Depoimentos revelam facetas da imprensa de resistência na Comissão da Verdade

Foco foi imprensa alternativa, estudantil, feminina e de resistência fora do país
03/10/2013 20:15 | Monica Ferrero " Foto: Roberto Navarro

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Igor Fuser e Amélinha Teles<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg130660.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Mylton Severiano e Adriano Diogo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg130661.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Anivaldo Padilha e José Luiz Del Royo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg130662.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Comissão da Verdade<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-10-2013/fg130663.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Na continuação do ciclo a Imprensa de resistência à ditadura, a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, em sua 81ª audiência pública, ouviu depoimentos sobre a imprensa alternativa, estudantil, feminina e de resistência fora do Brasil. Os convidados ouvidos foram Mylton Severiano, Rachel Moreno, José Luiz Del Royo, Anivaldo Padilha e Igor Fuser.

"Participei de um dos 150 grupos de jornalistas que resolveu, durante a ditadura, fazer jornalismo com as próprias mãos, pois nos grandes veículos a censura não permitia", disse Mylton Severiano. Sua primeira experiência foi no Bondinho, que era um jornal que falava de comportamento, e que "protestava contra aquele estado das coisas indiretamente, sem falar de política", contou.

Severiano deu destaque, porém, à sua participação no jornal Ex-, que "fazia jornalismo de peso, mas usava uma linguagem um pouco cifrada, pois tudo era dito nas entrelinhas". Foi fundado por grupo de jornalistas oriundo da revista Realidade, em 1973, tinha tiragem entre 18 a 20 mil exemplares e grandes problemas financeiros, que afetavam sua periodicidade.

Sua reportagem mais notável, no número 16, foi sobre a morte de Vladimir Herzog, com o título "Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós", e teve a participação de dez jornalistas voluntários que trabalhavam na grande imprensa. Foi a última edição do jornal, que chegou a 50 mil exemplares vendidos, pois a nº 17 foi apreendida.

Tentaram relançar as matérias sob o nome de +1, mas Severiano e outros jornalistas acabaram presos. Finalizando, ele disse que "o Ex- foi um "devezenquandanário" que arrostou a ditadura, e foi por ela fechado".

Da creche à política

Em 1974, houve entre as estudantes da USP um movimento pela criação de creches para seus filhos, que foi divulgado pelo Jornal da Tarde e acabou vitorioso. Essa divulgação fez com que o grupo fosse procurado por mulheres da periferia, que tinham o mesmo problema, contou Rachel Moreno.

Para congregar as mulheres, foi lançado em 1978 o jornal Nós Mulheres. A publicação abordava a questão de gênero, direitos reprodutivos e sexualidade, a realidade das mulheres, as condições de trabalho. Também lutou pela anistia e pelas liberdades democráticas. Isso levou a outras atividades, como a organização do Congresso da Mulher Metalúrgica no ABC. Raquel lembrou, inclusive, que a grande greve dos metalúrgicos começou numa fábrica onde as operárias eram mulheres.

Resistência no exílio

A imprensa do exílio é muito pouco conhecida, embora tenham existido quase cem títulos. O primeiro, Boletim Brasileiro de Informação, foi lançado em Santiago, Chile, já em março de 1964, disse José Luiz Del Royo.

Esses jornais surgiram pois os cerca de 10 mil exilados procuravam divulgar notícias do Brasil e também denunciar a ditadura em jornais locais através de reportagens e em publicações na língua local.

Segundo Del Royo, que citou o nome de algumas das publicações, a maior dificuldade era a obtenção de notícias. Um dos meios era obter de funcionários de aeroportos que recebiam aviões da Varig os jornais lidos no voo. Também os jornais abordavam questões ideológicas, servindo de debate entre as correntes políticas.

Experiência nos EUA

Anivaldo Padilha disse que foi preso e torturado em 1970, e conseguiu fugir para o Chile. Mas, como era ligado à esquerda protestante brasileira, foi convidado para ir aos Estados Unidos, onde chegou em 1971.

A maior dificuldade era a total ignorância não só sobre o Brasil, mas também sobre a situação política, continuou Padilha. Para conseguir apoio à luta democrática, com apoio das igrejas protestantes, que eram os canais para a divulgação de causas sociais, foram lançados diversos boletins em inglês.

Eram divulgadas as prisões e torturas, e houve edição "desmontando" o chamado "milagre" brasileiro. Houve grande repercussão uma edição sobre o genocídio indígena na rota da Transamazônica, que estava em construção. Para obter informações, Padilha contou ter uma rede de pessoas que mandava semanalmente recortes de jornais pelo correio.



Jornal estudantil

A história do jornal Cobra de Vidro foi contada por Igor Fuser. O jornal, de distribuição gratuita, era escrito por estudantes e publicado por centros acadêmicos das "faculdades isoladas de São Paulo", ou seja, as que não pertenciam a universidades, como FGV, FEI e Cásper Libero.

Fuser destacou que o Cobra de Vidro teve sua primeira edição lançada em fins de 1975. Tinha um duplo caráter de resistência à ditadura e de conscientização política, refletindo ainda as mudanças de orientação política das entidades estudantis. Durou até 1978, quando houve a reorganização da União Estadual dos Estudantes (UEE),

O presidente da Comissão da Verdade, Adriano Diogo (PT), leu carta de José Luiz Del Royo pedindo a inclusão do nome de sua ex-mulher Isis Dias de Oliveira, desaparecida desde janeiro de 1972, na lista de atestados de óbito a serem retificados.

alesp