullying. Ele prevê a adoção de regras de convívio, formação de comitês escolares, treinamento de professores e apoio às vítimas.

Espanha

Recentemente, uma equipe de pesquisadores da Universidade Complutense de Madri desenvolveu um método aplicado, segundo os responsáveis, com sucesso em escolas espanholas. Utiliza-se um programa de computador em que os alunos identificam, de forma anônima, os colegas de que gostam ou não na turma. Assim, os educadores conseguem descobrir problemas de relacionamento e agir de forma preventiva, antes que o bullying ocorra.

Canadá

Cerca de 10% a 15% dos estudantes secundários afirmam serem vítimas de violência física ou psicológica ao menos uma vez por semana. O país investe em pesquisa e campanhas de prevenção por meio do Centro Nacional de Prevenção ao Crime. Projetos recebem financiamento a fim de desenvolver ações antiviolência, seja em uma ou poucas escolas, seja com amplitude nacional.

Finlândia

A Finlândia é um dos poucos países que já especificou, por meio de lei, esse tipo de violência escolar. Quando a intimidação é promovida de forma persistente e intencional " características fundamentais do bullying ", o agressor pode ser punido com penas que vão desde o pagamento de multa até restrição de liberdade. As escolas onde os atos de violência são registrados, caso não tenham se empenhado em preveni-los, ficam sujeitas a processos judiciais por negligência.

Estados Unidos

Nos Estados Unidos, muitos casos de reações violentas de alunos estão ligadas a histórico de bullying, como o notório massacre de Columbine, em 1999. Como reação aos casos de perseguição escolar, a maior parte dos Estados norte-americanos já aprovou leis para coibir esse tipo de violência e que obrigam as escolas a adotar planos de prevenção e medidas disciplinares para combater as ações de intimidação. A prevenção ao bullying também costuma fazer parte do currículo dos alunos.

República Checa

Após três episódios dramáticos registrados em 1999, em que uma criança atirou em si mesma, outra teve um colapso nervoso e uma terceira foi ameaçada de afogamento por colegas, o governo checo lançou um projeto piloto para combater o bullying. Colocado em prática em 2002 e 2003, o programa levou à constatação de que uma abordagem ampla " incluindo treinamento de todo o pessoal escolar, educação das famílias, ação conjunta da polícia e de conselhos locais e supervisão das atividades " é capaz de reduzir em até 75% os casos de violência.

alesp