Relatos de casos de membros do PCR emocionam na Comissão da Verdade

Depoimentos mostram que real causa das mortes foi alterada
06/09/2013 20:21 | Da Redação - Sillene Coquetti - Foto: Yara Lopes

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Edival Nunes Cajá, Adriano Diogo e José NIvaldo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2013/fg129484.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Público acompanha relatos na Comissão da Verdade<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2013/fg129486.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Vivian Mendes, Rafael Martinelli, Edival Nunes Cajá, Adriano Diogo, José Nivaldo, Amélia Teles, Fernando Oliveira, Wanderson Pinheiro<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2013/fg129487.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

A Comissão Estadual da Verdade discutiu nesta sexta-feira, 6/9, os casos dos militantes do Partido Comunista Revolucionário (PCR), Emmanuel Bezerra dos Santos e Manoel Lisboa de Moura, mortos por agentes repressores da ditadura militar. Presidida pelo deputado Adriano Diogo (PT), a reunião elucidou detalhes da passagem dos presos pelo Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi).

O professor de história e ex-preso político, José Nivaldo Jr., contou ter sido preso na mesma época do militante Manoel Lisboa e descreveu em detalhes a cena que, mesmo depois de tantos anos, não sai de sua cabeça. "Não posso imaginar um ser humano deformado daquele jeito, estava todo retalhado. Os pés e as mãos descarnados, o ventre aberto e o rosto desfigurado", relatou.

Preso no DOI-Codi do Recife, dentro do 4° Exército, José Nivaldo, ao voltar para sua cela, teve o capuz tirado por seu algoz para que visse o estado do companheiro de cela, lavado em sangue, em situação praticamente indescritível. Para ele, após ver a situação do militante Manoel, era impossível imaginá-lo de pé, quanto mais ter participado de uma troca de tiros com a polícia de São Paulo. Segundo documentos do DOPS/SP, a versão oficial traz como causa da morte ferimentos causados por tiroteio entre subversivos e policiais. Na ocasião, Manoel Lisboa e Emmanuel Bezerra não teriam resistido aos "ferimentos ocasionados no tiroteio" em São Paulo, mas foram sequestrados por agentes policiais em Recife.

Preso e torturado com choque elétrico na língua, pênis e pés molhados, além dos espancamentos, José Nivaldo disse que sobreviveu porque seu pai, médico influente, gritou aos quatro cantos acerca de seu sequestro. "Isso me manteve vivo", afirmou. Sua história pode ser encontrada no livro Pesadelo: rememorando uma prisão política, de sua autoria.

Carrasco em Olinda

"Um carrasco pisou no solo de Olinda" - em alusão ao ex-presidente da República Emílio Garrastazu Médici - era o título do panfleto entregue pelo PCR à população. Com medo de serem pegos, os membros inventaram o panfleto bomba (os panfletos eram colocados dentro de uma lata que, com pólvora, explodia e fazia chover panfletos), que alcançava um maior número de pessoas.

Em 1978, o sociólogo Edival Nunes Cajá foi preso e torturado, mas não delatou ninguém. Ele disse que os torturadores faziam questão de contar como os militantes iriam morrer. "Fizeram isso com Manoel e depois queimaram a pele dele com velas, após várias sessões de torturas."

Segundo Cajá, somente os depoimentos dos sobreviventes podem trazer à luz o que aconteceu com os companheiros que enfrentaram a sala de tortura e não sobreviveram. Diante disto, parabenizou o trabalho da Comissão da Verdade e defendeu as investigações de todos os órgãos de repressão - Oban, Operação Condor, entre outros - além de responsabilizar órgãos que agiram dentro e fora do país. Para ele, não era viável para os EUA o Brasil ter um presidente como Jango, que pregava a reforma agrária. "O corte abrupto (golpe militar) não foi por acaso e sim para incorporar o mercado interno brasileiro aos EUA." Assim, surgiram os movimentos de luta armada, "para tomar de volta o que era de direito, um país livre e democrático".

Colar da morte

Emmanoel Bezerra também foi brutalmente torturado, sem nada declarar. "Ele teve seu órgão genital cortado e o umbigo puxado para fora: usou o colar da morte", afirmou Cajá. Emmanoel voltaria a Pernambuco, vindo do Chile, em 15 de setembro, mas no dia 4 de setembro foi encontrado em São Paulo, tendo os órgãos de repressão declarado que ele foi morto em tiroteio com a polícia, junto com Manoel Lisboa. No entanto, Cajá acredita que ele foi levado para São Paulo depois de morto.

Para o fundador e dirigente da ALN (Ação Libertadora Nacional), Rafael Martinelli, Pernambuco foi um dos estados mais violentos na repressão. "A Comissão da Verdade tem que contar a história das torturas em âmbito nacional, principalmente, para os jovens."

alesp